UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI - UNIVATES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU DOUTORADO EM AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO AGRICULTURA ORGÂNICA PELA AGRICULTURA FAMILIAR SOB A ÓPTICA SOCIOECONÔMICA, ECONÔMICA E FINANCEIRA: ANÁLISE DO DESEMPENHO DA PRODUÇÃO MATO-GROSSENSE Vilma Eliane Machado de Oliveira Lajeado/RS, fevereiro de 2024 Vilma Eliane Machado de Oliveira AGRICULTURA ORGÂNICA PELA AGRICULTURA FAMILIAR SOB A ÓPTICA SOCIOECONÔMICA, ECONÔMICA E FINANCEIRA: ANÁLISE DO DESEMPENHO DA PRODUÇÃO MATO-GROSSENSE Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Ambiente e Desenvolvimento, da Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES, como parte das exigências para a obtenção do grau de Doutora em Ambiente e Desenvolvimento na área de concentração Espaço e Problemas Socioambientais. Orientadora: Profa. Dra. Luciana Turatti Coorientador: Prof. Dr. Alexandre André Feil Lajeado/RS, fevereiro de 2024 Vilma Eliane Machado de Oliveira AGRICULTURA ORGÂNICA PELA AGRICULTURA FAMILIAR SOB A ÓPTICA SOCIOECONÔMICA, ECONÔMICA E FINANCEIRA: ANÁLISE DO DESEMPENHO DA PRODUÇÃO MATO-GROSSENSE A Banca examinadora abaixo aprova a Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Ambiente e Desenvolvimento, da Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES, como parte da exigência para a obtenção do grau de Doutora em Ambiente e Desenvolvimento na área de concentração Espaço e Problemas Socioambientais. ___________________________________ Profa. Dra. Luciana Turatti – orientadora Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES ___________________________________ Prof. Dr. Alexandre André Feil - coorientador Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES ___________________________________ Prof. Dr. Carlos Cândido da Silva Cyrne Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES ___________________________________ Prof. Dr. Clovis Antônio Kronbauer Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS ___________________________________ Prof. Dr. Agilson Poquiviqui Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT Lajeado/RS, fevereiro de 2024 Dedico esse trabalho, aos meus pais e aos meus filhos. AGRADECIMENTOS Ao Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento (PPGAD) da Universidade Vale do Taquari (UNIVATES) e ao corpo docente, que muito contribuíram com meu avanço profissional, em especial, à professora doutora Neli Teresinha Galarce Machado, pelo tratamento humano dispensado. À Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), campus de Juara, por todo auxílio e contribuições nas viagens de coleta de dados. Aos doutores Agilson Poquiviqui, Carlos Cândido da Silva Cyrne e Clovis Antônio Kronbauer, por aceitarem examinar este trabalho. À professora doutora Luciana Turatti e ao professor doutor Alexandre André Feil, pelas orientações nas etapas deste trabalho, por todo apoio, compartilhamento de conhecimento e oportunidades oferecidas. As participações de vocês foram especiais e essenciais. Aos agricultores orgânicos, que me confiaram informações do seu dia a dia, da sua família e do seu negócio. Agradeço o carinho e o respeito que tiveram ao me receberem em suas casas. Aos colegas de curso, agradeço a oportunidade de crescimento comum, a atenção e a amizade desde o início. Aos meus pais, Osvaldo e Vilma, pelo apoio e carinho. Aos meus filhos Bruno, João Henrique e Felipe, por compreenderem as ausências necessárias e por toda colaboração. À minha neta Bianca, sua chegada me preencheu de amor e fortaleceu meu desejo de tornar seu mundo melhor. “Esquecer como cavar a terra e cuidar do solo é esquecer de nós mesmos”. (Mahatma Gandhi) RESUMO A degradação dos recursos naturais afeta, direta ou indiretamente, as atividades econômicas e sociais, a saúde e o bem-estar da população, razão pela qual o setor agrícola tem como desafio produzir para gerar desenvolvimento econômico, suprir a demanda por alimentos, sem, contudo, deixar de preservar o meio ambiente e proporcionar saúde e bem-estar, nesse contexto, a agricultura orgânica surge como uma alternativa. O objetivo desta pesquisa foi identificar o desempenho do sistema agrícola orgânico em propriedades da agricultura familiar no Estado de Mato Grosso, em âmbito, socioeconômico, financeiro e econômico. Para tanto, realizou-se uma análise do perfil dos agricultores e de suas unidades agrícolas produtivas de alimentos orgânicos, inseridas na agricultura familiar; identificaram-se as características das atividades agrícolas do sistema produtivo de alimentos orgânicos em âmbito socioeconômico, financeiro e econômico; avaliou-se o desempenho financeiro e econômico das unidades agrícolas produtivas de alimentos orgânicos, bem como o desempenho socioeconômico dos agricultores; analisaram-se as variáveis intervenientes que influenciam o desempenho das unidades agrícolas de alimentos orgânicos. A pesquisa, quanto ao problema, é classificada como qualiquantitativa e descritiva, quanto ao objetivo geral. A coleta de dados ocorreu por meio do procedimento técnico survey, mediante um questionário estruturado e aplicado através de entrevista com os produtores familiares que cultivam