CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE DIREITO AS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.441/2007 E SUAS PECULIARIDADES COMO FORMA ALTERNATIVA DE ACESSO À JUSTIÇA Tatiani Calderaro Dalcin Lajeado, junho de 2009 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 1 CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE DIREITO AS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.441/2007 E SUAS PECULIARIDADES COMO FORMA ALTERNATIVA DE ACESSO À JUSTIÇA Tatiani Calderaro Dalcin Monografia apresentada ao Curso de Direito, do Centro Universitário UNIVATES, como exigência para a obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª. Ms. Bianca Corbellini Bertani. Lajeado, junho de 2009. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 2 AGRADECIMENTO A Deus, primeiramente, a quem com grande emoção agradeço por tudo... Aos meus queridos pais, Luiz Fernando e Carla, não só pelo apoio financeiro, mas por sempre acreditarem que é importante estudar, e me convencerem disso... A vocês que me deram a vida, que me dedicaram incontáveis esforços e amor infinito. Que muitas vezes abdicaram de seus sonhos em favor dos nossos (meu e das gurias). Todo o meu agradecimento pela dedicação de vocês, pelo amor que me fez mais forte, fazendo-me entender que sou capaz de ir mais além... Às minhas queridas irmãs Katiússia, Vanessa e Karine, pelo carinho e força que me dão, por estarmos sempre juntas nos momentos mais importantes, por "contar" com vocês. P.S: Esqueci de agradecer à Karine, por ceder “espontaneamente” o computador na hora em que eu precisava escrever a minha mono e, que mesmo com sua pouca idade, corria para “segurar” o ônibus quando eu me atrasava... Ao meu “eterno namorado” Maurício, por estar sempre ao meu lado quando eu precisei, por me “agüentar”. A ti, que foi não apenas namorado, mas acima de tudo, amigo e companheiro. De nada me adiantaria as vitórias, se não tivesse com quem partilhar… Ao meu querido avô e mestre Gilberto, pelo carinho, exemplo de vida, fonte de admiração e respeito: minha inspiração! Meus objetivos profissionais serão atingidos no dia em que me compararem a ti (que pretensão a minha, hein...) À minha querida avó Neuza, “mãe com açúcar”: por todo o carinho, por ter sido peça fundamental, ajudando a formar e manter o meu caráter, que sempre acreditou em mim, quando eu mesma duvidava... B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 3 Ao meu querido avô Odilo, pelo carinho que tem por mim, pela preocupação, pois mesmo quando eu não “entendia” o que ele falava, sabia que tinha algum fundamento. Agradeço por nunca ter me negado um ensinamento ou uma palavra de apoio... À minha avó Alda (In Memoriam) de quem sinto falta, pois sou humana. Ninguém pode me culpar por querer partilhar minha conquista com as pessoas que amo, muito embora nem sempre elas estejam presentes. Mas, do alto de onde está, está comigo, sempre esteve. Disso nunca duvidei... Aos meus tios, tias, primos, primas, dindos, dindas, afilhado, afilhada, cunhados, co- cunhada, sogro, sogra, por estarem sempre presentes na minha vida, dando força e coragem, pelo carinho e companheirismo, pela acolhida recebida em suas casas que pude considerar o prolongamento da minha própria ... Ao Oficial Rogério Brochado, por ter me convidado a “entrar” na área Notarial e Registral, e com quem aprendi muito do pouco que sei... Ao Oficial Alexsander Jost, por permitir que eu continuasse aprendendo cada vez mais, sempre compartilhando o seu conhecimento. Agradeço pelo empréstimo dos livros, que muito contribuíram para a conclusão deste trabalho, pela compreensão do meu “cansaço e stress” – por vezes “estampado” no meu rosto, neste último ano de faculdade – pelo apoio, pelas boas conversas... Aos meus amigos, a todos, sem exceção, que tiveram um papel fundamental naquilo que conquistei, pois sem medir esforços, sem titubear, me ajudaram, me ouvindo, me socorrendo mesmo quando nem pedia, e muitas vezes apenas estando presentes nos momentos mais difíceis... Aos meus colegas, com os quais passei inúmeras noites na UNIVATES, às vezes em sala de aula, outras no centro de convivência (o famoso prédio “9”), muitas no restaurante (he, he); criamos laços e muitos deles indissociáveis, feitos no dia em que nos encontramos nessa instituição, e que se perpetuarão com certeza. A vocês, obrigada. Aos professores, que foram reais tutores em seu papel e souberam encontrar o melhor momento para mostrar o Direito como realmente é... Por fim, um agradecimento todo especial à minha orientadora, professora Bianca Corbellini Bertani, por acreditar em mim e aceitar acompanhar-me na elaboração do presente trabalho. Por sua imensa dedicação e pela segurança transmitida durante a orientação...ah, e B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 4 por responder tão rapidamente os e-mails com os ajustes finais da mono... Tenho grande admiração e respeito por teu trabalho como professora e advogada. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 5 "A justiça atrasada não é justiça; senão injustiça qualificada e manifesta". (Rui Barbosa) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 6 RESUMO O ordenamento jurídico há muito reclama por procedimentos que sejam céleres e contribuam para desafogar o judiciário. Este trabalho tem como escopo mostrar as alterações que a Lei 11.441 de 04 de Janeiro de 2007, introduziu no ordenamento jurídico, a qual é de grande relevância social, pois altera dispositivos do Código de Processo Civil, possibilitando a realização de inventário, partilha, separação consensual e divórcio consensual por via administrativa – desde que observadas as condições expressas na nova lei – procedimentos anteriormente determinados somente pelas vias judiciais. Nesse sentido, fez-se uma análise sobre a exigência desse tipo de legislação, que faculta a utilização da via extrajudicial – no caso em tela, especificamente no que tange a realização dos referidos atos junto ao tabelionato de notas, na realização de escrituras públicas – além de reavaliar a competência-chave do Judiciário. Procurou-se analisar se a medida atingiu os objetivos a que se propôs: agilizar, simplificar e reduzir custos no atendimento à população, além do descongestionar o Judiciário. Este humilde trabalho não tem a pretensão de esgotar o tema, mas busca expor um novo olhar sobre o assunto, esperando poder ajudar, de alguma forma, nesse perene mister. Palavras-chave: separação e divórcio - via administrativa - tabelionato de notas - escritura pública – celeridade – manutenção da segurança jurídica. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 7 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Apud Citado por Art. Artigo CF, CF/88 Constituição Federal Brasileira CNNR Consolidação Normativa Notarial e Registral DOU Diário Oficial da União p. página CPC Código de Processo Civil CG Corregedoria Geral CNJ Conselho Nacional de Justiça CFOAB Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil LDE Lei do Divórcio Extrajudicial OAB Ordem dos Advogados do Brasil TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo N° Número § Parágrafo B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 8 SUMÁRIO 1Considerações Iniciais..................................................................................................... 2 ACESSO À JUSTIÇA.................................................................................................... 2.1 Definição de “acesso à justiça”..................................................................................... 2.2 Acesso à justiça: conscientização em direitos fundamentais......................................... 2.3.Acesso à justiça e procedimentos extrajudiciais: a busca de soluções alternativas ...... 2.4 Formas Alternativas de Solução de Conflitos............................................................... 2.4.1 A Mediação................................................................................................................ 2.4.2 A Arbitragem.............................................................................................................. 2.4.3 A Conciliação............................................................................................................. 2.4.4 Os Procedimentos Administrativos ou Extrajudiciais................................................ 3 AS INOVAÇÕES NO ÂMBITO SOCIAL OCASIONADAS PELA LEI 11.441/07 E SEUS ASPECTOS CONTROVERTIDOS.................................................................. 3.1. A separação e o divórcio consensuais na Lei 11.441/2007: uma análise dos seus requisitos de validade e a sua facultatividade...................................................................... 3.2 A escolha do Tabelionato de Notas para lavrar a escritura .......................................... 3.3 A indicação do advogado pelo tabelião......................................................................... 3.4 A gratuidade das escrituras de separação e divórcio..................................................... 3.5 O segredo de justiça das informações constantes na escritura...................................... 3.6 Temas polêmicos e aspectos controvertidos: breves considerações.............................. 3.6.1 A possibilidade de se escriturar a conversão da separação judicial em divórcio....... 11 15 20 22 25 27 27 28 31 32 35 35 46 48 50 52 53 53 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 9 3.6.2 O restabelecimento de Sociedade Conjugal............................................................... 3.6.3 A (im)possibilidade de se escriturar a separação ou o divórcio no tabelionato de notas, quando a mulher estiver grávida: a situação do Nascituro........................................ 3.6.4 A escritura como título hábil, inclusive para a execução de alimentos nas separações e divórcios extrajudiciais................................................................................... 3.6.5 O estado civil do separado extrajudicialmente........................................................... 4 A MANUTENÇAO DA SEGURANÇA JURÍDICA DAS SENTENÇAS NOS DIVÓRCIOS E SEPARAÇÕES EFETUADOS PELA VIA ADMINISTRATIVA.... 4.1 Breves Considerações sobre a importância dos Princípios para o Direito.................... 4.2 Princípios Típicos do Direito Notarial.......................................................................... 4.2.1 Princípio da Economia............................................................................................... 4.2.2 Princípio da Forma..................................................................................................... 4.2.3 Princípio da Imediação............................................................................................... 4.2.4 Princípio da Rogação ou Instância............................................................................. 4.2.5 Princípio do Consentimento....................................................................................... 4.2.6 Princípio da Unicidade do Ato................................................................................... 4.2.7 Princípio da Matricidade ou conservação................................................................... 4.2.8 Princípio da Legalidade.............................................................................................. 