CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU DOUTORADO EM AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO AVALIAÇÃO DA CONTAMINAÇÃO DO SOLO POR METAIS TÓXICOS (CÁDMIO, CROMO, CHUMBO E ALUMÍNIO) EM ESTANDES DE TIRO NO ESTADO DO PARANÁ/BRASIL Valmir de Souza Lajeado, setembro de 2016 Valmir de Souza AVALIAÇÃO DA CONTAMINAÇÃO DO SOLO POR METAIS TÓXICOS (CÁDMIO, CROMO, CHUMBO E ALUMÍNIO) EM ESTANDES DE TIRO NO ESTADO DO PARANÁ/BRASIL Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Ambiente e Desenvolvimento, do Centro Universitário UNIVATES, como parte da exigência para obtenção do grau de Doutor em Ambiente e Desenvolvimento na área de concentração Tecnologia e Ambiente. Orientador: Prof. Dr. Odorico Konrad Co-orientador: Prof. Dr. Affonso C. Gonçalves Jr. Lajeado, setembro de 2016. RESUMO O objetivo da pesquisa foi mostrar os riscos a que estão expostos os profissionais de segurança pública quando do treinamento de tiro em estandes. A hipótese levantada e confirmada foi de que os solos dos locais de treinamento estão contaminados por metais tóxicos, em especial o chumbo. Diante disso, foram realizadas análises do solo de estandes de tiro da Polícia Militar do Paraná (PMPR), localizados nos municípios de Cascavel, Cruzeiro do Oeste e São José dos Pinhais, e também de dois estandes particulares em Marechal Cândido Rondon e Guaíra, através de levantamento de amostras em duas campanhas realizadas: uma no ano de 2013 e outra em 2015. Foram apurados os teores de chumbo (Pb), cromo (Cr), alumínio (Al) e cádmio (Cd), e verificado se havia índices de contaminação por esses metais, culminando com a apresentação do panorama atual dos estandes utilizados pelos policiais militares. O trabalho apresenta os resultados do monitoramento temporal do solo nos anos citados, consistindo na análise dos índices alcançados, obtendo-se, assim, os teores dos metais tendo em vista a deposição de projéteis de arma de fogo no solo dos estandes. Foi possível avaliar o grau de contaminação existente, confrontando com a determinação legal da Resolução 420/2009, do CONAMA, que estabelece os níveis aceitáveis ou não de metais no solo. Os resultados das análises dos níveis de metais permitiram estabelecer as condições ambientais dos solos dos estandes de tiro. Do levantamento, se concluir que os teores de metais tóxicos encontrados nos solos dos estandes demandam atenção; como no caso do Pb, os resultados apresentam índices elevados, pois 60% das amostras ultrapassaram o Limite de Investigação estabelecido pela norma legal. Essa constatação sugere a pronta intervenção da PMPR e dos donos dos estandes particulares nos locais pesquisados iniciando, de imediato, ações de remediação nas áreas já contaminadas com a elaboração de planos de manejo, a fim de se evitar o aumento da contaminação e a exposição ao risco dos atiradores, policiais militares e população da circunvizinhança. Palavras-chave: contaminação; estande de tiro; metais tóxicos. ABSTRACT The objective of the research was to show the risks public safety professionals are exposed to when practicing at shooting ranges. The hypothesis which was tested and confirmed was that practicing areas’ soils are contaminated by toxic metals, especially by lead. Therefore, soil analyzes were performed at shooting ranges owned by the Military Police of Paraná (MPPR), located in the cities of Cascavel, Cruzeiro do Oeste and São José dos Pinhais, also at two private shooting ranges located in Marechal Cândido Rondon and Guaíra. One sample was collected in 2013 and the other in 2015. The levels of lead (Pb), chromium (Cr), aluminum (Al) and cadmium (Cd) were valued, and it was checked if there were signs of contamination by these metals, culminating with the presentation of the current situation of the shooting ranges used by the militaries. The paper presents the results of the time monitoring of the soil in those years, consisting in analyzing the reached data, obtaining the metal levels once there is a constant deposition of firearm projectiles on the shooting range ground. It was possible to evaluate the degree of contamination, which was confronted with the legal determination of the Resolution 420/2009 of CONAMA, which establishes acceptable levels of metals in soils. The results of the metal levels’ analysis made it possible to establish the environmental conditions of shooting ranges’ soils. The study made concluded that the toxic metal levels found in the shooting ranges’ soils demand attention; as in the example of Pb, which the the results showed high rates, 60% of the samples exceeded the limit set by the legal norm. This conclusion suggests the immediate intervention by MPPR and by the owners of the private shooting ranges tested, immediately starting to take actions over the already contaminated areas, elaborating management plans in order to avoid the increase of the contamination and the exposure of the militaries and surrounding population. Keywords: contamination; shooting range; toxic metals. DEDICATÓRIA A meu pai João (in memoriam) e minha mãe Sebastiana que dignamente me oportunizaram o estudo. AGRADECIMENTO A Deus que me permite a vida. À Professora Ada, da Escola Municipal Vereador André Nadolny, professora que me ensinou a ler e escrever. A todos os professores e professoras que por minha vida passaram e me fizeram chegar até aqui. A Cristiane, minha esposa e também professora, pelo amor incondicional, e pelo apoio, com certeza sem ela não seria possível esta conquista. À Maria Clara e Ana Luiza, minhas filhas, pelo carinho, amor e compreensão quando da minha ausência. Ao professor Odorico Korand, meu orientador, pela paciência, dedicação e zelo ao me ensinar bons caminhos da ciência e por me tolerar nos debates pessoais e online, obrigado pela motivação. Ao professor Affonso Celso Gonçalves Junior, meu co-orientador, pela parceria, dedicação e companheirismo além das calorosas e gentis recepções no laboratório. Ao meu amigo Ricardo Braga que foi parceiro nos trabalhos de campo e análises químicas. Ao povo brasileiro que por meio da CAPES me garantiu cursar o Doutorado. Aos funcionários do Programa de Pós Graduação em Ambiente e Desenvolvimento, da biblioteca central da UNIVATES, em especial a Ana, e todos os demais servidores da instituição, pela presteza e gentileza no atendimento deste aluno. Aos funcionários e alunos do Laboratório de Química Ambiental e Instrumental da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Marechal Candido Rondon – PR, pela atenção e qualidade do trabalho prestado. A todos os pesquisadores e estudiosos que serviram de inspiração e contribuíram com seus conhecimentos para a construção deste trabalho. A todos os policiais militares que me ajudaram e me dirigiram palavras de incentivo para continuar no caminho da pesquisa. A todas as pessoas que com certeza esqueci de mencionar, pois, foram e são inúmeras, que direita e indiretamente me ajudaram a alcançar este objetivo. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Arma de fogo: pistola Marca Taurus, calibre .40, utilizada pela PMPR. ... 32 Figura 2 – Estrutura de um projétil de arma de fogo. ................................................ 32 Figura 3 – Projéteis depositados no solo do estande de tiro da APMG. .................... 42 Figura 4 - Trado Holandês sendo utilizado durante a pesquisa................................. 58 Figura 5 – Processo de coleta das amostras ............................................................ 60 Figura 6 – Mapa da localização dos estandes de tiro pesquisados no Estado do Paraná. ...................................................................................................................... 61 Figura 7 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Marechal Candido Rondon ........................................................................................ 63 Figura 8 – Croqui do estande de tiro particular em Marechal Candido Rondon-PR. . 63 Figura 09 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Guaíra ....................................................................................................................... 64 Figura 10 – Croqui do estande de tiro particular em Guaíra-PR. .............................. 65 Figura 11 – Local coberto por vegetação onde ao fundo se pode ver o barrando do estande desativado de Guaíra .................................................................................. 65 Figura 12 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Cruzeiro do Oeste ..................................................................................................... 66 Figura 13 – Croqui do estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR. ............ 67 Figura 14 – Barreira de pneus preenchida pelo solo do local do Estande de Cruzeiro do Oeste ..................................................................................................... 67 Figura 15 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande de Cascavel.................................................................................................................... 68 Figura 16 – Croqui do estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR. .......................... 69 Figura 17 – Para-balas e barreira de pneus do Estande de Cascavel ...................... 70 Figura 18 – Vista da distribuição no terreno das áreas de coleta da APMG ............. 71 Figura 19 – Croqui do estande de tiro desativado da PMPR na APMG, em São José dos Pinhais-PR. ......................................................................................................... 71 Figura 20 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande desativado da APMG ................................................................................................. 72 Figura 21 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande Principal da APMG .................................................................................................... 73 Figura 22 – Croqui do estande de tiro principal da PMPR na APMG, em São José dos Pinhais-PR. ......................................................................................................... 74 Figura 23 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande Principal da APMG .................................................................................................... 75 Figura 24 - Mapa simplificado de solos do Estado do Paraná .................................. 82 Figura 25 - Descrição, georreferenciamento dos pontos de coleta do Estande Principal da APMG - Manancial ................................................................................. 98 Figura 26 – Projéteis depositados no solo do estande de tiro da APMG. ................ 101 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Valores médios dos teores de argila, silte, areia e capacidade de troca catiônica (CTC) das áreas de estande de tiro no estado do Paraná. ........................ 80 Tabela 2 - Valores orientadores de substâncias para solos e águas subterrâneas ... 84 Tabela 3 - Valores médios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das áreas do estande de tiro particular de Marechal Candido Rondon-PR. ............................................................ 85 Tabela 4 - Valores médios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das áreas do estande de tiro de tiro particular em Guaíra-PR. ................................................................................ 88 Tabela 5 - Valores médios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das áreas do estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR. ........................................................................ 