no sistema orgânico, domiciliados no Estado de Mato Grosso. Como resultado, obteve-se uma análise da viabilidade financeira e econômica no que tange à produção, e uma análise do bem- estar, da saúde e das condições socioeconômicas do produtor e de sua família. Os resultados demonstram um cenário positivo em relação a si mesmo, do desempenho do sistema agrícola orgânico nos âmbitos socioeconômico, econômico e financeiro, no Estado de Mato Grosso. Como sugestão para o registro dos eventos financeiros, foi proposto um instrumento de registro e avaliação do desempenho financeiro das unidades agrícolas produtivas de alimentos orgânicos. Palavras-chave: agricultura familiar; cultivo orgânico; viabilidade econômica e financeira; bem-estar socioeconômico. ABSTRACT The degradation of natural resources affects, directly or indirectly, economic and social activities, the health and well-being of the population, which is why the agricultural sector faces the challenge of producing to generate economic development, meeting the demand for food, without, however, failing to preserve the environment and provide health and well-being, in this context, organic agriculture emerges as an alternative. The objective of this research was to identify the performance of the organic agricultural system on family farming properties in the State of Mato Grosso, in socioeconomic, financial and economic terms. To this end, an analysis of the profile of farmers and their agricultural units producing organic food, included in family farming, was carried out; the characteristics of agricultural activities in the organic food production system were identified in socioeconomic, financial and economic terms; the financial and economic performance of agricultural units producing organic food was evaluated, as well as the socioeconomic performance of farmers; the intervening variables that influence the performance of organic food agricultural units were analyzed. The research, regarding the problem, is classified as qualitative and descriptive, regarding the general objective. Data collection occurred through the technical survey procedure, using a structured questionnaire and applied through interviews with family producers who cultivate in the organic system, domiciled in the State of Mato Grosso. As a result, an analysis of the financial and economic viability regarding production was obtained, and an analysis of the well-being, health and socioeconomic conditions of the producer and his family. The results demonstrate a positive scenario in relation to the performance of the organic agricultural system in the socioeconomic, economic and financial spheres in the State of Mato Grosso. As a suggestion for recording financial events, an instrument for recording and evaluating the financial performance of agricultural units producing organic food was proposed. Keywords: family farming; organic cultivation; economic and financial solutions; socioeconomic well-being. LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Perfil dos membros das famílias dos produtores ..................................... 62 Gráfico 2 - Perfil das unidades agrícolas ................................................................... 64 Gráfico 3 - Estrutura das residências dos agricultores .............................................. 66 Gráfico 4 - Bens duráveis e equipamentos nos domicílios dos agricultores .............. 67 Gráfico 5 - Equipamentos domiciliares dos agricultores ............................................ 68 Gráfico 6 - Infraestrutura do saneamento domiciliar dos agricultores ....................... 69 Gráfico 7 - Infraestrutura disponível aos agricultores ................................................ 70 Gráfico 8 - Político-institucional ................................................................................. 72 Gráfico 9 - Relações Interpessoais ........................................................................... 72 Gráfico 10 - Relações Campo x Cidade .................................................................... 73 Gráfico 11 - Autodeclaração de saúde dos agricultores ............................................ 74 Gráfico 12 - Características gerais da saúde dos agricultores .................................. 75 Gráfico 13 - Hábitos Alimentares dos agricultores .................................................... 76 Gráfico 14 - Prática de atividades físicas pelos agricultores ..................................... 77 Gráfico 15 - Hábito do sono e do repouso dos agricultores ...................................... 78 Gráfico 16 - Bem-estar pessoal dos agricultores....................................................... 79 Gráfico 17 - Inserção Social dos agricultores ............................................................ 80 Gráfico 18 - Atividades de lazer praticadas pelos agricultores em seu tempo livre......80 Gráfico 19 - Ambiente de Trabalho dos agricultores ................................................. 81 Gráfico 20 - Riscos ocupacionais e perigos à saúde ................................................. 83 Gráfico 21 - Aspectos laborais .................................................................................. 