4.2.9 Princípio da Comunicação ou Publicidade................................................................. 4.2.10 Outros Princípios Notariais...................................................................................... 4.3 A Manutenção da segurança jurídica das sentenças em face da presença do tabelião e do advogado...................................................................................................................... 5CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... REFERÊNCIAS................................................................................................................ ANEXOS ........................................................................................................................... 54 56 57 60 62 62 65 65 66 68 69 70 71 73 74 76 77 79 84 87 93 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 10 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Com frequência, têm sido realizadas modificações na legislação processual, com o intuito de simplificar os trâmites processuais e baratear os custos de certos atos jurídicos. De fato, somente nos últimos três anos foram editadas quase dez leis para modificar o Código de Processo Civil, sendo que uma das últimas alterações foi realizada por meio da Lei n. 11.441, publicada em 05 de janeiro de 2007. O citado diploma normativo, que nem período de vacatio legis teve, modificou o Código Civil para possibilitar a realização do inventário, da separação e do divórcio consensuais pela via administrativa. Por outras palavras: o inventário, a separação e o divórcio, que durante tantos anos demandaram para sua realização a manifestação de um magistrado, podem, agora, nos casos previstos em Lei, ser realizados por meio de escritura pública, a ser lavrada pelo tabelião. Afastou-se, portanto, a necessidade de, nos casos previstos em Lei, haver pronunciamento jurisdicional para que seja realizado o inventário ou mesmo a dissolução da sociedade conjugal ou do vínculo matrimonial. O fundamento norteador da elaboração da Lei 11.441/07 – que já vem sendo chamada de “Nova Lei de Divórcio” apesar de abranger também o inventário por sucessão e a partilha de bens – está consignado no parágrafo inicial do “Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano”, publicado no DOU em dezembro de 2004 elaborado em conjunto e assinado pelos Presidentes dos três Poderes da República. Tal Pacto, em seu parágrafo inicial, traz à tona que poucos problemas nacionais possuem tanto consenso no tocante aos diagnósticos quanto à questão judiciária. A morosidade dos processos judiciais e a baixa eficácia de suas decisões retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 11 investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e solapam a crença dos cidadãos no regime democrático. Nesse sentido, busca-se responder ao seguinte questionamento: A Lei 11.441/2007, quanto à separação e divórcio consensuais realizados na via administrativa, é uma das formas alternativas de acesso à justiça, mantendo a segurança jurídica? Assim, para realização do estudo proposto e buscando atingir os objetivos a que se propôs, foi utilizado o método dedutivo, tendo em vista a utilização de argumentos gerais acerca da identificação das alterações trazidas pela lei 11.441/2007, na agilização dos trâmites de caráter consensual, desafogamento do Judiciário e redução de custos para o cidadão. Sendo assim, ao analisar a repercussão trazida pela lei em comento, é possível mensurar o provável impacto gerado no âmbito jurídico, bem como, verificar se a Lei 11.441/2007 manteve a segurança jurídica e desburocratizou tais feitos jurídicos. A abordagem utilizada foi a investigativa, em que o tipo de pesquisa consiste no bibliográfico, uma vez que foram utilizados livros, compilações, artigos, revistas jurídicas, legislação, análise de jurisprudências, bem como, material bibliográfico encontrado na internet. Num segundo momento, chegar-se-á ao ponto específico, por meio do qual serão analisados os princípios constitucionais do “acesso à justiça”, bem como, apresentados os aspectos controvertidos da Lei 11.441/07, analisando questões polêmicas, sempre estabelecendo paralelo quanto à aplicabilidade da referida lei e as novas alterações acarretadas no Código de Processo Civil, principalmente no que tange à manutenção da segurança jurídica do mesmo. Esta monografia está dividida em três capítulos. O primeiro capítulo será destinado à necessidade de analisar o significado de “acesso à justiça”, afastando-se de pronto a idéia de que pode ser considerado apenas como o acesso aos Tribunais, ou seja, o acesso via Poder Judiciário, bem como, consolidar a efetividade do acesso à justiça como o direito fundamental. Será enfocada – mesmo com a dificuldade em se estabelecer uma definição específica do que seja a justiça propriamente dita – a conceituação do “acesso a justiça” eficaz, acessível aos que dela precisam e em condições de dar resposta imediata às demandas, ou seja, uma Justiça capaz de atender a uma sociedade em constante mudança. O item seguinte traça um panorama acerca do “acesso à justiça” como conscientização em direitos fundamentais, a partir da compreensão do direito como meio de emancipação do homem, B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 12 desenvolvendo uma consciência crítica de cidadania fundada na concretização dos direitos fundamentais. Tendo em vista que a justiça não se restringe à esfera do Judiciário, o último tópico deste capítulo abordará os métodos alternativos de resolução dos conflitos, que devem ser também prestigiados, estimulando os jurisdicionados a buscar justiça fora dos tribunais públicos, como forma de se obter decisão mais rápida e eficaz. No capítulo seguinte, far-se-á um estudo acerca da separação e o divórcio consensuais na Lei 11.441/2007, analisando seus requisitos de validade e sua facultatividade. Em tópico próprio, analisar-se-á a escolha do tabelionato de notas para lavrar a escritura, a indicação do advogado pelo tabelião, a gratuidade nas escrituras de separação e divórcio extrajudiciais, a questão do segredo de justiça. E ainda, será dedicado espaço aos temas polêmicos e aspectos controvertidos da lei em comento, principalmente no que tange à possibilidade de se escriturar a conversão de separação consensual em divórcio, o restabelecimento da sociedade conjugal, a impossibilidade de se escriturar a separação ou o divórcio no tabelionato de notas, quando a mulher estiver grávida, a escritura como título hábil para a execução de alimentos nas separações e divórcios extrajudiciais, bem como, o estado civil do separado extrajudicialmente ou juridicamente. O último capítulo consiste na abordagem da importância do princípio da segurança jurídica, buscando demonstrar que a segurança não é apenas a proteção da vida, da incolumidade física ou do patrimônio, mas também e, principalmente, no caso, a segurança jurídica. Assim, este capítulo tem por objetivo identificar especialmente a manutenção da segurança jurídica dos feitos jurídicos, através dos princípios norteadores do direito notarial, principalmente no que tange à fé pública do tabelião e ao princípio da segurança jurídica propriamente dita. Nesse sentido, entende-se que o tema merece ser objeto de estudo, em face de sua grande relevância na seara do Direito de Família e Sucessões, na tentativa de modernizar o processo civil brasileiro, reduzindo parcela do volume de atividade do Judiciário e liberando- se os magistrados para que direcionem as suas atividades às demandas que realmente precisam de intervenção judicial. Igualmente, a lei em comento acarretará novas alterações no Código de Processo Civil e na rotina dos Cartórios, pois esta veio acompanhada de uma série de controvérsias, as quais serão analisadas mais profundamente ao longo deste trabalho. Portanto, este breve estudo se justifica como meio de difusão desta nova tentativa de modernizar o processo civil brasileiro, reduzindo parcela do volume de atividade do Judiciário e liberando-se os magistrados para que direcionem as suas atividades às demandas que B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 13 realmente precisam de intervenção judicial, oriunda dessa tão discutida lei, a qual acarretará novas alterações no Código de Processo Civil e na rotina do Cartórios, pois veio acompanhada de uma série de controvérsias, as quais serão analisadas mais profundamente ao longo deste trabalho. Diante do exposto, defende-se no presente estudo que é inegável o caráter desburocratizador da Lei 11.441/2007, uma vez que o presente diploma legal segue a tendência mundial de retirar do Judiciário os atos de jurisdição voluntária, de forma a agregar ao serviço qualidade de prestação privada e desobstaculizar a Justiça. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 14 2 ACESSO À JUSTIÇA “Quando Jesus de Nazaré, no julgamento perante o pretor romano, admitiu ser rei, disse ele: 'Nasci e vim a este mundo para dar testemunho da verdade! Ao que Pilatos perguntou: 'O que é a verdade?' Cético, o romano obviamente não esperava resposta a essa pergunta, e o Santo também não a deu. Dar testemunho da verdade não era o essencial em sua missão como rei messiânico. Ele nascera para dar testemunho da justiça, aquela justiça que Ele desejava concretizar no reino de Deus. E, por essa justiça, morreu na cruz. Dessa forma, emerge da pergunta de Pilatos - o que é a verdade? -, através do sangue do crucificado, uma outra questão, bem mais veemente, a eterna questão da humanidade: o que é a justiça? Nenhuma outra questão foi tão passionalmente discutida; por ne- nhuma outra foram derramadas tantas lágrimas amargas, tanto sangue precioso; sobre nenhuma outra, ainda, as mentes mais ilustres - de Platão a Kant - meditaram tão profundamente. E, no entanto, ela continua até hoje sem resposta. Talvez por se tratar de uma dessas questões para as quais vale o resignado saber de que o homem nunca encontrará uma resposta definitiva; deverá apenas tentar perguntar melhor”. Com essas considerações, Kelsen (2001) – logo após o prefácio de sua obra “O que é a Justiça” – ressaltou a dificuldade em se estabelecer uma definição específica do que seja a justiça, propriamente dita. Assim, antes de se partir para um estudo mais aprofundado do conceito de “acesso à justiça”, faz-se mister tecer breves considerações no que tange à “justiça”. Aguiar (1987) é incisivo em afirmar que é pouco provável que haja uma definição universal de justiça que agrade a todos, “por isso a sentença vinda dos tribunais de “justiça” nada tem de justo e sim de direito, porque é nele, no direito escrito ou não, que se baseiam os juízes e os tribunais em suas decisões”. Assim, para o autor, a justiça pode ocorrer para um e não para outro, mas para o Estado e para os tribunais o direito está posto e esse é o seu real objetivo. Reportando-se novamente aos ensinamentos de Kelsen (2001, p.12) tem-se na justiça B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 15 "uma característica possível, porém não necessária, de uma ordem social". E indaga: mas o que significa ser uma ordem justa? Significa essa ordem regular o comportamento dos homens de modo a contentar a todos, e todos encontrarem sob ela felicidade. O anseio por justiça é o eterno anseio do homem por felicidade. Não podendo encontrá-la como indivíduo isolado, procura essa felicidade dentro