91 Tabela 6 - Valores médios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das áreas do estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR. ...................................................................................... 93 Tabela 7- Valores médios dos teores de Al, Cd, Pb e Cr das áreas do estande de tiro da PMPR (desativado) na APMG em São José dos Pinhais-PR. .............................. 96 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Resultados análise especial estande Marechal Cândido Rondon .......... 87 Gráfico 2 – Resultados análise especial estande Guaíra .......................................... 89 Gráfico 3 – Resultados análise especial estande Cruzeiro do Oeste ........................ 92 Gráfico 4 – Resultados análise especial estande Cascavel ...................................... 95 Gráfico 5 – Resultados análise especial estande APMG Desativado ........................ 97 Gráfico 6 – Resultados análise especial estande APMG Principal .......................... 100 Gráfico 7 – Comparativo dos resultados dos estandes pesquisados em relação aos Valores de Investigação. ......................................................................................... 107 LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas ACI - Área Contaminada sob Intervenção Al - Alumínio AMR - Área em Processo de Monitoramento para Reabilitação AOAC - Associação Oficial de Química Analítica B - Boro Ca – Cálcio Cd – Cádmio CERCLA - Comprehensive Environmental Response, Compensation, and Liability Act CETESB - Companhia Ambiental do Estado de São Paulo CF - Constituição Federal CFSd - Curso de formação de soldados Cl - Cloro Co – Cobalto Codevasf- Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba CONAMA - Conselho Nacional de Meio Ambiente Cr - Cromo CSM/MOP - Centro de Suprimento e Manutenção de Material Operacional CSM-Int - Centro de Suprimento e Manutenção de Intendência CSM-MB - Centro de Suprimento e Manutenção de Material Bélico CSM-O - Centro de Suprimento e Manutenção de Obras CSP - Curso Superior de Polícia CTC - capacidade de troca catiônica Cu – Cobre DOD - Departamento de Defesa dos Estados Unidos. EB - Exército Brasileiro EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EPA - Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos EUA - Estados Unidos Fe - Ferro gr - Grain GSR – Guns hot residues IAP - Instituto Ambiental do Paraná K - Potássio LI – Limite de Investigação LQ - Limite de quantificação Mg – Magnésio MMRP - Programa de Resposta de Munições Militares Mn - Manganês Mo - Molibdênio N - Nitrogênio NBR - Norma Brasileira Ni - Níquel ONU - Organização das Nações Unidas P - Fósforo Pb – chumbo PCRJ - Polícia Civil do Rio de Janeiro PM - Polícia Militar PMPR - Polícia Militar do Paraná PNMA - Política Nacional do Meio Ambiente S - Enxofre Sb - Antimônio SEAV - Setor Especial de Áreas Verdes SPT - Standard Penetration Test UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná USACE - US Army Corps of Engineers VRQs - Valores de Referência de Qualidade ZEI - Zona Especial Institucional Zn - Zinco ZR1 - Zona Residencial 1 ZR3 - Zona Residencial 3 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 17 1.1 Justificativa ........................................................................................... 21 1.2 Objetivo geral ........................................................................................ 22 1.3 Objetivos específicos ............................................................................ 22 2 REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................ 24 2.1 A PMPR – qualidade do serviço, treinamento, arma de fogo e resíduos contaminantes............................................................................................. 24 2.2 Polícia e arma de fogo – contaminação e poluição .............................. 30 2.3 A proteção ambiental – breve relato da evolução no tempo ................. 35 2.4 Metais tóxicos, metais pesados – conceitos, contaminação e consequências ............................................................................................ 40 2.5 Influência do Cd na saúde humana e meio ambiente ........................... 43 2.6 Influência do Cr na saúde humana e meio ambiente ........................... 44 2.7 Influência do Pb na saúde humana e meio ambiente ........................... 45 2.8 Influência do Al na saúde humana e meio ambiente ............................ 48 2.9 Estandes de tiro – prováveis fontes de contaminação ......................... 49 2.10 Normas ambientais – regulamentação do CONAMA ......................... 51 3 PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS .......................................................... 55 3.1 Métodos e ferramentas – amostragem ................................................. 55 3.2 Métodos e ferramentas – determinação dos pontos de coleta ............. 57 3.3 Estandes de tiro objetos da pesquisa ................................................... 61 3.3.1 Estande de tiro particular em Marechal Candido Rondon-PR . 62 3.3.2 Estande de tiro particular (desativado) em Guaíra-PR ............ 64 3.3.3 Estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR .............. 66 3.3.4 Estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR ............................ 68 3.3.5 Estande de tiro da PMPR na APMG em São José dos Pinhais-PR ................................................................................ 70 3.4 Determinação dos teores totais dos metais tóxicos ................... 75 3.5 Análise químicas e físicas (granulometria) do solo ..................... 76 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................... 78 4.1 Teores totais dos elementos tóxicos no solo ........................................ 78 4.2 Resultados obtidos a partir das determinações de metais (Cr, Cr, Pb e Al) dos estandes de tiros analisados .................................................... 84 4.2.1 Estande de tiro particular em Marechal Candido Rondon-PR . 84 4.2.2 Estande de tiro particular (desativado) em Guaíra-PR ............ 88 4.2.3 Estande de tiro da PMPR em Cruzeiro do Oeste-PR .............. 90 4.2.4 Estande de tiro da PMPR em Cascavel-PR ............................ 92 4.4.5 Estande de tiro desativado da PMPR na APMG em São José dos Pinhais-PR ......................................................................... 95 4.2.6 Estande de tiro em atividade da PMPR na APMG em São José dos Pinhais-PR ................................................................ 98 4.2.7 Estande de tiro secundário da APMG/PMPR em São José dos Pinhais-PR .............................................................................. 102 5 CONSTATAÇÕES, INFERÊNCIAS E SUGESTÕES ....................................... 104 6 CONCLUSÃO .................................................................................................. 114 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 117 ANEXOS ............................................................................................................. 130 17 1 INTRODUÇÃO A Polícia Militar (PM), por meio de seus agentes, se constitui no “braço armado” do Estado que detém, por questões legais, o monopólio do uso legítimo da força quando exista um descumprimento da ordem legal vigente. Assim, o uso de arma de fogo é um requisito inerente ao policial militar, que, muitas vezes, se vê diante de situações-limite que requerem decisões acertadas em frações de segundo. A atividade policial militar é de risco. Desse modo, a utilização de uma arma de fogo requer uma qualificação profissional adequada. Nesse contexto, os policiais militares, para a utilização de armas de fogo, necessitam de um treinamento que exige muito conhecimento técnico. Os treinamentos se dão pela execução de disparos com as armas utilizadas pela corporação, como meio de se qualificar o profissional de segurança pública. Esses treinamentos são parte da formação dos policiais militares e se prolongam ao longo da carreira como ferramenta contínua de qualificação profissional. Em regra geral, e no caso específico da Polícia Militar do Paraná (PMPR), no momento da prática do treinamento, os policiais utilizam, em suas armas, munição real, a qual é, geralmente, composta de projéteis de chumbo (Pb), que, ao serem disparados, se depositam nos barrancos, localizados nos estandes de tiro, 18 levantados para servirem de anteparo, sejam em estandes particulares ou pertencentes à PMPR. Em termos comparativos, nos Estados Unidos (EUA), onde há estudos consistentes sobre disparos de arma de fogo, existem mais de 3.000 armas pequenas de uso militar ativas em estandes de tiro, e estima-se que aproximadamente 70.000 toneladas de Pb são adicionados aos solos dos estandes por ano (MARIUSSEN et al., 2012). A necessidade de treinamento constante com a aplicação de técnicas que exigem a repetição quase que exaustiva do disparo real de arma de fogo acarreta a produção de um grande volume de resíduo de Pb acumulado nos barrancos dos estandes de tiro. O que se aduz a priore é que esses resíduos produzam um impacto ambiental1. E, como Pb, é um metal pesado que pode apresentar consequências danosas aos seres vivos, há que existir um controle de suas fontes de emissão, como é o caso dos treinamentos de tiro da PMPR. Um estudo sobre a utilização de armas de pequeno porte em estandes de tiro das forças militares no Canadá demonstrou a contaminação elevada com cobre (Cu), Pb, antimônio (Sb) e zinco (Zn) (LAFOND et al., 2013). No levantamento prévio feito nesta pesquisa não se encontrou normatização que regulamente o tratamento ambiental de tais resíduos produzidos durante os treinamentos de tiro da PMPR. Não existem normas disciplinadoras que determinem a gestão de resíduos sólidos, em especial o Pb, ou, ainda, um monitoramento sobre os níveis de concentração do referido metal no solo dos estandes de tiro. Percebe-se que esses treinamentos reais de tiro, feitos em estandes de tiro, ao que tudo indica, não primam pela preservação do meio ambiente, pois os locais são, de certa forma, adaptados para o fim a que se destinam, menosprezando a 1 Conforme a Resolução nº 001/86 do CONAMA, considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; a qualidade dos recursos ambientais. 