UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI - UNIVATES CURSO DE DESIGN - BACHARELADO Laura Thomas Horn DESIGN EM TRAMAS: RESSIGNIFICANDO OBJETOS AFETADOS PELAS CHEIAS DO RS POR MEIO DA TAPEÇARIA ARTESANAL Laura Thomas Horn Memorial Descritivo apresentado no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso II, do curso de Design da Universidade do Vale do Taquari - Univates, como parte das exigências para a obtenção do título de bacharel em Design. Orientador(a): Prof. Me. Raquel Barcelos de Souza Lajeado, julho de 2024. DESIGN EM TRAMAS: RESSIGNIFICANDO OBJETOS AFETADOS PELAS CHEIAS DO RS POR MEIO DA TAPEÇARIA ARTESANAL Laura Thomas Horn A banca examinadora aprova o Projeto Aplicado de Design apresentado por meio deste Memorial Descritivo, parte integrante do componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso II, do curso de Design, da Universidade do Vale do Taquari - Univates, como parte das exigências para a obtenção do título de bacharel em Design. Prof. Me. Raquel Barcelos de Souza - Orientadora Universidade do Vale do Taquari - Univates Prof. Me. Rodrigo de Azambuja Brod - Avaliador Universidade do Vale do Taquari - Univates Prof. Dra. Renata Lohmann - Avaliadora Universidade do Vale do Taquari - Univates Lajeado, 16 de julho de 2024 DESIGN EM TRAMAS: RESSIGNIFICANDO OBJETOS AFETADOS PELAS CHEIAS DO RS POR MEIO DA TAPEÇARIA ARTESANAL RESUMO Desde as civilizações antigas, a relação entre homem e objeto tor- nou-se essencial para o crescimento da sociedade e a construção das culturas e, a partir disso, desenvolveu-se o gosto pela decora- ção de superfícies, especialmente em estruturas arquitetônicas e artefatos têxteis. O presente trabalho consiste na ressignificação de objetos afetados pelas cheias a partir dos estudos de design de superfície e design emocional. A metodologia de Munari (2008), mos- trou-se a mais adequada para a realização do projeto. Palavras-chave: design; design de superfície; design emocional; tapeçaria; ressignificar. ABSTRACT Since ancient civilizations, the relationship between man and object has become essential for the growth of society and the construction of cultures and, from this, a taste for surface decoration developed, especially in architectural structures and textile artifacts. The present work consists of the reframing of objects affected by floods based on studies of surface design and emotional design. Munari’s (2008) methodology proved to be the most appropriate for carrying out the project. Keywords: design; surface design; emotional design; tapestry; resignify. SUMÁRIO 1. CONTEXTUALIZAÇÃO 1.1. Introdução 1.2. Arte ou design de superfície? 2. METODOLOGIA DE PROJETO 3. DESENVOLVIMENTO 3.1 Problema 3.2 Dados 3.2.1 Objetos artesanais e design emocional 3.2.2 Por que a tapeçaria? 3.2.2.1 Gunta Stölzl na Bauhaus 3.2.2.2 Milan Design Week 3.2.2.3 Tapeçaria no Brasil 3.2.3 Azulejo português em Pernambuco 3.2.4 Painel de inspiração 3.3 Criatividade 3.4 Materiais e processos 3.4.1 Tapeçaria: como tramar 3.4.1.1 Tear 3.4.1.2 Urdumes 3.4.1.3 Tramas 3.4.2 Tecidos: com o que tramar 3.4.3 Objetos: porque tramar 3.5 Experimentação 3.6 Solução 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 5. REFERÊNCIAS 1.1 Introdução Modificar e ressignificar o espaço no qual se habita sempre foi uma necessidade do ser humano. Desde as civilizações antigas, a relação entre homem e objeto tornou-se essencial para o crescimento da sociedade e a construção das culturas e, a partir disso, desenvolveu-se o gosto pela decoração de superfícies, especialmente em estruturas arquitetônicas e artefatos têxteis. Segundo Rüthschiling (2008), a relação entre design de superfície e o público acontece na interação das quali- dades sensoriais que essas superfícies oferecem. Sendo assim, entende-se o design de superfície para além de uma solução gráfica e visual, mas como uma ferramenta protagonista na solução de problemas de relacionamen- to entre homem e objeto. Pode-se dizer que as raízes do design de superfície estão presentes na linguagem visual da cerâmica e tecelagem, conhecidas hoje como azulejaria e tapeçaria. Em Portu- gal, país conhecido como “país do azulejo”, sua primeira utilidade foi com fins decorativos, objetivando o embele- zamento urbanístico e a necessidade de alegrar (Souza, 2013). Após sua popularização, o azulejo acabou desen- volvendo um protagonismo pela sua versatilidade e funcionalidade. 1 CONTEXTUALIZAÇÃO 9 No Brasil, a prática de revestimento de fachadas com azulejos iniciou-se entre as décadas de 1830 e 1840, com uma função não apenas estética, mas também utilitária, sendo muito importante para proteger contra a umidade devido ao clima tropical do país. Segundo Simões (1965, apud Cavalcanti e Cruz, 2002) o azulejo se nacionalizou brasileiro no estado de Pernambuco. Um marco importante foi a chegada de cerca de 1400 unida- des de azulejos de origem portuguesa no estado. O principal objeto de estudo para a pesquisa, realizada no Trabalho de conclusão de Curso I na graduação em Design da Univates, foi o livro “O Azulejo na Arquitetura Civil de Pernambuco - Século XIX” (Cavalcanti e Cruz, 2002)”, a partir dessa leitura, identificou-se os mais antigos azulejos encontrados no estado de Pernambuco, 120 deles são de origem portuguesa e 45 têm origem francesa. Este total de 165 azulejos se aproxima do número de imóveis que ainda exibem azulejos em suas fachadas no estado. Dentro dessa pesquisa, foram selecionados dez painéis de azulejo de origem portuguesa no estado de Pernam- buco para analisar os elementos e a composição visual desses azulejos. O critério para a escolha desses painéis foi conseguir uma grande diversidade de elementos, cores e texturas. A partir dessa análise, foram retirados elementos gráficos de cada um dos painéis de azulejos. O projeto final consiste na criação de novas padrona- gens a partir dos elementos retirados dos painéis, segui- do da análise e seleção dos desenhos desenvolvidos e aplicação dos mesmos em uma nova superfície diferente da analisada. Para a escolha da nova superfície na qual foi desenvolvi- do o projeto, foram pesquisadas diversas áreas de aplicação do design de superfície, sendo elas: papelaria, cerâmica, materiais sintéticos, interfaces virtuais e têxtil. Segundo Rüthschilling (2008), o têxtil se tornou a maior área de aplicação do design de superfície e com maior diversidade de técnicas, pois aborda todos os tipos de tecidos e nãotecidos a partir de diferentes métodos de entrelaçamento de fios. Tendo em vista o objetivo de criar novas possibilidades dentro do ramo do design de superfície, foi escolhida a área têxtil para a realização do projeto. 