UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI - UNIVATES CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLÓGICAS CURSO DE ENGENHARIA MECÂNICA IMPLEMENTAÇÃO DE UM CÓDIGO COMPUTACIONAL PARA SIMULAÇÃO DO ESCOAMENTO DE FLUIDOS INCOMPRESSÍVEIS Rafael Diogo Weimer Lajeado/RS, novembro de 2020 Rafael Diogo Weimer IMPLEMENTAÇÃO DE UM CÓDIGO COMPUTACIONAL PARA SIMULAÇÃO DO ESCOAMENTO DE FLUIDOS INCOMPRESSÍVEIS Monografia apresentada no componente curricular Trabalho de Conclusão de Curso II, do curso de Engenharia Mecânica, da Universidade do Vale do Taquari, como parte da exigência para obtenção do título de Bacharel em Engenharia Mecânica. Orientador: Prof. Dr. Lober Hermany Lajeado/RS, novembro de 2020 AGRADECIMENTOS À minha família, especialmente meus pais, por sempre me incentivarem a estudar, e por não medirem esforços para me ajudar sempre que necessário. Agradeço também aos meus amigos e colegas de trabalho, por sempre estarem presentes, me apoiando e incentivando, e pela compreensão pelos momentos em que me fiz ausente. Por fim, agradeço à Univates, e todos os professores do curso, pelos ensinamentos passados. RESUMO As equações de Navier-Stokes são Equações Diferenciais Parciais que descrevem o comportamento de diversos fluidos, sendo aplicadas em vários campos de estudo. Devido a sua complexidade, poucas situações possuem solução analítica, o que faz necessário a aplicação de outros métodos para obter soluções aproximadas e coerentes com a realidade. Uma dessas soluções é a dinâmica dos fluidos computacional, na qual são aplicados métodos numéricos para a simulação computacional de escoamentos. No presente estudo, buscou-se desenvolver um código numérico utilizando o método dos volumes finitos para simular o escoamento de fluidos incompressíveis em escoamento bidimensional para baixos números de Reynolds. O código foi desenvolvido utilizando uma malha desencontrada, e empregou-se o método PRIME para o problema do acoplamento pressão-velocidade e, para validação dos resultados, foi analisado o problema do escoamento em uma cavidade com tampa móvel utilizando diferentes números de Reynolds. As simulações foram feitas, inicialmente, em uma malha de 129 x 129 volumes de controle, e os resultados dos perfis de velocidade para números de Reynolds de 100 e 400 se mostraram próximos aos da literatura. Para os números de Reynolds de 1000 e 3200, a simulação com malha de 129 x 129 apresentaram diferenças elevadas para as velocidades máximas e mínimas em relação aos dados obtidos na literatura. Por isso, foram realizadas novas simulações em uma malha da 200 x 200, com as quais foi possível verificar uma melhora significativa nos resultados, sendo que a máxima variação entre os dados obtidos nas simulações e os dados obtidos na literatura passou de 26% para 16/8%. Além disso, foi realizada a comparação das linhas de corrente geradas pelo código numérico com as disponíveis na literatura, que se mostraram coerentes. Dessa forma, verificou-se que o código implementado possui boa precisão numérica e gráfica, fatores importantes para a análise de dados. Palavras-chave: Dinâmica dos Fluidos Computacional. Método dos Volumes Finitos. Equações de Navier-Stokes. Python. LISTA DE ILUSTRAÇÕES LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Deformação em fluidos ............................................................................ 16 Figura 2 – Classificação do escoamento dos fluidos ................................................. 20 Figura 3 – Escoamento turbulento (a) x Escoamento laminar (b) ............................. 21 Figura 4 – Escoamento uniforme em uma tubulação ............................................... 23 Figura 5 – Escoamento uni e bidimensional .............................................................. 24 Figura 6 – representação do escoamento de sangue no coração feita por Da Vinci x Simulação computacional.......................................................................................... 25 Figura 7 – Representação das linhas de corrente ..................................................... 26 Figura 8 – Padrão de linhas de emissão em torno de um objeto ............................. 27 Figura 9 – Gráfico vetorial da velocidade de um escoamento ................................... 28 Figura 10 – Gráfico de contorno de uma distribuição de pressão ............................. 28 Figura 11 – Movimentos e deformações de uma partícula ........................................ 29 Figura 12 – Rotação de um elemento de fluido ......................................................... 31 Figura 13 – Domínio contínuo x domínio discreto ..................................................... 39 Figura 14 – Exemplo de uma malha 2d não uniforme ............................................... 39 Figura 15 – Representação de uma malha unidimensional....................................... 40 Figura 16 – Representação do Método dos Volumes de Controle Unidimensional ... 41 Figura 17 – Exemplo de malha estruturada mista ..................................................... 42 Figura 18 – Exemplo de uma malha estruturada em blocos ..................................... 43 Figura 19 – Exemplo de malha não estruturada ........................................................ 43 Figura 20 – Representação das condições de fronteira ............................................ 44 Figura 21 – Arranjo colocalizado unidimensional. ..................................................... 46 Figura 22 – Representação do arranjo desencontrado. ............................................ 48 Figura 23 – Volume de controle unidimensional para integração .............................. 49 Figura 24 – Propriedades de uma solução numérica ................................................ 55 Figura 25 - Volumes de controle para cada variável ................................................ 58 Figura 26 – Volume de controle para a pressão ........................................................ 63 Figura 27 – Etapas do código numérico criado ......................................................... 67 Figura 28 – Representação do escoamento dentro de uma cavidade com tampa móvel ......................................................................................................................... 69 Figura 29 – Campos de velocidade para diferentes números de Reynolds .............. 70 Figura 30 – Campos de pressão para diferentes números de Reynolds ................... 72 Figura 31 – Comparação entre linhas de corrente para Re = 100 ............................ 82 Figura 32 – Comparação entre linhas de corrente para Re = 400 ............................ 82 Figura 33 – Comparação entre linhas de corrente para Re = 1000........................... 83 Figura 34 – Comparação entre linhas de corrente para Re = 3200........................... 83 Figura 35 – Comparação entre linhas de corrente da simulação (Re = 3200) e experimentais (Re = 10000). ..................................................................................... 84 Figura 36 – Linhas de corrente em diferentes instantes de tempo para Re = 3200 .. 85 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Perfil da componente velocidade u para Re = 100 ................................. 73 Gráfico 2 – Perfil da componente de velocidade u para Re = 400 ............................ 74 Gráfico 3 – Perfil da componente de velocidade u para Re = 1000 .......................... 74 Gráfico 4 – Perfil da componente de velocidade u para Re = 3200 .......................... 74 Gráfico 5 - Perfil da componente de velocidade v para Re = 100 ............................. 75 Gráfico 6 – Perfil da componente de velocidade v para Re = 400 ............................ 75 Gráfico 7 – Perfil da omponente de velocidade v para Re =1000 ............................. 76 Gráfico 8 – Perfil da componente de velocidade v para Re = 3200........................... 76 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Comparação das velocidades máxima e mínima para diferentes números de Reynolds. ............................................................................................................. 77 Tabela 2 – Comparação das velocidades máxima e mínima para diferentes números de Reynolds com malha de 200 x 200 ...................................................................... 81 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CDS Central Difference Scheme – Esquema das diferenças centrais Γ Coeficiente difusivo 𝑘 Condutividade térmica (W/m2.k) ∆ Diferença DFC Dinâmica dos Fluidos Computacional EDP Equação Diferenciais Parciais 𝑔 Gravidade (m/s2) m Massa (Kg) 𝜌 Massa específica (kg/m3) MDF Método das Diferenças Finitas MVF Método dos Volumes Finitos E Módulo de elasticidade (Pa) 𝑀 Número de Mach 𝑅𝑒 Número de Reynolds ∇ Operador gradiente 𝛾 Peso específico (N/m3) P Pressão (Pa) 𝑇 Temperatura (°C) 𝜏 Tensão cisalhante (Pa) 𝑆 Termo fonte TDMA TriDiagonal Matrix Algorithim – Algoritmo de matriz tridiagonal UDS Upwind Difference scheme – Esquema das diferenças upwind ∅ Variável Genérica �⃗⃗� Velocidade angular (rad/s) 𝜇 Viscosidade (Pa.s) VC Volume de Controle SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 11 1.1 Tema .................................................................................................................. 12 1.2 Problema de pesquisa ...................................................................................... 12 1.3 Objetivo geral .................................................................................................... 12 1.4 Objetivos específicos ....................................................................................... 12 1.5 Justificativa ....................................................................................................... 13 1.6 Estrutura do trabalho........................................................................................ 13 2 REFERENCIAL TEÓRICO..................................................................................... 15 2.1 Conceitos fundamentais da mecânica dos fluidos ........................................ 15 2.1.1 Definição de fluido ......................................................................................... 15 2.1.2 O meio contínuo ............................................................................................. 16 2.1.3 Campos vetoriais ........................................................................................... 17 2.1.4 Propriedades dos fluidos .............................................................................. 18 2.1.5 Classificação do movimento dos fluidos ..................................................... 19 2.1.5.1 Escoamento não viscoso ........................................................................... 20 2.1.5.2 Escoamento viscoso ................................................................................... 20 2.1.5.3 Escoamento laminar e turbulento .............................................................. 21 2.1.5.4 Escoamento compressível e incompressível ........................................... 