da sociedade. Justiça é felicidade social, é a felicidade garantida por uma ordem social. Para Chauí (1994), a justiça é a disposição de caráter que torna as pessoas propensas a fazer o que é justo, sendo por isso considerada a maior das virtudes, a virtude completa: o justo nos faz viver conforme as leis e a eqüidade; o injusto nos leva à ilegalidade e à desigualdade. Ferraz Júnior (2002, p. 155), ao discorrer sobre o assunto, explica que: No caso específico de uma teoria da justiça, pode-se perceber, então, que o seu objeto é, por natureza, apenas relativamente determinável. É possível dizer com rigor que, por exemplo, a justiça deve ser praticada. Mas é bem mais difícil definir quais são as ações justas, donde a exigência, em Aristóteles, de uma ética não imperativa, no estrito plano da moral. Assim, percebe-se que “justiça”, como vivência, é muito mais do que decisões proferidas pelo Poder Judiciário. Daí vem a necessidade de analisar o significado de “acesso à justiça”, afastando-se de pronto a idéia de que pode ser considerado apenas como o acesso aos Tribunais, ou seja, o acesso via Poder Judiciário. A Constituição Federal de 1988, através do preâmbulo e dos valores fundamentais inseridos em seu corpo constitucional, elegeu a justiça como um dos valores supremos da sociedade e a solução pacífica de controvérsias com um dos princípios de maior relevância para a sobrevivência do Estado Democrático de Direito. Surgem os meios extrajudiciais de resolução de disputas, que lado a lado com o Poder Judiciário efetivam o ideal de justiça social inseridos na Constituição Federal de 1988, excluindo a idéia de que somente a atividade jurisdicional é a única instituição capaz de alcançar o ideal de justiça social. Desta forma, os aludidos meios extrajudiciais, no papel de pacificadores de controvérsias, contribuem para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, onde os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, a igualdade e a justiça encontrem outro caminho para se efetivarem no seio da sociedade. A busca da concretização dos direitos fundamentais1 constitui o maior desafio do 1 A Constituição Federal de 1988, trouxe em seu Título II, os Direitos e Garantias Fundamentais, subdivididos em cinco capítulos: a) Direitos individuais e coletivos: são os direitos ligados ao conceito de pessoa humana e à sua personalidade, tais como à vida, à igualdade, à dignidade, à segurança, à honra, à liberdade e à propriedade. Estão previstos no artigo 5º e seus incisos; b) Direitos sociais: o Estado Social de Direito deve garantir as B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 16 Estado na contemporaneidade. Nesse sentido, no intuito de restaurar o Estado Democrático de Direito, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 enuncia extenso rol de direitos individuais homogêneos,2 coletivos3 e difusos4, qualificando-os de fundamentais e outorgando-lhes a supremacia peculiar às normas constitucionais. No que tange à necessidade de consolidar a efetividade do acesso à justiça como o direito fundamental, corolário do princípio democrático e exigir a efetivação dos direitos fundamentais decorrentes da Constituição, devem estar à disposição de todos os cidadãos, meios legítimos, institucionais ou não, tendentes à consolidação da cidadania. É oportuno vislumbrar a necessidade de uma concepção ampla de tal princípio, pois o acesso à Justiça não se resume ao mero direito de protocolar uma ação perante o Poder Judiciário, em busca da satisfação de um direito subjetivo. Ao contrário, como bem explicita Cappelletti (1988): este pensamento conduz a uma visão desfocada daquele direito fundamental, uma vez que o acesso à Justiça pode ser concebido como o pressuposto basilar - o mais fundamental dos direitos humanos - do Estado Democrático de Direito Constitucional, que pretenda garantir eficazmente, e não apenas proclamar os direitos de todos. Daí a necessidade de se compreender o acesso à Justiça como direito fundamental, que deve ser efetivado, concretizado, por todos os meios legítimos, judiciais ou extrajudiciais. liberdades positivas aos indivíduos. Esses direitos são referentes à educação, saúde, trabalho, previdência social, lazer, segurança, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Sua finalidade é a melhoria das condições de vida dos menos favorecidos, concretizando assim, a igualdade social. Estão elencados a partir do artigo 6º; c) Direitos de nacionalidade: nacionalidade, significa, o vínculo jurídico político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo com que este indivíduo se torne um componente do povo, capacitando-o a exigir sua proteção e em contra partida, o Estado sujeita-o a cumprir deveres impostos a todos; d) Direitos políticos: permitem ao indivíduo, através de direitos públicos subjetivos, exercer sua cidadania, participando de forma ativa dos negócios políticos do Estado. Está elencado no artigo 14; e) Direitos relacionados à existência , organização e a participação em partidos políticos: garante a autonomia e a liberdade plena dos partidos políticos como instrumentos necessários e importantes na preservação do Estado democrático de Direito. Está elencado no artigo 17. 2 Interesses Individuais Homogêneos: São aqueles de natureza divisível, cujos titulares são pessoas determinadas. Como exemplo podemos apontar, conforme ilustrado por Ricardo Ribeiro Campos, o caso de consumidores que adquiriram veículos cujas peças saíram defeituosas de fábricas e também a hipótese de instituição de tributo inconstitucional. Verificamos nestas duas hipóteses que mesmo havendo a possibilidade de a lesão atingir várias pessoas, cada uma delas, individualmente, poderá pleitear jurisdicionalmente a reparação a sua lesão, buscando atingir a preservação de seu bem jurídico. 3 Interesses Coletivos: São aqueles de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica. Ricardo Ribeiro Campos exemplifica que seria direito coletivo ação que visasse impedir o desrespeito à observância do quinto constitucional na composição dos Tribunais em detrimento da classe de advogados ou dos Membros do Ministério Público. Verifica-se neste caso a impossibilidade de um advogado ou um membro do Ministério Público ingressar individualmente com uma ação judicial, pois o direito é indivisível, devendo a ação ser pleiteada pelo órgão representativo da categoria. 4 Interesses Difusos: São aqueles indivisíveis, cujos titulares são pessoas indeterminadas. Como exemplo, cita- se o direito à paz pública, à segurança pública, ao meio ambiente. Ricardo Ribeiro Campos traz como exemplo a ação que tivesse como interesse impedir a poluição de um Rio, pois o direito ao meio ambiente saudável é direito de todas as pessoas indeterminadamente. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 17 A partir dessa assertiva têm-se os meios extrajudiciais de disputas como instrumentos que irão, lado a lado com a atividade jurisdicional, tentar concretizar as liberdades civis na medida em que, na mesma dimensão e força, conseguem efetivar e garantir os direitos fundamentais. Portanto, aos poucos, tenta-se mudar a mentalidade da cultura judicial litigante muito arraigada em formalismos jurídicos e, através da difusão desses meios extrajudiciais de solução de conflitos, pacificar as controvérsias existentes, antes mesmo de se ingressar com um árduo e demorado processo judicial. Ressalta-se que a utilização dos referidos meios não substitui a atuação do Poder Judiciário, ao contrário, seria inconcebível um verdadeiro Estado Democrático de Direito sem a existência de um Judiciário forte e independente, mas há períodos, em que as transformações são tão rápidas que se tornam claramente perceptíveis e, por vezes, de difícil assimilação. Na visão de Tesheiner (2007), é o que ocorre atualmente, com o processo civil, sujeito à modificações anuais, ou mesmo mensais, que vão tornando “irreconhecível o velho Código do tão recente ano de 1973”. Campilongo (1987), citando Cappelletti, adverte que Juristas em geral e processualistas de modo particular são concordes que o acesso à justiça pode ser "encarado como requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar, os direitos de todos". E lamenta que: “paradoxalmente, nossas estruturas de ensino jurídico, práticas judiciais, hábitos profissionais, pesquisa e teorias jurídicas, prestação de serviços legais, etc., não têm dado o devido valor ao tema “acesso à justiça” ”. A sociedade cobra uma atuação avançada e voltada para a solução dos conflitos, com uma nova mentalidade e visão de Justiça. Watanabe(1988, p.128/129) reflete bem essa dimensão quando afirma que: a problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites do acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa. Sempre que um direito não for respeitado espontaneamente, não há como fazê-lo legitimamente senão através do devido processo legal. Adotando, portanto, uma visão instrumentalista do direito processual, pode-se afirmar que todas as suas normas devem ser B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 18 criadas, interpretadas e aplicadas sob o prisma da efetividade do acesso à justiça. Em relação ao acesso à justiça como um princípio, Dinamarco (2003, p.372) aborda que “acesso à justiça é mais do que um princípio, é a síntese de todos os princípios e garantias do processo, seja a nível constitucional ou infraconstitucional, seja em sede legislativa ou doutrinária e jurisprudencial”. Chega-se à idéia do acesso à justiça, que é o pólo metodológico mais importante do sistema processual na atualidade, mediante o exame de todos e de qualquer um dos grandes princípios. Torres(2005, p.35), entretanto, ao dissertar sobre este assunto, afirma que: o acesso ao judiciário não se faz somente através de princípios, se faz principalmente, através de um sistema organizacional, democrático e real aproximação dos conflitos sociais ao Poder Judiciário, afastando a grande desconfiança dos cidadãos frente às instituições públicas, para não ser surpreendido e até substituído e pela iniciativa de uma “justiça privada”. O acesso a uma ordem jurídica justa passa pela Reforma do Judiciário, que se vê diante de problemas estruturais e históricos que interferem diretamente nessa questão. Dentre elas o autor destaca: a morosidade na prestação jurisdicional, a carência de recursos materiais e humanos, a ausência de autonomia efetiva dos poderes, a centralização geográfica das instalações, muitas vezes, dificultando o acesso da pessoa que mora na periferia, o corporativismo de membros e ausência de um controle externo por parte da sociedade, são alguns problemas, devendo portando, serem resolvidos. Cabe ao Judiciário a difícil tarefa, indo ao encontro dos problemas, buscar solucioná- los com rapidez, principalmente, incentivando a conciliação entre as partes em litígio “ora, um sistema jurídico incapaz de colocar em ação, em condições satisfatórias, uma política para recepcionar as insatisfações ocorrentes na sociedade, perde a legitimidade e compromete a existência da democracia”. O acesso à Justiça, inscrito no rol dos direitos fundamentais, ainda clama por efetividade, que só será alcançada quando os cidadãos tiverem consciência crítica de seus direitos e puderem contar com um sistema jurídico cada vez mais acessível à sociedade. As soluções da melhora pelo acesso à justiça não se encontram apenas no plano das reformas processuais. As normas devem ser entendidas, vistas e praticadas como um solucionador do acesso à justiça. Na Constituição cujo preâmbulo abriga a intenção de instituir um Estado Democrático, B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 19 destinado a assegurar o exercício dos direitos, e elege a justiça como um dos valores fundamentais de uma sociedade que se pretende fraterna e pluralista, não poderia também deixar de assegurar a inafastabilidade do controle jurisdicional. Porém e também nesse contexto, não podem ser deixados de lado, os meios alternativos, conhecidos como solucionadores do acesso à justiça. Ainda sob a ótica de Torres (2005), o tema “acesso à Justiça”, portanto, tem uma constatação global, a exigir dos povos instrumentos que efetivamente atendam aos direitos dos cidadãos “os Estados precisam ter a atenção voltada para mecanismos alternativos de solução de conflitos. É sabido que esse direito fundamental apresenta-se como uma idéia ampla, e o Judiciário é somente um dos meios para esse desiderato”. Busca-se um olhar para soluções possíveis extrajudicialmente. Assim, abordar-se-á no presente estudo, as alterações trazidas pela Lei 11.441/07 que possibilitou a realização de Separações, Divórcios, Inventários e Partilhas pela via administrativa, ou seja, extrajudicial, também como uma das formas de acesso à justiça. 