10 O têxtil aborda as técnicas de tecelagem, malharia, rendas, felpados, tapeçaria, e suas formas de acaba- mento e embelezamento como tinturaria, estamparia e bordados (Rüthschiling, 2008). Dentre elas, para o desen- volvimento do projeto destaca-se a tapeçaria: técnica artesanal e industrial de construção de tapetes e carpe- tes. 1.2 Arte ou design de superfície? O conceito de design de superfície chega ao Brasil na década de 1980, após Renata Rubim voltar de um perío- do de estudos nos Estados Unidos. Até então, o design de superfície não era considerado uma área do design, mas sim um desdobramento das artes. Rubim (2010) promove uma reflexão sobre a questioná- vel superficialidade do design de superfície: “O que é um tapete? É design de produto, é design têxtil, é arte ou não é nada disso? Ou trata-se apenas de uma peça decorativa sem qualquer preocupação maior de conteú- do?” É fato que o tratamento de superfícies se tornou um ramo importante dentro do design, mas o que é considerado design de superfície? A autora complemen- ta: “design de superfície trata-se apenas do tratamento cosmético que se dá a alguns produtos? Trata-se sempre de algo superficial, descartável, sem importância e sem qualquer conotação estética ou projetual mais aprofun- dada?” De modo geral, o design de superfície se preocupa com a criação de qualidades estéticas, funcionais e estrutu- rais desenvolvidas especificamente sobre uma superfí- cie, tendo em vista o contexto sociocultural, diferentes necessidades e os processos produtivos. Essa superfície pode ser expandida para além de um elemento bidimensional, passando a ser vista como uma estrutura gráfica tridimensional com características visuais, táteis, funcionais e simbólicas, possibilitando criar uma interação lúdica para transformação do coti- diano, propondo ao usuário interferir e ressignificar o próprio design. 11 12 Entende-se a metodologia projetual como uma série de operações necessárias ditadas pela experiência, dispos- tas em uma ordem lógica de execução do projeto a ser desenvolvido. Segundo Munari (p.10, 2008) seu objetivo é “atingir o melhor resultado com o menor esforço.” O autor defende a utilização de um método de projeto em todo o campo do design, justificando que criatividade não significa pensar de forma artística procurando uma solução imediata. Na obra “Das Coisas Nascem Coisas” (2008), o autor propõe uma metodologia projetual com foco na concep- ção de artefato seguindo 12 etapas de desenvolvimento (Figura 01). Esse método permite que o designer realize experimentação revisando sempre que necessário as etapas do projeto para alcançar o melhor resultado. 2 METODOLOGIA DE PROJETO 13 Munari (2008) defende que a metodologia projetual não é absoluta nem definitiva, permitindo que o designer modifique e adapte as etapas conforme as necessida- des, estimulando o mesmo a descobrir novos métodos que podem complementar o desenvolvimento do proje- to. A partir desses dados, a metodologia projetual de Bruno Munari foi dividida em 6 etapas, buscando aper- feiçoar o processo de criação agrupando etapas simila- res para simplificar a aplicação e desenvolvimento deste projeto. Figura 1 - Metodologia de Bruno Munari (2008) Fonte: Da autora (2024) 14 Figura 2 - Adaptação da metodologia de Munari (2008) Fonte: Da autora (2024) 15 16 O problema deste projeto está na ressignificação de objetos afetados pelas enchentes de maio de 2024, no Rio Grande do Sul, por meio do design de superfície. Como subproblemas, pode-se destacar: compreender a relação entre artes e design; a criação de estampas e padronagens tendo como base os elementos retirados dos painéis de azulejo português, analisados no trabalho de conclusão de curso I da autora; recolhimento e sele- ção da matéria prima da indústria têxtil; estudo e com- preensão das técnicas de tecelagem e tapeçaria artesa- nal; seleção e limpeza de objetos afetados pelas enchentes; criação de design de superfície têxtil aplica- do nos objetos afetados. O possível limite para o projeto pode-se considerar a técnica artesanal, pois impossibilita a criação em larga escala, porém se justifica na conexão pessoa-objeto e nas sensações envolvidas nesse processo. 3 DESENVOLVIMENTO 3.1 Problema: 17 3.2 Dados: A etapa de coleta de dados se divide em três fases importantes para o desenvolvimento do problema: a importância do design artesanal e emocional para o projeto, a pesquisa sobre referências da tapeçaria, bem como a análise de similares e os resultados obtidos a partir da análise dos painéis de azulejo português reali- zado no trabalho de conclusão de curso I da autora. 