22 2.1.5.5 Escoamento interno e externo ................................................................... 22 2.1.5.6 Escoamento uni, bi e tridimensional ......................................................... 23 2.1.6 Visualização do escoamento: observando o padrão de movimento do fluido......................................................................................................................... 24 2.1.6.1 Linhas de corrente ...................................................................................... 25 2.1.6.2 Linhas de emissão ...................................................................................... 26 2.1.6.3 Gráficos vetoriais ........................................................................................ 27 2.1.6.4 Gráficos de contorno .................................................................................. 28 2.1.7 A dinâmica dos fluidos e suas leis governantes ......................................... 29 2.1.7.1 A translação de uma partícula fluida ......................................................... 29 2.1.7.2 Rotação e vorticidade de partículas fluidas .............................................. 31 2.1.7.3 Deformações de um elemento de fluido e o campo de tensões ............. 32 2.1.7.4 A equação da continuidade ........................................................................ 33 2.1.7.5 Quantidade de movimento e as equações de Navier-Stokes .................. 34 2.1.7.5 A função de corrente para escoamentos .................................................. 36 2.2 Modelagem numérica e simulações computacionais .................................... 36 2.2.1 A forma genérica das equações de transporte ............................................ 37 2.2.2 Métodos numéricos e a discretização do domínio ...................................... 38 2.2.2.1 Método das diferenças finitas (MDF) ......................................................... 39 2.2.2.2 Método dos volumes finitos (MVF) ............................................................ 41 2.2.3 Tipos de malhas numéricas .......................................................................... 42 2.2.4 Condições iniciais e de contorno ................................................................. 44 2.2.5 O acoplamento Pressão-velocidade e os tipos de arranjo das variáveis . 45 2.2.7 Solução das equações discretizadas ........................................................... 53 2.3.6 Propriedades da solução numérica .............................................................. 54 3 METODOLOGIA .................................................................................................... 56 3.1 Classificação ..................................................................................................... 56 3.2 Etapas de elaboração do código computacional ........................................... 56 3.2.1 Delimitação das variáveis e do escoamento ................................................ 57 3.2.2 Discretização do domínio .............................................................................. 57 3.2.3 Discretização das equações ......................................................................... 58 3.2.4 Solução para o acoplamento Pressão-Velocidade ...................................... 62 3.2.5 Resolução do sistema linear encontrado ..................................................... 65 3.2.6 Implementação e verificação dos dados ...................................................... 66 4 ANÁLISE DOS RESULTADOS ............................................................................. 68 4.1 Escoamento em cavidade com tampa móvel ................................................. 68 4.1.1 Campo de velocidades................................................................................... 70 4.1.2 Campo de pressões ....................................................................................... 71 4.1.3 Perfil das componentes de velocidade ........................................................ 73 4.1.3 Análise das linhas de corrente ...................................................................... 81 4.1.3 Evolução temporal do escoamento .............................................................. 85 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 87 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 89 APÊNDICE A – Código numérico desenvolvido ................................................... 92 11 1 INTRODUÇÃO O estudo do comportamento e movimento dos fluidos e como eles interagem com o ambiente sempre despertou a curiosidade do ser humano, que, como nas demais áreas da ciência, buscou maneiras de expressar matematicamente suas observações e as leis fundamentais que os descrevem. Dentre tais leis encontram-se as equações de Navier-Stokes, equações parciais de segundo grau que descrevem o movimento de Fluidos Newtonianos e incompressíveis. No cotidiano de um engenheiro elas possuem diversas aplicações, pois podem ser utilizadas para prever o comportamento de fluidos em diversas situações, como no escoamento em tubulações, desenvolvimento de aeronaves, dentre outras. Porém, conforme Fortuna (2012), por se tratarem de equações diferenciais parciais - EDPs, elas possuem soluções analíticas somente para poucas situações, consideradas simples, devido a sua elevada complexidade. Devido ao seu alto grau de complexidade, faz-se necessária a aplicação de outras técnicas para se obter aproximações adequadas aos problemas modelados. Uma dessas alternativas é a aplicação de métodos numéricos juntamente com ferramentas computacionais para se obter soluções numéricas para as equações de Navier-Stokes e demais equações relacionadas e, assim, construir simulações e obter-se dados de interesse, tais como campos de velocidade, pressão e distribuição de temperaturas, para auxiliar na tomada de decisões. A essa área de estudos deu- se o nome de Dinâmica dos Fluidos Computacional (FORTUNA, 2012). 12 Nesse sentido, com a presente monografia busca-se o desenvolvimento de um código numérico para a simulação do escoamento de fluidos incompressíveis e Newtonianos, por meio da aplicação de técnicas numéricas para discretização das equações de Navier-Stokes a fim de se aprofundar os conhecimentos sobre as etapas metodológicas para tal. 1.1 Tema Desenvolvimento de um código numérico, por meio da linguagem Python, para a simulação do escoamento de fluidos incompressíveis em situações bidimensionais para baixos números de Reynolds. 1.2 Problema de pesquisa Existem diversos softwares comercias utilizados durante a etapa de desenvolvimento de projetos para a simulação do comportamento de fluidos e de como estes agem sobre outros corpos. Dessa forma, busca-se entender o funcionamento por detrás desses softwares, especificamente a metodologia matemática aplicada para simulação dos fenômenos físicos envolvendo a fluido dinâmica. 1.3 Objetivo geral O objetivo desta pesquisa é a modelagem e solução numérica das equações que governam o escoamento bidimensional de fluidos e a criação de um código com a linguagem Python para simulação e visualização desses fenômenos. 1.4 Objetivos específicos Os objetivos específicos são: a) modelagem das equações de escoamento de fluidos incompressíveis; b) discretização das equações através de um método numérico; c) implementação de um código utilizando a linguagem Python para a solução das equações; 13 d) verificação do código por meio da solução de problemas encontrados na literatura. 1.5 Justificativa As simulações computacionais são utilizadas em diversas áreas, dentre elas a mecânica dos fluidos, para simular e prever o comportamento de sistemas e situações complexas. Na mecânica dos fluidos, elas podem ser aplicadas em várias situações que envolvem a interação de fluidos e outros objetos e, assim, prever o valor de alguns parâmetros de interesse, como o campo de pressões, temperaturas e a velocidade do escoamento. De acordo com Moukalled, Mangani e Darwish (2016), a dinâmica dos fluidos computacional é uma ferramenta altamente utilizada em diversos ramos da indústria, como a automotiva e na de geração de energia, bem como na indústria de eletrônicos, na qual pode ser utilizada para implementar sistemas de energia ou melhorar a transferência de calor em equipamentos eletrônicos. Ainda, segundo os autores, ela se tornou uma ferramenta muito importante na área biomédica, na qual é utilizada para o desenvolvimento e validação de aplicações médicas. Há, atualmente, diversos softwares comerciais empregados para a realização dessas simulações. Porém, por se tratarem de programas pagos, não é possível consultar o código numérico empregado por eles. Além disso, inúmeras vezes, surgem situações específicas nas quais é preciso realizar a alteração de parâmetros e implementação de outras considerações, que não são possíveis em tais programas, sendo necessária a implementação de algoritmos específicos. Tendo em vista tais fatos, surge o interesse pela área, buscando conhecer quais métodos matemáticos são utilizados para a criação desses modelos e como eles são transformados em simulações computacionais. Além da vontade de implementar um código próprio para o desenvolvimento de habilidades e técnicas utilizadas na área de interesse da pesquisa. 1.6 Estrutura do trabalho A monografia está dividida em cinco capítulos. 14 No primeiro capítulo, realiza-se uma breve descrição sobre o tema e objetivos do trabalho, bem como sobre a importância e aplicações da dinâmica dos fluidos computacional. No segundo capítulo, aborda-se a revisão bibliográfica, na qual são apresentadas informações pertinentes ao assunto do trabalho, como os principais conceitos utilizados na mecânica dos fluidos, as principais leis que governam o escoamento de fluidos e uma revisão sobre os métodos numéricos e sua aplicação na dinâmica dos fluidos computacional. No terceiro capítulo, apresenta-se a classificação da proposta do trabalho, bem como uma descrição das etapas metodológicas seguidas para a discretização das equações e implementação do código numérico. No quarto capítulo, é realizada a análise dos resultados obtidos com as simulações e a comparação destes com dados disponíveis na literatura. Por fim, no quinto capítulo são apresentadas as conclusões, bem como sugestões para trabalhos futuros. 15 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Conceitos fundamentais da mecânica dos fluidos A mecânica dos fluidos, conforme Fox, Pritchard e McDonald (2014, texto digital) “é o estudo dos fluidos em repouso ou em movimento”. Essa definição, que parece muito simples, resume um amplo campo de estudos e aplicações. Na realidade, a mecânica dos fluidos pode ser utilizada para descrever diversas situações presentes no dia a dia, como o processo de respiração, o movimento dos rios e oceanos, o bater de asas de um pássaro e o voo de um avião, bem como o sangue circulando pelo corpo humano. 