84 Gráfico 22 - Índices de Liquidez das unidades agrícolas .......................................... 97 Gráfico 23 - Índices de Estrutura de Capital .............................................................. 99 Gráfico 24 - Índice de Rentabilidade das unidades agrícolas ................................. 101 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Municípios produtores de orgânicos por escopo ..................................... 28 Quadro 2 - Classificação dos produtores orgânicos no Estado do Mato Grosso ...... 50 Quadro 3 - Aspectos gerenciais das unidades agrícolas .......................................... 86 Quadro 4 - Balanço Patrimonial Perguntado unidades agrícolas (em milhares de reais) .................................................................................................................................. 92 Quadro 5 - DREP das unidades agrícolas (em milhares de reais) ............................ 94 Quadro 6 – Estrutura de Contas a Receber para as unidades agrícolas.................112 Quadro 7 – Estrutura de Contas a Pagar para as unidades agrícolas.....................113 Quadro 8 – Estrutura de Relatório Fluxo de Caixa para as unidades agrícolas.......114 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Identificação dos agricultores ................................................................... 60 Tabela 2 - Correlação de Spearman ....................................................................... 104 Tabela 3 – Plano de Contas Genérico para as unidades agrícolas pesquisadas....108 Tabela 4 – Modelo de Fluxo de Caixa para as unidades agrícolas pesquisadas....109 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 14 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................. 19 2.1 Agricultura orgânica ......................................................................................... 19 2.2 Produção orgânica no Estado de Mato Grosso .............................................. 27 2.3 Agricultura familiar ........................................................................................... 34 2.4 Desempenho econômico e financeiro ............................................................. 38 2.4.1 Controle gerencial .......................................................................................... 38 2.4.2 Balanço Patrimonial ....................................................................................... 40 2.4.3 Demonstração do Resultado do Exercício ................................................... 41 2.4.4 Análise Econômica e Financeira ................................................................... 41 2.5 Desempenho Socioeconômico ........................................................................ 45 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................................... 48 3.1 Tipificação da pesquisa .................................................................................... 48 3.2 Unidades de análise .......................................................................................... 49 3.3 Coleta e Instrumentos ....................................................................................... 50 3.4 Tratamento e análise dos dados ...................................................................... 52 4 APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ............................... 56 4.1 Perfil dos agricultores e de suas unidades agrícolas .................................... 56 4.1.1 Composição familiar, certificação orgânica e motivações da agricultura orgânica ................................................................................................................... 57 4.1.2 Perfil dos agricultores orgânicos ................................................................. 60 4.1.3 Estrutura familiar dos agricultores ............................................................... 62 4.1.4 Distribuição espacial e características das unidades agrícolas ................ 63 4.2 Desempenho socioeconômico ......................................................................... 65 4.2.1 Desempenho socioeconômico dos agricultores ......................................... 66 4.2.2 Autoavaliação dos agricultores sobre seu estilo de vida ........................... 74 4.3 Desempenho econômico e financeiro ............................................................. 85 4.3.1 Controle gerencial nas unidades agrícolas ................................................. 85 4.3.2 Demonstrativos contábeis das unidades agrícolas .................................... 90 4.3.2.1 Balanço Patrimonial Perguntado (BPP) das unidades agrícolas ............ 91 4.3.2.2 Demonstração do Resultado Exercício Perguntado (DREP) das unidades agrícolas................................................................................................................... 93 4.3.3 Índices Econômicos e Financeiros das Demonstrações Contábeis.......... 96 4.4 Análise das variáveis dos dados por Correlação de Spearman ................. 