2.1 Definição de “acesso à justiça” O acesso à justiça é um direito expresso na Constituição Federal de 1988 em seu art. 5º, XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. O princípio pressupõe a possibilidade de que todos, indistintamente, possam pleitear as suas demandas junto aos órgãos competentes, desde que obedecidas as regras estabelecidas pela legislação específica para o exercício do direito. O princípio do acesso à justiça significa que o legislador não pode criar obstáculos a quem teve seu direito lesado, ou esteja sob a ameaça de vir a tê-lo, de submeter sua pretensão ao Poder Judiciário. Nesse sentido, leciona Grinover (1990, p.244): é necessário acentuar o conteúdo da idéia de acesso à Justiça que não há de significar simplesmente o acesso ao Poder Judiciário; não só porque também existe o direito à assistência pré-processual, mas também num sentido mais amplo: é que acesso à Justiça significa, e deve significar, não apenas o acesso aos tribunais, mas o acesso à um processo justo, o acesso ao devido processo legal, àquele conjunto de garantias tão importantes que fez com que Mauro Cappelletti dissesse constituir o mais importante dos direitos, na medida em que dele depende a viabilização dos demais direitos. Ainda, para a autora, o acesso à Justiça deve ser “efetivo e material, o que significa dizer que a resposta apresentada pelo Estado deve dirimir o conflito existente ou legitimar a B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 20 situação ofertada em prazo razoável”. Na sua concepção, não basta que o poder judiciário receba a demanda e garanta o direito de ação processual, ou seja, o direito de agir dirigindo-se apenas ao órgão jurisdicional, deve também garantir uma decisão justa, sob pena de nada adiantar esta garantia constitucional. Watanabe (1988, p.128) discorre também, nessa mesma linha de raciocínio: a problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites do acesso aos órgãos judiciais já existentes. Não se trata apenas de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa. Uma empreitada assim ambiciosa requer, antes de mais nada, uma nova postura mental. Deve-se pensar na ordem jurídica e nas respectivas instituições, pela perspectiva do consumidor, ou seja, do destinatário das norma jurídicas, que é o povo, de sorte que o problema do acesso à Justiça traz à tona não apenas um programa de reforma como também um método de pensamento, como com acerto acentua Mauro Cappelletti". Cesar (2002, p.49) coloca em questão a conceituação do acesso à justiça. Dispõe o referido autor que “dentro de uma concepção axiológica de justiça, o acesso à lei não fica reduzido ao sinônimo de acesso ao Judiciário e suas instituições, mas sim a uma ordem de valores e direitos fundamentais para o ser humano, não restritos ao ordenamento jurídico processual”. Quando se aborda "acesso à Justiça", pensa-se logo numa Justiça eficaz, acessível aos que dela precisam e em condições de dar resposta imediata às demandas; enfim, uma Justiça capaz de atender a uma sociedade em constante mudança. Segundo Cappelletti e Garth (1988), a expressão “acesso à justiça” é reconhecidamente de difícil definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direitos e resolver seus litígios sob os auspícios do Estado. O sistema deve ser igualmente acessível a todos devendo produzir resultados que sejam individuais e socialmente justos. Concluem que sem dúvida, uma premissa básica será a de que a justiça social, tal como desejada pelas sociedades modernas, pressupõe o acesso efetivo. Observam, porém, que o seu enfoque sobre o acesso à Justiça é primordialmente sobre o primeiro aspecto (acessibilidade), sem perderem de vista o segundo. E concluem: “Sem dúvida, uma premissa básica será a de que a justiça social, tal como desejada por nossas sociedades modernas, pressupõe o acesso efetivo”. Sobre o assunto, assim dispôs Rodrigues (1994, p.29): a expressão em comento é deveras vaga, ensejando que a doutrina a ela ofereça dois sentidos, válidos e não excludentes, atuando em complementariedade. O primeiro, B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 21 atribuindo ao significante justiça o mesmo sentido e conteúdo que o Poder Judiciário, torna sinônimas as expressões acesso à Justiça e acesso ao Judiciário; o segundo, partindo de uma visão axiológica de expressão justiça, compreende o acesso a ela como o acesso a uma determinada ordem de valores e direitos fundamentais para o ser humano. Para ele, até bem pouco tempo, o entendimento que se empregava, restringia o significado somente ao acesso aos órgãos judiciais. Atualmente, existe uma posição unânime no fato de que o acesso à justiça não se limita a um direito à ordem jurídica, ou seja, não é o acesso à justiça a admissão do processo, ou simplesmente a possibilidade do ingresso em juízo. Dinamarco (1998, p.304) acerca do assunto, é incisivo em afirmar que “o acesso à Justiça é, mais do que ingresso no processo e aos meios que ele oferece, modo de buscar eficientemente, na medida da razão de cada um, situações e bens da vida que por outro caminho não se poderia obter”. Dissertando sobre o mesmo assunto, Figueira Júnior (1994, p.30) corrobora tal idéia. Assim: Faz-se mister a existência de mecanismos geradores da efetividade do processo, cuja realização verifica-se por intermédio de instrumentos que possibilitem a consecução dos objetivos pelo autor, com rapidez, isto é, dentro de um período de tempo razoável e compatível com a complexidade do litígio, proporcionando ao beneficiário da medida a concreta satisfação do escopo perseguido. Na concepção de Cintra, Grinover e Dinamarco (2003, p.33), “acesso à justiça não se identifica, pois, com a mera admissão ao processo, ou possibilidade de ingresso em juízo. Para que haja o efetivo acesso à justiça é indispensável que o maior número possível de pessoas seja admitido a demandar e a defender-se adequadamente”. Assim, os conceitos expostos neste tópico são importantes para o embasamento deste trabalho, porém, não há como firmar sobre o tema “acesso à justiça” uma teorização definitiva. A discussão sobre o acesso, deve ser focada na estipulação de consensos mínimos, nunca na inútil busca de um modelo perpétuo. Na verdade, por acesso à justiça deve-se entender como a proteção a qualquer direito (individual, coletivo ou difuso) sem qualquer restrição (judicial ou extrajudicial). Não basta simplesmente a garantia formal da defesa dos direitos e o de acesso aos tribunais, mas a garantia de proteção material desses direitos, assegurando a todos os cidadãos, independente de qualquer condição social. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 22 2.2. Acesso à Justiça: conscientização em direitos fundamentais Reconhecido como direito fundamental, o pleno acesso ao Judiciário, em sua acepção normativa, encontra-se disposta no art. 5o, XXXV e LXXIV, da Constituição Federal de 19885. Campilongo (1991) adverte que na tipologia tradicional o "acesso à justiça" é confundido com o acesso aos tribunais. Se o acesso à justiça, na tipologia tradicional, é confundido com acesso aos tribunais, vem a questão do acesso à justiça ante as desigualdades vivenciadas. Sobre o assunto, Silva, J. (1998, p.222/223) ensina que: Formalmente, a igualdade perante a Justiça está assegurada pela Constituição, desde a garantia de acessibilidade a ela (art. 5º, XXXV. CF/ 88)”. Mas realmente essa igualdade não existe, “pois está bem claro hoje, que tratar “como igual” a sujeitos que econômica e socialmente estão em desvantagem, não é outra coisa senão uma ulterior forma de desigualdade e de injustiça (cf. Cappelletti, Processo, Ideologia e Sociedade, p. 67) . Torres (2005, p.49) tece uma crítica à complexidade e formalismo exagerado do processo civil mostrando a inconformidade com a excessiva demora na conclusão de uma causa judicial, realizando uma abordagem sobre diversas reformas processuais, referindo os projetos que visam a simplificação dos procedimentos para melhorar a atividade jurisdicional, procurando identificar as causas que obstaculizam efetividade de uma jurisdição mais eficaz: o acesso à justiça, como um direito fundamental, recomenda uma atuação sintonizada com outros mecanismos estruturais e organizados das comunidades, numa ação direta no local dos fatos, ali procurando resolver situações que normalmente não chegariam jamais ao Judiciário, quer pela ausência dos poderes constituídos, quer pelos altos custos de um processo, em razão das despesas diversas, como papéis, documentos, e trabalhos de profissionais, quer pela demora na tramitação dos feitos, uma marca que se propaga e que já se torna, infelizmente, uma realidade constrangedora e desestimulante para buscar a justiça nos fóruns e tribunais. Sobre este tema, Sarlet (2006, p.35) salienta que o termo “direitos fundamentais” se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de um determinado Estado. Ainda dissertando sobre o mesmo assunto, o autor assevera que “os direitos fundamentais nascem e se desenvolvem com as Constituições nas quais foram reconhecidos e assegurados”. Bezerra (2001, p.121) reforça a idéia de que “todo o espírito da Constituição é 5 Art. 5o, XXXV e LXXIV, da CF de 1988 “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” e “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 23 eminentemente social, de justiça social, depreende-se que o acesso à justiça, a par de ser um direito do cidadão, guinda-se à qualidade de direito fundamental constitucionalmente garantido”. Segundo o autor em comento, para lutar pela concretização dos direitos é preciso antes de tudo, que a pessoa tenha consciência de que possui direitos. Tal proposição, apesar de óbvia, não tem merecido uma análise mais profunda dos operadores do direito. No entendimento de Cappelletti e Garth (1988), o primeiro momento do acesso à Justiça é o conhecimento por parte do cidadão de que é sujeito de direitos fundamentais, fator este que condiciona a efetividade de toda ordem jurídica