2.1.1 Definição de fluido Mas o que especificamente é um fluido? É preciso ter uma definição precisa antes que se possa fazer qualquer afirmação sobre as leis que governam tais substâncias. Muitos autores definem os fluidos como um estado da matéria diferente do estado sólido, classificação na qual encontram-se tanto líquidos quanto gases. Pode- se caracterizá-los pela sua reação a aplicação de uma tensão tangencial, com a qual, diferentemente dos sólidos, eles irão se deformar de forma contínua até que a tensão cesse (DAUGHERTY; FRANZINI, 1965; FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014; RIEUTOURD, 2015). Além disso, os autores também comentam sobre outras características dessas substâncias, como a capacidade de, ao serem colocadas em algum recipiente, se deformarem e assumirem o seu formato. 16 Conforme colocado por Albertson, Barton e Simons (1966), a estrutura atômica dos sólidos e dos fluidos é diferente. Nos sólidos, a estrutura molecular é rígida e tende a resistir a forças aplicadas sobre ela, diferentemente dos fluidos, que apresentam uma estrutura molecular mais flexível, na qual os átomos e moléculas conseguem se mover pelo espaço em que se encontram. Os fluidos apresentam uma propriedade característica conhecida como viscosidade (µ). Ela representa uma resistência ao movimento entre duas camadas de fluido sobressalentes, ou ainda, a resistência a uma força de cisalhamento (DAUGHERTY; FRANZINI, 1965). Na Figura 1, é representado um elemento de fluido entre duas placas planas. Se for aplicada uma força constante na placa superior, é possível observar que o elemento de fluido irá se deformar constantemente até a força deixar de ser aplicada. Figura 1 – Deformação em fluidos Fonte: Fox, Pritchard e McDonald (2014, texto digital). A viscosidade está diretamente relacionada com essa deformação. Dessa forma, um fluido com alta viscosidade apresentará uma taxa de deformação menor do que a de um fluido com baixa viscosidade. De acordo com Potter, Wiggert e Ramadan (2012), a viscosidade faz com que as camadas de fluidos fiquem aderidas às superfícies que estão em contato, fazendo com que essas camadas desenvolvam as mesmas velocidades que as superfícies. Essa condição é conhecida como “Condição de Não Deslizamento”. 2.1.2 O meio contínuo Imaginando uma quantidade de fluido dentro de um recipiente, pode-se considerar que suas características, como a massa específica, são homogêneas em qualquer ponto escolhido aleatoriamente, num mesmo instante de tempo. Porém, 17 quando a distância de observação é diminuída até ser possível observar as moléculas que formam o fluido, percebe-se que suas propriedades podem apresentar grandes variações de uma região para a outra, devido a distribuição da matéria. De acordo com Fox, Pritchard e McDonald (2014), no meio contínuo, que é o alicerce da mecânica dos fluidos, considera-se que as propriedades dos fluidos estão distribuídas continuamente, ou seja, considera-se as propriedades do ponto de vista macroscópico. Para isso, segundo os autores, a hipótese do contínuo é válida enquanto as dimensões características do problema forem maiores que o caminho médio livre das moléculas. 2.1.3 Campos vetoriais A maioria das propriedades dos fluidos são grandezas vetoriais, que possuem módulo, direção e sentido. Além disso, elas podem variar de acordo com o ponto em que estão sendo medidas e com o passar do tempo (RIEUTOURD, 2015). Por exemplo, a velocidade do fluido em um ponto específico pode ser representada pelo vetor �⃗� , conforme demonstra a Equação 1. �⃗� = 𝑉(𝑥, 𝑦, 𝑧, 𝑡) (1) Caso a velocidade de cada componente também varie com o tempo, o vetor velocidade pode ser representado pela Equação 2. �⃗� = 𝑉(𝑥(𝑡), 𝑦(𝑡), 𝑧(𝑡), 𝑡) (2) Conforme Rieutord (2015), esse tipo de observação das propriedades em pontos do domínio, e não de partículas específicas, é conhecido como visão euleriana. A utilização de vetores introduz a noção de um campo vetorial, no qual a quantidade vetorial em questão pode assumir diferentes valores em diferentes pontos (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). Ainda, segundo Fox, Pritchard e Mcdonald (2014), o escoamento pode ser classificado em transiente ou permanente. No regime permanente, a propriedade observada mantém-se constante no ponto escolhido para observação. Já no regime 18 transiente, a propriedade varia suas características no ponto de observação com o passar do tempo. O regime permanente pode ser expresso pela Equação 3: 𝜕�⃗� 𝜕𝑡 = 0 (3) 2.1.4 Propriedades dos fluidos Na literatura específica, diversos autores apresentam outras propriedades, além da viscosidade, utilizadas para descrever os fluidos, e que são muito presentes na mecânica dos fluidos (ALBERTSON; BARTON; SIMONS, 1966; DAUGHERTY; FRANZINI, 1965; FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014; POTTER; WIGGERT; RAMADAN, 2012). Uma delas é a massa específica, definida como sendo a quantidade de matéria por unidade de volume (kg/m3), usualmente representada pela letra ρ, conforme mostra a Equação 4: 𝜌 = 𝛿𝑚 𝛿𝑉 (4) Relacionado com a massa específica, tem-se o peso específico (EQUAÇÃO 5), definido como a força peso exercida por uma unidade de volume, e que é representado por γ, em N/m3. 𝛾 = 𝛿𝑚∗𝑔 𝛿𝑉 = 𝜌𝑔 (5) É muito comum encontrar uma relação entre a viscosidade absoluta (𝜇) e a massa específica (𝜌). Essa razão é conhecida como viscosidade cinemática (𝜈), é representada pela Equação 6: 𝜈 = 𝜇 𝜌 (6) Na qual a viscosidade absoluta tem dimensão de tensão por segundo (Pa.s), a massa especifica tem as dimensões da Equação 4, e a viscosidade cinemática possui dimensões de comprimento ao quadrado pelo tempo (m2/s). 19 Os fluidos apresentam também características de compressibilidade e elasticidade, que representam a mudança sofrida pela massa específica e pressão em uma unidade de volume pela ação de forças externas e são representadas pelo módulo de elasticidade E, com unidade de N/m2, conforme mostra a Equação 7: 𝐸 = 𝜌 𝑑𝑃 𝑑𝜌 (7) Outras duas propriedades importantes são a pressão e a temperatura do fluido. A pressão pode ser entendida, na estática dos fluidos, como sendo o peso de uma coluna de fluido acima da região considerada, ou como uma relação entre uma força e um elemento de área. Ela é representada na Equação 8 pela letra P, 𝑃 = 𝑑𝐹 𝑑𝐴 (8) cuja unidades são N/m2 ou Pa. É interessante definir a variação da pressão em um elemento de fluido na sua forma vetorial. Essa variação é chamada de gradiente de pressão e está relacionada com as forças de superfície e de campo que atuam sobre o elemento de fluido (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014) e é representada na Equação 9. 𝑔𝑟𝑎𝑑 𝑃 ≡ ∇𝑃 ≡ (𝑖̂ 𝜕𝑃 𝜕𝑥 + 𝑗̂ 𝜕𝑃 𝜕𝑦 + �̂� 𝜕𝑃 𝜕𝑧 ) ≡ (𝑖̂ 𝜕 𝜕𝑥 + 𝑗̂ 𝜕 𝜕𝑦 + �̂� 𝜕 𝜕𝑧 )𝑃 (9) 2.1.5 Classificação do movimento dos fluidos O escoamento de fluidos pode ser caracterizado pelo seu número de Reynolds, que representa uma razão entre as forças inerciais e viscosas, conforme mostra a Equação 10: 𝑅𝑒 = 𝜌 𝑣𝐿 𝜇 , (10) na qual L representa o comprimento característico. Dessa relação, observa-se que, quando o número de Reynolds for pequeno, são as forças viscosas que possuem 20 maior relevância no escoamento, e conforme ele aumenta, elas deixam de ter tanta influência (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014; PURCELL, 1977). O movimento dos fluidos pode ser classificado de várias maneiras, conforme mostra o diagrama na Figura 2. Nesta seção, serão abordadas cada uma das classificações. Figura 2 – Classificação do escoamento dos fluidos Fonte: Fox, Pritchard e McDonald (2014, texto digital). 2.1.5.1 Escoamento não viscoso Conforme Daugherty e Franzini (1965) e Fox, Pritchard e McDonald (2014), o escoamento não viscoso também pode ser chamado de escoamento invíscido ou escoamento ideal, e ocorre quando os efeitos da viscosidade são desconsiderados, ou seja, 𝜇 = 0. 2.1.5.2 Escoamento viscoso No escoamento viscoso, a viscosidade do fluido influencia no seu movimento e também nas forças experimentadas por objetos imersos nele. Cabe observar, ainda, que os fluidos viscosos podem ser divididos em duas categorias. A primeira é a dos fluidos conhecidos como Newtonianos; para esses fluidos, a tensão cisalhante é 21 diretamente proporcional ao gradiente de velocidades (POTTER; WIGGERT; RAMADAN, 2012), conforme mostra a Equação 11 𝜏𝑥𝑦 = 𝜇 𝑑𝑢 𝑑𝑦 (11) na qual 𝑢 é o componente da velocidade em relação ao eixo x. Exemplos de fluidos Newtonianos são a água, gasolina, e a maioria dos líquidos. A segunda categoria é a dos fluidos chamados de Não Newtonianos. Conforme Fox, Pritchard e McDonald (2014), para esses fluidos a taxa de deformação não é diretamente proporcional à tensão de cisalhamento, sendo necessárias outras equações para descrever seu comportamento. A pasta de dentes é um exemplo de fluido Não Newtoniano. 2.1.5.3 Escoamento laminar e turbulento O escoamento laminar caracteriza-se por camadas laminares de fluido escoando adjacentes umas às outras, sem se misturar. Já no escoamento turbulento, as camadas de fluidos sofrem alterações e interagem umas com as outras, gerando padrões de movimento aleatórios, fazendo com que sua análise seja extremamente complicada (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). Na Figura 3 apresenta-se a diferença entre o escoamento laminar e turbulento para um campo de velocidades. Figura 3 – Escoamento turbulento (a) x Escoamento laminar (b) Fonte: Potter, Wiggert e Ramadan (2012, pg. 103). A classificação do escoamento como laminar ou turbulento está diretamente relacionada com o número de Reynolds, uma vez que ele representa a relação entre 22 as forças viscosas, que atuam quando a velocidade do fluido é baixa, e as forças de inércia, que predominam quando a velocidade de escoamento é alta. Dessa forma, escoamentos laminares apresentarão números de Reynolds relativamente baixos e escoamentos turbulentos apresentarão números de Reynolds altos. 2.1.5.4 Escoamento compressível e incompressível Conforme Potter, Wiggert e Ramadan (2012), os fluidos são classificados como incompressíveis quando sua densidade permanece constante durante o escoamento ou quando sua variação é muito pequena e não influencia nele. A maioria dos líquidos e alguns gases podem ser tratados como incompressíveis. Ainda, segundo os autores, fluidos que apresentam variação da massa específica durante o escoamento, de tal maneira que influencie no escoamento, são denominados compressíveis. Gases escoando em turbinas de aviões e outras aeronaves de alta velocidade se enquadram nessa categoria. Uma maneira de determinar se o escoamento de um gás é compressível ou incompressível é o número de Mach, que é uma relação entre a velocidade do fluido e a velocidade da onda sonora, conforme mostra a Equação 12: 𝑀 = 𝑉 𝑐 (12) Assim, se M < 0,3, o escoamento pode ser considerado incompressível. 2.1.5.5 Escoamento interno e externo Existem duas formas de escoamento de fluidos: aquelas em que ele escoa dentro de tubulações ou outras superfícies, como é o caso da maioria das aplicações industriais, que podem ser classificados como escoamentos internos (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014); ou quando o fluido escoa livremente sobre uma região, não estando confinado; sendo classificado, conforme os autores, como escoamento externo. 