19 possibilidade de contaminação do solo por sustâncias tóxicas, em especial, metais pesados (BVENURA & AFOLAYAN, 2012). Os treinamentos para emprego das armas de fogo se dão nos estandes de tiro da corporação e estandes de tiro particulares localizados em diversos municípios do Estado do Paraná. Para o treinamento, são utilizadas munições reais cujos projéteis são compostos de Pb, lançados contra os “barrancos” dos estandes de tiro. Por ficarem depositados no solo, são, em tese, uma fonte de contaminação, o que despertou o interesse de estudo do presente trabalho. A pesquisa estudou os níveis de metais tóxicos provenientes de projéteis de arma de fogo no solo de determinados estandes de tiro particulares e da PMPR, em cinco regiões do Estado do Paraná. Atualmente há questões que não possuem respostas, como, por exemplo: os estandes de tiro da PMPR representam risco aos policiais que os utilizam? Representam risco à comunidade localizada no seu entorno? Os estandes de tiro da PMPR são fonte de contaminação para o meio ambiente? Caso exista contaminação, qual o nível em que se encontra? Se existentes, os níveis de contaminação estão dentro dos parâmetros legais? Existe regulamentação que determine o controle e monitoramento dos estandes de tiro? Há estudo ou existe determinação para a recuperação das áreas de estande de tiro degradadas? Diante desse cenário, a hipótese é que os estandes de tiro da PMPR, e também os particulares, são fontes de contaminação do solo em níveis superiores aos permitidos pela legislação em vigor, no caso a Resolução 420/2009 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA). E, atualmente, para os estandes de tiro, não há controle ambiental adequado dos resíduos produzidos pelos treinamentos, considerando-se que, quanto maior for a utilização e a deposição de projéteis de Pb no solo dos estandes de tiro, maior (in tese) será a contaminação, não só do solo, mas também das águas superficiais e subterrâneas da região do entorno. Seguindo um roteiro proposto na introdução é apresentada a justificativa que 20 deu base ao presente trabalho, destacando a importância da pesquisa inédita no âmbito da gestão ambiental no que diz respeito à contaminação do solo por metais tóxicos nos estandes de tiro da PMPR. O segundo capítulo apresentará o referencial teórico sobre o tema, discorrerá sobre a atual legislação e os aspectos ambientais. Exibirá ao leitor as características e efeitos, sobre o ambiente e seres humanos, dos metais tóxicos, com embasamento em autores que já pesquisaram o tema. O terceiro capítulo trará o procedimento metodológico que foi utilizado para realização da pesquisa, demonstrando quais foram os estandes pesquisados, determinando suas localizações e características. Esclarecerá que a amostragem foi realizada com base na metodologia proposta pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP), além de similaridade com as diretrizes da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) 2000/2003. Além disso, deixa claro que as amostras de solo coletadas foram encaminhadas para o Laboratório de Química Ambiental e Instrumental da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), campus de Marechal Cândido Rondon - PR, para a realização das análises propostas. O quarto capítulo apresentará os resultados encontrados trazendo ao leitor a discussão desenvolvida. Será apresentado um debate intenso acerca dos índices obtidos em laboratório em confronto com as determinações legais da Resolução 420/2009 do CONAMA. Serão apresentadas as considerações sobre os valores de análise de rotina, análise de micronutrientes, análise granulométrica e análise especial. Esta última apresentará os valores dos seguintes metais: alumínio (Al), cádmio (Cd), chumbo (Pb) e cromo (Cr). Finalizando o capítulo, demonstrar-se-á se a hipótese levantada sobre a contaminação dos estandes foi ou não comprovada. No quinto capítulo, serão apresentadas as constatações, inferências e sugestões deduzidas a partir dos resultados obtidos. Será, também, exposta uma abordagem atual das disposições nacionais e internacionais, no que tange à gestão inovadora de estandes de tiro, como forma de contribuição para uma melhoria na administração dos espaços pesquisados. https://translate.googleusercontent.com/translate_c?depth=1&hl=pt-BR&ie=UTF8&prev=_t&rurl=translate.google.com.br&sl=en&tl=pt-BR&u=http://ac.els-cdn.com/S0301479713000595/1-s2.0-S0301479713000595-main.pdf%3F_tid%3Db5967cd2-5e0c-11e4-ba80-00000aab0f26%26acdnat%3D1414437120_83cb5d9178df92f5c8af8efeb9d9998c&usg=ALkJrhg1KIKVaPkHESDwf4iUr8RnKpaW-g#8 21 Por fim, serão declaradas as conclusões sobre todo o levantamento feito no presente trabalho 1.1 Justificativa O tema da segurança pública conquista cada vez mais a atenção de pesquisadores, que demonstram, em grande parte, certa preocupação tanto com o estudo do funcionamento desarmonioso da sociedade, como com a falta de condições para a preservação da ordem pública. Tudo com ênfase na concentração da criminalidade nos grandes centros urbanos, assunto de relevante importância nas sociedades contemporâneas em cujo cenário a polícia tem papel de destaque (PASSOS, 2011). Ao observar o funcionamento de um estande de tiro, em que policiais realizam treinamento com suas armas de fogo disparando contra barrancos onde ficam depositados os projéteis compostos de chumbo, surgiu o questionamento: há contaminação do solo? O chumbo é um metal tóxicos que causa graves problemas à saúde humana, portanto, estudar seus efeitos no solo dos estandes de tiro é de suma importância para impedir danos ao meio ambiente e aos usuários destes locais. O fato de existirem estandes sem um manejo adequado dos projéteis acumulados no solo suscitou a dúvida motivadora da pesquisa. Compreender os processos que geram resíduos de Pb, e demais metais tóxicos, provenientes dos disparos de armas de fogo de policiais militares em treinamento, se tornou imperativo para uma boa gestão dos estandes de tiro da PMPR e particulares. A base da justificativa do presente estudo pode ser verificada na contradição entre o dever de proteger e a ação de contaminar o solo decorrente do treinamento (essencial à qualificação profissional) dos policiais militares com munição de projétil de Pb. Ressalta-se que esta atividade se dá, a priori, sem qualquer preocupação e regulamentação específica que vise controlar e monitorar as áreas sob o risco de 22 contaminação, viabilizando, ao menos, alguma ação de remediação. A pesquisa se torna relevante ao buscar e apresentar dados que possam demonstrar a real situação de áreas potencialmente contaminadas por metais tóxicos, especialmente o Pb. No tocante à saúde pública, tais dados são de fundamental importância para a proteção dos policiais militares que utilizam os estandes de tiro, bem como da comunidade que vive no entorno destes locais, e é atingida, direta ou indiretamente, pela contaminação. Além do ineditismo, o trabalho contribuirá para a formulação de normas de gestão das referidas áreas e fornecerá subsídios para estabelecer políticas públicas, visando ao enfrentamento do problema relacionado à contaminação. Assim, contribuirá também para alertar os responsáveis pela PMPR (também dos estandes particulares) sobre a importância do monitoramento dos estandes de tiro no que concerne à contaminação e ao manejo ambiental adequado. 1.2 Objetivo geral O estudo em questão apresenta como objetivo geral avaliar os teores e distribuição dos metais tóxicos: cádmio (Cd), cromo (Cr), Pb, alumínio (Al) no solo de cinco estandes de tiro (três da PMPR e dois particulares), definindo parâmetros que permitam estabelecer níveis de contaminação nas referidas áreas pela disposição dos projéteis de Pb disparados por armas de fogo. 1.3 Objetivos específicos No que tange aos objetivos específicos, o trabalho procurou: - Caracterizar os parâmetros físicos e químicos dos solos onde estão situados 23 os estandes de tiro analisados na pesquisa; - Apresentar a distribuição e a concentração das variações de metais tóxicos nos estandes de tiro envolvidos na pesquisa; - Identificar se os estandes de tiro pesquisados são possíveis fontes de contaminação do solo, avaliando o efeito da deposição de projéteis de Pb disparados por arma de fogo nesses locais; - Discutir os resultados obtidos, sugerindo propostas para uma nova gestão dos resíduos sólidos encontrados nos estandes de tiro. 24 2 REFERENCIAL TEÓRICO Neste capítulo é descrita a revisão bibliográfica sobre o tema apresentando a estrutura básica de funcionamento da PMPR, tratando da importância da qualidade do serviço prestado, bem como da necessidade de treinamento com arma de fogo e consequentemente a existência de resíduos contaminantes. Ainda tratará da proteção ambiental ao logo do tempo, relacionando a dinâmica dos metais tóxicos apontando os principais aspectos toxicológicos e a influência na saúde humana e meio ambiente do Cd, Cr, Pb e Al. Derradeiramente aborda descritivamente a questão da contaminação dos estandes de tiro apresentando ao final a legislação e os aspectos ambientais contidos em normas ambientais e em especial na regulamentação do CONAMA. 2.1 A PMPR – qualidade do serviço, treinamento, arma de fogo e resíduos contaminantes A temática da segurança pública encontra-se entre os direitos e garantias fundamentais descritos no caput do artigo 5º Constituição Federal (CF) (MARCHI, 2010). A concretização dos direitos fundamentais numa sociedade democrática tem relação direta com a aplicação da lei no cotidiano social. Infere-se, no entanto, que a aplicação da lei apenas efetiva-se de forma justa quando da existência de organismos policiais cientes do seu papel de protetor da ordem constitucional. Desta feita, houve um aperfeiçoamento constitucional e os direitos humanos 25 evoluíram juntamente com a polícia, exigindo uma adequação à nova realidade, o que gerou transformações em benefício da sociedade (MARCHI, 2010). A consciência policial é representada pela formação cidadã do agente estatal, processo de formação que se dá pelo treinamento. Basílio (2008) destaca que a função do treinamento policial é capacitar o agente policial para o trabalho diário. Se o treinamento estiver em desacordo com os ditames constitucionais de respeito aos direitos fundamentais, ter-se-á uma organização policial repressora cujas consequências são perniciosas para a democracia. Assim, a formação do policial é fundamental para a construção e efetivação dos direitos fundamentais do cidadão. O exercício de segurança nas condições de cidadania plena foi, e ainda é, muito discutido por diversos autores na contemporaneidade (COSTA, 2005). A percepção que se tem é de que uma mudança está em curso quando da aplicação de novos modelos de policiamento, com uma vertente mais dedicada aos anseios das comunidades locais. A mudança de foco na atuação dos organismos policiais depende, em boa medida, de um treinamento eficaz que transmita informação, desenvolva habilidades, atitudes e conceitos, com vista a uma adequada formação do policial (BASILIO, 2008). Novas iniciativas de formação por meio da inovação, como, por exemplo, o ensino a distância, têm o potencial de beneficiar o policiamento e melhorar a segurança pública (MUGFORD, et al., 2013). Porém, a tônica apresentada nos modelos atuais de policiamento realizados pelas Polícias Militares Brasileiras ainda possui uma enorme força repressiva. Segundo Basílio (2008), em uma política de segurança repressiva, os policiais são formados para atuarem de forma reativa. A melhoria da qualidade dos serviços prestados pela PMPR, ao que tudo indica, e pelo discurso empírico, depende de ações que facilitem uma formação sociocultural e profissional de maior nível, aliada a políticas que respeitem e concretizem o direito de todos à educação, coadunada com os ditames de um estado democrático de direito (ORTEGA, 2015). Desse modo, possuir, em seus quadros, policiais com uma formação 26 qualificada fará com que uma instituição de segurança pública possa fornecer ao cidadão um serviço de boa qualidade. Com agentes bem preparados, a função primordial de guardar os mandamentos constitucionais se completará pela formação qualificada e continuada (LUIZ, 2008). Em um país onde o senso comum vislumbra uma formação policial precária e corrompida, o fortalecimento de iniciativas ou mesmo de políticas públicas voltadas ao resgate da imagem da polícia é fundamental para a reestruturação do modelo de formação e qualificação profissional. O ensino policial necessita ser voltado a uma formação profissional que atenda aos anseios do cidadão que será atendido e do policial que realizará a atividade de policiamento. Uma formação qualificada, para que o agente policial possa exercer suas funções com excelência, é essencial para o fortalecimento da estrutura educacional da própria instituição (LUIZ, 2008) Diante do cenário acima apresentado, algumas discussões acerca da formação do profissional de segurança pública afloram. Um qualificado agente público de segurança passa por treinamentos teóricos e práticos, pois deve haver um equilíbrio entre o intelecto e o físico. No que concerne à parte física do treinamento, além de habilidades