3.2.1 Objetos artesanais e design emocional O objeto artesanal é definido por Lima (2005 apud Prudencio, 2012) pela combinação de duas condições: o processo de produção essencialmente manual e a liberdade do artesão na condução do projeto, podendo definir o ritmo e os processos de produção e a matéria- -prima conforme a realidade em que o se encontra. Muito antes de um objeto artesanal ser um nome ou uma marca, ele é a assinatura de quem o fez, conservando, real ou metaforicamente, suas impressões digitais (Prudencio, 2012). Com isso, pode-se dizer que os artefa- tos confeccionados à mão, sendo esses utilitários ou não, são a materialização de saberes culturais e de identidade das civilizações. Norman acredita que os objetos desempenham um papel muito maior do que apenas meros bens materiais: “um objeto favorito é um símbolo que induz a uma pos- tura mental positiva, um lembrete que nos traz boas recordações, uma expressão de nós mesmos” (Norman, 2008, p.26). Segundo o autor, qualquer design está sempre entrela- çado em três dimensões: visceral, comportamental e reflexivo. O visceral é o que a natureza faz, coexistimos no mesmo ambiente com outros seres vivos, condições climáticas e fenômenos naturais e, a partir disso, somos regularmen- te sintonizados para receber os sinais emocionais do ambiente (Norman, 2008). Essa dimensão está ligada à estética, no julgamento rápido do bonito ou feio, quero ou não quero, bom ou ruim. Em contraponto, o comportamental diz respeito ao uso sob o ponto de vista objetivo, sem se importar com a aparência. O autor define como importante: função, compreensibilidade, usabilidade e sensação física. É o prazer de realizar uma tarefa do início ao fim de forma fluida e sem interrupções (Norman, 2008). Nessa dimen- são, o desempenho se destaca como essencial e deve satisfazer uma necessidade. 18 O nível reflexivo comunica uma mensagem. Está relacio- nado com a cultura, o significado de um produto ou de seu uso, as lembranças pessoais e com a auto-imagem. Essa dimensão está nas relações de longo prazo e expe- riência de uso. Norman argumenta que “a beleza exami- na por baixo da superfície, a beleza vem da reflexão consciente e da experiência” (Norman, 2008, p. 111). Para o autor, a aparência da superfície e utilidade com- portamental desempenham papéis pequenos no nível reflexivo. Nessa dimensão, é levado em consideração a história da interação, as associações que as pessoas têm com os objetos e as lembranças que eles evocam. “Utilidade e usabilidade são importantes, mas sem diversão e prazer, alegria e entusiasmo, e até ansiedade e raiva, medo e fúria, nossas vidas seriam incompletas.” (NormanN, 2008, p. 28) Para Norman (2008), não é possível ter design sem essas três dimensões. A partir desse pensamento e dos estu- dos realizados, observa-se a possibilidade de, neste trabalho, trazer um novo significado visceral e reflexivo para objetos que eram utilizados totalmente de forma funcional e que, devido a fenômenos externos, se torna- ram inutilizados. Nesse sentido, o projeto utiliza a tapeçaria para ressigni- ficar a superfície de alguns objetos afetados pelas en- chentes de maio de 2024 do Rio Grande do Sul, trazendo um novo sentido para os mesmos. 3.2.2 Por que a tapeçaria? O têxtil se tornou a maior área de aplicação do design de superfície e com maior diversidade de técnicas. Suas técnicas abordam: rendas; felpados; tecelagem, definido pelo entrelaçamento de fios verticalmente (urdume) com fios horizontais (trama) para se obter um tecido plano; jacquard, uma técnica específica de tecelagem para revestimento de estofados; tapeçaria, técnica artesanal e/ou industrial de construção de tapetes; e suas formas de acabamento e embelezamento como tinturaria, estamparia e bordados (Rüthschiling, 2008). 3.2.2.1 Gunta Stölzl na Bauhaus Com o passar do tempo, o têxtil se tornou uma das áreas mais bem sucedidas da Bauhaus, desenvolvendo habilidades manuais como teares manuais, bordados e tricô, além de técnicas industriais. Fundada por Walter Gropius em abril de 1919, na Alemanha, a escola de design e artes tinha como principal objetivo unir arte e artesanato. 19 A Oficina de Tecelagem foi fundada em conjunto com a escola e logo se tornou um “gueto” feminino, pois era uma das poucas oficinas que as mulheres podiam fre- quentar. Os tecidos desenvolvidos pelas alunas nas oficinas tinham dois propósitos: usados para resolver problemas práticos, aplicados em projetos residenciais desenvolvidos pelos alunos da Bauhaus ou a pedido da indústria; e para fins artísticos, priorizando a estética e a expressão das alunas, servindo também como estudo de cores, formas e texturas (Moreira, 2019). Gunta Stölzl (05/03/1897 - 22/04/1983), aluna, professo- ra e posteriormente diretora da oficina de tecelagem da Bauhaus, foi uma das mais importantes designers têxteis da época. A designer trouxe conhecimento das técnicas de tecelagem e produção industrial para a escola, além de sistemas de teares para a aprendizagem das alunas. Stölzl desenvolveu diversos projetos têxteis, como carpetes, tecidos para decoração e tecidos para móveis de outros designers, também ajudou a manter a escola financeiramente a partir da venda de seus produtos (Moreira, 2019). Seus trabalhos abordavam a descons- trução de formas e cores. Figura 3 - Oficina de tecelagem bauhaus Fonte: Site oficial Gunta Stölzl (1928) 20 Figura 4 - Peça de tapçaria de Gunta Stölzl Fonte: Site oficial Gunta Stölzl (1928) Stölzl trouxe destaque e reconhecimento para a oficina de tecelagem da Bauhaus e para toda a área da tapeça- ria artesanal e industrial, além de incentivar e encorajar diversas mulheres a entrarem para o ramo da arte e do design na época. Segundo Baumhoff (2001 apud Moreira, 2019), foi a oficina de tecelagem que mais se aproximou dos conceitos iniciais da Bauhaus de unir arte e maqui- nário, pois diversos projetos das alunas foram produzi- dos industrialmente. 