23 Cada um dos dois tipos de escoamento apresenta características distintas e podem, ainda, ser divididos nas classificações anteriores. Além disso, ambos apresentam números de Reynolds característicos. 2.1.5.6 Escoamento uni, bi e tridimensional Outra classificação frequente dos fluidos é quanto à quantidade de coordenadas necessárias para descrever o escoamento e a variação da velocidade. Os escoamentos reais são tridimensionais, porém eles apresentam resoluções complexas e muito difíceis, sendo necessário utilizar simplificações, aplicando técnicas e considerações físicas para eliminar uma das coordenadas, obtendo-se assim, o escoamento bidimensional (ALBERTSON; BARTON; SIMONS, 1966). De acordo com Albertson, Barton e Simons (1966), escoamentos mais simples podem ser aproximados por escoamentos unidimensionais, nos quais as velocidades e acelerações só variem em uma dimensão. Além disso, pode-se aplicar para tais escoamentos a ideia de escoamento uniforme (FIGURA 4), na qual é utilizada uma média dos valores característicos, como a velocidade, para descrever o escoamento, simplificando em muito a sua análise (ALBERTSON; BARTON; SIMONS, 1966; FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). Figura 4 – Escoamento uniforme em uma tubulação Fonte: Potter, Wiggert e Ramadan (2012, pg. 101). Na Figura 5 é apresentado o exemplo do campo de velocidades para um escoamento através de um cano, no qual inicialmente havia um campo unidimensional, visto na região esquerda. Devido variação no diâmetro da tubulação, surge um escoamento bidimensional, pois a velocidade passa a variar com o raio e com a direção x. 24 Figura 5 – Escoamento uni e bidimensional Fonte: Fox, Pritchard e McDonald (2014, texto digital). 2.1.6 Visualização do escoamento: observando o padrão de movimento do fluido Quando se trabalha fluidos escoando em tubulações ou sobre superfícies de objetos, é interessante a visualização do comportamento do fluido, para observar características do escoamento, como a velocidade, e outras informações. Leonardo Da Vinci, por exemplo, famoso por suas descobertas e por sua genialidade, já fazia uso de representações visuais do escoamento de fluidos em seus trabalhos de pesquisa (GARHIB; KREMERS; KOOCHESFAHANI; KEMP, 2002). Ainda, conforme os mesmos autores, em seus estudos sobre o corpo humano, em especial o bombeamento de sangue pelo coração, Da Vinci utilizou linhas de corrente para representar a movimentação do sangue e a formação de vórtices em suas ilustrações. Na Figura 6, pode-se observar uma de suas ilustrações em comparação com uma modelagem computacional da mesma região do coração, o que mostra como ele era preciso em seus trabalhos. 25 Figura 6 – representação do escoamento de sangue no coração feita por Da Vinci x Simulação computacional Fonte: Garhib, Kremers, Koochesfahani e Kemp (2002, pg. 220). Algumas formas de visualização de escoamentos, apresentadas por diversos autores, serão brevemente comentadas a seguir. 2.1.6.1 Linhas de corrente As linhas de corrente (FIGURA 7) são definidas como linhas traçadas tangente ao vetor velocidade das partículas em um mesmo instante de tempo (DAUGHERTY; FRANZINI, 1965) e podem ser utilizadas para observar como se dá o escoamento do fluido em diferentes pontos da região observada (ÇENGEL; CIMBALA, 2007). 26 Figura 7 – Representação das linhas de corrente Fonte: White (2018, pg. 40). Conforme White (2018), as linhas de corrente são um dos meios mais utilizados para observar o comportamento dos fluidos, e a relação matemática que as descreve é apresentada na Equação 13: 𝑑𝑟 𝑉 = 𝑑𝑥 𝑢 = 𝑑𝑦 𝑣 = 𝑑𝑧 𝑤 (13) na qual 𝑑𝑟 é um elemento de comprimento de arco de uma linha de corrente e 𝑉 é o vetor velocidade tangencial a ela. 2.1.6.2 Linhas de emissão De acordo com Çengel e Cimbala (2007), Fox, Pritchard e McDonald (2014), entre outros autores, as linhas de emissão são formadas quando conectamos todas as partículas que passaram em um determinado ponto. Experimentalmente, pode-se inserir tinta ou fumaça em um determinado ponto do escoamento continuamente, e assim observar o seu desenvolvimento. Ainda, conforme os autores, as linhas de emissão e de corrente são idênticas para escoamentos laminares e permanentes. Na Figura 8, observa-se um escoamento em regime permanente, no qual utilizou-se fumaça para marcar a trajetória das partículas que passavam em determinados pontos. As linhas brancas representam as linhas de emissão obtidas e o comportamento do fluido em um determinado instante de tempo. 27 Figura 8 – Padrão de linhas de emissão em torno de um objeto Fonte: White (2018, pg. 42). 2.1.6.3 Gráficos vetoriais Çengel e Cimbala (2015, pg.149) definem os gráficos vetoriais como “uma matriz de setas que indicam o módulo e a direção de uma propriedade vetorial em determinado instante de tempo”. Na modelagem computacional, esse tipo de gráfico é muito útil e permite visualizar o comportamento de diversos campos, como o de velocidade e pressão, e identificar padrões, como a ocorrência de vorticidades e recirculação de fluido. Na Figura 9, é apresentado um exemplo de gráfico vetorial do comportamento da velocidade de um escoamento ao redor de um objeto cúbico. 28 Figura 9 – Gráfico vetorial da velocidade de um escoamento Fonte: Çengel e Cimbala (2015, pg. 159). 2.1.6.4 Gráficos de contorno Por definição, “o gráfico de contorno mostra as curvas de valor constante de uma propriedade escalar (ou módulo de uma propriedade vetorial) em determinado instante” (ÇENGEL; CIMBALA, 2007, pg. 119). Ou seja, eles são linhas traçadas em um instante de tempo, que conectam pontos da propriedade observada (pressão, temperatura, velocidade), que apresentam os mesmos valores (FIGURA 10). Figura 10 – Gráfico de contorno de uma distribuição de pressão Fonte: Çengel e Cimbala (2015, pg. 151). 29 2.1.7 A dinâmica dos fluidos e suas leis governantes A dinâmica dos fluidos pode ser descrita por três leis fundamentais, sendo elas: a conservação de massa, a conservação do momento, e a conservação da energia (WHITE, 2018). Ainda, conforme o autor, quando busca-se uma abordagem que ofereça informações das propriedades dos fluidos em diversos pontos distintos do escoamento, utiliza-se a abordagem diferencial, na qual todo o conjunto de equações é modelado através de um elemento diferencial de fluido. Durante o escoamento, um elemento de fluido pode estar sujeito a diferentes tipos de movimento e deformações (ÇENGEL; CIMBALA, 2007), sendo eles: translação (FIGURA 11.a), rotação (FIGURA 11.b), deformação linear (FIGURA 11.c) e deformação angular (FIGURA 11.d). Figura 11 – Movimentos e deformações de uma partícula Fonte: Çengel e Cimbala (2015, pg 152). 2.1.7.1 A translação de uma partícula fluida A translação, conforme Çengel e Cimbala (2015), está relacionada com a velocidade do escoamento, uma vez que a partícula de fluido se deslocará em função do campo de velocidades. Durante o escoamento, o fluido pode apresentar diferenças de velocidades devido a diversas situações, como a diminuição ou aumento do diâmetro de uma tubulação. Essas alterações ocorrem devido à aceleração aplicada ao fluido, em função da ação de alguma força sobre o escoamento. De acordo com Fox, Pritchard e McDonald (2014), devido à velocidade em um escoamento ser descrita por um campo, é necessário desenvolver uma equação que descreva sua aceleração de forma a manter as características de campo. Conforme descrito na sessão 2.1.3, o vetor velocidade pode ser denotado pela Equação 2, ou através das suas componentes escalares 𝑢, 𝑣, 𝑤, sendo que cada uma delas é uma função de x, y, z e t (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014), assim, obtêm-se a Equação 14, 30 �⃗� = 𝑢𝒊 + 𝑣𝒋 + 𝑤𝒌 (14) A aceleração, conhecida como a taxa de variação da velocidade pelo tempo, é descrita pela Equação 15, 𝑎 = 𝑑𝑉 𝑑𝑡 = (𝑢 𝜕𝑉 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑉 𝜕𝑦 +𝑤 𝜕𝑉 𝜕𝑧 ) + 𝜕𝑉 𝜕𝑡 (15) na qual, o termo 𝜕𝑉 𝜕𝑡 é conhecido como aceleração local (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014, pg.168) e o termo entre parênteses é chamado pelos mesmos autores, de aceleração convectiva. Na literatura, diversos autores (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014; RIEUTOURD, 2015) definem um operador comum ao escoamento dos fluidos, chamado usualmente de derivada material. Esse operador aparece com frequência em diversas equações, a exemplo da Equação 15, e é denotado pela Equação 16, 𝐷∅ 𝐷𝑡 = 𝜕∅ 𝜕𝑡 + (�⃗� . ∇)∅ = 𝜕∅ 𝜕𝑡 + (𝑢 𝜕∅ 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕∅ 𝜕𝑦 + 𝑤 𝜕∅ 𝜕𝑧 ) (16) na qual o termo ∅ representa alguma quantidade de interesse, e o termo (�⃗� . ∇)∅ é conhecido como termo convectivo. Conforme Rieutourd (2015), o termo convectivo é responsável pelo transporte de ∅ pelo campo de velocidades. Assim, o vetor aceleração pode ser descrito pela Equação 17, 𝐷𝑉 𝐷𝑡 = 𝑎 ⃗⃗⃗ = 𝜕𝑉 𝜕𝑡 + (�⃗� . ∇)�⃗� , (17) ou ainda, por se tratar de uma equação vetorial, pode ser escrita através de suas componentes escalares, conforme mostram as Equações 18, 19 e 20: 𝑎𝑥⃗⃗⃗⃗ = 𝐷𝑢 𝐷𝑡 = (𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑢 𝜕𝑦 +𝑤 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ) + 𝜕𝑢 𝜕𝑡 (18) 𝑎𝑦⃗⃗ ⃗⃗ = 𝐷𝑣 𝐷𝑡 = (𝑢 𝜕𝑣 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑣 𝜕𝑦 + 𝑤 𝜕𝑣 𝜕𝑧 ) + 𝜕𝑣 𝜕𝑡 (19) 31 𝑎𝑧⃗⃗⃗⃗ = 𝐷𝑤 𝐷𝑡 = (𝑢 𝜕𝑤 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑤 𝜕𝑦 +𝑤 𝜕𝑤 𝜕𝑧 ) + 𝜕𝑢 𝜕𝑡 (20) 2.1.7.2 Rotação e vorticidade de partículas fluidas Partículas fluidas em escoamentos podem girar em torno de seus eixos conforme se deslocam (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). A taxa de rotação, conhecida como velocidade angular �⃗⃗� , pode ser representada em coordenadas cartesianas pela Equação 21. �⃗⃗� = 𝜔𝑥𝑖 + 𝜔𝑦𝑗 + 𝜔𝑧𝑘 (21) Conforme Çengel e Cimbala (2007, pg. 120), a taxa de rotação para um eixo pode ser definida como a “taxa de rotação média de duas retas inicialmente perpendiculares que se cruzam nesse ponto”. Na Figura 12, é apresentado um exemplo dessa definição e é possível visualizar um elemento de fluido inicialmente retangular em que duas retas, a e b, se encontram no ponto P. Após ele se mover, ambas as retas apresentam deslocamento, devido à deformação e rotação. Figura 12 – Rotação de um elemento de fluido Fonte: Çengel e Cimbala (2015, pg. 152). 32 Dessa forma, através de manipulações algébricas, a velocidade angular no eixo z pode ser definida de acordo com a Equação 22: 𝜔𝑧 = 1 2 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑥 − 𝜕𝑢 𝜕𝑦 ) (22) Assim, considerando todos os eixos, o vetor velocidade angular pode ser escrito conforme a Equação 23: �⃗⃗� = 1 2 [( 𝜕𝑤 𝜕𝑦 − 𝜕𝑣 𝜕𝑧 ) 𝑖 + ( 𝜕𝑢 𝜕𝑧 − 𝜕𝑤 𝜕𝑥 ) 𝑗 + ( 𝜕𝑣 𝜕𝑥 − 𝜕𝑢 𝜕𝑦 )𝑘] (23) Pode-se perceber, na Equação 23, que ela é o resultado de um produto vetorial, conhecido como rotacional de �⃗� (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014), representado pela notação: ∇ × �⃗� Com ele, pode-se definir o vetor vorticidade como sendo duas vezes a velocidade angular (POTTER, WIGGERT; RAMADAN, 2012), representado pela Equação 24: 𝜁 = 2ω = ∇ × �⃗� (24) Dessa forma, os escoamentos podem ser classificados ainda como rotacionais ou irrotacionais. Em um escoamento rotacional, as partículas de fluido se movimentam enquanto giram em torno de si mesmas; e no escoamento irrotacional, elas se movem sem velocidade angular (ÇENGEL; CIMBALA, 2015). 