como correr e saltar, os policiais devem saber atirar com suas armas de fogo (PERSSON, 2011). A utilização de armas de fogo exige habilidade, destreza e treinamento apropriado, pois o emprego inadequado pode gerar danos irreparáveis, como a perda de vidas humanas. Assim, há necessidade de constante treinamento haja vista a necessidade de preparar o policial para oferecer uma resposta coerente, em uma situação que envolve estresse e medo, e que sua conduta seja capaz de proteger a própria vida e a de terceiros, mantendo a coerência com as normas e a ordem social (PINC, 2011). O treinamento com arma de fogo pode ser simulado ou real. No caso simulado, o policial pode realizar diversos exercícios que não exigem o disparo da arma de fogo propriamente dito. Já no caso do treinamento real, o agente deve efetuar disparos com o armamento apropriado. Nesse caso, as instituições policiais 27 utilizam-se dos chamados estandes de tiro (locais devidamente reservados para a prática do tiro real) onde os policiais realizam os treinamentos fazendo disparos com suas armas de fogo2. Em geral, esses estandes de tiro são locais abertos, cercados por muros de alvenaria. São também levantados barrancos de terra, que servem de anteparo para os tiros disparados pelas armas de fogo. Mas, mesmo sendo os estandes de tiro instalados, muitas vezes, em locais afastados, a prática do tiro expõe ao risco seus praticantes por uma série de aspectos, dentre os quais destaca-se a exposição ao ruído causado pelas de armas de fogo, que é um fator de risco estabelecido (CHOI et al., 2012). Em se tratando de resíduos, até mesmo os orgânicos, se convertem em problema quando descartados de forma inadequada. Essa desatenção, em muitos casos, traz o acúmulo de resíduos (lixo) em áreas impróprias, podendo gerar contaminação do solo e águas, bem como causar desconforto aos moradores, gerando e atraindo insetos e outros animais, potenciais transmissores de doenças, entre outros processos de poluição ambiental (HOEHNE et al., 2012). Após o disparo de arma de fogo propriamente dito, grande parte dos resíduos é proveniente do cano da arma, resultado de partículas queimadas e não queimadas da pólvora, consistindo em compostos orgânicos e de metal, tal como Pb, Cu, latão, níquel ou de material de encamisamento (TRIMPE, 2011). Resíduos, no caso dos projéteis de arma de fogo, que se convertem em um passivo ambiental que tende à contaminação do solo das áreas dos estandes de tiro. O acúmulo de Pb, com a sua consequente deposição no solo, pode levar graves implicações ao ecossistema e aos seres humanos (PERES & MOREIRA; 2003). Estudo realizado na Dinamarca mostrou que uma grande parte (quase 60%) dos atiradores de estandes de tiro fechados naquele país tinham concentrações de 2 Constatação in loco em vários municípios onde estão localizadas as unidades da PMPR. 28 Pb no sangue potencialmente prejudiciais (GRANDAHL, et al., 2012). Os resultados encontrados sobre os teores dos metais analisados neste trabalho poderão contribuir para a formação de uma base de dados, bem como para o estabelecimento de normas de controle e manejo ambiental dos estandes de tiro da PMPR, diminuindo o potencial de risco relativo à contaminação do solo por metais tóxicos. Isso, pois, avaliar o risco representado pela contaminação do solo urbano para a saúde humana é uma questão crítica na pesquisa acadêmica e políticas públicas (BI et al., 2013). Ademais, no que tange à legislação, a PMPR, conforme a Lei 16.575 - 28 de Setembro de 2010, é “instituição permanente, força auxiliar e reserva do Exército Brasileiro (EB), organizada com base na hierarquia e na disciplina, destina-se à preservação da ordem pública, à polícia ostensiva, à execução de atividades de defesa civil”. Assim, exerce também atividade de fiscalização e proteção ao meio ambiente. A PMPR, como todas as outras polícias militares brasileiras, são reguladas pelo Art. 144, § 5º, da CF, sendo responsáveis pelo policiamento ostensivo e preventivo, cabendo a elas a função de polícia administrativa (SOUZA, 2006). A estrutura da Polícia Militar Paranaense divide-se em órgãos de direção, órgãos de apoio e órgãos de execução. Os órgãos de direção compõem o Comando-Geral da Corporação, que compreende: Comandante-Geral; Subcomandante-Geral; Estado-Maior; Corregedoria-Geral; Diretorias; Gabinete do Comandante-Geral; Comissões; Conselho Econômico e Financeiro; Assessorias Militares; Consultoria Jurídica (PARANÁ, 2010). Os órgãos de apoio, por sua vez, realizam as atividades-meio da Corporação, atendendo às necessidades de pessoal, de semoventes e de material de toda a Polícia Militar, atuando em cumprimento das diretrizes e ordens dos órgãos de direção (PARANÁ, 2010). Dentre os órgãos de apoio, a Diretoria de Apoio Logístico possui, em sua 29 subestrutura, o Centro de Suprimento e Manutenção de Intendência (CSM-Int), o Centro de Suprimento e Manutenção de Material Bélico (CSM-MB) e o Centro de Suprimento e Manutenção de Obras (CSM-O), responsáveis pela aquisição, recebimento, armazenagem, distribuição e controle de suprimentos, veículos, armamentos e munições, bem como pela execução, fiscalização, manutenção e controle das edificações e obras da Corporação (PARANÁ, 2010). O Centro de Suprimento e Manutenção de Material Operacional (CSM/MOP) é o órgão incumbido do recebimento, da estocagem, da distribuição dos suprimentos e da execução da manutenção no que concerne ao armamento e munição, ao material de comunicações, ao material de motomecanização e ao material especializado de bombeiros (PARANÁ, 2010). Segundo a legislação, os órgãos de execução são constituídos pelas unidades operacionais da Corporação e realizam as atividades-fim da PMPR; cumprem as missões ou a destinação da Corporação. Para isso, executam as diretrizes e ordens emanadas dos órgãos de direção e são apoiados, em suas necessidades de pessoal, de semoventes, de material e de serviços, pelos órgãos de apoio (PARANÁ, 2010). A possibilidade de contaminação do solo pela ação de agentes da PMPR (por meio do treinamento de tiro nos estandes de tiro sob sua responsabilidade) não pode ser admissível em uma instituição que tem por dever a proteção do meio ambiente por suas ações de fiscalização dado que, dentre os órgãos de execução, a PMPR possui o Batalhão de Polícia Ambiental, encarregada do policiamento ostensivo, visando ao cumprimento dos dispositivos legais na proteção da fauna, da flora e do meio ambiente (PARANÁ, 2010). A exigência de uma nova postura que conceba a preservação do meio ambiente é uma tendência nas corporações privadas e também no âmbito público. Num exemplo recente, o governador da Flórida, nos EUA, emitiu decreto exigindo que todos os órgãos estaduais realizem as suas reuniões em hotéis com certificação ambiental, determinando aos servidores do Estado que se utilizem hotéis com ‘certificados-verdes’ para atividades oficiais (PARSA et al., 2014). 30 Retomando a pesquisa da Lei 16.575, não se identificou em seu bojo o órgão responsável pelo descarte ou reuso do material bélico ou munição utilizados pela PMPR, tampouco normas internas que regulamentem o tratamento ambiental dos resíduos produzidos após os treinamentos, ou diretrizes que estabeleçam cuidados e controle dos espaços físicos dos estandes de tiro no que concerne à poluição e contaminação por metais tóxicos3. 2.2 Polícia e arma de fogo – contaminação e poluição Conforme o Decreto-Lei nº 667, de 2 de julho de 1969, compete às Polícias Militares, executar com exclusividade, o policiamento ostensivo fardado, planejado pela autoridade competente, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a manutenção da ordem pública e o exercício dos poderes constituídos (BRASIL, Decreto-Lei nº 667, 1969). No estado do Paraná, a PMPR é o órgão responsável pelo policiamento ostensivo fardado em todo território paranaense. Policiamento ostensivo é aquele em que o policial, isoladamente ou em grupo, pode ser reconhecido de relance, quer pelo fardamento utilizado, quer pelo armamento ou pela própria viatura (ROCHA, 2009). Para tanto, além de utilizar um fardamento que os identifique imediatamente, os policiais militares fazem uso de armas de fogo, as quais, no entanto, podem contaminar o meio ambiente ou, até mesmo, poluí-lo (CHOI et al., 2012). Nesse sentido, compreende-se contaminação como parte de um processo de poluição; refere-se à transmissão de substâncias ou microorganismos nocivos à saúde, sua constatação não implica necessariamente um desequilíbrio ecológico (BRAGA, et al. 2002). E, conforme a Lei 6.938/81, poluição é a degradação da 3 Foram pesquisados os arquivos legislativos da PMPR, não sendo encontradas normas relativas ao tema. 31 qualidade ambiental resultante de atividades que, direta ou indiretamente, prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população ou lancem matérias em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. Já a Lei 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos define em seu artigo 3º, inciso III, que área contaminada é local onde há contaminação causada pela disposição, regular ou irregular, de quaisquer substâncias ou resíduos. A citada lei define ainda o que resíduos sólidos são material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível (BRASIL, Lei 12.305, 2010). Para se chegar à conclusão de que arma de fogo pode contaminar ou até poluir o meio ambiente, há que se conhecer o funcionamento da ferramenta. Arma de fogo pode ser entendida como uma máquina térmica, cuja utilização independe da força física (excetuando a força relacionada ao pressionamento do gatilho) e, como não poderia deixar de ser, baseia-se nos princípios da termodinâmica (CHEMELLO, 2007). As armas de fogo (Figura 1) utilizadas pelos policiais militares podem ainda ser definidas como artefatos de arremesso que empregam a força expansiva dos gases resultantes da combustão da pólvora para expelir seus projéteis (GEORG; KELNER e SILVINO JR, 2011). 32 Figura 1 – Arma de fogo: pistola Marca Taurus, calibre .40, utilizada pela PMPR. Fonte: http://www.taurusarmas.com.br, acessado em 12 abr. 13. Os integrantes da Polícia Militar utilizam diversos equipamentos, como cassetetes e algemas, que não se constituem em arma de fogo. Todavia, com as armas de fogo, é utilizada munição (Figura 2), artefato completo, pronto para carregamento e disparo de uma arma, ou seja, são corpos carregados com explosivos ou agentes químicos destinados a produzir danos (BRUM, 2010). Figura 2 – Estrutura de um projétil de arma de fogo. Fonte: CHEMELLO, 2007, com adaptação do autor. O conceito de munição ainda considera ‘os tiros de exercício, que não possuem carga de explosão, mas apenas de lançamento, tiros de salva, utilizados 33 em cerimônias militares’, mesmo que só produzam ruído e há, ainda, ‘munição de festim utilizada nos treinamentos da tropa’ (BRUM, 2010). No caso do trabalho diário dos policiais militares, é utilizada, em suas armas, o que se conceitua de munição letal, caracterizada em usinados com preenchimento do estojo provido de iniciador (espoleta) de fogo central ou anular, com carga propelente e projétil sólido (ARAÚJO, 2007). Assim, quatro elementos básicos compõem a estrutura da munição: estojo, mistura iniciadora, pólvora e projétil (ou conjunto bucha + bagos de Pb, nos cartuchos de caça) (ANDRADE, 2005). Ao ser disparada uma arma de fogo são produzidas, dentro do cartucho, partículas provenientes de resíduos da espoleta, do propelente e metais dos projéteis e da própria arma, pois, no ato do disparo, o detonador golpeia a espoleta e o calor da combustão (carga de inflamação) derrete a mistura iniciadora ou primer (FREITAS, 2010; ROMAO, et al., 2011). As munições letais possuem, nos cartuchos, ‘misturas iniciadoras à base de estifinato de Pb [PbOH(NO)], nitrato de bário, trissulfeto de antimônio, tetrazeno e Al.’ (CHEMELLO, 2007). As composições de pólvora e mistura iniciadora nas munições podem ser diferentes, seja pela simples desigualdade na proporção entre ingredientes ou na própria composição (SALLES, 2011). Essa mistura iniciadora é responsável por deflagrar a combustão da pólvora (carga de projeção) contida no estojo em função de uma deformação da cápsula de espoletamento que quebra os cristais de estifinato de Pb (composto explosivo), um oxidante (nitrato de bário, dióxido de Pb ou nitrato de Pb), um combustível (trissulfeto de antimônio ou siliceto de cálcio), sensibilizantes (trinitrotolueno, tetraceno) e aglutinantes (goma-arábica, resinas celofane e goma-laca) (FREITAS, 2010; ROMAO, et al., 2011). A dinâmica do funcionamento de um disparo de arma de fogo pode ser descrito da seguinte maneira: 34 A expansão gasosa ocorre pela região anterior do cano da arma, orientada para frente; contudo, parte do fluxo de massa gasosa é expelido pela região posterior da arma. Este fluxo contém os gases provenientes da combustão (CO₂ e SO₂), assim como vários compostos inorgânicos, como nitrito, nitrato, cátions de metais como chumbo (Pb),antimônio (Sb) e, particulados metálicos oriundos do atrito e da subsequente fragmentação dos projéteis metálicos disparados (BORGES, p. 47, 2013). Conforme Martiny e Pinto (2008), uma grande quantidade de vapor contendo material particulado é gerada quando do disparo por uma arma de fogo. Esse vapor é expelido pelas aberturas e folgas presentes na arma. Em pistolas, o escape dos gases ocorre principalmente pela boca do cano, janela de ejeção e eventos de exaustão (quando presentes). Já em armas como os revólveres, esse material é expelido pelo cano e folgas do tambor. Em armas longas, como fuzis e carabinas, os gases podem ser expelidos pelo cano, janela de ejeção, eventos de exaustão e quebra-chama (MARTINY & PINTO, 2008). De todo o processo, ‘os elementos Pb, Sb e Ba são os principais marcadores químicos presentes nos resíduos inorgânicos produzidos por disparos de armas de fogo’ (ROMAO, et al., 2011). A composição das partículas do material expelido nos gases contém elementos metálicos advindos do cano (Fe), estojo (Cu, Zn, Ni), projétil (Pb, Sb) e principalmente do iniciador (normalmente Pb, Ba e Sb;), além de componentes (orgânicos) da pólvora (MARTINY & PINTO, 2008). Esses elementos e as partículas e gases expelidos a partir do cano da arma são considerados como "resíduo de disparo ou pólvora" (em inglês, guns hot residue - GSR); esse material, após o disparo, acaba depositado na roupa ou corpo de uma vítima ou na roupa e mãos de um atirador (ALVAREZ & ARCO, 2012). Não só o disparo gera contaminação, representando riscos ao ambiente, mas também o manejo de grânulos de Pb, no momento da montagem dos cartuchos e durante a reciclagem da sucata de Pb de projéteis já utilizados (SANTOS, 2006). Além de toda a composição química descrita na mistura iniciadora do cartucho de munição, pode ser encontrada no projétil liga de Pb (contendo Pb, 35 estanho e antimônio). Outro tipo encontrado é o projétil encamisado e semi- encamisado, sendo que o núcleo deste último é frequentemente de Pb puro (ANDRADE, 2005). Destaca-se que a presença de determinadas substâncias no meio ambiente, como a dos metais tóxicos acima descritos, em quantidades que causem desequilíbrio, modificando a estrutura original do local, acarreta a contaminação da área. Ao realizar estudo na região de Flandres, na Bélgica, Van Dyck (1995) definiu que geralmente um local contaminado é um lugar onde os resíduos (resultado da ação humana) estão presentes ou em que a poluição dos solos e águas subterrâneas pode ocorrer. Cabe esclarecer que a Lei 12.305/2010, que trata de resíduos sólidos, define que resíduos perigosos são aqueles que, em razão de suas características de toxicidade, patogenicidade, carcinogenicidade, dentre outras, apresentam significativo risco à saúde pública ou à qualidade ambiental, de acordo com lei, regulamento ou norma técnica. Após se entender a dinâmica de funcionamento das armas de fogo e verificando todo o processo químico que envolve o treinamento dos policiais pelo disparo das armas, pode-se fazer um paralelo com o conceito de Van Dyck (1995) e definir um estande de tiro como um local contaminado por resíduos perigosos. 2.3 A proteção ambiental – breve relato da evolução no tempo A preocupação com a qualidade do meio ambiente, ao longo do tempo, vem se tornando tema principal em debates no cenário mundial. Na história luso- brasileira, já no reinado português de Dom Afonso IV, havia previsão de sanções aos que interferissem no meio ambiente sem autorização. Em 1393, as Ordenações Afonsinas (conjunto de legislações do período colonial português) já proibiam o corte deliberado de árvores frutíferas (WAINER, 1999). 36 As Ordenações Filipinas de 1603 (outro conjunto de legislações do período colonial português) demonstravam evidentes preocupações com o meio ambiente, determinando, dentre outras providências: a proibição de caça de determinadas espécies animais, a proibição de pesca com rede em determinadas épocas, menções expressas à poluição das águas, normativas sobre a ictiofauna, águas, animais domésticos e regulava a pesca: (locais, período e instrumentos) (COSTA et al., 2012). No período da república, com a vigência da Constituição de 1891, avanços foram constatados no Código Civil de 1916, que previa o uso nocivo da propriedade. Na década de 1930, aparecem as primeiras legislações que trataram especificamente da proteção ao meio ambiente, dentre as quais destacam-se a proteção aos animais, código das águas, exploração da caça e pesca (BERTOLI, 2004). Hodiernamente, no cenário mundial, a questão ambiental passa a ganhar corpo no século XX, tendo como marco, na década de 1960, o lançamento do livro ‘Silent Spring’ (Primavera Silenciosa) de Raquel Carlson, no qual a autora descreve os perigos do uso de pesticidas químicos e apresenta a nocividade desses produtos aos seres vivos e ao meio ambiente (SILVA, 2005). Em 1972, um grupo, denominado Clube de Roma, constituído por intelectuais e empresários preocupados com as consequências que uma crise ecológica poderia acarretar (GRÜM, 2000), publicou um relatório chamado The Limits of Growth (Os Limites do Crescimento), apontando que o consumo mundial estava crescendo de tal forma que levaria a humanidade a um colapso. Também em 1972, em Estocolmo, na Suécia, a Organização das Nações Unidas (ONU) realizou uma conferência sobre o Ambiente Humano, que resultou na Declaração de Estocolmo e no reconhecimento de que os Estados necessitavam de uma resolução universal sobre a proteção e a melhoria do meio ambiente humano (PASSOS, 2009). 37 Assim, se inicia a construção de mecanismos de proteção do meio ambiente, com um viés de universalidade. Vinte anos depois, a ONU realiza outra Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992, que teve como escopo discutir problemas urgentes referentes à proteção ambiental e ao desenvolvimento socioeconômico (PASSOS, 2009). Seguindo a evolução mundial, no Brasil, o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado se tornou um direito fundamental do cidadão (BRASIL, 1988), donde decorre a obrigação dos órgãos fiscalizadores de inspecionarem as atividades poluidoras. A CF de 1988 foi uma inovação no âmbito nacional, pois trouxe ao cenário brasileiro o artigo 225, que reza: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988). O texto constitucional prescreve obrigações a quem agride o meio ambiente, com a previsão, no § 2º, de que aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei (BRASIL, 1988). O legislador constitucional ainda previu no § 3º que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (BRASIL, 1988). Mesmo antes dos ditames constitucionais, a Lei 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), estabeleceu padrões de qualidade ambiental, o zoneamento ambiental, a avaliação de impactos ambientais, bem como o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras (BRASIL, 1981). 38 A PNMA define a competência e orienta os órgãos governamentais, nos três níveis de poder, no que concerne à definição de áreas, critérios e normas de ação, com vistas a garantir o crescimento e desenvolvimento econômico, tentando preservar o meio ambiente, de maneira sustentável, por meio da conscientização, fiscalização e da aplicação de penalidades (VIANNA et al., 2005). Mesmo com a edição da Lei 6.938/81, somente em 2009 foi aprovada a Resolução nº 420 do CONAMA, no dia 28 de dezembro de 2009, que dispõe sobre os critérios e valores orientadores da qualidade do solo quanto à presença de substâncias químicas, e estabelece diretrizes para o gerenciamento ambiental de áreas contaminadas por essas substâncias em decorrência de atividades antrópicas (CONAMA, 2009). A Resolução define etapas de gerenciamento do solo, orientadas pelos órgãos ambientais competentes (federais, estaduais e municipais) tendo como princípios básicos a geração e a disponibilização de informações; a gradualidade na fixação de metas ambientais, como subsídio à definição de ações a serem cumpridas; a racionalidade e otimização de ações e custos; a responsabilização do causador pelo dano e suas consequências; e a comunicação de risco (CONAMA, 2009). Os órgãos governamentais, ao realizarem especificamente o monitoramento e controle ambiental, necessitam de técnicas analíticas capazes de determinar vários elementos, principalmente os metais pesados, haja vista os efeitos tóxicos nos seres vivos (VIERA, 2004). Nessa perspectiva, a Resolução determina que a proteção do solo deve ser realizada de maneira preventiva, a fim de garantir a manutenção da sua funcionalidade, ou de maneira corretiva, visando restaurar sua qualidade, ou recuperá-la de forma compatível com os usos previstos (CONAMA, 2009). Assim define como funções principais do solo, dentre outras: servir como meio básico para a sustentação da vida e de habitat para pessoas, animais, plantas e outros organismos vivos; manter o ciclo da água e dos nutrientes; agir como filtro 39 natural, tampão e meio de adsorção, degradação e transformação de substâncias químicas e organismos (CONAMA, 2009). A Resolução constitui uma fonte de informações sobre os conceitos a serem empregados na proteção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para tanto, define um conceito para o que seja contaminação: [...] presença de substância(s) química(s) no ar, água ou solo, decorrentes de atividades antrópicas, em concentrações tais que restrinjam a utilização desse recurso ambiental para os usos atual ou pretendido, definidas com base em avaliação de risco à saúde humana, assim como aos bens a proteger, em cenário de exposição padronizado ou específico (CONAMA, 2009). Com vistas à prevenção e controle da qualidade do solo, a determinação legal da Resolução implica que os empreendimentos, cujas atividades apresentarem potencial de contaminação dos solos e águas subterrâneas, deverão, por exemplo, a critério do órgão ambiental competente, implantar programa de monitoramento de qualidade do solo e das águas subterrâneas na área do empreendimento e, quando necessário, na sua área de influência direta e nas águas superficiais (CONAMA, 2009). Além dessa determinação, os responsáveis pelo empreendimento devem apresentar relatório técnico conclusivo sobre a qualidade do solo e das águas subterrâneas (CONAMA, 2009). De acordo com a Lei 12.305/2010 os responsáveis pelos estandes de tiro devem ser considerados geradores de resíduos sólidos, pois, assim são definidas as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas incluído o consumo (BRASIL, Lei 12.305, 2010). Atualmente a potencialidade de contaminação do solo e águas nos estandes de tiro é premente, tendo em vista as condições em que estes se encontram, sendo necessária a realização de levantamento e monitoramento da qualidade do solo em suas áreas de abrangência. 