21 3.2.2.2 Milan Design Week Este ano, a Milan Design Week, o maior evento dedicado ao design e à inovação do mundo, contou com diversas empresas da indústria têxtil, como Jan Kath, Moret e Nanimarquina, algumas desenvolvendo peças de tapeça- ria manualmente durante o evento (figura 5). Jan Kath (nascido em 1972), designer alemão, é um dos designers de tapetes feitos à mão mais requisitados do mundo. Seu trabalho consiste em combinar elementos clássicos da tapeçaria oriental com um estilo contempo- râneo e minimalista (Figura 6). Kath também usa a inter- pretação de motivos fotorrealistas na arte têxtil, no qual aperfeiçoa juntamente com os seus tecelões de tapetes nas oficinas em Katmandu (Nepal). “Eu quero criar as antiguidades do amanhã” (JAN KATH).Figura 5 - Milan Design Week 2024 Figura 6 - Tapeçaria de Jan Kath Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) 22 Para a produção dos tapetes na empresa de Kath, é montado um desenho em pixels (Figura 7) no papel, onde é pintado cada área com as cores que serão utilizadas no produto final, esse gabarito serve como um mapa para guiar o artesão na hora de confeccionar a peça (Figura 8) . Figura 7 - Gabarito da tapeçaria de Jan Kath Figura 8 - Produção de tapeçaria seguindo o gabarito Fonte: Intagram de Jan Kath @ jankathofficial (2024) Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) 23 Outra empresa presente na Milan Design Week é a Moret, uma fábrica italiana com artesanato turco, que presta um serviço de produção de tapetes contemporâ- neos sob medida em colaboração com designer e arqui- tetos, seu objetivo é a criação de ambientes exclusivos para promover os tapetes Moret como peças peças de arte-design colecionáveis, únicos e raros. Na Moret, processo de criação, produção e entrega do produto segue a seguinte organização: Análise a partir da visão do cliente considerando a melhor solução técni- ca e financeira; estudo gráfico e escolha de técnicas baseado na necessidade do cliente; compra de matéria- -prima natural (Figura 10) para garantir a qualidade do produto; desenvolvimento dos tipos de fios escolhidos para a peça; tingimento dos fios com as cores escolhi- das; tecelagem manual ou mecânica; acabamentos nas bordas, queima dos fios e lavagem da peça; embalagem e transporte; e por fim a instalação no local. Figura 9 - Tapeçaria de Moret Figura 10 - Materia-prima da tapeçaria de Moret Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) 24 A Nanimarquina também participou da Milan Design Week. Trata-se de uma empresa familiar espanhola que surgiu na década de 1970 em Barcelona. Um de seus maiores projetos de destaque é o Losanges (Figura 11), criado a partir de técnicas adquiridas das raízes do artesanato do Paquistão. A técnica (Figura 12) consiste na organização de cores de uma forma mais espontâ- nea, menos padronizada e com um caráter mais ousado e extremo. Figura 11 - Tapeçaria Losanges de Nanimarquina Figura 12 - Produção da peça Losanges de Nanimarquina Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) Fonte: Acervo pessoal da autora (2024) 25 3.2.2.3 Tapeçaria no Brasil Alguns nomes de destque no ramo da tapeçria no Brasil são Tomie Ohtake, Alex Rocca e Carmen Lenartowicz. Tomie Ohtake (21/11/1913 - 12/02/2015) entrou no campo da prática artística aos 39 anos. A artista plástica japonesa chegou ao Brasil e iniciou sua carreira artística na pintura, experimentando também os desenhos, gravu- ras, esculturas e a tapeçaria. Sua carreira alcançou maior reconhecimento a partir dos 50 anos, período em que realizou exposições individuais e ganhou prêmios na maioria dos salões brasileiros. Um de seus trabalhos de maior destaque foi a peça de tapeçaria criada para o Memorial da América Latina, o exemplar de 1990 possui 70 metros de largura e foi instalado na lateral interna no Auditório, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Figura 13 - Tapeçaria de Tomie Ohtake no Memorial da América Latina Fonte: Site oficial Tomie Ohtake (2023) 26 Alex Rocca é um designer e artista têxtil de Curitiba. Estudou informática, cinema e design de interiores, mas encontrou sua verdadeira expressão na arte com lãs e cores, utilizando técnicas como tufting e bordado. Suas obras são marcadas pela busca por liberdade artística e um olhar poético inspirado na arquitetura e no cinema, criando peças sensoriais que exploram sombras, volu- mes e texturas. Em seus trabalhos, Rocca utiliza mate- riais como lã natural, algodão, viscose, seda, bambu, fibra de papel, sisal, cobre, etc. Carmen Lenartowicz, também é uma artista têxtil com diversos trabalhos em tapeçaria para parede. Em seus trabalhos, a artista utiliza texturas e volumes para criar peças inspiradas nos arrecifes de corais a partir das técnicas de crochês e bordados. As obras transmitem uma mensagem de conscientização e responsabilidade para a proteção dos ecossistemas marinhos. Figura 14 - Tapeçaria de Alex Rocca Figura 15 - Tapeçaria de Carmen Lenartowicz Fonte: Site oficial de Alex Rocca (2021) Fonte: Instagram de Carmen Lenartowicz @carmenlenartowicz (2021) 27 3.2.3 Azulejo português em Pernambuco Na pesquisa do trabalho de conclusão de curso I da autora, foram analisados os padrões visuais de dez painéis de azulejo de origem portuguesa encontrados no estado de Pernambuco. Nesta análise, foram obser- vados os elementos como ponto, linha, forma, textura, cor e transparência, além da identificação de equilíbrio, proporção, harmonia, contraste, radiação, graduação e repetição. A partir desta análise, destacou-se sete painéis para a realização do presente trabalho. Os painéis foram apre- sentados da seguinte forma: módulo, identificação dos elementos de destaque, elementos destacados do módulo, imagem do painel, sistema de repetição e paleta de cores identificadas no módulo. Painel 1: figura 16. Superfície lisa; elementos assimétri- cos no módulo; uso do azul, cor destaque da azulejaria portuguesa, além da cor base do azulejo; repetições simples, ou seja, o módulo sempre estará na mesma posição e sentido dentro do painel; motivos com ele- mentos da natureza e formas orgânicas. A partir da análise do painel, destacou-se 5 elementos que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 16 - Painel de análise 1 Fonte: Da autora (2024) 28 Painel 2: figura 17 Superfície lisa; conjunto de elementos simétricos no módulo; uso de azul e amarelo, além da cor base do azulejo; repetições simples, ou seja, o módulo sempre estará na mesma posição e sentido dentro