2.1.7.3 Deformações de um elemento de fluido e o campo de tensões Como mencionado anteriormente, as partículas fluidas estão sujeitas a dois tipos de deformações: a deformação linear e a deformação angular. Conforme Fox, Pritchard e McDonald (2014), quando uma partícula está sujeita a uma força 33 proveniente da gravidade ou do contato com outros elementos fluidos, esta pode ser decomposta de acordo com suas componentes. A componente perpendicular gera deformação linear, enquanto a componente tangencial gera deformação angular. A taxa de deformação a qual o elemento de fluido está sendo submetido é um tensor (POTTER; WIGGERT; RAMADAN, 2012) que pode ser descrito como: 𝑒𝑖𝑗 = ( 𝑒𝑥𝑥 𝑒𝑥𝑦 𝑒𝑥𝑧 𝑒𝑦𝑥 𝑒𝑦𝑦 𝑒𝑦𝑧 𝑒𝑧𝑥 𝑒𝑧𝑦 𝑒𝑧𝑧 ) = ( 𝜕𝑢 𝜕𝑥 1 2 ( 𝜕𝑢 𝜕𝑦 + 𝜕𝑣 𝜕𝑥 ) 1 2 ( 𝜕𝑢 𝜕𝑧 + 𝜕𝑤 𝜕𝑥 ) 1 2 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑥 + 𝜕𝑢 𝜕𝑦 ) 𝜕𝑣 𝜕𝑦 1 2 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑧 + 𝜕𝑤 𝜕𝑦 ) 1 2 ( 𝜕𝑤 𝜕𝑥 + 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ) 1 2 ( 𝜕𝑤 𝜕𝑦 + 𝜕𝑣 𝜕𝑧 ) 𝜕𝑤 𝜕𝑧 ) (25) na qual as componentes 𝑒𝑥𝑥, 𝑒𝑦𝑦 e 𝑒𝑧𝑧 representam a deformação linear, e as outras seis componentes representam as deformações angulares em cada eixo. Ainda, conforme Potter, Wiggert e Ramadan (2012), a taxa de deformação de uma partícula está relacionada com as componentes de tensão em um elemento de fluido. O conceito de tensões, normal e cisalhante, é útil para entender como as forças se distribuem nos planos de um elemento fluido (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). As nove componentes da tensão agindo e um elemento infinitesimal são: ( 𝜎𝑥𝑥 𝜏𝑥𝑦 𝜏𝑥𝑧 𝜏𝑦𝑥 𝜎𝑦𝑦 𝜏𝑦𝑧 𝜏𝑧𝑥 𝜏𝑧𝑦 𝜎𝑧𝑧 ) 2.1.7.4 A equação da continuidade De acordo com Çengel e Cimbala (2007, pg. 150), “a massa, assim como a energia, é uma propriedade conservada, e não pode ser criada nem destruída durante um processo”. Isso significa que, para um elemento de volume diferencial, a quantidade de matéria que entra nele deve ser equivalente à quantidade de matéria que o deixa. Essa relação pode ser expressa pela Equação 26: 𝜕𝜌𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝜌𝑣 𝜕𝑦 + 𝜕𝜌𝑤 𝜕𝑧 + 𝜕𝜌 𝜕𝑡 = 0 (26) 34 Reconhecendo o termo divergente na Equação 26, pode-se reescrevê-la conforme a Equação 27: ∇. 𝜌�⃗� + 𝜕𝜌 𝜕𝑡 = 0 (27) As Equações 26 e 27 são duas maneiras de representar a equação conhecida como “equação da continuidade” (WHITE, 2018, pg. 218). Conforme Fox, Pritchard e McDonald (2014), há duas situações em que a Equação 27 pode ser simplificada. A primeira delas é quando a massa específica (𝜌) é constante. Nesse caso, o fluido é considerado incompressível e a massa específica não é função do campo de velocidades ou do tempo. Dessa forma, a Equação 27 passa a ser representada pela Equação 28: 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝑣 𝜕𝑦 + 𝜕𝑤 𝜕𝑧 = ∇. �⃗� = 0 (28) Ainda, de acordo com os autores, o segundo caso ocorre quando o escoamento é permanente, ou seja, não depende do tempo. Dessa forma, o valor da massa específica será constante em um mesmo ponto, variando somente em pontos distintos do escoamento. Nesse caso, a equação da continuidade é representada pela Equação 29: 𝜕𝜌𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝜌𝑣 𝜕𝑦 + 𝜕𝜌𝑤 𝜕𝑧 = ∇. 𝜌�⃗� = 0 (29) 2.1.7.5 Quantidade de movimento e as equações de Navier-Stokes Quando a direção ou velocidade de um elemento de fluido muda, é necessária a ação de uma força que promova tal mudança (DAUGHERTY; FRANZINI, 1965). De acordo com Fox, Pritchard e McDonald (2014), dois tipos de forças podem agir sobre um elemento fluido: as forças de superfície, provocadas pelo contato entre corpos, e as forças de campo, devido à ação de campos potências, como é o caso da gravidade. 35 Analisando um elemento de fluido diferencial e aplicando a segunda Lei de Newton sobre ele, é possível obter as Equações 30, 31 e 32, que descrevem a quantidade de momento (WHITE, 2018). 𝜌𝑔𝑥 + 𝜕𝜎𝑥𝑥 𝜕𝑥 + 𝜕𝜏𝑦𝑥 𝜕𝑦 + 𝜕𝜏𝑧𝑥 𝜕𝑧 = 𝜌 ( 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑢 𝜕𝑦 + 𝑤 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ) (30) 𝜌𝑔𝑦 + 𝜕𝜏𝑥𝑦 𝜕𝑥 + 𝜕𝜎𝑦𝑦 𝜕𝑦 + 𝜕𝜏𝑧𝑦 𝜕𝑧 = 𝜌 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑣 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑣 𝜕𝑦 + 𝑤 𝜕𝑣 𝜕𝑧 ) (31) 𝜌𝑔𝑧 + 𝜕𝜏𝑥𝑧 𝜕𝑥 + 𝜕𝜏𝑦𝑧 𝜕𝑦 + 𝜕𝜎𝑧𝑥 𝜕𝑧 = 𝜌 ( 𝜕𝑤 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑤 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑤 𝜕𝑦 + 𝑤 𝜕𝑤 𝜕𝑧 ) (32) As Equações 30, 31 e 32 são, conforme White (2018), as equações da quantidade de momento diferenciais que descrevem o comportamento de qualquer fluido. Nelas, observa-se que o lado esquerdo das equações possui termos relacionados à taxa de variação das tensões que podem ser simplificados e reescritos aplicando algumas considerações físicas. Considerando o escoamento incompressível de um fluido Newtoniano, no qual a tensão de cisalhamento é proporcional à taxa de deformação angular, que apresenta viscosidade constante (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014) como simplificações, as Equações 30, 31 e 32 podem ser reescritas em suas componentes cartesianas, conforme mostram as Equações 33, 34 e 35: 𝜌 ( 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑢 𝜕𝑦 +𝑤 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ) = 𝜌𝑔𝑥 − 𝜕𝑝 𝜕𝑥 + 𝜇 ( 𝜕2𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑢 𝜕𝑦 + 𝜕2𝑢 𝜕𝑧 ) (33) 𝜌 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑣 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑣 𝜕𝑦 +𝑤 𝜕𝑣 𝜕𝑧 ) = 𝜌𝑔𝑦 − 𝜕𝑝 𝜕𝑦 + 𝜇 ( 𝜕2𝑣 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑣 𝜕𝑦 + 𝜕2𝑣 𝜕𝑧 ) (34) 𝜌 ( 𝜕𝑤 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑤 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑤 𝜕𝑦 + 𝑤 𝜕𝑤 𝜕𝑧 ) = 𝜌𝑔𝑧 − 𝜕𝑝 𝜕𝑧 + 𝜇 ( 𝜕2𝑤 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑤 𝜕𝑦 + 𝜕2𝑤 𝜕𝑧 ) (35) As Equações 33, 34 e 35 são conhecidas como Equações de Navier-Stokes, consideradas como “a pedra fundamental da mecânica dos fluidos” (ÇENGEL; CIMBALA, 2007, pg. 373). Essas três equações, juntamente com a equação da 36 continuidade, descrevem muitas situações interessantes para fluidos viscosos, como o escoamento em tubulações e outras aplicações industriais (WHITE, 2018; FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). Por fim, as três equações podem ser escritas em sua forma vetorial, conforme mostra a Equação 36: 𝜌 𝐷�⃗⃗� 𝐷𝑡 = 𝜌 [ 𝜕�⃗⃗� 𝜕𝑡 + (�⃗� . ∇⃗⃗ )�⃗� ] = − ∇⃗⃗ 𝑃 + 𝜌𝑔 + 𝜇∇⃗⃗ 2�⃗� (36) 2.1.7.5 A função de corrente para escoamentos Para um escoamento bidimensional, é útil utilizar-se de uma única função 𝜓(𝑥, 𝑦, 𝑡), que represente as componentes 𝑢 e 𝑣 da velocidade, sendo ela chamada de Função de corrente 𝜓 (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014). Ela é uma representação matemática que descreve um campo de escoamento e está relacionada com as linhas de corrente que são tangentes à velocidade do fluido em todos os pontos do domínio de representação, pois, conforme White (2018), dada uma linha de corrente, a função ψ assume um valor constante ao longo dela. Dessa forma, as componentes da velocidade em um escoamento bidimensional podem ser representadas pela Equação 37: 𝑢 = 𝜕𝜓 𝜕𝑦 , 𝑣 = 𝜕𝜓 𝜕𝑥 (37) 2.2 Modelagem numérica e simulações computacionais A dinâmica dos fluidos, assunto abordado na seção 2.1, trata do escoamento de fluidos, os quais, considerando fluidos Newtonianos e incompressíveis, podem ser modelados pelas Equações 38, 39 e 40, apresentadas a seguir: Continuidade: 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝑣 𝜕𝑦 + 𝜕𝑤 𝜕𝑧 = ∇. �⃗� = 0 (38) Momento: 𝜌 𝐷�⃗⃗� 𝐷𝑡 = − ∇⃗⃗ 𝑃 + 𝜌𝑔 + 𝜇∇⃗⃗ 2�⃗� (39) 37 Energia: 𝑝𝑐𝑣 𝑑𝑇 𝑑𝑡 = 𝑘 ∇⃗⃗ 2𝑇 + Φ (40) As equações de Navier-Stokes, escritas em sua forma vetorial na Equação 39, são equações diferenciais parciais (EDPs), não lineares, que possuem solução analítica somente para problemas muito simples (FORTUNA, 2012). Além disso, a Equação 39 é uma equação vetorial acoplada (FOX; PRITCHARD; MCDONALD, 2014), ou seja, as componentes da velocidade e a pressão aparecem nas três equações (Equações 33, 34 e 35) quando ela é expressa em forma de componentes escalares, e precisam ser resolvidas simultaneamente. A dinâmica dos fluidos computacional (CFD) surgiu com o advento da computação (FORTUNA, 2012), sendo utilizada para resolver problemas complexos (MALISKA, 2014) envolvendo as equações de Navier-Stokes ou outras equações pertinentes. Para tanto, é necessário realizar a discretização das equações governantes e aplicar diferentes métodos numéricos, fazendo uso de códigos computacionais, para obter informações sobre os campos de velocidade, pressão e temperatura do escoamento. 2.2.1 A forma genérica das equações de transporte As equações abordadas no tópico anterior estão relacionadas à conservação de uma variável de interesse (massa, momento ou energia) e apresentam uma escrita muito similar que, de acordo com Patankar (2009), pode ser generalizada pela Equação 41: 𝜕 𝜕𝑡 (𝜌𝜙) + ∇(𝜌�⃗� 𝜙) = ∇(Γ Δ 𝜙) + 𝑆 (41) Conforme o autor, 𝜙 representa a variável dependente e pode assumir diferentes formas, como a velocidade ou a temperatura, enquanto os parâmetros Γ e 𝑆 assumem diferentes significados, de acordo com o termo 𝜙. Na Equação 41, o primeiro termo do lado esquerdo representa a variação no tempo da quantidade escolhida, enquanto o segundo termo representa a convecção através do volume de controle. Já o primeiro termo do lado direito está relacionado com a difusão da propriedade, e o último é o termo fonte, que é introduzido para definir 38 termos remanescentes que não estão inclusos nessa equação (MALISKA, 2014; PATANKAR, 2009). Versteeg e Malalasekera (2007) sugerem uma variação da Equação 41 para volumes de controle na forma integral, apresentada na Equação 42: 𝜕 𝜕𝑡 (∫ 𝜌𝜙𝑑𝑉 𝐶𝑉 ) + ∫ 𝒏. 𝐴 (𝜌�⃗� 𝜙)𝑑𝐴 = ∫ 𝒏. 𝐴 (Γ∆𝜙)𝑑𝐴 + ∫ 𝑆𝑑𝑉 𝐶𝑉 (42) na qual o primeiro termo do lado esquerdo representa a taxa de incremento da quantidade 𝜙 dentro do volume de controle e o segundo termo representa a variação líquida de 𝜙 devido à convecção através dos limites do volume de controle. Já do lado direito, o primeiro termo representa o aumento líquido da quantidade 𝜙 devido à difusão através das superfícies do volume de controle e o segundo termo representa a geração líquida de 𝜙 dentro dele. Ainda, conforme os autores, ambas as equações são os primeiros passos para a utilização do Método dos Volumes Finitos, que será abordado nas próximas seções. 2.2.2 Métodos numéricos e a discretização do domínio Os métodos numéricos são ferramentas aplicadas para problemas em que a solução analítica é difícil ou impossível de ser encontrada, sendo necessária a utilização de operações aritméticas, tais quais equações algébricas, para obter soluções aproximadas (BRASIL; BALTHAZAR; GÓIS, 2015; CHAPRA; CANALE, 2016; FORTUNA, 2012). Para tornar as soluções numéricas possíveis, é necessário transformar o domínio contínuo em um domínio discreto através de um processo chamado de discretização (BRASIL; BALTHAZAR; GÓIS, 2015). Enquanto o domínio contínuo consiste de infinitos pontos (FIGURA 13), o domínio discreto consiste em uma série de pontos interligados, formando uma malha, nos quais as soluções das equações algébricas serão resolvidas. 