40 2.4 Metais tóxicos, metais pesados – conceitos, contaminação e consequências Em relação à terminologia empregada, há uma controvérsia e uma crítica ao termo “metais pesados”. O termo é frequentemente usado para se referir a um conjunto muito heterogêneo de elementos, incluindo o grupo de metais, semi- metais e não metais, que têm sido associados com a contaminação e potencial toxicidade, sendo mais usual para identificar elementos definidos como poluentes do meio ambiente e alimentos (ŠAJN et al., 2013; SOARES, 2004). Ao largo da controvérsia, o termo “metais pesados” é utilizado para elementos químicos que contaminam o meio ambiente, que provocam diferentes danos à biota, quais sejam, metais, semi-metais e mesmo não metais como, por exemplo, o selênio (TSUTIYA, 1999). A presença de substâncias e de metais no solo por si só não é motivo de preocupação, pois nutrientes como nitrogênio (N), fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca), magnésio (Mg) e enxofre (S) (macronutrientes), ferro (Fe), manganês (Mn), cobre (Cu), molibdênio (Mo), zinco (Zn), boro (B), cloro (Cl) e níquel (Ni) (micronutrientes) são considerados essenciais ao crescimento dos vegetais por desempenharem funções consideradas vitais ao desenvolvimento das plantas (KIRKBY & RÖMHELD, 2007; JEZLER, 2012). A contaminação causada por metais pesados em solos tratados com resíduos urbanos é avaliada frequentemente pelos teores totais desses elementos no solo, mas há, ainda, a possibilidade de contaminação do lençol freático devido à grande concentração de metais pesados (TSUTIYA, 1999). Devido à migração de lixiviados, solos têm sido contaminados com metais pesados, tais como Pb, Cu, Zn, Fe, Mn, Cr e Cd, encontrados em resíduos sólidos, gerando sérios problemas ao meio ambiente (KANMANI &; GANDHIMATHI, 2012). Aumentos da concentração de metais pesados no solo, em especial de Pb, 41 tendo em vista a ação antropogênica, que podem causar sérios riscos à saúde humana, necessitam ser estimados e estudados (ABREU, ABREU & ANDRADE, 1998). Os metais pesados têm se apresentado cada vez mais próximos da cadeia alimentar dos animais e, em especial, da do homem (FERNANDES et al., 2007). Isso também se verifica quanto aos teores de metais pesados presentes em solos e disponíveis às plantas, sendo de fundamental importância a avaliação do risco de entrada desses elementos potencialmente tóxicos na cadeia alimentar (FERREIRA, et al., 2001). A constatação de que a utilização de armas de fogo libera metais tóxicos no meio ambiente, os quais podem causar contaminação, traz consigo a obrigação de verificar as consequências do uso e emprego desses equipamentos pelos policiais militares. Gonçalves Jr. (2013) declara que, em meio aos poluentes, os metais tóxicos estão entre os que mais causam preocupação, dado que vários processos têm produzido resíduos ricos nesses elementos. O que se verifica é que o processo de treinamento dos policiais militares gera a contaminação por Pb no momento da denotaçãoda espoleta, que contém estifilato de Pb, sendo liberadas partículas de Pb quando o projétil passa através do cano da arma (SANTOS, 2006). Resumidamente, o processo de treinamento feito pelos policiais militares, para utilizar armas de fogo, se dá pela repetição de técnicas de tiro e, por consequência, o disparo de arma de fogo propriamente dito. As armas expelem projéteis compostos de Pb. Esse material é lançado contra os barrancos onde ficam depositados. Conforme o manual do Método Giraldi - 2006, o treinamento de tiro de policiais não exige um local (estande de tiro) sofisticado; para a sua realização, basta um simples barranco para contenção dos projéteis (GIRALDI, 2006). O manual conclui declarando que o treinamento pode ser feito, de igual forma, em qualquer bairro ou cidade (GIRALDI, 2006). 42 Ao se verificar o Manual Giraldi – 2006, a inferência que se pode fazer é de que não há preocupação ambiental alguma quando da instalação ou treinamento em um estande de tiro. Logo se vislumbra que o solo dos barrancos e toda área que serve de anteparo aos projéteis nos estandes de tiro sejam passíveis de contaminação por metais tóxicos, em especial Pb. O presente trabalho aponta que o treinamento de tiro por policiais se mostra também como fonte de contaminação. Como se pode observar pela Figura 3, muitos resíduos sólidos ficam depositados no solo dos estandes de tiro, de modo semelhante ao que ocorre no estande de tiro da Academia Policial Militar do Guatupê (APMG). Figura 3 – Projéteis depositados no solo do estande de tiro da APMG. Fonte: Elaborado pelo Autor Entender a dinâmica de um possível processo de contaminação do solo por metais tóxicos é de grande importância, tendo em vista os riscos que pode acarretar à qualidade das águas superficiais e subterrâneas, além dos altos custos envolvidos em operações de remediação (SOARES et al., 2005). Está patente que o uso de armas de fogo pela PMPR caracteriza-se como 43 uma fonte de contaminação. Os projéteis de Pb se constituem em resíduo sólido depositado no solo dos estandes de tiro, e, como tal, acarretam vários problemas. Konrad & Calderan (2011) destacam dentre eles: a poluição do ar, contaminação do solo, das águas superficiais e dos lençóis freáticos; riscos à saúde pública pela proliferação de diversos tipos de doenças; agravamento de problemas socioeconômicos. 2.5 Influência do Cd na saúde humana e meio ambiente O Cd é encontrado naturalmente na crosta da Terra, sendo comumente associado ao Zn, Pb e minério de Cu, com uma abundância de 0,1 a 0,5 mg.Lˉ¹ (PIZZAIA, 2013). A contaminação por Cd pode acontecer via ingestão de produtos agrícolas e de solo, resultando em potencial risco à saúde (CAMPOS et al., 2013). Em humanos, o Cd pode se acumular com maior ênfase nos rins, no fígado e nos ossos, podendo levar a disfunções renais e osteoporose, além de favorecer a geração de radicais livres, interferências no sistema imunológico e nervoso, consequentemente afetando o sistema visual e olfativo; pode, ainda, causar enfisemas pulmonares e desmineralização óssea (PIZZAIA, 2013). Os efeitos tóxicos do Cd se manifestam principalmente nos ossos e rins. Pessoas com baixas reservas de ferro são particularmente vulneráveis a esses efeitos adversos (GARCÍA & CRUZ, 2012). Além de comida e cigarros, que são as principais fontes de exposição dos seres humanos ao Cd, a exposição pode ocorrer através de líquidos, seja por conta de tubulações que contenham Cd em soldas ou água contaminada por resíduos descartados nos rios ou em locais de captação (GARCÍA & CRUZ, 2012). Existem evidências epidemiológicas que determinam ser o Cd um agente carcinogênico em relação à saúde humana, sendo classificado em sétimo lugar no ranking da lista das substâncias mais perigosas divulgadas pela Agência de Saúde Pública Federal dos EUA (LACORTE, 2012). 44 2.6 Influência do Cr na saúde humana e meio ambiente Sendo considerado um elemento com traço essencial para o ser humano, o Cr é um metal de grande importância na área da indústria, como é o caso da galvanoplastia, polimento de metais, produção de ligas metálicas, estruturas da construção civil, fertilizantes, tintas, pigmentos, curtumes, preservativos para madeira entre outros usos, consequentemente, é considerado um grande poluidor do meio ambiente (AMORIM, 2000; TRINDADE et al., 2012; CETESB, 2014). Conforme Trindade(2012): Entretanto, se encontrado em altas concentrações, também pode ser tóxico aos indivíduos. A intoxicação geralmente conduz à corrosão do aparelho digestivo, diarréias, náuseas, efeitos cutâneos, danos aos rins, fígado e pulmões, hemorragias internas e desenvolvimento de carcinomas (TRINDADE et al., p. 68, 2012). Rotineiramente, materiais que utilizam Cr são descartados de forma inadequada e sem tratamento. Esses resíduos possuem alto poder de contaminação, pois o Cr liberado atinge os lençóis freáticos com facilidade, ou mesmo reservatórios ou rios, que são as fontes de abastecimento de água das cidades (MAGRO, 2010). Em condições normais, as concentrações de Cr em água doce são baixas. Na forma trivalente, o Cr é essencial ao metabolismo humano, porém, na forma hexavalente, é tóxico e cancerígeno (CETESB, 2014). A presença do Cr em altas concentrações traz consequências ambientais, principalmente, sobre espécies aquáticas, acumulando-se em guelras, brônquios, vísceras, coração, pele, escamas e músculos (MAGRO, 2010). 45 2.7 Influência do Pb na saúde humana e meio ambiente Conforme Mavropoulos (1999), ao citar Larini, a contaminação do solo pelo Pb pode se dar de forma natural ou geológica, ou ainda por meio de atividades exercidas pelo homem, como a mineração, a indústria e o transporte. E complementa ressaltando que o teor de Pb nos solos tende a se alterar de região a região. Por exemplo, em regiões próximas às vias de tráfego intenso e de indústrias, os teores de Pb se apresentam bem mais elevados do que aqueles encontrados em áreas isoladas (MAVROPOULOS, 1999). Estudos apontam que a contaminação por Pb nos solos provém de fontes antrópicas, tais como o uso de insumos agrícolas com teores elevados de Pb, deposição atmosférica, mineração e resíduos industriais (PIERANGELI, 1999). No trabalho apresentado por Van Geen et al. (2012), que buscou estimar a população do Peru que poderia estar exposta ao Pb do solo contaminado nas proximidades de minas de exploração, foi constatado que 53% das amostras de solo tinham uma concentração de Pb acima do máximo de 1.200 mg/kg recomendados pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA). Esse estudo obteve resultados esclarecedores, pois demonstrou que, nos locais pesquisados, as cinco maiores concentrações de Pb no solo, que variaram entre 5.000 e 12.000 mg/kg, foram observadas em amostras colhidas acerca de 500 m da margem do poço de extração e apenas 11 das 74 amostras apresentaram concentrações de Pb abaixo do limite de 400 mg/kg conforme recomenda a EPA (VAN GEEN et al., 2012). Pierangeli et al. (2001) faz uma observação quanto aos teores de Pb e normas reguladoras brasileiras: No Brasil, teores de chumbo superiores aos reportados na literatura mundial têm sido observados em alguns fertilizantes e calcários (Amaral Sobrinho et al., 1992), biossólidos (Langenbach et al., 1994) e compostos de lixo urbano (Cravo et al., 1998). Embora existam normas regulamentares relativas à concentração máxima permitida de Pb para que um resíduo ou corretivo possa ser adicionado aos solos, elas são muito genéricas, uma vez que não levam em conta os atributos dos solos. (PIERANGELI et al., p. 280, 2001) 46 Geralmente, o Pb acumula-se na camada superficial do solo em vista de sua baixa mobilidade no perfil (ABREU, ABREU & ANDRADE, 1998). Miranda et al. (2011), ao citar Peres e Moreira (2003), destaca que não somente os solos poluídos por essa substância como também águas poluídas ou as resultantes de suas fragmentações, geram a contaminação dos animais que as habitam, podendo constituir uma ameaça para a saúde humana através da biomagnificação (PERES & MOREIRA; 2003). Uma pequena quantidade desse metal é transportada para as águas subterrâneas ou mesmo superficiais. A maior parte do Pb fica retida no solo. Esse processo ocorre tendo em vista vários fatores como o pH, a composição mineral, quantidade e tipo de matéria orgânica, dentre outros encontrados no solo, que dificultam a travessia (PAOLIELLO; CHASIN, 2001). Várias são as fontes de contaminação do solo. Cunha (2003) aponta a galena, sulfeto de Pb, como a fonte primária mais importante de Pb e a principal fonte comercial. Outra fonte, como, por exemplo, a atividade de mineração, tem a capacidade de perturbar ou alterar os ciclos naturais dos elementos químicos no ambiente, causando a acumulação dos metais tóxicos nas águas, sejam elas superficiais ou subterrâneas, também nos sedimentos, solos, na atmosfera e, portanto, no organismo dos homens e animais, por meio da ingestão de água e alimentos e da inalação de partículas de poeira (CUNHA, 2003). Todavia, no caso do Pb, quando encontrado em níveis de exposição moderada no ambiente e nas ocupações laborais, um importante aspecto dos seus efeitos tóxicos a ser observado é a reversibilidade das variações bioquímicas e funcionais induzidas (MOREIRA & MOREIRA, 2004a). O Pb é um elemento tóxico não essencial que se acumula no organismo e compromete virtualmente todos os órgãos e sistemas do corpo humano, sendo que os mecanismos de toxicidade propostos envolvem processos bioquímicos basilares (MOREIRA & MOREIRA, 2004). 