103 4.5 Ferramenta de controle gerencial financeiro - Proposta de um instrumento de mensuração e de análise do desempenho financeiro das unidades agrícolas..................................................................................................................106 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 117 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 120 APÊNDICES ........................................................................................................... 133 APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) .............. 134 APÊNDICE B - Identificação da amostra ............................................................. 136 APÊNDICE C - Âmbito social ................................................................................ 138 APÊNDICE D - Âmbito econômico e financeiro .................................................. 146 APÊNDICE E - Escala nominal das variáveis ...................................................... 149 14 1 INTRODUÇÃO O histórico da degradação ambiental e o uso dos recursos naturais nos processos produtivos levantam discussões acerca de um sistema de produção contínuo que conserve o meio ambiente, buscando sua preservação e continuidade produtiva (TACHIZAWA, 2009). O meio ambiente é constantemente explorado por organizações, entre elas, as rurais, que acessam os recursos naturais e os utilizam como sendo recursos ilimitados, sem se preocuparem com os impactos causados à natureza (DIAS, 2011). A agricultura tem como desafio a alimentação da população mundial e, ao mesmo tempo, a preservação do meio ambiente, por meio da redução do uso de agrotóxicos e das técnicas estabelecidas como depredadoras do ambiente (LECHENET et al., 2017). A prática da agricultura convencional1, principalmente após o advento da chamada Revolução Verde, no período pós-Segunda Grande Guerra Mundial, não considerou as agressões ao ambiente (físicas, sociais e culturais), desgastando, de forma sistemática, a estrutura agropecuária existente (LECHENET et al., 2017). O sistema agrícola orgânico2 é frequentemente proposto como solução para o desafio de alcançar a segurança alimentar sustentável (SEUFERT; RAMANKUTTY, 2017). Conforme sustentam Home et al. (2018), a produção orgânica é capaz de 1 Esta tese adota o conceito de sistema agrícola convencional como um sistema agrícola produtivo, baseado no uso de fertilizantes químicos e agrotóxicos (MEIRELLES; RUPP, 2014). 2 Nesta tese, entende-se sistema agrícola orgânico como um método de produção agrícola que dispensa a utilização de insumos químicos, sendo caracterizado pelo processo de levar em consideração a relação solo/planta/meio ambiente para a proteção do meio ambiente e a saúde humana e animal (MEIRELLES; RUPP, 2014). 15 preservar e de manter a saúde do meio ambiente e do ser humano, uma vez que se preocupa com a qualidade de vida da população mundial, como também das futuras gerações. Tamanha é preocupação, que o movimento agroecológico está intimamente ligado aos fundamentos do desenvolvimento sustentável. A agricultura orgânica, frequentemente vista como um caminho para sair da pobreza para os pequenos agricultores, devido à redução do uso de insumos externos e o aumento da renda por meio de melhores preços de comercialização para os produtos agrícolas orgânicos, contraria a dependência do mercado, ao mesmo tempo em que melhora os meios de subsistência (BLACE; CUKA; SILJKOVIC, 2020). Esta também é considerada uma opção para a prática de uma agricultura sustentável nos países em desenvolvimento como o Brasil, porque oferece uma combinação única que envolve baixa tecnologia, baixa necessidade de insumos externos, conservação ambiental e acesso a mercados que pagam melhores preços (Forster et al., 2013). No universo da agricultura familiar, há a preocupação com a cultivo de alimentos de qualidade e com a possibilidade de estabelecer uma relação mais harmoniosa com o meio ambiente, nesse conjunto, encontram-se as famílias dedicadas à produção de alimentos orgânicos3 (TRICHES; GERHARDT; SCHNEIDER, 2014). Os agricultores familiares que se dedicam ao cultivo orgânico entendem e conservam os componentes do meio ambiente, por compreenderem que são elementos importantes para a promoção da biodiversidade (ALVES et al., 2018). A agricultura familiar consiste em empreendimentos de pequenos produtores rurais que atuam na plantação, na cultura e na negociação de produtos agropecuários (ZAMITH; ALBUQUERQUE, 2016). Segundo esses autores, a agricultura familiar se caracteriza por ocupar uma mão de obra constituída por membros da família e da população local, para a produção de alimentos para a subsistência e a venda do excedente para a geração de renda. Os alimentos orgânicos atraem o interesse dos consumidores, por serem saudáveis para a humanidade e sustentáveis para o meio ambiente (GOMERO, 2018), e os pequenos agricultores interessados no cultivo orgânico por reduzir os efeitos dos pesticidas na saúde, alcançar novos mercados; contudo, muitas vezes, há a preocupação de não conseguir gerar renda suficiente para realizar a transição (da agricultura tradicional para a orgânica) (PHAM; SHIVELY, 2019), assim, a decisão da 3 Nesta tese, adota-se o conceito de alimento orgânico como aquele que possui certificação, conforme legislação federal brasileira - Lei nº. 