do painel; motivos com formas orgânicas e geométricas. A partir da análise do painel, destacou-se 3 elementos que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 17 - Painel de análise 2 Fonte: Da autora (2024) 29 Painel 3: figura 18 Superfície lisa; conjunto de elementos simétricos no módulo; uso de amarelo e verde escuro; repetições com rotação, ou seja, o módulo é rotacionado no sentido horário para a graduação do painel; motivos com ele- mentos da natureza e formas orgânicas. A partir da análise do painel, destacou-se 3 elementos que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 18 - Painel de análise 3 Fonte: Da autora (2024) 30 Painel 4: Figura 19 Superfície lisa; elementos simétricos no módulo; uso de dois tons de azul, além da cor base do azulejo; repeti- ções simples, ou seja, o módulo sempre estará na mes- ma posição e sentido dentro do painel; motivos com linhas e formas geométricas. A partir da análise do painel, destacou-se 3 elementos que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 19 - Painel de análise 4 Fonte: Da autora (2024) 31 Painel 5: Figura 20 Superfície lisa; conjunto de elementos simétricos no módulo; uso do azul e cor base do azulejo; repetições com rotação, ou seja, o módulo é rotacionado no sentido horário para a graduação do painel; motivos com ele- mentos da natureza e formas orgânicas. A partir da análise do painel, destacou-se 3 elementos que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 20 - Painel de análise 5 Fonte: Da autora (2024) 32 Painel 7: Figura 21 Painel com dois módulos. Módulo 1: Superfície lisa; elementos simétricos; uso do azul e cor base do azulejo; repetições simples, ou seja, o módulo sempre estará na mesma posição e sentido den- tro do painel; motivos com formas geométricas. Módulo 2: Superfície lisa; conjunto de elementos simétri- cos; uso do azul e cor base do azulejo; repetições sim- ples, ou seja, o módulo sempre estará na mesma posição e sentido dentro do painel; motivos com elementos da natureza e formas orgânicas. A partir da análise do painel, destacou-se 4 elementos: 3 dos módulos e 1 elemento da faixa que compõe o painel, que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 21 - Painel de análise 6 Fonte: Da autora (2024) 33 Painel 7: Figura 22 Superfície lisa; conjunto de elementos simétricos no módulo; uso de azul, amarelo, verde, laranja e preto, além da cor base do azulejo; repetições simples, ou seja, o módulo sempre estará na mesma posição e sentido dentro do painel; motivos com com elementos da natureza. A partir da análise do painel, destacou-se 4 elementos que serão utilizados na etapa Criatividade do projeto. Figura 22 - Painel de análise 7 Fonte: Da autora (2024) 34 A partir da análise, obteve-se os elementos visuais da figura 23 que serão utilizados para a criação das novas padronagens. Figura 23 - Elementos de destaque dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 35 3.2.4 Painel de inspiração O painel de inspiração foi montado a partir dos seguintes dados: análise de similares ou seja, referências de produ- tos que apresentam técnicas de tapeçaria artesanal; objetos transformados para uso não convencional; inspi- rações de estampas e padronagens; paleta de cores desejável no projeto; e os módulos de azulejo citados no item 3.2.3. Figura 24 - Painel de inspirações Fonte: Da autora (2024) 36 3.3 Criatividade: A etapa criativa do projeto foi desenvolvida a partir da análise dos painéis de azulejo português, utilizando como base para a criação de novas padronagens os elementos destacados dos painéis. A partir disso, obser- vou-se os seguintes requisitos: as padronagens deveriam manter uma continuidade independente do desenho do módulo, ou seja, todas as padronagens deveriam se encaixar em qualquer sentido ou posição. Para isso, a criação dos módulos foi feita a partir da técnica de rapport, citada por Rubim em “Desenhando a Superfície” (2010). Segundo Rubim (2010), rapport é o termo utilizado para se referir a forma de repetição e modulação de um desenho (módulo). A técnica citada pela autora (figura 25), consiste na junção das extremidades para a continuação do dese- nho do módulo, tornando sua repetição contínua, assim, poderá ser aplicada em qualquer superfície por meio da repetição do módulo. Figura 25 - Técnica de rapport Fonte: Livro “Desenhando a Superfície” de Renata Rubim (2010) 37 Para a criação dos módulos, inicialmente dividiu-se o mesmo conforme a Figura 26 e identificou-se os locais de encaixe do desenho no módulo (Figura 27) seguindo a técnica de rapport citada por Rubim (2010). Assim, os módulos poderão ser repetidos mantendo a continuida- de do desenho. Com o encaixe do módulo definido, iniciou-se a geração de alternativas com os elementos destacados dos pai- néis de azulejo. Nessa etapa, foram experimentados diferentes agrupamentos e disposições dos elementos para desenvolver os módulos. As cores foram escolhidas inicialmente tendo como referência os painéis de azulejo português e o painel de inspirações, priorizando o azul e branco. Figura 26 - Divisão do módulo Figura 27 - Locais de encaixe do desenho no módulo Fonte: Da autora (2024) Fonte: Da autora (2024) 38 Figura 29 - Geração de alternativasFigura 28 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 39 Figura 30 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) módulo sistema de repetição 40 Figura 31 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 41 Figura 33 - Geração de alternativasFigura 32 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 42 Figura 34 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 43 Figura 36 - Geração de alternativasFigura 35 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 44 Figura 37 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 45 Figura 39 - Geração de alternativasFigura 38 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 46 Figura 40 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 47 Figura 42 - Geração de alternativasFigura 41 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 48 Figura 43 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 49 Figura 45 - Geração de alternativasFigura 44 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 50 Figura 46 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 51 Figura 48 - Geração de alternativasFigura 47 - Elementos dos painéis Fonte: Da autora (2024)Fonte: Da autora (2024) 52 Figura 49 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 53 Figura 50 - Padronagem desenvolvida com elementos dos painéis de azulejo Fonte: Da autora (2024) 54 3.4 Materiais e processos: Nessa etapa, buscou-se entender os processos da tape- çaria artesanal e suas técnicas de produção, bem como a escolha e seleção dos materiais e objetos utilizados no projeto. 