constitucional e, principalmente, do princípio democrático. Para estes autores, o conhecimento dos direitos não se confunde com a mera informação, devendo ser entendido como “conscientização”, que envolve não apenas o “saber que têm direitos”, mas também o desenvolvimento de novas formas de ver a vida, de conceber a realidade e de pensar, de modo a produzir mudanças de percepção e de comportamento: Evidentemente, falar-se em conscientização em direitos fundamentais não significa pressupor que os cidadãos sejam meros receptores de conhecimento, totalmente ignorantes de sua condição humana, ou que o processo pedagógico seja de “mão única”. Ao contrário, o programa de educação em direitos fundamentais deve ser construído através do diálogo e da troca de experiências, objetivando a consciência (dinâmica) crítica da realidade e não somente a ciência (estática) dos direitos. É neste contexto que o estudo de Cappelletti (1990, p. 129) destaca três ondas renovatórias garantidoras do acesso à justiça, adiante esclarecidas, quais sejam, a assistência judiciária gratuita aos desprovidos de condições financeiras para a contratação de técnicos habilitados na defesa de seus direitos e dispensa do pagamento das custas judiciais; a implementação de meios de resolução de conflitos inerentes aos interesses difusos e coletivos e a instituição de meios alternativos de resolução de conflitos e simplificação dos meios processuais de resolução de conflitos. Os problemas principais do movimento reformador tem sido os seguintes: a) o obstáculo econômico, pelo qual muitas pessoas não estão em condições de ter acesso às cortes de justiça por causa de sua pobreza, aonde seus direitos correm o risco de serem puramente aparentes; b) o obstáculo organizador, através do qual certos direitos ou interesses “coletivos” ou “difusos” não são tutelados de maneira eficaz se não se operar uma radical transformação das B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 24 regras e instituições tradicionais de direito processual, transformações essas que possam ter uma coordenação, ou “organização” daqueles direitos ou interesses; c) finalmente, o obstáculo propriamente processual, através do qual certos tipos tradicionais de procedimentos são inadequados aos seus deveres de tutela. Atualmente, o maior fator de descrédito da população em face do Poder Judiciário é a morosidade da prestação jurisdicional. Neste contexto, Patah (2005) reunindo pensamento de outros autores, coloca que as razões da tão propalada crise da Justiça decorrem de diversos fatores, tais como: a) aumento do número de ações decorrentes dos novos direitos da terceira e quarta gerações; b) legislação minuciosa e protecionista de cunho individualista ultrapassada; c) utilização de recursos meramente procrastinatórios; d) reduzido número de juízes; e) falta de: fiscalização no cumprimento do dever funcional dos magistrados, qualificação dos operadores do direito e incentivo à solução extrajudicial dos conflitos, entre outros. Sejam quais forem os motivos, Dinamarco (1998, p.304) defende que: o processo como instrumento de pacificação social deve ser capaz de produzir resultados efetivos na vida das pessoas (efetividade da tutela jurisdicional), como também de fazê-lo logo (tempestividade) e mediante soluções aceitáveis segundo o direito posto e a consciência comum da nação (Justiça). Por sua vez, a doutrina processualista sublinha que o princípio da brevidade deriva da própria concepção do processo como um mal que, como tal, deve ser eliminado do cenário jurídico o mais rapidamente possível. Urge, portanto, aperfeiçoar o cidadão, verdadeiro operador dos processos de mudança social, para, a partir da compreensão do direito como meio de emancipação do homem, desenvolver-se uma consciência crítica de cidadania fundada na concretização dos direitos fundamentais, entre os quais está o acesso à justiça. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 25 2.3. Acesso à justiça e procedimentos extrajudiciais: a busca de soluções alternativas É indiscutível, na atualidade, o esgotamento do Poder Judiciário como instância exclusiva para resolução de conflitos. A morosidade dos procedimentos, a ineficácia das decisões, os altos custos das ações, acabam por afugentar o grosso da população dos tribunais, privando-a, na maioria das vezes, da efetivação de seus direitos fundamentais. Mesmo com todas as inovações e alterações introduzidas no ordenamento jurídico, ainda persistem inúmeras limitações que impedem um efetivo acesso à justiça (judicial). Para Grinover (1998), existe uma verdadeira crise da administração da justiça, já que o aparelho judiciário e a administração da Justiça não acompanharam o extraordinário progresso científico do direito processual. Segundo Torres (2005, p.35), falar em acesso à justiça é viabilizar a discussão sobre uma série de fatores, englobando a estrutura da instituição do Poder Judiciário, que se quer democratizar, aberta, próxima do cidadão, e com meios legais adequados que ensejem a agilização do processo. Para o autor, “não se oportuniza esse princípio constitucional se os órgãos estatais não estiverem presentes, orientando e informando sobre o direito de cada um, como é o caso de uma Defensoria Pública organizada e de um Judiciário atuante”. Porém, para Morais (1999, p.80) o acesso à Justiça está amplamente ligado ao “binômio possibilidade-viabilidade de acessar o sistema jurídico em igualdade de condições, e à busca de tutela especifica para o direito e/ou interesse ameaçado e, por óbvio, com a produção de resultados justos e efetivos”. Segundo o autor, os métodos alternativos de resolução dos conflitos, fora da justiça pública devem ser também prestigiados, estimulando os jurisdicionados a buscar (procurarem) justiça fora dos tribunais públicos, como forma de se obter decisão mais rápida e eficaz. Como disse: o problema do acesso à Justiça não é uma questão de "entrada", pois, pela porta gigantesca desse templo chamado Justiça, entra quem quer, seja através de advogado pago, advogado mantido pelo Poder Público, advogado escolhido pela própria parte, sob o patrocínio da assistência judiciária, não havendo, sob esse prisma, nenhuma dificuldade de acesso. O problema é de "saída", pois todos entram, mas poucos conseguem sair num prazo razoável, e os que saem, fazem-no pelas "portas de emergência", representadas pelas tutelas antecipatórias, pois a grande maioria fica lá dentro, rezando, para conseguir sair com vida. Tendo em vista que a justiça não se restringe à esfera do Judiciário, Capelletti e Garth (1988) defendem que a busca de soluções práticas para os problemas de acesso à justiça inclui B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 26 historicamente três momentos (ou três ondas): a) Assistência judiciária para os pobres: a ser superado, em que as pessoas que nenhum ou pouco acesso à informação e à representação adequada, deveriam ser auxiliadas. Inicialmente, eram nomeados advogados particulares, sem contraprestação, que pelo desinteresse evidente, em função da gratuidade, passaram a cometer reiteradas falhas. Surge então a figura do Estado. Este remunera o advogado particular, favorecendo a isonomia na escolha do profissional, do pobre em relação ao rico. É o método do “advogado remunerado pelos cofres públicos”, ou seja, advogados exclusivos para prestarem assistência judiciária – os Defensores Públicos. Ocorre que não é possível o Estado manter advogado em número suficiente para fornecer atendimento individual e qualificado. b) Representação dos interesses coletivos e difusos: Surge com o crescimento da importância dos direitos sociais que tendem a beneficiar os mais frágeis (crianças, idosos, deficientes), e é um obstáculo que vem sendo superado, pois a concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos direitos difusos. Havia entraves quanto aos direitos que pertencessem a um grupo, estes não se enquadravam às regras processuais de legitimidade, procedimento, atuação dos juizes, representação adequada. c) O acesso à representação em juízo a uma concepção mais ampla de acesso à justiça: está relacionada com os métodos alternativos de solução de conflitos. É livre e irrestrito o acesso à justiça. Porém, está condicionada a realidade prática e a existência de obstáculos. Os entraves não-jurídicos seriam a pobreza, a falta de informação e os fatores simbólicos, psicológicos e ideológicos que afastam da justiça (por medo, insegurança, sentimento de inferioridade). Os entraves jurídicos são denotados a partir da limitação da legitimidade para agir, a duração dos processos, o formalismo, a estrutura do judiciário, ausência de assistência extrajurídica. Nesse sentido, melhorar o acesso à justiça é uma exigência que encontra resposta no desenvolvimento de procedimentos complementares dos processos jurisdicionais, estando estes muitas vezes melhor adaptados à natureza dos litígios. Dessa forma, os meios alternativos de resolução de litígios podem ser utilizados em diferentes áreas do direito, podendo ser utilizados em diferentes contextos, quer no âmbito de processos judiciais quer enquanto mecanismos voluntários, abrangendo diversas formas de composição: a) Arbitragem; b) Conciliação; c) Mediação; e, mais recentemente, d) Procedimentos Administrativos. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 27 Assim, o conceito de mecanismos de resolução alternativa de conflitos utilizado no presente estudo corresponde às formas de administração de controvérsias estabelecidas fora do processo judicial, os quais serão estudados brevemente em tópicos próprios. 2.4 Formas Alternativas de Solução de Conflitos 2.4.1 A Mediação Os conflitos fazem parte da vida, sejam eles individuais, sociais, institucionais, empresariais, profissionais, políticos entre outros. A mediação, por sua vez, é um processo baseado em regras, técnicas e saberes cujo objetivo é gerir a qualidade da comunicação entre os intervenientes em conflito, no sentido de privilegiar a resolução dos problemas que os opõem, construindo eles próprios as suas soluções. Sabe-se que a mediação é uma das formas extrajudiciais para a solução não formal de conflitos. Nessa seara, existem várias definições para o conceito de Mediação de Conflitos. Busch e Folger (1994, p.103) apud Falsarelli (2003) asseveram que a medição é “um método no qual uma terceira parte imparcial facilita um processo pelo qual os disputantes podem gerar suas próprias soluções para o conflito”. Para Warat (2001), a mediação é uma “forma ecológica de resolução de conflitos na qual o intuito de satisfação do desejo substitui a aplicação coercitiva e terceirizada de uma sanção legal”. No entendimento de Garret (1994, p.40) apud Falsarelli (2003), a mediação é definida como um processo voluntário de resolução de conflitos, no qual um terceiro coordena as negociações entre as partes. Diferentemente do juiz, o mediador não tem autoridade para impor a decisão sobre os disputantes. Ao contrário, “o mediador conduz o processo, por meio da discussão do problema, dos temas que precisam ser resolvidos e das soluções alternativas para a solução do conflito. As partes, entretanto, é que decidem como construirão o consenso”. Por sua vez, Falsarelli (2003, p.78-79) preleciona do sentido de que: voltada para a construção do consenso, a mediação sugere que onde há conflito, disputas e dificuldades humanas, há a oportunidade para a reconciliação, a comunicação, o entendimento, o aprendizado. O paradigma visivelmente presente na proposta da mediação desafia o sistema oficial de resolução de disputas baseado na lógica adversarial, o qual pressupõe um sistema binário, dialético, pelo qual as partes confrontam-se entre si perante uma autoridade cuja decisão será coercitiva e amparada no ordenamento legal. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 28 Percebe-se que a mediação possibilita a transformação da “cultura do conflito” em “cultura do diálogo” na medida em que estimula a resolução dos problemas pelas próprias partes. A valorização das pessoas é um ponto importante, uma vez que são elas os principais e responsáveis pela resolução da divergência. Como se depreende do estudo do tema em tela, a mediação é um meio alternativo de solução de controvérsias, em que um terceiro auxilia as partes a chegarem, por si próprias, a um acordo. A solução de conflitos configura o principal objetivo da mediação, através do diálogo – que deve ter como fundamento a visão positiva do conflito, a cooperação entre as partes e a participação do mediador como facilitador dessa comunicação – é o caminho seguido para se alcançar essa solução. O segundo objetivo da mediação é a prevenção de conflitos, estimulando a cultura da comunicação pacífica. Por fim, vê-se que não só os juizes investidos nas funções jurisdicionais são capazes de resolver conflitos das pessoas, mas outros profissionais treinados, da área jurídica ou de fora dela, desde que tenham as técnicas, visando à importância da “democratização” nos meios judiciários, onde se insere a mediação. 2.4.2 A Arbitragem Buscando-se uma alternativa mais rápida e econômica que os meios jurídicos convencionais para solução de controvérsias entre pessoas e empresas, houve a edição da Lei 9.307/96, conhecida como Lei de Arbitragem. Alguns doutrinadores asseveram que a arbitragem constitui o meio alternativo para a solução de litígios. Não compete com o Judiciário nem contra ele atenta, pois o Poder Judiciário independente e forte constitui o esteio do Estado de Direito. Ela é a técnica, pela qual a divergência pode ser solucionada, por meio da intervenção de terceiro (ou terceiros), indicado pelas partes, gozando da confiança de ambas. Com a assinatura da cláusula compromissória ou do compromisso arbitral, a arbitragem assume o caráter obrigatório. Pode ser realizada por um árbitro ou por mais de um. Neste caso, estará constituído o Tribunal Arbitral. A sentença arbitral tem força judicial. Nesse sentido, Maia Neto (2001) traz que a norma jurídica que trata da aplicação da arbitragem “permite que partes em conflito dispensem submeter o julgamento à justiça estatal, B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 29 permitindo que escolham uma pessoa da confiança de ambas, denominado árbitro, a quem caberá decidir o conflito”. Segundo o autor, para utilizar esta alternativa de resolução de conflitos, as partes devem firmar uma convenção de arbitragem, via cláusula compromissória, contratada anteriormente ao eventual litígio, ou através do compromisso arbitral, que é firmado quando surge a controvérsia. Ele alerta sobre o procedimento da arbitragem, o qual somente pode ser adotado sobre direitos patrimoniais disponíveis, baseia-se no princípio da autonomia de vontade das partes, que podem estipular o rito a ser seguido pelos árbitros, observando os princípios processuais do devido processo legal. Costa (2001, p.51), lembra que: A constitucionalidade da arbitragem decorre da idéia básica da desmistificação do monopólio da justiça nas mãos do Estado-juiz, haja vista que a atividade jurisdicional não é de sua exclusividade, v.g., quando o Senado Federal julga o Presidente da República por crime de responsabilidade (art. 52, I, da CF), etc .[...] Com isso, os princípios da ubiqüidade da justiça e do juiz natural mantêm-se íntegros e ilesos com o advento da arbitragem facultativa em nosso ordenamento pátrio. Posiciona-se de forma clara a respeito dessa discussão, Nery Jr. (1999, p.357) que apresenta: Não se pode tolerar, por flagrante inconstitucionalidade, a exclusão, pela lei, da “apreciação de lesão a direito pelo Poder Judiciário, que não é o caso do juízo arbitral. O que se exclui pelo compromisso arbitral é o acesso à via judicial, mas não à jurisdição. Não se poderá ir a justiça estatal, mas a lide será resolvida pela justiça arbitral. Em ambas há, por óbvio, a atividade jurisdicional. Teixeira6 (1997, p.39-48), manifesta sua opinião: Conhecido é o prestígio que o constituinte brasileiro tem dado ao princípio consagrado no art. 5º, inc. XXXV da atual Constituição, segundo o qual ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’. Cuida- se de comando constitucional que o Judiciário brasileiro cultiva com justificado zelo e que tem merecido da doutrina acentuado relevo. Daí a defesa que a cultura jurídica do País dele faz, posto que na Constituição de 1946 em proteção ao cidadão e como advertência ao legislador, a espelhar o repúdio do constituinte de então às arbitrariedades do período ditatorial que se findara, como anotou Pontes de Miranda ao qualificá-lo de ‘princípio da ubiqüidade da Justiça’, ‘a mais típica e a mais prestante’ criação do constituinte de 1946. A exemplo do que também ocorreu em relação ao modelo anterior, não faltarão vozes, e respeitáveis, como já estão a ser ouvidas aqui e acolá, de que o novo instituto poderia representar uma fenda na solidez dessa garantia. 6 Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, do Superior Tribunal de Justiça B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 30 E segue o autor, justificando, contudo, que esse temor não é mais que inquietação, na medida em que o modelo de arbitragem adotado pela Lei 9.307/96 dele não exclui o Judiciário. E isso por múltiplas razões7. Assim, analisando as lições de vários autores, depreende-se que embora preservadas as garantias da ampla defesa e do contraditório, a rapidez na solução do conflito é o primeiro ponto favorável à arbitragem, que se opõe à notória morosidade da justiça estatal, comprometedora de sua eficácia. E como se não bastassem estas vantagens, e comungando do pensamento de Maia Neto (2001), a opção pela arbitragem resulta em custos menores, especialmente em função do prazo para definição do litígio, estabelecido pela lei em seis meses, conforme o artigo 22 da Lei 9307/968, sendo certo que o maior ônus imposto pela justiça estatal tem sido justamente o demasiado tempo de duração das ações judiciais, além do fato da decisão produzir entre os litigantes os mesmos efeitos da sentença proferida pelo Poder Judiciário, uma vez serem os árbitros juízes de fato e de direito, sem que haja possibilidade de recursos. Ademais, como observa Maia Neto (2001), nem por isso o judiciário é afastado do procedimento, sendo possível intervir e decidir quando surgem incidentes no curso do processo, bem como sobre eventual irregularidade formal da sentença arbitral, além de ser o responsável pela execução coativa da decisão. 7 A uma, porque a nova lei é explícita (art. 33) em assegurar aos interessados o acesso ao Judiciário para a declaração da nulidade da sentença arbitral nos casos que elenca, em procedimento hábil, técnico e de maior alcance do que o criticado procedimento homologatório anterior. A duas, pela igual possibilidade de argüir-se a nulidade em embargos à execução (art. 33, § 3º, c/c art. 741, CPC). A três, porque a execução coativa da decisão arbitral somente poderá ocorrer perante o Judiciário, constituindo a sentença arbitral título executivo judicial, assim declarado na nova redação dada pelo art. 41 ao inciso III do art. 584 do CPC. De igual forma, a efetivação de eventual medida cautelar deferida pelo árbitro reclamará a atuação do juiz togado, toda vez que se fizerem necessárias a coercio e a executio. A quatro, porque, para ser reconhecida ou executada no Brasil (art. 35), a sentença arbitral estrangeira se sujeitará à homologação do Supremo Tribunal Federal (ou de outro órgão jurisdicional estatal – v.g., o Superior Tribunal de Justiça –, se a Constituição, reformada, assim vier a determinar). A cinco, porque do Judiciário é o controle ‘sobrevindo no curso da arbitragem controvérsia acerca de direitos indisponíveis e verificando-se que de sua existência, ou não, dependerá o julgamento’. A seis, porque também caberá ao Judiciário decidir por sentença acerca da instituição da arbitragem na hipótese de resistência de uma das partes signatárias da cláusula compromissória (art. 7º). Como se nota, prevê a nova lei a presença do Judiciário para responder à convocação da parte que eventualmente sentir-se lesada. Essa, aliás, é uma das características do modelo arquitetado, limitando-se o Judiciário a ser convocado quando da presença de lesão. Em outras palavras, apenas no confronto é que se busca o Judiciário. 8 Art. 22 – O(s) árbitro(s) deverá(ão) prolatar a Sentença Arbitral por escrito, obedecendo ao disposto nos artigos 26 e 27 de Lei 9307/96, na sessão que encerrou a instrução processual, ou no prazo máximo de dez (10) dias, desde que não ultrapasse os cento e oitenta (180) dias contados do início do procedimento arbitral.Parágrafo Primeiro: O prazo para a prolação da sentença disposto no caput deste artigo poderá ser prorrogado em caso superveniente, quando da decisão da sentença depender de laudo pericial ou quando pendente do Poder Judiciário decisão sobre direitos indisponíveis e nos moldes do parágrafo único do artigo 23 da Lei de Arbitragem ou, ainda, quando por decisão do(s) árbitro(s) ou das partes e diante da peculiaridade do litígio entender-se necessário mais tempo para a prolação da sentença. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 31 Diante do exposto, torna-se claro ser a arbitragem uma alternativa de acesso à justiça – considerando que o desempenho do Poder Judiciário tem sido moroso e muitas vezes ineficiente – mostrando-se um porto seguro àqueles que procuram uma solução ágil dos conflitos. 2.4.3 A Conciliação A conciliação9 é um meio alternativo de resolução de litígios, que utiliza um terceiro imparcial, interveniente, que conduz o processo em conjunto com as partes, para que estas cheguem voluntariamente a um acordo. Por outras palavras, a conciliação é uma forma de resolução de controvérsias na relação de interesses administrada por um Conciliador investido de autoridade ou indicado pelas partes, a quem compete aproximá-las, controlar as negociações, aparar as arestas, sugerir e formular propostas, apontar vantagens e desvantagens, objetivando sempre a composição do litígio pelas partes. O conciliador observa os aspectos objetivos do conflito, estimula uma resolução rápida da questão, e assiste as partes, promovendo e propondo soluções para que estas alcancem um acordo da sua responsabilidade. Nota-se que a conciliação tem suas próprias características onde, além da administração do conflito por um terceiro neutro e imparcial, este mesmo conciliador tem a prerrogativa de poder sugerir um possível acordo, após uma criteriosa avaliação das vantagens e desvantagens que tal proposição traria a ambas as partes. Nesse sentido, Wolkmer (1997, p.312) adverte para a necessidade de se buscar soluções alternativas ao modelo monista estatal de jurisdição, apontando formas de resolução institucionalizadas e vias não institucionalizadas, apresentando posicionamento esclarecedor, quanto ao mecanismo da conciliação10: A “conciliação” pode ser vista como uma prática judicial (instaurada a partir do processo) ou extrajudicial (alternativa para evitar o processo estatal), mais ou menos formal, podendo ou não ser institucionalizada, capaz de mediar controvérsias entre partes antagônicas, conflitos de interesses e litigiosidade provenientes das relações de consumo. O crescimento dos conflitos de natureza coletiva e a impossibilidade da engenharia processual individualista de canalizá-los determinam, cada vez mais, na sociedade industrial de massa, a operacionalização alternativa do instituto da “conciliação”, considerando que sua natureza pode ser judicial ou extrajudicial, 9 Definição do Conselho Nacional de Justiça disponibilizada no site www.conciliar.cnj.gov.br 10 Hoje no Brasil a conciliação está prevista nos Juizados de Pequenas Causas – Lei 7244/84; nos Juizados Especiais - Lei 9099/95; Instituto da Arbitragem – Lei 9307/96; Juízes de Paz – Lei Complementar 59, de 18/01/2001; CPC atual, que prega que o Juiz deve tentar a conciliação a qualquer tempo; Juizados de Conciliação – Resolução 460/2005; Centrais de Conciliação de Varas de Família – Resolução 407/2003. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 32 pública ou privada, facultativa ou obrigatória, a 'conciliação' revela-se não só como variante à solução dos litígios, mas, igualmente, como direção mais diferenciada e espontânea aos rituais canonizados da processualista estatal. Tal posicionamento segue uma tendência da doutrina nacional de alargamento da definição de conciliação, aplicando-a quase que como gênero, como sinônimo de resolução alternativa, denotadora da necessidade de se buscar uma forma mais fácil de definição para conflitos. Para o autor, o critério que deve nortear a conciliação extrajudicial como ruptura e alternativa à justiça formal do Estado, não está na aplicação da lógica fundante da atual legislação positiva, mas num novo tipo de interpretação emancipatória, norteada pela legitimidade de novas identidades sociais e firmada na equidade, na ordenação de justos interesses e na satisfação plena das necessidades humanas fundamentais. Nesse sentido preleciona Walter Nunes: Uma sociedade bem organizada tem várias oportunidades de solucionar suas questões. A conciliação, que começou a ser estimulada desde a criação dos Juizados Especiais, é o avanço natural das organizações de classe, e a Justiça mais aproximada do interesse das partes. O movimento vai não só sensibilizar os órgãos da Justiça sobre a importância disso, como também fazer os envolvidos se aprofundarem no desenvolvimento de técnicas de conciliação. [texto digital] Assim, a Justiça de Conciliação favorece o processo de paz social ao fomentar a cultura do diálogo e tornar a Justiça mais efetiva e ágil, com a redução do número de conflitos litigiosos e do tempo para a análise dos processos judiciais. Não há vencedores e vencidos e, sim, pacificados. 2.4.4 Os Procedimentos Administrativos ou Extrajudiciais “Extrajudicial: Locução empregada para designar atos que se fazem ou se processam fora do juízo, isto é, sem a presença do juiz”. Muitos são os conflitos que podem ser resolvidos mediante negociação extrajudicial com enorme economia de dinheiro e tempo para as partes. No entanto, aspectos jurídicos relevantes devem ser considerados, de modo que só se deve implementar uma negociação administrativa ou extrajudicial, com o amparo de um trabalho de advogados competentes, competência decorrente do notável saber jurídico e da experiência de atuação, o qual saberá quando se faz imperioso relevar a negociação extrajudicial e passar para o plano processual (judiciário). B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 33 Nesse sentido, falar-se-á, principalmente, no procedimento administrativo ou extrajudicial notarial – cuja jurisdição é preventiva – uma vez que o presente estudo visa aprofundar as alterações trazidas pela lei 11.441/2007, a qual permitiu a realização de inventário, separação e divórcio consensuais pela via administrativa. A lei em comento, foi originada pelo Projeto de Lei 4.725, de 2004, cuja exposição de motivos que indica os princípios e finalidades buscadas por seu autor, demonstra a efetiva necessidade de disponibilizar o acesso à justiça pela via administrativa, visando à simplificação dos procedimentos. Conforme Ferreira (2007, p.13), toma-se como exemplo o procedimento para uma separação. A burocracia do processo judicial envolve: a) petição de separação b) documentos; c) distribuição; d) formação dos autos; e) parecer do Ministério Público; f) designação da data da audiência; g) publicação no diário Oficial; h) audiência; i) sentença; j) publicação da sentença; k) atestação do trânsito em julgado; l) mandado de averbação. São doze etapas, portanto, que podiam em alguns casos serem cumpridas em conjunto, como a sentença que é seguida do mandado de averbação. No procedimento notarial, a burocracia resume-se a: a) documentos; b) lavratura; c) leitura e assinaturas; d) traslado para averbação. Há, portanto, uma economia de oito etapas. O referido autor ressalta que a Lei 11.441/2007 assemelha o ato notarial ao processo judicial com caráter de jurisdição voluntária. Há, de fato, no serviço notarial – todo ele – verdadeira juris dictio, ou seja, a palavra da Lei aplicada aos fatos pela tutela estatal.11 Para Carnelutti12, caracteriza a jurisdição voluntária, a prevenção do litígio, que é uma das razões essenciais da atividade notarial. Já, para Wach e Calamandrei13, a jurisdição voluntária também se destina à formação de atos e negócios jurídicos, tendo uma função constitutiva, igualmente típica da atividade notarial. Assim, segundo Ferreira (2007), em breve resumo, o procedimento notarial resume-se às seguintes fases: 1) Rogatória: que consiste na solicitação do atendimento, feita oralmente e já com a entrega de documentos ou a autorização para que o tabelião proceda a todos os atos – 11 A conceituação mais freqüente de jurisdição envolve a palavra final do Estado e uma pretensão de alguém, decidindo pela prevalência do interesse de um pelo outro. Entendemos que há jurisdição também quando não há litígio. Sobre o assunto, José Frederico Marques, Ensaio sobre a jurisdição voluntária, autor que entende não haver jurisdição na atividade notarial. Para ele, há administração pública de interesse privado. 12 Apud Ovídio Baptista da Silva, Curso de processo civil, p.44. 13 Idem. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 34 inclusive extranotariais – tendentes à lavratura da escritura ou ata. Neste momento, e nos subseqüentes, o notário assessora e adverte os clientes sobre as prescrições legais e os efeitos do ato ou negócio que formalizará; 2) Minuta: na qual o tabelião redige uma minuta que é discutida e aprovada pelos clientes; 3) Protocolo: momento em que o tabelião lavra o ato no livro próprio. Há casos em que o ato é realizado no próprio documento apresentado e que é devolvido aos clientes (autenticações de documentos); 4) Conclusão: quando o ato é assinado pelos interessados, pelo escrevente, se houver, e pelo tabelião; 5) Circulação e conservação: a primeira ocorre quando o traslado e as certidões são expedidas para que os interessados tenham cópia do ato, possibilitando a circulação e a produção de efeitos nas esferas administrativa e particular. A segunda, na qual o tabelião conserva o documento para publicidade futura. Assim, resta evidente que o procedimento administrativo notarial não tem as características ou tampouco segue os princípios do direito processual civil. Este procedimento, mais “enxuto” em comparação com o judicial, realizado com a observância dos princípios que serão expostos no último capítulo deste trabalho, está agora a serviço dos atos de inventário, partilha, separação e divórcio, sendo os dois últimos atos, analisados mais profundamente neste estudo. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 3 AS INOVAÇÕES NO ÂMBITO SOCIAL OCASIONADAS PELA LEI 11.441/07 E SEUS ASPECTOS CONTROVERTIDOS As inovações estabelecidas pela Lei 11.441/2007 que alteraram o Código de Processo Civil são relativas à possibilidade de realização de inventário, partilha, separação e divórcio consensual, mediante escritura pública, ou seja, a forma administrativa. Esta lei tem o escopo de desafogar o Poder Judiciário, agilizar os procedimentos desta natureza e baratear custas, pois tais procedimentos sendo amigáveis, agora podem se realizar diretamente em cartório evitando assim o caminho judicial. Partindo desse pressuposto, o presente capítulo tem por objetivo explorar as inovações trazidas pela Lei 11.441/2007, bem como, apresentar seus pontos controvertidos, no que toca à separação e divórcio consensuais por escritura pública. 3.1. A separação e o divórcio consensuais na Lei 11.441/2007: uma análise dos seus requisitos de validade e a sua facultatividade É comum ouvir que "para casar é muito fácil, difícil é separar". Infelizmente os procedimentos dissolutórios do casamento14 são lentos e penosos, principalmente quando existe o litígio entre as partes envolvidas. A Lei 11.441/2007 que trouxe a possibilidade da 14 Monteiro (2004) definiu o casamento como “a união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de se reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos”. No mesmo sentido, para Silvio Rodrigues, casamento é “o contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência”. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 36 realização de separação15 e divórcio16 consensual, além de inventário, partilha, em tabelionato de notas, retirando a intervenção do Estado do âmbito da vida privada dos cônjuges. Para Ferreira(2007), a lei veio dar voz ao anseio da população em geral, vez que não raro a queixa de o processo de separação ou de divórcio ser mais complexo do que o procedimento para contrair núpcias. No entender de Simão e Tartuce (2007), um aspecto positivo da Lei 11.441 é o de que muitos ex-cônjuges não gostavam de ter de justificar os motivos da separação para o juiz. Com a possibilidade da separação e divórcio de forma extrajudicial, não haverá mais a necessidade de expor os motivos do fim do relacionamento, desde que haja acordo entre as partes. Por sua vez, Agapito (2007) acrescenta que as escrituras poderão ser assinadas em diligência, ou seja, o tabelião pode ir até o escritório do advogado ou à casa das partes se elas se sentirem constrangidas de comparecer ao cartório. Antes da Lei 11.441/07, conforme dispunha o antigo art. 982 do CPC, o inventário e a partilha eram sempre processados judicialmente, mesmo que todas as partes fossem capazes; ou seja, a tutela jurisdicional sempre tinha de ser acionada, apesar de toda a consciência que a pessoa maior e capaz tem para bem dispor de sua vontade. A separação e o divórcio eram sempre judiciais; a partir da nova lei, poderão ser consensuais, e feitos também no cartório de notas, desde que apresentada a documentação necessária nos termos do art.33 da Resolução 35 do CNJ17 e presentes alguns requisitos, conforme art. 1.124-A18, inserido no CPC pelo novo instituto legal. 