10.831/2003. https://www-sciencedirect.ez316.periodicos.capes.gov.br/topics/earth-and-planetary-sciences/smallholder 16 conversão depende da crença de que os problemas técnicos serão suficientemente resolvidos, além de uma série de fatores sociais (HOME et al., 2018). Embora a transição para a produção orgânica dependa da consciência dos produtores e consumidores, o produtor rural se convence da conversão da produção convencional para a orgânica, desde que haja garantia de viabilidade econômica, financeira e social do sistema produtivo de alimentos orgânicos (COUTO, 2007). Os fatores que contribuem para a conversão produtiva podem ser de ordem pessoal (idade, objetivos, valores, estilo de vida e saúde), ligados à unidade de produção (características da propriedade, recursos de trabalho e de capital) ou, ainda, relacionados ao ambiente externo (rentabilidade, programas e políticas de conversão, preço, vias de comercialização e subsídios) (MASS et al., 2018). A agricultura orgânica apresenta uma proposta de produção que visa preservar os recursos naturais; entretanto, os questionamentos apresentados por esse modelo de produção não se limitam aos aspectos técnicos e ambientais, mas também incorporam nas discussões e práticas, as dimensões, social e econômica, que interferem na continuidade dos sistemas produtivos (RAMANKUTTY et al., 2019). A agricultura orgânica insere-se nesta ampla definição, fundamentada, principalmente, nas dimensões técnico-agronômicas de produção e de manejo dos ecossistemas; porém, outros aspectos carecem dessas discussões (BAHIENSE; ANGELETTI; SOUZA, 2015). Com base nestas considerações, esta tese abre uma discussão sobre a agricultura orgânica em âmbito socioeconômico, econômico e financeiro, haja vista que essa modalidade de cultivo também estabelece relações entre estas três dimensões. Deste modo, o tema desta pesquisa é a agricultura familiar e o cultivo orgânico primário de alimentos, com foco na compreensão da situação do agricultor na esfera socioeconômica e da unidade de produção agrícola familiar orgânica, nas esferas econômica e financeira, no Estado de Mato Grosso, no ano de 2022. A partir do problema da pesquisa, questiona-se qual é o desempenho do sistema agrícola orgânico no Estado de Mato Grosso, no âmbito socioeconômico, econômico e financeiro? O objetivo geral da investigação consistiu em analisar o desempenho do sistema agrícola orgânico em propriedades da agricultura familiar no Estado de Mato Grosso, no âmbito socioeconômico, econômico e financeiro. Para deslindar o objetivo geral da pesquisa, foram propostos os seguintes objetivos específicos: a) analisar o perfil dos agricultores e de suas unidades agrícolas 17 produtivas de alimentos orgânicos inseridas na agricultura familiar; b) identificar o desempenho socioeconômico dos agricultores; c) identificar o desempenho econômico e financeiro das unidades agrícolas produtivas de alimentos orgânicos; d) analisar as variáveis intervenientes que influenciam o desempenho das unidades agrícolas de alimentos orgânicos e; propor um instrumento de mensuração e de avaliação do desempenho financeiro que atenda as unidades de produção primária de alimentos orgânicos. As discussões envolvendo sistemas produtivos agrícolas orgânicos vão além do seu funcionamento técnico-agronômico, pois não é apenas a sua funcionalidade que deve ser estudada, mas também, seu funcionamento num conjunto de diferentes dimensões: a produtiva; a ambiental e a socioeconômica (RAMANKUTTY et al., 2019). O bem-estar humano deve representar o objetivo final desse sistema produtivo agrícola, com a consequente satisfação das necessidades básicas (econômicas, sociais e ambientais) dos indivíduos (ULMAN et al., 2021). A satisfação das necessidades básicas (econômicas, sociais e ambientais) dos indivíduos representa a maior preocupação social, sendo escopo e centro de todas as ações particulares, grupais, comunitárias, regionais e/ou nacionais, direcionadas a uma ou a todas as dimensões do desenvolvimento sustentável (ULMAN et al., 2021). Conforme ressaltam estes autores, uma sociedade sustentável é a que registra altos níveis de bem-estar econômico, social e ambiental. Os sistemas agrícolas produtivos estão interconectados, por isso, são necessários estudos interdisciplinares mais integrados, visando à superação de práticas insustentáveis (ZAGATA; UHNAK; HRABÁK, 2021). Os autores (RAMANKUTTY et al., 2019); (BLACE; CUKA; SILJKOVIC, 2020); (HOME et al., 2018); (ULMAN et al., 2021) e (ZAGATA; UHNAK; HRABÁK, 2021) afirmam que são necessárias pesquisas nas dimensões, econômica, financeira e social, dentro do sistema produtivo agrícola de alimentos orgânicos, tendo em vista sua relação com essas dimensões. A proposta desta tese se justifica pelo fato de colaborar com discussões que analisam o cultivo agrícola orgânico, nas dimensões socioeconômico, econômica e financeira. Além disso, os resultados da pesquisa auxiliam a compreender o desempenho do sistema agrícola orgânico, em uma análise integrada. A originalidade desta pesquisa se evidencia na abordagem das dimensões socioeconômica, econômica e financeira, no sistema agrícola de produção de alimentos orgânicos, nas 18 unidades