3.4.1 Tapeçaria: como tramar As peças de tapeçaria artesanal são produzidas em teares, uma espécie de moldura onde são dispostos fios no sentido vertical (urdume) seguido do entrelaçamento de fios no sentido horizontal (trama). As técnicas apre- sentadas a seguir são baseadas na produção de tapeça- ria artesanal de Diana Cunha, artista têxtil portuguesa. 3.4.1.1 Tear Segundo Cunha (2019), na tapeçaria artesanal encon- tram-se vários tipos de teares manuais: o pente liço, tipo mais complexos de tear que garante a separação e espaçamento do urdume; tear de pregos, que consiste em uma moldura com pregos nas extremidades para prender as linhas do urdume; tear circular, onde os fios do urdume são dispostos como uma teia, neste a trama começa a ser trabalhada a partir do centro; tear de moldura, tipo mais simples de tear que pode ser cons- truído com quatro pedaços de madeira formando uma moldura; teares não convencionais, objetos diversos nos quais podem ser tramados uma tapeçaria, nestes as peças possuem uma moldura fixa, ou seja, a peça não é retirada do tear. Figura 51 - Tipos de tear Fonte: Cunha, Diana (2019) Tear não convencional Tear de moldura Tear circular Tear pente liço Tear de pregos 55 3.4.1.2 Urdumes As técnicas de preparação do urdume e disposição das tramas foram apresentadas a partir do tear de moldura, mas podem ser aplicadas da mesma maneira nos demais tipos de tear. A preparação do urdume pode ser feita de duas formas: teia de vários fios, no qual cada linha do urdume é colo- cada separadamente, nesta técnica a tensão pode ser mais facilmente controlada; e teia de fio único, nesta téc- nica é usado um fio contínuo que forma todo o urdume. Em ambas as técnicas, deve ser usado um fio sem elasti- cidade para não deformar a peça e manter a mesma tensão em cada linha. A distância dos fios do urdume pode variar dependendo do tipo e tamanho de peça que se deseja criar. 3.4.1.3 Tramas A trama de uma peça de tapeçaria pode ser feita de diversas formas e com diferentes tipos de tecido. Os pontos básicos das tramas são: ponto travão, ponto tafetá, ponto sumac e franjas. Figura 52 - Preparação do urdume Fonte: Elaborado pela autora (2024) 56 O ponto travão é um dos pontos fundamentais da tape- çaria, é uma espécie de nó utilizado para delimitar a parte inferior e superior da peça, impedindo que a trama se desfaça, também pode ser usada para criar espaços vazios e definir contornos da peça. Inicia-se o ponto dando um nó no primeiro fio do urdume e seguindo conforme a figura 30, para finalizar, faz-se o mesmo nó no último fio do urdume ou até o ponto que se deseja limitar. O tafetá é o ponto mais comum da tapeçaria e pode resultar em diferentes padrões conforme a maneira que for tramado. Consiste em passar o fio da trama interca- lando horizontalmente com o fio do urdume por cima e por baixo. O ponto deve iniciar por baixo do primeiro fio do urdume, bem como finalizar por baixo do último fio, assim a ponta do fio da trama permanece na parte de trás da peça. Figura 53 - Ponto travão Figura 54 - Ponto tafetá Fonte: Elaborado pela autora (2024) Fonte: Pinterest da autora (2024) 57 Para as franjas, primeiramente deve-se definir o compri- mento desejado para a peça, a partir disso, duplica-se o tamanho do fio e corta-se esse pedaço na quantidade necessária para essa parte da peça. O ponto é feito passando o fio da trama por cima de dois fios do urdu- me, depois passa-se as duas pontas entre os mesmos dois do urdume. Para esse ponto, é essencial ter o ponto tafetá por baixo de onde deseja-se aplicar as franjas, para as mesmas não se desmancharem. Por último, o ponto sumac é um dos pontos que mais da textura à peça. Deve-se iniciar o ponto passando o fio da trama por baixo do primeiro do urdume e em seguida por cima do segundo fio, após isso, dá-se a volta por baixo do segundo fio do urdume conforme a Figura 56, segue-se nesse mesmo esquema até finalizar a parte desejada. Cunha (2019) atenta para que a trama seja feita sem apertar os pontos com o fio, evitando que a peça se deforme, para isso deve-se sempre conferir se os fios do urdume continuam paralelo com o tear. Figura 55 - Franjas Figura 56 - Ponto sumac Fonte: Pinterest da autora (2024) Fonte: Pinterest da autora (2024) 58 Para a finalização, a artista indica que a última linha da trama seja feita com pontos firmes, ou seja, ponto travão ou sumac, para as demais tramas da peça não desloca- rem. Cunha (2019) também destaca a importância de finalizar todos os pontos por trás da peça, assim os arremates ficam escondidos, pode-se fazer um nó com o fio e cortar o excesso ou escondê-lo entre a trama. Por fim, pode-se escolher tirar a peça do tear ou não. 3.4.2 Tecidos: com o que tramar Um dos requisitos que se identificou necessário para o projeto é a reutilização de materiais. Vive-se um momen- to em que questionar e repensar a maneira em que se consome é essencial para diminuir os impactos no plane- ta. A partir disso, entende-se que também é um papel do design se preocupar com essa pauta, assim, optou-se pela reutilização de