39 Figura 13 – Domínio contínuo x domínio discreto Fonte: Fortuna (2012, pg. 37). Conforme Maliska (2014), os métodos numéricos tradicionalmente utilizados na resolução de problemas que envolvam equações diferenciais, como as EDPs, são o Método dos Elementos Finitos (MEF), o Método das Diferenças Finitas (MDF) e o Método dos Volumes Finitos (MVF), sendo que os dois últimos, os mais utilizados na dinâmica dos fluidos computacionais, serão abordados nas próximas seções. 2.2.2.1 Método das diferenças finitas (MDF) Conforme mencionado na seção anterior, a solução de EDPs por meio de métodos numéricos envolve a discretização do espaço contínuo em uma série de pontos distribuídos pela região, sendo que estes pontos podem estar distribuídos igualmente (FIGURA 13) ou de maneira não uniforme (FIGURA 14). Figura 14 – Exemplo de uma malha 2d não uniforme Fonte: Ferziger e Peric (2002, pg. 40). 40 O método das diferenças finitas faz uso da expansão da série de Taylor (PATANKAR, 2009; FORTUNA, 2012) para obter aproximações das equações diferenciais na sua forma algébrica para cada um dos pontos da região discretizada, gerando assim, um conjunto de expressões algébricas com uma quantidade finita N de parâmetros desconhecidos, os quais precisam ser resolvidos. Conforme Fortuna (2012), a série de Taylor para uma função 𝑓 contínua em um dado intervalo pode ser escrita de acordo com a Equação 43, 𝑓(𝑥) = 𝑓(𝑥0) + (∆𝑥) 𝑑𝑓 𝑑𝑥 | 𝑥0 + (∆𝑥)2 2! 𝑑2𝑓 𝑑𝑥2 | 𝑥0 + (∆𝑥)3 3! 𝑑3𝑓 𝑑𝑥3 | 𝑥0 + 𝑅𝑛, (43) na qual, ∆𝑥 = 𝑥 − 𝑥0 representa a distância entre dois pontos na malha, e 𝑅𝑛 são os termos de maior ordem. Considere a Figura 15, que representa um conjunto de pontos igualmente espaçados no espaço unidimensional. Se a série de Taylor for aplicada no ponto 𝑥𝑖, é possível obter uma aproximação da primeira derivada de 𝑓 através de algumas manipulações algébricas. Figura 15 – Representação de uma malha unidimensional Fonte: Fortuna (2012, pg. 83). Dentre outras expressões possíveis de serem obtidas através desse processo, encontram-se as expressões das diferenças finitas centrais de primeira e segunda ordem da função 𝑓 (FORTUNA, 2012), sendo elas: - Diferenças centrais de primeira ordem: 𝜕𝑓 𝜕𝑥 | 𝑖 = 𝑓𝑖+1−𝑓𝑖−1 2∆𝑥 + 𝑂(∆𝑥)2 (44) - Diferenças centrais de segunda ordem: 𝜕𝑓 𝜕𝑥 | 𝑖 = 𝑓𝑖+1−2𝑓𝑖+𝑓𝑖−1 (∆𝑥)2 + 𝑂(∆𝑥)2 (45) nas quais o termo 𝑂(∆𝑥)2 representa os termos restantes da série de Taylor que foram omitidos, que, de acordo com Ferziger e Peric (2002), são chamados de erros de 41 truncamento e medem a precisão da aproximação em relação ao espaçamento ∆𝑥 entre os pontos considerados. 2.2.2.2 Método dos volumes finitos (MVF) Da mesma forma que o Método das Diferenças Finitas, o Método dos Volumes Finitos parte da geração da malha numérica. Porém, diferentemente do MDF, no MVF é gerada uma malha composta por pequenos volumes de controle, centrados em torno dos nós (VERSTEEG; MALALASEKERA, 2007; FORTUNA, 2012), conforme mostra a Figura 16. Figura 16 – Representação do Método dos Volumes de Controle Unidimensional Fonte: Fortuna (2012, pg. 120). No MVF, conforme Patankar (2009), Versteeg e Malalasekera (2007), são realizadas integrações das equações governantes em cada volume de controle, resultando em um grupo de equações algébricas discretizadas no espaço e tempo, que devem ser resolvidas de modo a se obter a distribuição da propriedade avaliada. Assim, conforme os mesmos autores, o processo de integração representa um balanço da propriedade considerada em cada volume de controle. Para Ferziger e Peric (2002), uma das maiores vantagens do MVF é que as propriedades do sistema são conservadas em escala global, uma vez elas estão implícitas na estrutura do método. Fortuna (2012) complementa que, além da fácil interpretação física das equações obtidas, o MVF é muito útil quando necessária a utilização de malhas não uniformes. 42 2.2.3 Tipos de malhas numéricas A malha numérica gerada na etapa de discretização depende do domínio que está sendo discretizado e do tipo de problema estudado, sendo que cada tipo de malha apresenta suas características próprias, bem como vantagens e desvantagens (MALISKA, 2014). O tipo de malha mais comum é a malha estruturada (FIGURA 17), na qual cada elemento fluido apresenta o mesmo número de elementos vizinhos (MALISKA, 2014; FERZIGER; PERIC, 2002). A estrutura geométrica depende do problema, podendo ser composta apenas de elementos cartesianos ou ser mista, contendo coordenadas cilíndricas e cartesianas, para se adaptar à geometria do problema. Figura 17 – Exemplo de malha estruturada mista Fonte: Ferziger e Peric (2002, pg. 27). Para geometrias complexas, é necessária a implementação de outros tipos de malhas, sendo uma delas a malha estruturada em blocos. Nesse tipo de malha, conforme Versteg e Malalasekera (2007), o domínio é dividido em sub-regiões, as quais apresentam malhas estruturadas próprias (FIGURA 18). Dessa forma, é possível priorizar regiões nas quais uma maior resolução é necessária com malhas mais refinadas. 43 Figura 18 – Exemplo de uma malha estruturada em blocos Fonte: Versteeg e Malalasekera (2007, pg. 310). Por fim, existe a opção da geração de malhas não estruturadas (FIGURA 19) que, de acordo com Ferziger e Peric (2002), são o tipo de malha mais flexível e podem representar a geometria de qualquer domínio. Esse tipo de malha faz uso de diferentes tipos de geometria, e diferente do método estruturado, cada elemento de volume pode apresentar diferentes quantidades de elementos vizinhos (MALISKA, 2014). Figura 19 – Exemplo de malha não estruturada Fonte: Versteeg e Malalasekera (2007, pg. 311). 44 2.2.4 Condições iniciais e de contorno Conforme Fortuna (2012), as condições de contorno desempenham um papel fundamental em modelagens que envolvam as EDPs, pois são elas que ditam o comportamento físico dos problemas modelados. O mesmo vale para os problemas transientes, nos quais é de fundamental importância especificar o valor inicial das variáveis observadas em todos os pontos do domínio (VERSTEEG; MALALASEKERA, 2007), uma vez que a evolução temporal se dará a partir desses valores. As condições de contorno são aplicadas aos diversos tipos de fronteiras encontradas no domínio de simulação. Conforme os autores citados anteriormente, elas geralmente são: fronteiras de entrada do fluido, paredes sólidas, fronteiras de simetria, fronteiras periódicas, fronteiras de pressão constante e fronteiras de saída do fluido. Cabe ressaltar que elas recebem esses nomes devido à região nas quais são aplicadas. Moukalled, Mangani e Darwish (2016) comentam que existem diversos tipos de condições de contorno, como as citadas anteriormente, e, de modo genérico, há dois tipos que são mais utilizados para variáveis genéricas, a saber: condição de contorno de Dirichlet, para a qual um valor fixo é definido para a variável em uma determinada região; e a condição de contorno de Neumann, para a qual um fluxo é especificado para a região. A Figura 20 ilustra as principais condições de fronteiras encontradas durante a modelagem numérica. Figura 20 – Representação das condições de fronteira Fonte: Fortuna (2012, pg.289). 45 É importante ressaltar que, conforme Fortuna (2012), as regiões de fronteira, como entradas e saídas de fluido, devem estar localizadas a uma certa distância das áreas que são o foco da simulação para reduzir a sua interferência sobre tal região. 2.2.5 O acoplamento Pressão-velocidade e os tipos de arranjo das variáveis Durante o processo de discretização, duas situações relacionadas ao gradiente de pressão presente nas equações de Navier-Stokes merecem um tratamento especial. Primeiramente, existe o problema do acoplamento entre a pressão e a velocidade. Considerando as Equações 33 e 34, reescritas novamente aqui somente duas dimensões, tem-se: - momento na direção x: 𝜌 ( 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑢 𝜕𝑦 ) = 𝜌𝑔𝑥 − 𝜕𝑝 𝜕𝑥 + 𝜇 ( 𝜕2𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑢 𝜕𝑦 ) (46) - momento na direção y: 𝜌 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑣 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑣 𝜕𝑦 ) = 𝜌𝑔𝑦 − 𝜕𝑝 𝜕𝑦 + 𝜇 ( 𝜕2𝑣 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑣 𝜕𝑦 ) (47) - equação da continuidade: 𝜕𝜌𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝜌𝑣 𝜕𝑦 = 0 (48) É possível perceber, observando as Equações 46 a 48, que elas são acopladas, ou seja, as componentes de velocidade aparecem simultaneamente nas três equações, enquanto o termo que representa a variação da pressão aparece somente nas Equações 46 e 47 (VERSTEEG; MALALASEKERA, 2007). Caso o campo de pressões seja conhecido, é necessário somente a aplicação de um processo iterativo para a evolução das velocidades no tempo, no qual cada uma das componentes da velocidade pode ser atualizada por sua respectiva equação do movimento (MALISKA, 2014). 46 O problema surge quando o campo de pressões não é conhecido e se faz necessário, também, uma equação para avançar a pressão. Ocorre que, conforme Maliska (2014), em problemas incompressíveis a pressão não possui uma equação evolutiva que forneça os valores corretos para o próximo passo de tempo e que, quando utilizados nas equações do movimento, forneçam componentes de velocidade que satisfaçam a equação da continuidade. Uma solução para esse problema, é a utilização de algoritmos da família SIMPLE (Semi Implicit Linked Equations). Nesse algoritmo, conforme Rieutourd (2015) as equações de Navier-Stokes são reformuladas para a criação de uma equação para o momento, e outra, em conjunto com a equação da continuidade, para a pressão. As duas equações são resolvidas sequencialmente, em um processo iterativo no qual o campo de velocidades atual é obtido aplicando-se o campo de pressão do passo anterior. O novo campo de velocidades é utilizado, então, para se obter o novo campo de pressões. Esse processo é repetido até que ambos os campos de pressão e velocidades satisfaças as equações de momento e da continuidade. Além da questão do acoplamento entre pressão e velocidades, o local onde as informações relativas a pressão e as velocidades serão armazenadas também é importante. Para problemas utilizando sistemas ortogonais, dois modos diferentes são mais empregados, sendo eles o arranjo colocalizado e o desencontrado. No arranjo colocalizado, todas as variáveis são armazenadas no centro do mesmo volume de controle (MALISKA, 2014), conforme mostra a Figura 21. Figura 21 – Arranjo colocalizado unidimensional. Fonte: Adaptado de Moukalled, Mangani e Darwish. (2016, pg 564). Conforme Maliska (2014) e Patankar (2009), o problema do arranjo colocalizado está no gradiente de pressão. Discretizando o gradiente de pressão no volume de controle Pc, pintado de azul na Figura 21, obtêm-se a Equação 49: 𝑑𝑃 𝑑𝑥 ≈ 𝑃𝑒− 𝑃𝑤 ∆𝑥 (49) 47 Na qual, 𝑃𝑒 representa a pressão na face leste do volume de controle e 𝑃𝑤 na face oeste. Esses dois termos precisam ser aproximados, por meio da média do valor da pressão entre dois pontos nodais, conforme mostra a Equação 50: 𝑃𝑒− 𝑃𝑤 ∆𝑥 = ( 𝑃𝐸+𝑃𝑃 2 )−( 𝑃𝑃+𝑃𝑊 2 ) ∆𝑥 = 𝑃𝐸− 𝑃𝑊 2∆𝑥 (50) Dessa forma, observa-se pela Equação 50, que o gradiente de pressão utilizado na equação do momento será entre dois pontos alternados da malha, e não entre dois pontos consecutivos, uma vez que a pressão no nó central, 𝑃𝐶, não aparece na equação (PATANKAR, 2009), o que, de acordo com os autores, pode trazer alguns problemas. Caso um campo de pressões oscilatório ou não uniforme ocorra, tal situação pode não ser sentida pelo gradiente de pressões obtido na Equação 50, sendo considerado por esta como um campo uniforme de pressão, resultando em um comportamento não condizente com a realidade (MALISKA, 2014; PATANKAR, 2009; VERSTEEG; MALALASEKERA, 2007). Uma possível solução para esse problema é a utilização de outro arranjo para o armazenamento das variáveis. Um deles é o chamado arranjo desencontrado. Nesse arranjo, são utilizados diferentes volumes de controle para cada uma das variáveis, que são armazenadas nos seus respectivos centros. Na Figura 22, está representado esse tipo de arranjo, para o qual os volumes de controle (VC) das componentes de velocidade 𝑢 e 𝑣 foram deslocados e estão centrados nas faces dos volumes de controle nos quais estão armazenadas as pressões. Cada uma das três variáveis, então, possui seu próprio volume de controle, indicado em azul na Figura 22, e as pressões passam a estar localizadas nas faces dos VC das componentes de velocidade. 