produtivas da agricultura familiar do Estado de Mato Grosso. Esta tese, que se vincula à área de concentração que avalia a interação do homem com o ambiente, considerando-o parte integrante dos ecossistemas, através da linha de pesquisa Espaço e Problemas Socioambientais, busca contribuir com informações sobre as unidades agrícolas produtivas de alimentos orgânicos. A estrutura da tese está organizada em cinco capítulos. No primeiro, apresenta- se a introdução geral à pesquisa, na qual se contextualizou a temática abordada. O segundo traz uma visão geral dos conceitos teóricos abordados na pesquisa. O terceiro aborda a metodologia utilizada para responder ao problema da pesquisa. No quarto capítulo, foram apresentados e discutidos os resultados obtidos através das respostas alcançadas para cada objetivo específico. Para encerrar, no quinto capítulo, são expostas as considerações finais da pesquisa, enfatizando uma síntese reflexiva do estudo. 19 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Os conceitos articuladores desta tese são desenvolvidos nas esferas da agricultura orgânica, da agricultura familiar e do desempenho nos âmbitos socioeconômico, econômico e financeiro. Considerando que o tema desta pesquisa aborda o cultivo orgânico primário de alimentos, inicia-se esta seção com a contextualização conceitual do tema Agricultura Orgânica e a trajetória histórica da Agricultura Orgânica no Brasil. 2.1 Agricultura orgânica Apesar da origem imbricada, a agroecologia e a agricultura orgânica não são sinônimos. A agroecologia é uma ciência com limites teóricos bem definidos, que procura inter-relacionar o saber de diferentes áreas do conhecimento, com o objetivo de propor um encaminhamento para a agricultura que respeite as condicionantes ambientais impostas pela natureza desta atividade econômica (ASSIS; ROMEIRO, 2002). Já a agricultura orgânica é uma prática agrícola e, como tal, um processo social que apresenta alguns vieses expressos em diferentes formas de encaminhamento tecnológico e de inserção no mercado, na qual, em função de como esta ocorre, os limites teóricos da agroecologia são respeitados em maior ou menor grau (ASSIS; ROMEIRO, 2002). A agricultura orgânica é um método específico de produção de alimentos, usando substâncias e processos naturais (MILLER, 2021), seus princípios básicos são 20 de não uso de adubos artificiais, dando importância ao uso de matéria orgânica na melhoria da fertilidade e da vida do solo como fator principal para a eliminação de pragas e doenças, à melhoria dos rendimentos e à qualidade dos produtos agrícolas (PENTEADO, 2001). Altiere (2004) defende que a agricultura orgânica é um sistema que sustenta a produção agrícola evitando ou excluindo o uso de fertilizantes e agrotóxicos, que são substituídos por recursos encontrados na unidade de produção agrícola. Esses recursos internos incluem energia solar ou eólica, controle biológico de pragas, fixação biológica do nitrogênio, além de outros nutrientes liberados da matéria orgânica ou das reservas do solo. Segundo Botkin (2018), a agricultura orgânica utiliza técnicas e métodos diferentes dos pacotes convencionais, impondo limites ao uso de agroquímicos, bem como regula a permissão, a restrição e a proibição de produtos naturais, mediante regras específicas. Ainda, conforme o mesmo autor, na agricultura orgânica o solo é percebido como um organismo vivo que deve ser protegido e alimentado. Por isso, o manejo orgânico privilegia práticas que garantam um fornecimento constante de matéria orgânica, que é fundamental para a construção da fertilidade do solo em seu sentido mais amplo. Ramos (2018) explica que o solo é formado por um conjunto de partículas, como argila, silte, areia, nutrientes, água, ar, além de ser formado pelo sistema vivo, que contém os macro-organismos (minhocas e artrópodes) e os micro-organismos (bactérias, fungos, vírus, algas, nematoides e protozoários), bem como as raízes das plantas. Todos esses organismos estão relacionados, pois os organismos vivos dependem da presença de minerais, ar e água para se desenvolverem. Esses organismos vivos atuam como transformadores da matéria orgânica, promovendo o aumento da fertilidade do solo, a melhora da estrutura física do solo e contribuem para o desenvolvimento das plantas (RAMOS, 2018). A agricultura orgânica, além de produzir de maneira sustentável, estimula a biodiversidade por meio dos ciclos biológicos e da atividade biológica do solo, além de visar ao bem-estar do agricultor, à autossuficiência do pequeno agricultor, à preservação rural e seus costumes (HLPE, 2019). Nesse sentido, os autores Caporal e Costabeber (2002) explicam que o alimento orgânico é o resultado de uma produção por meio do manejo equilibrado do solo e dos demais recursos naturais, buscando a harmonia entre esses elementos e 21 os seres humanos, ou seja, o agricultor desenvolve um trabalho harmonizado com a natureza, oferecendo ao consumidor alimentos que promovem não apenas a saúde deste último, mas a do planeta como um todo. A produção de alimentos no sistema orgânico deve ser comprovada mediante certificação, e todo o processo de produção é monitorado por credenciadoras e/ou certificadoras