47 No organismo humano, a absorção do Pb é influenciada por alguns aspectos como a rota de exposição, forma química, tamanho da partícula, assim como pela solubilidade dos compostos desse metal e variações individuais fisiológicas e patológicas (MOREIRA & MOREIRA, 2004b). Em adultos, os efeitos da exposição podem influenciar as funções do sistema nervoso central e também o aumento da pressão sanguínea, o que se torna um fator de risco para pessoas cardiopatas (JAKUBOWSKI, 2011). Grande parte das pesquisas sobre os efeitos na saúde provocados pelo Pb tem sido focada em crianças porque elas são mais vulneráveis ao Pb do que adultos. Estudos mostram que as crianças sofrem mais, pois, nelas, os efeitos críticos atingem o sistema nervoso, enquanto que nos adultos com exposição ocupacional excessiva, ou até por acidente, os cuidados são com a neuropatia periférica e a nefropatia crônica (JAKUBOWSKI, 2011; MOREIRA & MOREIRA, 2004a). Gonçalves Jr (2013), ao citar Paoliello & Chasin (2001), explica que o Pb é o metal pesado tóxico em maior quantidade na crosta terrestre, apresentando uma concentração média entre 10 e 20 mg/kg-1. Ademais o referido metal provoca várias alterações bioquímicas, todas elas deletérias (SCHIFER, BOGUSZ &MONTANO, 2005). Uma releitura da teoria acerca da contaminação do solo por Pb mostra fontes clássicas de contaminação: No Brasil, dentre as principais fontes, temos: a poeira contaminada nas áreas das comunidades que vivem próximas a fábricas ou ao redor de minerações; o material particulado trazido para o interior da casa por aqueles que trabalham em indústrias que manipulam chumbo; o uso de porcelana esmaltada e utensílios de PVC; a fabricação caseira de chumbadas de pesca e cartuchos; tinturas de cabelo; tintas de brinquedos; projéteis de arma de fogo alojados em articulações ou canal medular; e até mesmo alimentos, industrializados ou frescos, dependendo se a água utilizada na irrigação ou o solo onde foram plantados estão ou não com níveis de chumbo elevados (EVANGELISTA & SILVA, p. 8, 2013). Os efeitos do Pb no organismo humano são devastadores, razão pela qual http://lattes.cnpq.br/4734802565141093 48 se faz necessário manter o controle dos níveis do referido metal no meio ambiente, observando rigorosamente os ditames legais. 2.8 Influência do Al na saúde humana e meio ambiente Apesar de ser dos elementos mais abundantes, o terceiro elemento depois do oxigênio e sílica no meio ambiente, configurando 8,8 % na crosta terrestre, o Al está presente em reduzidas quantidades nos seres vivos (ROSALINO, 2011). O Al e seus sais são amplamente usados pela indústria no tratamento da água, como aditivo alimentar, na fabricação de latas, telhas, papel alumínio, na indústria farmacêutica (CETESB, 2014). Em solos ácidos e com elevados teores de Al3+, a toxicidade de Al é o fator mais limitante à produtividade agrícola (DEL GUERCIO & CAMARGO, 2011; KOCHIAN, 1995). Conforme a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) (2014), na água, o Al pode ocorrer em diferentes formas: [...] é influenciado pelo pH, temperatura e presença de fluoretos, sulfatos, matéria orgânica e outros ligantes. [...] Em águas com extrema acidez, afetadas por descargas de mineração, as concentrações de alumínio dissolvido podem ser maiores que 90 mg/L. Na água potável, os níveis do metal variam de acordo com a fonte de água e com os coagulantes à base de alumínio que são usados no tratamento da água (CETESB, p. 6, 2014). Autores divergem quanto à classificação do Al. Oliveira (2014) entende que o Al, apesar de não ser classificado como metal pesado, está entre a vasta relação de poluentes da água e interfere significativamente no ecossistema aquático quando em excesso (OLIVEIRA, 2014). Cunha et al. (2011) e Silva (2007) entendem que o Al é um metal pesado abundante nas rochas e causa problemas em 30-40% das terras cultiváveis do planeta. Em solos ácidos, ele torna-se solúvel, é absorvido pelas raízes e inibe o crescimento das plantas (CUNHA et al., 2011; SILVA, 2007). A principal via de exposição humana ao Al é pela ingestão de alimentos e 49 água, com exceção da via ocupacional, não havendo indicações de que apresente toxicidade aguda por via oral (CETESB, 2014). Não há indicação de carcinogenicidade para o Al, porém, alguns autores o relacionam à doença de Alzheimer e a outros tipos de escleroses, já que nos pacientes com a doença foi detectado o aumento da concentração de Al no cérebro, músculos e ossos (CETESB, 2014; DANTAS et al., 2007). 2.9 Estandes de tiro – prováveis fontes de contaminação A PMPR mantém, em algumas cidades do Estado, estandes de tiro onde são realizados os treinamentos de seus agentes. Em alguns casos, os estandes de tiro são áreas abertas onde os disparos de arma de fogo são realizados contra “barrancos” de terra, ou armações de pneus preenchidos com areia ou com a própria terra do local4. A deposição de resíduos de munições em estande de tiro pode representar uma ameaça para o meio ambiente e fauna, tendo em vista que animais domésticos ou selvagens podem beber de córregos ou lagos contaminados, ou podem alimentar-se do pasto contaminado na área do campo de tiro (MARIUSSEN et al., 2012). Os estandes de tiro da PMPR são locais onde os militares estão expostos ao contato com o Pb, quer seja pelo manuseio do armamento e munição ou mesmo pelo Pb no solo resultante dos disparos nos barrancos. Assim, conforme artigo 14 da Resolução 420/2009 do CONAMA,a existência dos estandes de tiro demanda um cuidado ambiental(CONAMA, 2009). Entretanto, ao se buscar informações sobre a gestão ambiental dos estandes de tiro da PMPR, não foram encontradosdados disponíveis que permitissem deduzir se há ou não contaminação destes espaços. Não havendo 4 Constatação mediante visitação in loco dos estandes da PMPR. 50 informação disponível, não há, em tese, um conflito ambiental (MEDEIROS, 2004). Peddicord & Lakind (2000), ao pesquisarem o estande de tiro ao ar livre do Centro Blue Mountain Sportsman, operado por Westchester Country, que fica a aproximadamente 40 km ao norte de Nova York, EUA, trataram dos riscos para a saúde humana e ecológica em um campo de tiro ao ar livre; fizeram avaliações dos perigos aos seres vivos decorrentes do uso de munições e armas de fogo. Os autores destacaram que o Pb se converte numa exceção ao risco mínimo à saúde humana. As análises indicaram níveis elevados de Pb no sangue (acima de 10 µg/dL) para os clientes do centro de tiro e funcionários, decorrentes do uso de armas de pequeno calibre e da ingestão de sedimentos e águas superficiais (PEDDICORD & LAKIND, 2000). Os resultados da análise indicam níveis elevados de Pb no sangue (acima de 10 µg / dL) também para as crianças que convivem nos estandes de tiro pesquisados. Cerca de 30% das crianças que ingerem solo, sedimentos e águas superficiais apresentaram alterações significativas nas amostras de sangue (PEDDICORD & LAKIND, 2000). Os autores concluem que sedimentos e águas superficiais parecem ter maior contribuição para os níveis elevados de Pb no sangue das crianças que adentram os estandes de tiro de forma irregular (PEDDICORD & LAKIND, 2000). A probabilidade da existência da contaminação do solo dos estandes de tiro por Pb é alta. Conforme Hardison Jr. et al. (2003), a contaminação de solos pela utilização de disparos com projéteis de Pb está em crescimento. Em sua pesquisa, os autores procuraram apurar a existência de contaminação de campos de tiro e as reações de intemperismo de projéteis de Pb no solo, além do significado da abrasão dos projéteis de Pb para a contaminação do solo. Segundo os autores, a abrasão de projéteis de Pb e, na sequência, seu intemperismo, pode ser uma fonte expressiva de contaminação por Pb em solos de um estande de tiro (HARDISON JR. et al., 2003). 51 Este estudo, vinculado aos demais apresentados ao longo da presente pesquisa, leva a diligenciar atentamente para a existência de contaminação, e até de poluição, por metais pesados dos solos dos estandes de tiro da PMPR e de estandes particulares (HARDISON JR. et al., 2003). 2.10 Normas ambientais – regulamentação do CONAMA Machado et al. (2004) indica que a seriedade de um determinado cenário de contaminação depende de alguns fatores, dentre os quais é preciso que haja a disponibilização do contaminante para o meio ambiente. Os autores esclarecem que: Havendo a disponibilização do contaminante, é interessante que se conheçam os possíveis caminhos a serem percorridos pelo mesmo, a intensidade e o espraiamento da contaminação. Desempenham um papel fundamental na busca de respostas para estas questões as condições hidrogeológicas, as características das camadas de solo e as condições geotécnicas do local, assim como as características do próprio contaminante. Havendo a possibilidade do contaminante se propagar, é necessário que se identifiquem as possíveis formas de exposição da população ao contaminante (existência de poços para o consumo de água, ingestão de alimentos contaminados, aspiração de poeira, geofagia, etc.) (MACHADO et al., p. 142, 2004). O ponto de referência para verificar se há ou não contaminação dos solos pesquisados é a Resolução nº 420/2009 do CONAMA, que dispõe sobre critérios e valores orientadores de qualidade do solo quanto à presença de substâncias químicas e estabelece diretrizes para o gerenciamento ambiental de áreas contaminadas por essas substâncias em decorrência de atividades antrópicas (CONAMA, 2009). Ao fazer uma análise sobre a citada Resolução, Skorupa (2013), citando Rohde (2008), apresenta as fases para se estabelecer valores de qualidade do solo: Para este fim, foram estabelecidos os seguintes termos e definições: 1. valor de referência de qualidade: concentrações naturais, determinadas com base em interpretação estatística de análises físico-químicas de diversas amostras; 2. valor de prevenção: concentrações-limite de 52 determinada substância, com o intuito de garantir a manutenção e/ou restauração do ecossistema, compatíveis com os usos previstos; 3. valor de investigação: definição usada para concentrações de determinada substância no solo ou na água subterrânea acima do qual existem riscos potenciais à saúde humana. A determinação de concentrações naturais de um elemento ou substância no solo (‘background’), sem influência antrópica, é um passo importante para a definição de valores orientadores e preventivos de contaminação do solo. Outro termo bastante comum na literatura é o nível de base (‘baseline’) que é a concentração de um determinado elemento ou substância em alguns pontos de amostragem no tempo, e que pode incluir influência humana (ROHDE, 2008). Assim, o nível de base não corresponde necessariamente às