48 Figura 22 – Representação do arranjo desencontrado. Fonte: Adaptado de Moukalled, Mangani e Darwish. (2016, pg 578). Dessa forma, a discretização das equações do momento é realizada para os volumes de controle das componentes de velocidades 𝑢 e 𝑣. Assim, o gradiente de pressões será dado pelas pressões armazenadas nas faces dos volumes de controle das velocidades, e o problema do comportamento não realistico do campo de pressões é resolvido (VERSTEEG; MALALASEKERA, 2007). 2.2.6 Esquemas de Interpolação dos termos difusivos e convectivos Ainda na etapa de discretização das equações de Navier-Stokes, depara-se com outra situação além do gradiente de pressões. Durante o processo de integração, a aproximação das derivadas envolve valores de variáveis que não estão definidas nos centros dos volumes de controle (FERZIGER; PERIC, 2002), como foi o caso observado para a aproximação feita na Equação 50, durante a avaliação do gradiente de pressões. Nesses casos, é necessária a interpolação das variáveis para se obter as aproximações desejadas. 49 Considerando somente os termos convectivos e difusivos da equação de transporte, escrita para uma dimensão, tem-se a Equação 51: 𝑑 𝑑𝑥 (𝜌𝑢𝜙) = 𝑑 𝑑𝑥 (Γ 𝑑𝜙 𝑑𝑥 ) (51) Pode-se integrar a Equação 51 em relação ao volume de controle centrado em P, apresentado na Figura 23. Assim, a integral será limitada pelas faces leste (e) e oeste (w) do VC, nas quais serão resolvidas as equações. Figura 23 – Volume de controle unidimensional para integração Fonte: Versteeg e Malalasekera (2007, pg. 135). A integração resulta na Equação 52: (𝜌𝑢𝜙)𝑒 − (𝜌𝑢𝜙)𝑤 = (Γ 𝑑𝜙 𝑑𝑥 ) 𝑒 − (Γ 𝑑𝜙 𝑑𝑥 ) 𝑤 (52) Na qual, os termos do lado esquerdo da equação representam o fluxo convectivo da quantidade 𝜙 através do volume de controle, e os termos do lado direito representam o fluxo difusivo. Se faz necessário, nesse ponto, a utilização de diferentes esquemas de interpolação, a serem utilizados tanto para os termos convectivos quanto para os termos difusivos. Existe uma vasta gama de funções de interpolação na literatura, sendo que nesta seção serão apresentados apenas alguns esquemas, indicados por Patankar (2009), para situar o leitor a respeito dos métodos que serão utilizados na metodologia. 50 2.2.6.1 O esquema das diferenças centrais No esquema de diferenças centrais (CDS) são utilizados somente dois pontos nodais, conforme mostra a Equação 44, apresentada na seção 2.2.2.1. Dessa forma, aplicando-o na Equação 52, obtêm-se: 𝜌𝑢 (𝜙𝐸+𝜙𝑃) 2 − 𝜌𝑢 (𝜙𝑃+𝜙𝑊) 2 = Γ (𝜙𝐸−𝜙𝑃) Δ𝑋 − Γ (𝜙𝑃−𝜙𝑊) Δ𝑋 (53) Os termos presentes na Equação 53 podem ser rearranjados conforme mostra a Equação 54: 𝐴𝑃𝜙𝑃 = 𝐴𝑒𝜙𝐸 + 𝐴𝑤𝜙𝑊 (54) Na qual os termos “A” representam os coeficientes calculados das faces e no centro do volume de controle, e os termos 𝜙 representam a propriedade avaliada nos respectivos pontos nodais. Cabe ressaltar que a metodologia seguida até aqui, inclusive a notação utilizada para representar os termos nas equações e suas respectivas orientações é um padrão seguido na literatura. Os coeficientes abreviados na Equação 54 são dados pelas equações a seguir: 𝐴𝑃 = 2Γ Δ𝑥2 (55) 𝐴𝑒 = − 𝜌𝑢 2Δ𝑥 + Γ Δ𝑥2 (56) 𝐴𝑤 = 𝜌𝑢 2Δ𝑥 + Γ Δ𝑥2 (57) De acordo com Maliska (2014), deseja-se sempre que os coeficientes representados pelas Equações 55, 56 e 57 sejam positivos, uma vez que a presença de coeficientes negativos pode levar a solução a divergir, dependendo do processo iterativo utilizado. Ainda, conforme o autor, dependendo do problema estudado, a aplicação do CDS para os termos convectivos pode criar instabilidades que geram soluções oscilatórias e não realistas. 51 Nesse ponto, se faz necessário a apresentação de uma nova constante adimensional, conhecida como Número de Peclet, que, conforme Moukalled, Mangani e Darwish (2016), representa uma razão entre a taxa convectiva e difusiva de transporte da propriedade 𝜙. Ele é escrito como: 𝑃 = ρuΔx Γ (58) Na qual, Δx representa o comprimento característico do volume de controle na direção considerada, 𝑢 é a velocidade na face em que está sendo calculado o número de Peclet, Γ é uma constante dependente da variável usada na Equação de Transporte, e ρ é a densidade do fluido. Assim, no caso do esquema de diferenças centrais, pode se mostrar que o número de Peclet precisa ser menor ou igual a 2 para que o coeficiente da face leste (Equação 56) seja positivo. Isso coloca outra restrição para a utilização do CDS nos termos convectivos, pois, para manter o número de Peclet menor que dois, é preciso de uma malha muito refinada quando são utilizadas velocidade elevadas. 2.2.6.2 O esquema upwind O esquema upwind (UDS) é uma solução para evitar o aparecimento de coeficientes negativos. Ele é mais compatível com o processo convectivo e imitia a física do problema, na qual o valor dos coeficientes convectivos na face dos volumes de controle depende da direção na qual o fluido está se movimentando (MOUKALLED; MANGANI; DARWISH, 2016). Simplificadamente, pode-se dizer que para os termos convectivos, presentes no lado esquerdo da Equação 52, o valor de 𝜙 nas faces será igual a um dos valores de 𝜙 nos centros dos volumes de controle adjacentes, dependendo da direção do fluxo convectivo naquele instante. Por exemplo, considerando a face leste (e) do volume de controle da Figura 23: 𝜙𝑒 = 𝜙𝑃 𝑠𝑒 𝜌𝑢 > 0 (59a) Ou 52 𝜙𝑒 = 𝜙𝐸 𝑠𝑒 𝜌𝑢 < 0 (59b) Por mais interessante que seja esse esquema, uma de suas desvantagens e que ele pode causar a dissipação numérica de gradientes elevados em alguns problemas (MALISKA, 2014). Com base dois esquemas apresentados, existem outras funções de interpolação que incorporam o CDS e UDS e fazem uso do número de Peclet como um peso entre convecção e difusão. Um desses esquemas, apresentado por Patankar (2009), será demostrado a seguir. 2.2.6.3 O esquema Power-law De acordo com Patankar (2009), o esquema Power-Law fornece uma melhor aproximação dos coeficientes calculados nas faces dos volumes de controle com a variação do número de Peclet, além de não apresentar expressões difíceis de serem computadas quando comparado a outros esquemas. Considerando o coeficiente 𝐴𝑒, apresentado anteriormente na Equação 56. Ele agora assume novos valores, apresentados a seguir: Para 𝑃𝑒 < −10, 𝐴𝑒 = Γ Δ𝑥 ∗ −𝑃𝑒 = − 𝜌𝑢𝑒 (60a) Para −10 ≤ 𝑃𝑒 < 0, 𝐴𝑒 = Γ Δ𝑥 ∗ (1 + 0.1𝑃𝑒) 5 − Γ Δ𝑥 ∗ 𝑃𝑒 = Γ Δ𝑥 ∗ (1 + 0.1𝑃𝑒) 5 − 𝜌𝑢𝑒 (60b) Para 0 ≤ 𝑃𝑒 ≤ 10, 𝐴𝑒 = Γ Δ𝑥 ∗ (1 + 0.1𝑃𝑒) 5, (60c) Para 𝑃𝑒 > 10, 53 𝐴𝑒 = 0. (60d) O mesmo procedimento pode ser adotado para avaliar o coeficiente nas demais faces do volume de controle. De acordo com Patankar (2009), o esquema power law é um esquema de interpolação no qual estão embutidos os esquemas CDS e UDS e que utiliza o número de Peclet como parâmetro para definir qual a situação do escoamento. Dessa forma, para valores de Peclet superiores a |10|, quando o termo convectivo é muito superior ao difusivo, predomina o fluxo convectivo pela face do volume de controle, como se pode ver nas Equações 60a e 60d. Para valores menores que |10|, ocorre uma mescla entre difusão e convecção (EQUAÇÕES 60b e 60c), e para valores de Peclet iguais a zero, quando o fluido está em repouso, ocorre somente a difusão. 2.2.7 Solução das equações discretizadas Uma vez discretizado o domínio do problema e obtidas as equações algébricas correspondentes aos diversos pontos gerados, é necessário realizar o processo de resolução do sistema de equações, afim de se obter os valores da variável estudada nas diversas regiões da malha numérica. Os métodos utilizados para a solução das equações algébricas obtidas podem ser divididos em duas categorias: Os métodos diretos e os métodos iterativos. Conforme Fortuna (2012), com a aplicação dos métodos diretos obtêm-se a solução dos sistemas lineares após uma sequência limitada de passos. Como os sistemas lineares são escritos em notação matricial, pode-se utilizar técnicas de transformações que facilitem a resolução. Um exemplo de método direto é a eliminação de Gauss e a obtenção da matriz inversa. Porém, os métodos diretos não são utilizados com frequência na dinâmica dos fluidos computacional, uma vez que as matrizes são geralmente muito grandes, o que os torna impraticáveis devido ao tempo e custos envolvidos (MOUKALLED; MANGANI; DARWISH, 2016; FERZIGER; PERIC, 2002). Já os métodos iterativos fazem uso de estimativas iniciais, que são aplicadas aos sistemas de equações e então refinadas, sendo repetido o processo até o critério de convergência adotado ser aceito (MOUKALLED; MANGANI; DARWISH, 2016). 54 De acordo com Ferziger e Peric (2002) e Fortuna (2012), o sistema de equações algébricas obtido na etapa de discretização pode ser tanto linear quanto não linear, sendo este último resolvido somente pelos métodos iterativos, o que evidencia uma das vantagens de sua utilização. Maliska (2014) apresenta diversos métodos iterativos, sendo alguns deles: Método de Jacobi, Método de Gauss-Seidel, Método das Sobrerrelaxações Sucessivas, Método Linha a Linha, dentre outros. 2.3.6 Propriedades da solução numérica Uma boa solução numérica para um problema envolvendo Equações Diferenciais Parciais deve apresentar algumas características que garantam que ela seja estável e convergentes (MALISKA, 2014), sendo elas: Consistência: Uma aproximação numérica é dita consistente quando, ao tornar os intervalos da malha numérica cada vez menores, de modo que eles tendam a zero, ela se torne a equação parcial original, ou seja, nesse processo, os erros de truncamento devem tender a zero (FORTUNA, 2012; MALISKA, 2014; FERZIGER; PERIC, 2002). Estabilidade: Para a solução numérica ser considerada estável, os erros que ocorrem durante o processo não devem se amplificar durante o processo de resolução (FERZIGER; PERIC, 2002). De acordo com Fortuna (2012), exemplos de erros comuns são erros de arredondamento que podem acumular e influenciar significativamente nos resultados obtidos, bem como a escolha incorreta de condições de fronteira e iniciais. Convergência: Conforme Maliska (2014), caso as condições de estabilidade e consistência sejam atendidas, a solução numérica é dita convergente, ou seja, os resultados obtidos por meio dela são boas aproximações das soluções reais. A Figura 24 apresenta a relação das três propriedades comentadas anteriormente. 