matéria-prima da indústria têxtil para a confecção das peças de tapeçaria. A Run More é uma empresa de moda feminina sediada na cidade de Estrela-RS que, mesmo sendo uma indús- tria, tem a sustentabilidade como um de seus valores e busca sempre reduzir os impactos ambientais. A empre- sa também procura dar o destino mais correto para as sobras de tecido, com isso, identificou-se a possibilidade de contribuir com a destinação desse material por meio do design, assim, foram recolhidos cerca de 90 kg de retalhos de tecido da empresa. Figura 57 - Sobras da indústria têxtil Fonte: Da autora (2024) 59 Estes tecidos foram separados e organizados em uma tabela por tipos de composição e cores, ao todo identifi- cou-se mais de 100 tecidos diferentes. A composição dos tecidos são, em sua maioria, poliamida, poliéster, elastano e algodão. As cores variam entre cores primá- rias, secundárias, terciárias e tons neutros. 3.4.3 Objetos: porque tramar A escolha dos objetos para confecção das peças de tapeçaria foi feita a partir da reflexão sobre os aconteci- mentos climáticos de maio de 2024 no Rio Grande do Sul. As cheias atingiram lugares nunca antes imaginados, causando a destruição de grande parte das cidades. Sabe-se que também é papel do design se manifestar diante as situações da atualidade e, tendo isso em vista, identificou-se necessário o envolvimento de objetos atingidos pelas cheias no presente trabalho, afinal foi a realidade vivida pela autora durante esse processo. Para isso, foram resgatados cinco objetos inutilizados pelas cheias: duas cadeiras de madeira, uma mesa de ferro, um suporte de som e um patins. Figura 58 - Cores e tipos de tecido Fonte: Da autora (2024) 60 Figura 59 - Cadeiras de madeira antes das cheias Figura 60 - Cadeiras de madeira depois das cheias Fonte: Da autora (2003) Fonte: Da autora (2024) 61 Figura 61 - Suporte de som antes das cheias Figura 62 - Suporte de som depois das cheias Fonte: Carvalho, Juliano (2024) Fonte: Da autora (2024) 62 Figura 65 - Patins antes das cheias Figura 66 - Patins depois das cheias Fonte: Da autora (2022) Fonte: Da autora (2024) 63 Após a seleção dos objetos, foi realizada a limpeza e res- tauração dos mesmos para iniciar a confecção das peças de tapeçarias, para isso, o processo utilizado foi a trama em tear não convencional, citado por Cunha (2019) na etapa 3.4.1.1. 3.5 Experimentação: Na etapa de experimentação do projeto, foram testadas as técnicas de tapeçaria apresentadas na etapa 3.4. Também foram escolhidos os módulos para a confecção da tapeçaria, assim como a paleta de cores para as peças e o tipo de ponto utilizado em cada uma delas. Para experimentar os tipos de disposição de urdume e pontos da trama, foi construído um tear com estacas de madeira medindo 130cm x 130cm e nele montou-se a base do urdume seguindo a técnica de fio único. O material utilizado para a teia foi o fio de algodão. Figura 67 - Limpeza dos objetos Figura 68 - Tear construido pela autora Fonte: Da autora (2024) Fonte: Da autora (2024) 64 A partir da identificação dos tecidos na etapa 3.4.2, foi adaptada a paleta de cores dos módulos conforme as cores e quantidades de tecido. Figura 69 - Testes de cores Fonte: Da autora (2024) 65 Para a utilização dos tecidos, os mesmos foram corta- dos em tiras variando entre 1cm e 3cm de largura, variando com o tipo, textura e elasticidade de cada tecido, bem como o ponto utilizado para cada parte das peças. A partir disso, testou-se os pontos de trama (ponto travão, tafetá, sumac e franjas) com diferentes tipos de tecidos para entender como cada um se comportava na peça. Também foi testado a disposição de urdumes com vários fios em um tear de moldura. Essa etapa foi impor- tante para identificar e escolher os tecidos e pontos mais adequados para cada parte das peças.Figura 70 - Tecido cortado e separado Figura 71 - Tear com vários fios Fonte: Da autora (2024) Fonte: Da autora (2024) 66 3.5 Solução Como solução, foram selecionados cinco padrões cria- dos para aplicação nos objetos. Após a identificação e escolha dos tecidos e pontos para cada peça, montou-se um desenho de construção para guiar a autora no momento da trama. Para esse guia, foi medida a área do local de aplicação da peça no objeto e dividida em centímetros. Os fios do urdume foram distri- buídos com a distância de 1cm entre eles e, para os fios da trama, buscou-se manter a largura de 1cm também. Em alguns casos, os pontos tiverem que ser adaptados tendo em vista a espessura do tecido. O tamanho do módulo foi adaptado a partir da área tramada na peça. Devido à espessura dos tecidos, optou-se por tramar um módulo avulso nos objetos, ou seja, sem utilizar o sistema de repetição, para preservar a nitidez dos elementos dos módulos. 67 Cadeira 1: Roda de chimarrão de domingo A área de aplicação da cadeira possui a medida de 30cm x 30cm. A partir disso, dividiu-se o módulo no desenho de construção para o desenvolvimento da peça. Para a teia do urdume, foi utilizado o fio de algodão de 3mm de espessura na técnica de fio único com espaça- mento de 1cm entre cada linha. Para a trama, foram utilizados quatro tipos de tecido de poliamida com texturas e espessuras diferentes. Os pontos utilizados foram: ponto tafetá na cor bege; ponto tafetá na cor azul; ponto sumac na cor verde; e ponto sumac na cor vermelha. O ponto travão da peça foi feito com o mesmo fio de algodão do urdume para manter a peça mais firme. Durante o processo de trama, o tamanho do módulo sofreu uma leve alteração devido a tensão dos fios e o desenho foi adaptado. Para a finalização da peça, os pontos foram arremata- dos na parte de trás da peça. Figura 72 - Desenho de construção da cadeira 1 Fonte: Da autora (2024) 68 Figura 73 - Resultado da peça de tapeçaria na cadeira 1. 