concentrações naturais de elementos ou substâncias no solo (‘background’) e é definido como o intervalo de dois desvios-padrão em relação à média, ou seja, a inclusão de 95% dos resultados do intervalo (ROHDE, 2008), assumindo-se uma distribuição normal (SKORUPA, p. 13- 14, 2013). A Resolução 420/2009 estabelece, em seu artigo 21, os princípios básicos para o gerenciamento de áreas contaminadas: I - a geração e a disponibilização de informações; II - a articulação, a cooperação e integração interinstitucional entre os órgãos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, os proprietários, os usuários e demais beneficiados ou afetados; III - a gradualidade na fixação de metas ambientais, como subsídio à definição de ações a serem cumpridas; IV - a racionalidade e otimização de ações e custos; V - a responsabilização do causador pelo dano e suas consequências; e, VI - a comunicação de risco (CONAMA, 2009). Conforme se verifica, a constatação de que uma área está contaminada implica uma série de ações por parte dos agentes envolvidos, sejam eles públicos ou particulares (CONAMA, 2009). Decorre da Resolução, por meio do gerenciamento de áreas contaminadas, o resguardo à saúde humana e garantia de um meio ambiente saudável (CONAMA, 2009). O gerenciamento das áreas deverá conter procedimentos e ações voltadas ao atendimento dos seguintes objetivos: I - eliminar o perigo ou reduzir o risco à saúde humana; II - eliminar ou minimizar os riscos ao meio ambiente; III - evitar danos aos demais bens a proteger; IV - evitar danos ao bem estar público durante a execução de ações para reabilitação; e V - possibilitar o uso declarado ou futuro da área, observando o planejamento de uso e ocupação do solo (CONAMA, 2009). A citada Resolução do CONAMA (2009) define ainda que, para o 53 gerenciamento de áreas contaminadas, o órgão ambiental competente deverá instituir procedimentos e ações de investigação e de gestão, conforme ilustrado no Anexo I, baseadas nas seguintes etapas definidas no artigo 23: I - Identificação: etapa em que serão identificadas áreas suspeitas de contaminação com base em avaliação preliminar, e, para aquelas em que houver indícios de contaminação, deve ser realizada uma investigação confirmatória, às expensas do responsável, segundo as normas técnicas ou procedimentos vigentes. II - Diagnóstico: etapa que inclui a investigação detalhada e avaliação de risco, às expensas do responsável, segundo as normas técnicas ou procedimentos vigentes, com objetivo de subsidiar a etapa de intervenção, após a investigação confirmatória que tenha identificado substâncias químicas em concentrações acima do valor de investigação. III - Intervenção: etapa de execução de ações de controle para a eliminação do perigo ou redução, a níveis toleráveis, dos riscos identificados na etapa de diagnóstico, bem como o monitoramento da eficácia das ações executadas, considerando o uso atual e futuro da área, segundo as normas técnicas ou procedimentos vigentes (CONAMA, 2009). A Resolução apresenta uma série de requisitos quando uma área é declarada contaminada, entretanto, o fato é que não há fiscalização das áreas de estande de tiro da PMPR, o que demonstra a possibilidade de que os espaços estejam contaminados e necessitem de intervenção do órgão ambiental competente (CONAMA, 2009). A literatura fornece hoje uma diversidade de métodos de determinação de teores naturais de metais no solo. No entanto, há necessidade de normatização por parte das agências regulamentadoras do método a ser adotado, possibilitando a comparação com os valores orientadores (CONAMA, 2009). O CONAMA estabeleceu os métodos 3050 e 3051 da EPA, e suas atualizações, tornando-os métodos-padrão para a obtenção dos teores de metais em solos do Brasil para comparação com os Valores de Referência de Qualidade (VRQs)5 (BIONDI, 2010). Há possibilidade de que as áreas dos estandes de tiro já estejam na terceira fase do gerenciamento de áreas contaminadas, conforme artigo 23 da Resolução 5 Conforme artigo 6º, inciso XXII, da Resolução 420/2009 do CONAMA, Valor de Referência de Qualidade-VRQ: é a concentração de determinada substância que define a qualidade natural do solo, sendo determinado com base em interpretação estatística de análises físico-químicas de amostras de diversos tipos de solos. 54 420/2009 do CONAMA. Ou seja, áreas que necessitem de intervenção exigindo ações de controle para a eliminação do perigo ou redução dos valores a níveis toleráveis. Existindo então a contaminação nos estande de tiro, há que se cumprir a Resolução. Assim, a PMPR deverá gerenciar as áreas visando controlar e eliminar a contaminação existente, buscando realizar ações que de fato resolvam o problema apresentado (CONAMA, 2009). 55 3 PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS Este capítulo apresenta a descrição dos métodos e ferramentas utilizados nos procedimentos para extração das amostras de solos que foram analisadas e demonstra como foram determinados os pontos de coleta. No capítulo, são exibidas e relacionadas as características de cada área dos estandes de tiro objetos da pesquisa. Por fim, traz o detalhamento teórico, baseado na literatura contemporânea, do método de análise físico-química utilizado para a determinação dos teores de metais pesados ora estudados. 3.1 Métodos e ferramentas – amostragem A composição do solo pode interferir num possível processo de contaminação. Estudo realizado por Yin et al. (2010) na Flórida, nos EUA, demonstrou que a alta umidade, temperatura e precipitação contribuiu para o aumento do intemperismo dos projéteis de Pb descartados no solo com consequente dissolução e lixiviação (YIN et al., 2010). Durante as últimas décadas, vários procedimentos para extração de metais pesados em solos têm sido desenvolvidos e modificados (RAURET, 1998). Assim, coube estabelecer uma forma adequada de coleta. 56 Pelozato et al. (2010), ao citar Raubert (1998), argumentam sobre a importância da escolha do método de extração, afirmando que esta se dá pela possibilidade de determinar não somente o teor do ponto de vista quantitativo, mas também a disponibilidade, a mobilidade do metal pesado. No estudo acima citado, os autores (que tratavam de solo e plantas) concluíram que a importância fecha o ciclo na possibilidade de transferência do metal pesado do solo para a planta e, por consequência, a entrada desse na cadeia alimentar (PELOZATO et al., 2011; RAURET, 1998). Em seu trabalho, Machado et al. (2011) realizaram sondagem de acordo com o teste padrão de penetração (do inglês, Standard Penetration Test, SPT). Os autores seguiram normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) (ABNT, 1986). O material foi coletado de acordo com a Norma Brasileira (NBR) 6457, sendo realizadas cinco perfurações em distintos locais da área de coleta a ser pesquisada, distribuindo-as, uniformemente, no terreno, (MACHADO et al., 2011). A realização de análise geoestatística mostra-se uma boa via para se obter um diagnóstico dos teores de metais de uma área. Basicamente, a obtenção de duas campanhas de amostragem é suficiente para se conquistar o objetivo almejado. A primeira se dá de forma aleatória e com objetivo de obter informações sobre o comportamento e teor de metais na área; a segunda, de forma sistemática, com o objetivo de avaliar a distribuição espacial dos metais ao longo da área de estudo (MACHADO et al., 2011). Pesquisadores têm recorrido a técnicas de coleta de material utilizando-se de sondagens a trado. Fernandes et al. (2007) recolheram amostras de solo para avaliar a concentração de metais pesados em áreas olerícolas no Estado de Minas Gerais. Para tanto, as amostras de solo foram coletadas com um trado de inox. Os autores introduziram o trado até 20 cm de profundidade no solo. A partir de determinado número de amostras simples, variável em função do tamanho da 57 área e nunca inferior a 10 tomadas, o material foi homogeneizado e uma porção de aproximadamente 500 g foi transferida para sacos plásticos (FERNANDES et al., 2007). Machado et al. (2004) realizaram campanha de investigação de campo utilizando diversas sondagens a trado na zona urbana e na área do entorno de uma antiga fábrica de Pb na cidade de Santo Amaro, na Bahia. Durante os estudos, os pesquisadores concluíram que deveriam priorizar a coleta de amostras superficiais, com profundidades variando em torno de 30 cm. As amostras foram cadastradas e armazenadas em sacos plásticos, sendo levadas para a realização de ensaios de espectro-fotogrametria de absorção atômica, de modo a se calcular as concentrações de Zn, Cd e Pb (MACHADO et al., 2004). No presente trabalho, se buscou dar continuidade a métodos científicos já consagrados, como os acima apresentados, bem como os abaixo descritos, visando esclarecer qual a real situação dos estandes de tiro pesquisados. 3.2 Métodos e ferramentas – determinação dos pontos de coleta Trabalhos já realizados adotaram a metodologia de coletar amostras de solo superficiais em profundidade em torno de 10 centímetros abaixo da superfície a fim de detectar os níveis de arsênico, Cr, Cu, Pb e Zn (KOOTBODIEN et al., 2012). Seguindo diretrizes da EPA 2000/2003, pesquisadores estadunidenses coletaram solo superficial (0 e 20 cm) e subsolo (20 e 35 cm), perfurando pequenos buracos no espaço da área pesquisada e acondicionando as amostras de solo em sacos plásticos etiquetados com zíper e armazenados em temperatura ambiente, posteriormente encaminhados até o laboratório onde puderam ser realizadas as análises (STRUCKHOFF et al., 2013). Com o objetivo de recolher amostras dos solos pesquisados, utilizou-se o https://translate.googleusercontent.com/translate_c?depth=1&hl=pt-BR&ie=UTF8&prev=_t&rurl=translate.google.com.br&sl=en&tl=pt-BR&u=http://ac.els-cdn.com/S0301479713000595/1-s2.0-S0301479713000595-main.pdf%3F_tid%3Db5967cd2-5e0c-11e4-ba80-00000aab0f26%26acdnat%3D1414437120_83cb5d9178df92f5c8af8efeb9d9998c&usg=ALkJrhg1KIKVaPkHESDwf4iUr8RnKpaW-g#8 58 trado tipo holandês (Figura 4), com caçamba de 20 cm de altura e 6 cm de diâmetro, volume de aproximadamente 560 cm³, haste de 1 m de altura. Esse modelo se configurou numa ferramenta que tornou a operação mais fácil e ágil, com a vantagem de permitir a retirada das amostras na profundidade correta e das mesmas quantidades de terra de todos os pontos amostrados (ROSOLEM, TOZI & GARCIA, 2010). Figura 4 - Trado Holandês sendo utilizado durante a pesquisa. Fonte: Elaborado pelo Autor A determinação dos pontos de coleta das amostras levou em conta o local de onde são disparadas as armas dentro dos estandes de tiros e os pontos de impacto dos projéteis. Assim, foram retiradas amostras junto aos boxes de abrigo dos atirados, bem como dos barrancos de terra e também entre estes pontos de 10 a 15 metros dos barrancos. Os parâmetros foram estabelecidos a partir de estudo detalhado dos resultados das amostras coletadas dos solos, para as quais foram realizadas duas campanhas (coletas de solo). 59 A primeira campanha foi realizada ao longo do ano de 2013, e outra no ano de 2015, com o objetivo de conseguir comparações entre os níveis de metais encontrados e que pudessem indicar o comportamento (a mobilidade) dos elementos químicos em análise. A amostragem foi realizada com base na metodologia proposta pelo IAP (IAP, 2014), sendo divididas em áreas homogêneas e representativas ao longo do estande de tiro. Para a coleta das amostras, foi retirada a vegetação e outros detritos da superfície do solo a ser amostrado. O solo foi coletado com o auxílio do trado holandês, na profundidade de 0-20 cm. Foram coletadas cinco amostras simples, depositadas em uma bandeja para homogeneização e formação da amostra composta,constituindo a amostras 01, 02, 03, 04, 05 e amostra