15 Para Nery e Nery (2002), Separação Judicial é um negócio jurídico bilateral que tem como propósito adequar legalmente aquilo que ocorre no plano dos fatos, isto é, conferir o status de separados àqueles que já não coabitam mais no mesmo lar. Revela-se uma verdadeira hipótese de distrato, em que as partes - cônjuges - acordam acerca da dissolução da sociedade conjugal, fazendo concessões mútuas para atingir o seu desiderato. (NERY JÚNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e legislação extravagante anotados. São Paulo: RT, 2002). 16 Divórcio - do lat. divortiu significa dissolução do vínculo matrimonial, ficando os divorciados livres para contrair novas núpcias. Em outras palavras, com o divórcio, a relação jurídica antes existente entre os cônjuges, decorrente do casamento, se extingue, podendo o cônjuge divorciado contrair novas núpcias. (Constituição Federal/88; Código Civil 2002) 17 Art. 33 - Para a lavratura da escritura pública de separação e de divórcio consensuais, deverão ser apresentados: a)certidão de casamento; b) documento de identidade oficial e CPF/MF; c) pacto antenupcial, se houver; d) certidão de nascimento ou outro documento de identidade oficial dos filhos absolutamente capazes, se houver; e) certidãode propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos; e f) documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens móveis e direitos, se houver. 18 Art 1124-A- A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo dos cônjuges quanto à retomada pela mulher de seu nome de solteira ou à manutenção do nome adotado quando do casamento B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 37 Pela nova legislação, é possível o procedimento cartorário para a dissolução conjugal amigável, não havendo filhos menores ou incapazes, observados os prazos legais exigidos19, e mediante escritura pública que deverá forçosamente proceder a partilha de bens comuns, dispor sobre eventual pensão alimentícia e, ainda, o acordo quanto ao nome adotado em razão do casamento.Tal ato só deverá ser lavrado se os cônjuges forem assistidos por advogado comum ou, advogados de cada um, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. Serão gratuitos tais atos aos declaradamente pobres20. Cassetari (2007), acerca do supramencionado artigo, elenca que a separação e o divórcio pela via administrativa exigem os seguintes requisitos: a) Ser consensual, ou seja, as partes concordarem com a sua realização: Primeiramente, no que tange ao consenso, Barbosa (2006) assevera que é importante haver concordância dos indivíduos em relação ao destino de suas posições jurídicas. Sobreleva que sua anuência seja autêntica e não decorrente de pressões e desinformações de qualquer uma das partes. Para a autora, a comunicação e o diálogo são essenciais para o afastamento das animosidades e o estabelecimento da relação em bases conciliatórias. Nesse sentido, questiona: como obter o consenso em momentos de acirramentos, animosidades e perdas? A mediação surge como importante técnica em tal contexto ao contemplar uma forma de gerir os conflitos com enfoque precípuo nas pessoas e em seus verdadeiros interesses. Tal método promove uma abordagem mais profunda da controvérsia ao funcionar como um acompanhamento das partes para que possam gerir seus conflitos e formular uma decisão célere, ponderada, eficaz e satisfatória em relação ao impasse instalado. §1º - A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e para o registro de imóveis. §2º - O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum, ou advogados de cada um deles, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. §3º - A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da Lei. 19 Para a Separação: Art. 1.574 CC: Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges se forem casados por mais de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por ele devidamente homologada a convenção; Para o Divórcio: Art. 1.580, §2º CC: O divórcio poderá ser requerido, por um ou por ambos os cônjuges, no caso de comprovada separação de fato por mais de dois anos; Art. 226, § 6º CF: O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. 20 Art. 1.124-A, § 3º do CPC, a gratuidade do procedimento extrajudicial dependerá apenas de declaração do interessado a respeito de sua impossibilidade financeira, não sendo necessário fazer prova da falta de recursos para seu custeio:“[...] § 3º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei”. E Art. 7º da resolução 35 do CNJ: “Para a obtenção da gratuidade de que trata a Lei nº 11.441/07, basta a simples declaração dos interessados de que não possuem condições de arcar com os emolumentos, ainda que as partes estejam assistidas por advogado constituído”. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 38 No dicionário jurídico organizado por J.M. Othon Sidou, a separação consensual é conceituada como um modo preliminar de extinção da sociedade conjugal por mútuo consentimento. Já o divórcio consensual acarretaria a dissolução definitiva da sociedade conjugal, independentemente da indicação de causa. Desta forma, para ser consensual basta existir mútuo consentimento dos cônjuges na separação; para o divórcio ser consensual, basta, também, existir consenso em definitivamente extinguir o vínculo conjugal, sem discussão do motivo que originou tal desejo. Ademais, conclui que o requisito da consensualidade na separação e no divórcio extrajudiciais se dá somente para exigir dos cônjuges concordância em pôr fim à sociedade conjugal, conforme preceitua o art. 1.571 do Código Civil: Art. 1.571. A sociedade conjugal termina: I - pela morte de um dos cônjuges; II – pela nulidade ou anulação do casamento; III - pela separação judicial; IV - pelo divórcio. § 1º O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente. § 2º Dissolvido o casamento pelo divórcio direto ou por conversão, o cônjuge poderá manter o nome de casado; salvo, no segundo caso, dispondo em contrário a sentença de separação judicial. Ainda acerca da questão da consensualidade, e seguindo a linha de raciocínio empregado pelo autor supracitado, Gaburri (2007) destaca que o procedimento extrajudicial, trazido pela lei em análise, restringe-se àquelas hipóteses de ausência de litigiosidade ou quando esta puder ser composta amigavelmente entre os contratantes, e se não envolver interesse de menores ou incapazes. Todo o procedimento, em resumo, visa resolver a partilha de bens entre maiores e capazes. Deste modo, reitera o autor que, caso perceba o tabelião que um dos contratantes esteja dispondo, no todo ou em parte, de sua meação ou mesmo renunciando à pensão alimentícia da qual notoriamente necessita, deverá recusar-se a lavrar a escritura. Ainda no que concerne à consensualidade, Hertel (2007, p.226) preceitua que: para a realização da separação ou do divórcio pela via administrativa, o Legislador exigiu o preenchimento de alguns requisitos. O primeiro deles é que os interessados estejam de comum acordo quanto às condições da dissolução, ou seja, somente admite-se a utilização da via administrativa quando a dissolução for consensual. Qualquer divergência entre os cônjuges obstará a utilização da via administrativa. Dá-se o desfazimento do casamento sem a intervenção judicial e sem a atuação do Ministério Público, através de simples manifestação de vontade dos cônjuges. Sendo assim, a B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 39 dissolução da sociedade conjugal por consenso, muitas vezes é uma atitude muito mais sensata do que foi o casamento, e este não necessita de qualquer intervenção do Poder Judiciário. b) não haver filhos menores ou incapazes das partes, hipótese em que a via judicial é obrigatória: O art. 1.124-A, incluído ao CPC pela lei em comento dispõe que a separação e o divórcio consensuais poderão ser realizados por escritura pública caso não haja filhos menores ou incapazes do casal, e observados os demais requisitos legais. No entendimento de Cahali e Rosa (2007, p.100), para a lavratura das escrituras de que trata o artigo em debate, o notário deverá se certificar de que o casal não possui filhos menores ou incapazes: a incapacidade se refere à falta de capacidade de fato, sendo esta a aptidão para o exercício dos direitos da vida civil sem a necessidade de assistência ou de representação. Assim, a incapacidade é o reconhecimento, pela lei, da inexistência dos requisitos para que uma pessoa possa exercer os seus direitos, e decorre de duas situações distintas, a menoridade ou a interdição. Afirmam ainda os autores, que a incapacidade decorrente da idade cessa aos dezoito anos, quando a pessoa passa a ter capacidade de fato e pode exercer livremente os atos da vida civil. “A emancipação, prevista no art. 5° do Código Civil, representa a aquisição da capacidade civil antes da idade legal, mas não resolve a menoridade. Ou seja, mesmo emancipada, a pessoa continua sendo menor”. Para Gaburri (2007), com a emancipação dos filhos menores nos termos do art. 5° do Código Civil, em que pese cessar a incapacidade, persiste a menoridade. Deste modo conclui- se pela necessidade do procedimento judicial, mormente pelo fato de que poderão os pais emancipar seus filhos menores para que, com intuito fraudulento, lhes sejam possibilitadas as vias extrajudiciais. Observa ainda o autor que, valendo-se da separação e divórcio extrajudiciais, vale dizer, mediante escritura pública, não haverá intervenção do MP, tampouco audiência perante o juiz, que não homologaria a separação ou o divórcio caso vislumbrasse alguma tentativa de fraude. Nessa linha de raciocínio, Hertel (2007, p.226) destaca que havendo filhos, salvo se todos capazes, a dissolução por meio da via administrativa é vedada. “Note-se que, mesmo que um filho seja maior, mas sendo ele incapaz, por qualquer outro motivo, não haverá possibilidade de ser realizada a dissolução administrativa do enlace matrimonial”. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 40 Cahali e Rosa (2007, p. 100/101) fazem uma análise sobre esta perspectiva, ressaltando que a questão é colocada à discussão, porque o artigo trata expressamente das duas hipóteses como impedimento para a lavratura da escritura pública de separação e de divórcio. “Não poderá o notário lavrá-la caso haja filhos menores do casal, ainda que emancipados, ou de filhos incapazes, menores ou interditos”. Outra, porém, é a orientação do Conselho Nacional de Justiça, que, através do art. 47 da Resolução 3521, demonstra admitir a utilização da via extrajudicial se os filhos menores forem emancipados. Outro ponto importante a esse respeito se refere à extensão que a expressão “filhos menores ou incapazes do casal” tem. Explicam os autores supra: em um primeiro momento, tem-se a impressão de que a regra impeditiva vale somente para os filhos havidos do casamento. Ou seja, se o casal tivesse um filho menor nascido desse casamento e quisesse se separar, teria que fazê-lo judicialmente. Se o filho fosse anterior ao casamento e apenas de um dos cônjuges, o casal poderia optar pela via judicial ou pela administrativa. Entretanto salientam os autores que a interpretação mais coerente com os princípios constitucionais vigentes aponta para outro sentido, uma vez que o art. 227 da Constituição Federal estabelece como dever da família, da sociedade e do Estado, dentre outros, resguardar as crianças e os adolescentes de todas as formas de preconceito: Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. [...] § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casament