69 Cadeira 2: Roda de chimarrão de domingo A área de aplicação da cadeira possui a medida de 30cm x 30cm. A partir disso, dividiu-se o módulo no desenho de construção para o desenvolvimento da peça. Para a teia do urdume, foi escolhido utilizar o fio de algodão na técnica de fio único com espaçamento de 1cm entre cada linha. Para a trama, optou-se pelos mesmos quatro tipos de tecido de poliamida da cadeira 1. Os pontos escolhidos foram: ponto tafetá na cor bege; ponto tafetá nos triângulos de cor azul; ponto sumac nas linhas de cor azul; ponto sumac na cor verde; e ponto sumac na cor vermelha. Assim como o ponto travão em fio de algodão. A peça ainda está em processo de desenvolvimento no momento da entrega deste memorial e será finalizada para a apresentação da banca. Figura 74 - Desenho de construção da cadeira 2 Fonte: Da autora (2024) 70 Figura 75 - Resultado da peça de tapeçaria na cadeira 2. 71 Suporte de som: acústica das tramas Neste objeto, foi escolhido aplicar duas peças, uma em cada lateral do objeto. A primeira área de aplicação possui a medida de 33cm x 102cm. O módulo foi adapta- do para 32cm x 64cm, somando mais 40cm das franjas na parte inferior. A partir disso, dividiu-se o módulo no desenho de construção para o desenvolvimento da peça. Para a teia do urdume, foi escolhido utilizar o fio de algodão na técnica de fio único com espaçamento de 1cm entre cada linha. Para a trama, optou-se por cinco tipos de tecido, quatro de poliamida e um de algodão e poliéster. Os pontos escolhidos foram: ponto tafetá na cor bege; ponto sumac na cor azul; ponto sumac na cor verde; ponto sumac na cor rosa; ponto sumac na cor laranja; franjas na cor rosa; e ponto travão em fio de algodão. A peça ainda está em processo de desenvolvimento no momento da entrega deste memorial e será finalizada para a apresentação da banca. Figura 76 - Desenho de construção do suporte de som Fonte: Da autora (2024) 72 Suporte de som: acústica das tramas Para a outra lateral do objeto, a área de aplicação pos- sui a medida de 33cm x 51cm. O módulo foi adaptado para 32cm x 32cm. A partir disso, dividiu-se o módulo no desenho de construção para o desenvolvimento da peça. Para a teia do urdume, foi escolhido utilizar o fio de algodão na técnica de fio único com espaçamento de 1cm entre cada linha. Para a trama, optou-se por quatro tipos de tecido de poliamida. Os pontos escolhidos foram: ponto tafetá na cor bege; ponto sumac na cor azul; ponto sumac na cor verde; ponto sumac na cor rosa; franjas na parte inferior nas cores bege, rosa e verde; e ponto travão em fio de algodão. A peça ainda está em processo de desenvolvimento no momento da entrega deste memorial e será finalizada para a apresentação da banca. Figura 77 - Desenho de construção do suporte de som Fonte: Da autora (2024) 73 Figura 78 - Resultado da peça de tapeçaria no suporte de som 74 Patins: tramas sobre rodas No patins, para a área de aplicação da peça, foi escolhi- do o local do cadarço, medindo 15cm x 5cm. O módulo foi repetido três vezes no sentido vertical para preen- cher toda a área onde anteriormente havia o cadarço. A partir disso, dividiu-se o módulo no desenho de constru- ção para o desenvolvimento da peça. Para a teia do urdume, foi escolhido utilizar o fio de algodão na técnica de fio único com espaçamento de 1cm entre cada linha. O urdume foi passado nos furos do cadarço. Para a trama, optou-se por três tipos de tecido de polia- mida. Os pontos escolhidos foram: ponto tafetá na cor azul clara, no fundo; ponto sumac na cor azul escura; ponto sumac nos pontos verdes; e ponto travão em fio de algodão. A peça ainda está em processo de desenvolvimento no momento da entrega deste memorial e será finalizada para a apresentação da banca. Figura 79- Desenho de construção so patins Fonte: Da autora (2024) 75 Figura 80 - Aplicação no patins 76 Figura 81 - Resultado final 77 78 A partir do estudo e das escolhas feitas para o projeto, entendeu-se a importância que os objetos possuem para as pessoas e como essa relação pode ser ressigni- ficada por meio do design. Inicialmente, buscou-se compreender essa relação entre pessoa-objeto a partir dos conceitos de design emocional de Norman (2008) entendendo que todo projeto de design está entrelaçado nos níveis visceral, comportamental e reflexivo. Para materializar esse estudo, buscou-se aprofundamento na área do design de superfície, por meio da análise de azulejos e estudo sobre a tapeçaria. O têxtil se tornou a maior e mais explorada área de aplicação do design de superfícies, a partir disso, entende-se a relevância da tapeçaria artesanal ainda nos dias de hoje. Para o desenvolvimento do trabalho, a metodologia de Munari (2008) se mostrou eficaz, pois possibilitou com- preender todas as etapas que compõem o projeto e a importância de cada uma delas para o processo de criação. O resultado da proposta de unir técnicas ancestrais com materiais da atualidade tornou-se interessante para mostrar inúmeras possibilidades de criação dentro do design. No momento da entrega deste memorial, o desenvolvi- mento dos objetos ainda não está finalizado, porém já pode-se compreender o papel do design diante aos problemas da atualidade, podendo trazer soluções a partir de técnicas desenvolvidas no passado. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 79 REFERÊNCIAS Alex Rocca. Disponível em <https://alex-rocca.com/>. Acesso em: 23 jun. 2024. ALONI, Yael; STADLER, Monika; ALONI, Ariel. Gunta Stölzl. Disponível em: <https://www.guntastolzl.org/> . Acesso em: 22 jun. 2024. CAVALCANTI E CRUZ, Sylvia Tigre de Hollanda e Antonio de Menezes e. O AZULEJO NA ARQUITETURA CIVIL DE PERNAMBUCO: SÉCULO XIX - 1ªED. (2002) - Sylvia Tigre de Hollanda Cavalcanti; Antonio de Menezes e Cruz CUNHA, Diana. Introdução à tapeçaria em tear manual. Domes- tika, 2019. Disponível em: <https://www.domestika.org/pt/courses/ 1107-introducao-a-tapecaria-em-tear-manua>. Acesso em: 23 jun. 2024. DONDIS A. Donis. Sintaxe da linguagem visual. São Paulo: Martins Fontes, 2000. Jan Kach. 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