de produtos orgânicos, de acordo com a regulamentação pertinente. A inspeção, consiste em reunir dados, checar documentos nas operações de campo e do sistema de condução orgânica das atividades na propriedade, as instalações, sacarias e embalagens, bem como, a situação geral, social e trabalhista (KAMIYAMA, 2011). Com todos os requisitos atendidos, é emitido um certificado de conformidade que atesta a qualidade dos produtos em relação à norma, os produtos passam a exibir o Selo de Qualidade Orgânica, tanto no Brasil como na União Europeia, adotou-se um selo único para identificar os produtos orgânicos certificados no mercado interno (KAMIYAMA, 2011). No Brasil, o sistema orgânico é definido pela Lei nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003, do Ministério da Agricultura e Abastecimento do Brasil (BRASIL, 2003). Considera-se sistema orgânico de produção agropecuário todo aquele em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso de recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo como objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energia não renovável, empregando, sempre que possível, métodos naturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, bem como busca eliminar o uso de organismos genéticos modificados e radiações ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenamento, distribuição e comercialização, com o intuito de proteger o meio ambiente. A reflexão sobre a produção agrícola orgânica, que ultrapassa preocupações meramente econômicas, compreende a unidade entre cultura e natureza nas práticas dos agricultores e nas práticas culturais consideradas ultrapassadas pelo modelo agrícola dominante (MORETTI, 2014). Com a aderência aos pacotes tecnológicos da agricultura convencional, as práticas que valorizavam a produção orgânica foram rotuladas como ultrapassadas e sem validade científica, ou seja, as técnicas agrícolas rurais consagradas ao longo dos tempos foram estigmatizadas como sinônimo de atraso (MONTEIRO; LONDRES, 2017). A agricultura orgânica iniciou na década de 1920 com as pesquisas do inglês 22 Albert Howard, e esta prática foi difundida, entre as décadas de 1930 e 1970, para vários países, enquanto a comercialização em escala mundial dos produtos orgânicos ocorreu a partir dos anos 1990 (MATTEI; MICHELLON, 2021). O início da agricultura orgânica no Brasil ocorreu na década de 1970, quando se passa a repensar o modelo convencional de produção agropecuária (REIS, 2018). No ano de 1981, ocorreu o I Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa (EBAA), na cidade de Curitiba/PR. Na década de 1980, ocorreram outros EBAAs: 1984, Petrópolis/RJ; 1987, Cuiabá/MT; 1989, Porto Alegre/RS. Os encontros tinham como participantes membros de ONGs, lideranças de movimentos sociais, representantes de instituições públicas e privadas, agricultores, profissionais e estudantes das ciências agrárias, bem como estudiosos de instituições de ensino, pesquisa e extensão rural (EBAA, 1984; EBAA, 1987). O Projeto Tecnologias Alternativas (PTA), institucionalmente ligado à Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional (Fase), foi criado em 1983, resultado de um trabalho de identificação de experiências positivas em processos alternativos à Revolução Verde (PETERSEN et al., 2013). A Constituição Federal de 1988 viabilizou a ampliação das instâncias de participação, destaca-se, nesse âmbito, a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CNDRS) (MOURA, 2017). E em 1989, a aprovação da Lei nº 7.802 – Lei de Agrotóxicos (regulamentada pelo decreto n. 4.074/02, alterado pelo decreto n. 6.913/09) foi o marco inicial da regulamentação da agricultura orgânica (BRASIL, 1989). A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que aconteceu no Rio de Janeiro no ano de 1992 – a Rio 92, impulsionou alguns princípios e diretrizes da agroecologia, como o Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras, com representação do Estado e da sociedade civil. A abertura à sociedade civil organizada assegurou o direcionamento de alguns projetos, em consonância com os princípios da agroecologia e da produção orgânica (MOURA, 2017). Em 1995, o Governo Federal instituiu o Comitê Nacional de Produtos Orgânicos (CNPO), por meio da portaria MA nº 192, para elaborar e aprimorar normas para a agricultura orgânica em nível nacional, com composição paritária entre governo e ONGs que atuavam no movimento orgânico (ALVES; SANTOS; AZEVEDO, 2012). 