55 Figura 24 – Propriedades de uma solução numérica Fonte: Fortuna (2012, pg. 135). 56 3 METODOLOGIA Este capítulo apresenta, inicialmente, a classificação do presente estudo e depois aborda a metodologia seguida para desenvolver o código numérico, bem como, apresenta o processo de discretização das equações governantes e demais etapas que culminaram na criação do algoritmo computacional, objetivos deste estudo. 3.1 Classificação A presente pesquisa é de natureza quantitativa, pois, de acordo com Chemin (2015), ela trata de dados matemáticos que pretendem ser obtidos de maneira clara e rigorosa, com a maior precisão possível. Do ponto de vista do objetivo geral, ela pode ser classificada como descritiva explanatória, pois o aluno tem interesse em se familiarizar com o a situação problema, bem como obter dados e descrever um determinado fenômeno. Além disso, ela pode ser classificada também como bibliográfica, uma vez que foram utilizadas informações obtidas na literatura específica para desenvolvimento do código numérico. 3.2 Etapas de elaboração do código computacional A seguir, serão descritas as etapas metodológicas seguidas para a implementação do código numérico. 57 3.2.1 Delimitação das variáveis e do escoamento Essa etapa é de grande importância para a elaboração do código computacional, uma vez que a quantidade de variáveis, a geometria do problema e o tipo de escoamento influenciam no tipo de algoritmo que será desenvolvido. Cada tipo de escoamento possui características diferentes que devem ser levadas em conta durante as etapas de discretização e implementação do código, dessa forma, deve- se ser bem objetivo quanto a esses parâmetros. Para o trabalho em questão, optou-se pelo desenvolvimento de um algoritmo para simular o movimento de fluidos incompressíveis, laminares, com viscosidade constante em regime transiente. Além disso, o algoritmo será implementado em uma malha bidimensional e será utilizado o método dos volumes finitos para a discretização das variáveis. 3.2.2 Discretização do domínio Tendo definido o tipo de situação e o domínio do problema, parte-se então para a etapa de discretização dos parâmetros de interesse. Devido a utilização do método dos volumes finitos, definiu-se que a geometria empregada no formato das células seria retangular, formando uma malha estruturada cartesiana, na qual as variáveis estariam armazenadas no centro. Além disso, nessa etapa, optou-se por utilizar uma malha desencontrada, para a qual cada uma das três variáveis teria sua própria malha numérica. Dessa forma, os centros dos volumes de controle das malhas das variáveis 𝑢 e 𝑣 coincidem com as faces dos volumes de controle onde estão armazenadas as pressões, como mostra a Figura 25. 58 Figura 25 - Volumes de controle para cada variável Fonte: Adaptado de Ferziger e Peric (2002, pg. 189). 3.2.3 Discretização das equações Após a definição da malha numérica, foi realizada a discretização das equações governantes (Equações 46 a 48) que foram implementadas no código numérico. As equações, repetidas aqui por simplicidade, são: - Momento na direção x: 𝜌 ( 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑢 𝜕𝑦 ) = − 𝜕𝑝 𝜕𝑥 + 𝜇 ( 𝜕2𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑢 𝜕𝑦 ) (61) - Momento na direção y: 𝜌 ( 𝜕𝑣 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑣 𝜕𝑥 + 𝑣 𝜕𝑣 𝜕𝑦 ) = − 𝜕𝑝 𝜕𝑦 + 𝜇 ( 𝜕2𝑣 𝜕𝑥 + 𝜕2𝑣 𝜕𝑦 ) (62) - Conservação da massa: 𝜕𝜌 𝜕𝑡 + 𝜕𝜌𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝜌𝑣 𝜕𝑦 = 0 (63) Nas Equações 61 e 62, os termos relacionados à gravidade foram omitidos por simplicidade. 59 Partiu-se então, para o processo de integração das equações em relação ao espaço e ao tempo. Começando com a equação da quantidade de movimento na direção x (Equação 61), ela foi integrada em relação ao volume de controle P mostrado na Figura 25.b. Nela, é possível observar que as faces possuem índices minúsculos, a saber: e (leste), w (oeste), n (norte) e s (sul). Já as componentes das velocidades nos centros dos volumes adjacentes receberam os mesmos índices, porém escritos em maiúsculo. ∫ 𝑑 𝑑𝑡 (𝜌𝑢)𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 + ∫ 𝑑 𝑑𝑥 (𝜌𝑢𝑢)𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 + ∫ 𝑑 𝑑𝑦 (𝜌𝑣𝑢)𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 = − ∫ 𝑑𝑝 𝑑𝑥 𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 + ∫ 𝑑 𝑑𝑥 (𝜇 𝑑𝑢 𝑑𝑥 ) 𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 + ∫ 𝑑 𝑑𝑦 (𝜇 𝑑𝑢 𝑑𝑦 ) 𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 (64) O resultado da Equação 64 é a Equação 65: 𝜌𝑃𝑢𝑃− 𝜌𝑃 0𝑢𝑃 0 Δ𝑡 + 𝜌𝑢Δ𝑦|𝑒𝑢𝑒 Θ − 𝜌𝑢Δ𝑦|𝑤𝑢𝑤 Θ + 𝜌𝑣Δ𝑥|𝑛𝑢𝑛 Θ − 𝜌𝑣Δ𝑥|𝑠𝑢𝑠 Θ = 𝜇Δ𝑦 𝜕𝑢 𝜕𝑥 | 𝑒 𝜃 − 𝜇Δ𝑦 𝜕𝑢 𝜕𝑥 | 𝑤 𝜃 + 𝜇Δ𝑥 𝜕𝑢 𝜕𝑦 | 𝑛 𝜃 − 𝜇Δ𝑥 𝜕𝑢 𝜕𝑦 | 𝑠 𝜃 − 𝑑𝑝 𝑑𝑥 | 𝜃 Δ𝑥Δ𝑦 (65) É importante observar na Equação 65 que é empregado o termo Θ sobrescrito nas variáveis. Esse termo indica em qual nível de tempo as variáveis estão sendo analisadas. Quando Θ equivale a zero, como é o caso do primeiro termo do lado esquerdo, ele indica que os valores utilizados para aquela variável são da iteração passada. Agora, se Θ for igual a 1, ele indica que o valor da variável sendo utilizado será o da iteração atual. A escolha do valor de Θ acarreta em diferentes formulações para a equação discretizada. Para o modelo proposto nesse trabalho, optou-se pela utilização do termo valendo 1, gerando uma Formulação Totalmente Implícita, que, conforme Maliska (2008), é a mais utilizada para solução numérica na dinâmica dos fluidos, pois permite a utilização de intervalos de tempo (Δ𝑡) maiores. Uma vez obtido o resultado da integral em torno do volume de controle centrado em P, foi necessário definir qual método de interpolação seria utilizado para os termos convectivos (lado esquerdo da Equação 68) e difusivos (lado direito da Equação 65). 60 Seguindo a metodologia descrita por Patankar (2009), e apresentada a seguir, optou- se pelo esquema Power-law, descrito na seção 2.2.6.3. Dessa forma, a Equação 65 foi reescrita substituindo-se os termos difusivos e convectivos pelo esquema de interpolação, e após algumas modificações, obteve-se a Equação 66: 𝐴𝑃𝑢𝑃 = 𝐴𝐸𝑢𝐸 + 𝐴𝑊𝑢𝑊 + 𝐴𝑁𝑢𝑁 + 𝐴𝑁𝑢𝑁 + 𝑏 − 𝑑𝑝 𝑑𝑥 Δ𝑥Δ𝑦 (66) Na qual, os termos convectivos e difusivos referentes a cada face foram agrupados, gerando os coeficientes “A”, sendo eles: 𝐴𝐸 = 𝐷𝑒𝐴(|𝑃𝑒|) + ⟦−𝐹𝑒, 0⟧ (67a) 𝐴𝑊 = 𝐷𝑤𝐴(|𝑃𝑤|) + ⟦𝐹𝑤 , 0⟧ (67b) 𝐴𝑁 = 𝐷𝑛𝐴(|𝑃𝑛|) + ⟦−𝐹𝑛 , 0⟧ (67c) 𝐴𝑆 = 𝐷𝑠𝐴(|𝑃𝑠|) + ⟦−𝐹𝑠, 0⟧ (67d) Nas equações acima, os termos difusivos foram representados pela letra D e os termos convectivos pela letra F. Além disso, utilizou-se a notação 𝐴(|𝑃|), que representa a função de interpolação. Cada um desses termos será definido a seguir, juntamente com os demais termos presentes na Equação 66. 𝐴𝑃 0 = 𝜌𝑃 0𝛥𝑥𝛥𝑦 𝛥𝑡 (68a) 𝑏 = 𝐴𝑃 0𝑢𝑃 0 (68b) 𝐴𝑃 = 𝐴𝐸 + 𝐴𝑊 + 𝐴𝑁 + 𝐴𝑆 + 𝐴𝑃 0 (68c) 𝐹𝑒 = (𝜌𝑢)𝑒Δ𝑦, 𝐷𝑒 = 𝜇Δ𝑦 Δ𝑥 (68d) 𝐹𝑤 = (𝜌𝑢)𝑤Δ𝑦, 𝐷𝑤 = 𝜇Δ𝑦 Δ𝑥 (68e) 61 𝐹𝑛 = (𝜌𝑣)𝑛Δ𝑥, 𝐷𝑛 = 𝜇Δ𝑥 Δ𝑦 (68f) 𝐹𝑠 = (𝜌𝑣)𝑠Δ𝑥, 𝐷𝑠 = 𝜇Δ𝑥 Δ𝑦 (68g) 𝐴(|𝑃|) = ⟦0, (1 − 0.1|𝑃|)5⟧ (68h) Alguns detalhes importantes podem ser percebidos. O primeiro, é que na Equação 66 o gradiente de pressão não foi discretizado. Isso aconteceu porque esse termo receberá um tratamento diferente, na próxima seção, devido ao acoplamento entre pressão e velocidades. A respeito dos termos que aparecem entre chaves nas Equações 67 e 68h, essa notação indica que será utilizado o maior resultado entre os dois valores informados dentro delas. Por fim, em relação aos valores das velocidades 𝑢 e 𝑣 utilizadas nos termos difusivos e convectivos para faces do volume de controle, é necessário realizar uma média entre dois pontos adjacentes da malha numérica e utilizar esse resultado nesses termos, uma vez que se conhece as velocidades somente no centro dos volumes de controle e não nas suas faces. Em relação a equação do momento para a direção y (Equação 62), foi empregado o mesmo procedimento descrito para a equação do momento em x. Dessa forma, após a integração da equação em relação ao volume de controle representado na Figura 25.c, substituiu-se os termos convectivos e difusivos e então os valores foram agrupados, resultando na Equação 69. 𝐴𝑃𝑣𝑃 = 𝐴𝐸𝑣𝐸 + 𝐴𝑊𝑣𝑊 + 𝐴𝑁𝑣𝑁 + 𝐴𝑁𝑣𝑁 + 𝑏 − 𝑑𝑝 𝑑𝑦 Δ𝑥Δ𝑦 (69) Pode-se perceber que a Equação 69 apresenta a mesma estrutura da Equação 66, sendo que as únicas alterações foram em relação a variável que está sendo calculada, bem como no termo referente ao gradiente de pressão. Todos os coeficientes “A” são calculados da mesma maneira que para a equação do momento em x, seguindo as Equações 67 e 68. O único termo que sofre alteração é o termo b, que passa a ser definido como 62 𝑏 = 𝐴𝑃 0𝑣𝑃 0 (70) Após finalizar a discretização das equações do momento, foi realizado o mesmo procedimento para a equação da continuidade (Equação 63). Inicialmente, ela foi integrada em relação ao volume de controle em que está armazenada a informação da pressão (Figura 25.a), para a qual as velocidades 𝑢 e 𝑣 estão localizadas nas quatro faces, resultando na Equação 71. ∫ 𝑑𝜌 𝑑𝑡 𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 + ∫ 𝑑 𝑑𝑥 (𝜌𝑢)𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 + ∫ 𝑑 𝑑𝑦 (𝜌𝑣)𝑑𝑉 𝑑𝑡 𝑉,𝑡 = (𝜌𝑃−𝜌𝑃 0)Δ𝑥Δ𝑦 Δ𝑡 + [(𝜌𝑢)𝑒 − (𝜌𝑢)𝑤]Δ𝑦 + [(𝜌𝑣)𝑛 − (𝜌𝑣)𝑠]Δ𝑥 = 0 (71) Na Equação 71, conforme indica Patankar (2009), são utilizadas as velocidades atuais quando se segue o esquema totalmente implícito, que foi empregado para este algoritmo. A equação da continuidade discretizada (Equação 71) não é utilizada em nenhum momento como equação para se obter as velocidades atualizadas, sendo seu papel principal, o de restringir o campo de velocidades para que ele seja fiel a física do problema (MALISKA, 2014). 3.2.4 Solução para o acoplamento Pressão-Velocidade Com a discretização das Equações de Navier-Stokes feitas, foi preciso buscar uma solução para o acoplamento Pressão-Velocidade, comentando na seção 2.2.5. O primeiro passo para isso foi a escolha da malha desencontrada, o que fez com que os pontos nos quais as pressões e as velocidades fossem armazenadas estivessem intercalados. Dessa forma, o gradiente de pressões atua entre faces do volume de controle das velocidades, e, conforme Maliska (2014), age como força motriz para o movimento do fluido. Porém, pressão não possui uma equação própria que a faça avançar no tempo, como é o caso para as componentes de velocidade 𝑢 e 𝑣 que possuem as equações do momento. Dessa forma, se faz necessário o desenvolvimento e a aplicação de uma equação para a pressão que faça com que o processo evolua a cada iteração, sempre respeitando a equação da continuidade (MALISKA, 2014). 63 O método escolhido para solução do problema de acoplamento foi o Método Prime (Pressure Implicit Momentum Explicit), proposto por Maliska (2014), que segue