23 A Instrução Normativa nº 07, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), publicada em 1999, como resultado da discussão entre a sociedade civil e o Poder Executivo, dispõe sobre as normas e os procedimentos para a produção, a tipificação, o processamento, o envase, a distribuição, a identificação e a certificação da qualidade para os produtos orgânicos de origem vegetal e animal no Brasil (MAPA, 1999). A publicação da Lei Federal nº 10.831/2003 define e estabelece condições obrigatórias para a produção e a comercialização de produtos da agricultura orgânica (BRASIL, 2003). A regulamentação da lei ocorreu por meio do Decreto nº 6.323, de 27 de dezembro de 2007 (alterado pelo Decreto nº 7.794/2012), formulado com a participação da sociedade civil. A lei e o decreto criaram mecanismos de controle para a garantia da qualidade orgânica. O decreto criou o selo único oficial do Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica (SISOrg) e o Sistema Participativo de Garantia (SPG), não considerado nas normativas anteriores (BRASIL, 2007). Neste ínterim, há de se ter presente que, ao oficializar os sistemas participativos de garantia e do controle social na venda direta pelos agricultores familiares, a legislação brasileira legitima as diferentes práticas de avaliação da conformidade existentes no país e viabiliza o acesso aos programas de compra governamental para grupos de agricultores que fizeram a opção por SPG (KARAM et al., 2006). O Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade (SBAC), que possui regulamentação e procedimentos próprios para as atividades de creditação, certificação e treinamento, estabelece duas modalidades de certificação: a compulsória e a voluntária. A certificação de produtos orgânicos é estabelecida pela Lei 10.831/2003 e regulamentada pelo Decreto 6.323/2007 (Brasil, 2003; Brasil, 2007). Este decreto permite que agricultores familiares realizem a venda direta de sua produção sem a necessidade de certificação, tendo, no entanto, que constituir uma Organização de Controle Social (OCS), cadastrada no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SAMBUICHI et al., 2017). O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) são os órgãos regulamentadores dos produtos orgânicos. Para a certificação de um produto como orgânico no Brasil, existem três mecanismos de garantia da qualidade orgânica (MAPA, 2022): a) certificação por auditoria; b) certificação participativa; c) estar 24 vinculado a uma organização de controle social. O MAPA estabelece o conjunto de regras e requisitos que devem ser cumpridos para cada tipo de produção orgânica: produção primária vegetal, produção primária animal, extrativismo sustentável, processamento de produtos de origem vegetal, processamento de produtos de origem animal, entre outros (MAPA, 2022). O mecanismo de Certificação por Auditoria estabelece que uma certificadora, credenciada pelo MAPA e creditada pelo INMETRO, avalie se os requisitos para a produção orgânica estão sendo integralmente cumpridos. Esta avaliação engloba inspeções ou auditorias periódicas na unidade de produção orgânica, bem como ensaios de solo ou de produto, caso seja necessário (MAPA, 2022). Os requisitos para a produção orgânica são estabelecidos por meio de Instruções Normativas, documentos que estabelecem o que um produtor deve fazer para obter a certificação orgânica (MAPA, 2022). Em 2004, o MAPA criou o Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica (Pró-orgânico), por meio da Portaria nº 158/2004, que estabeleceu as ações de desenvolvimento e capacitação organizacional e tecnológica do mercado orgânico, de aprimoramento e adequação de marcos regulatórios, bem como de promoção e fomento à produção e à comercialização dos produtos e nos assuntos relativos à sua execução, seja assessorado pela Comissão Nacional da Produção Orgânica – CNPOrg, seja pelas Comissões da Produção Orgânica nas Unidades da Federação - CPOrg-UF (MAPA, 2004). A expansão dos mercados de alimentos orgânicos foi acompanhada por iniciativas de normatização dos processos produtivos, com o objetivo de garantir a qualidade desses alimentos aos consumidores e responder às exigências de mercados internacionais. A participação de organizações e redes da sociedade civil neste debate resultou em conquistas importantes, notadamente, no reconhecimento dos sistemas participativos de garantia da qualidade orgânica, não somente dos mecanismos de certificação por auditoria com características empresariais (MONTEIRO; LONDRES, 2017). No Plano Plurianual-PPA 2004-2007, estabelecido pela Lei nº 10.933/2004, foi inserido pela primeira vez o Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica, com o objetivo de aumentar a oferta de produtos orgânicos e sua exportação. O governo nacional estabeleceu como ações: a certificação da produção orgânica de alimentos; o fomento ao uso de produtos e processos apropriados à produção 25 orgânica de alimentos; organização e capacitação de agentes atuantes em produção orgânica de alimentos; publicidade de utilidade pública e transferência de tecnologia para o desenvolvimento da produção orgânica de alimentos, ações essas voltadas aos produtores, distribuidores e consumidores desses alimentos (BRASIL, 2004). A Coordenação de Agroecologia – COAGRE foi criada em 2005, com o objetivo de ser a unidade responsável pela implementação das ações previstas no Programa de Desenvolvimento da Agricultura Orgânica (FONSECA, 2009). Em junho de 2006, por meio da Portaria Interministerial (MAPA, MEC, MDA, MMA, MCT) nº 177/2006, foi instituída a Comissão Interministerial, com a finalidade de construir, aperfeiçoar e desenvolver políticas públicas para a inclusão e o incentivo à abordagem da agroecologia e de sistemas de produção orgânica nos diferentes níveis e modalidades de educação e ensino, bem como no contexto das práticas e movimentos sociais, do mundo do trabalho e das manifestações culturais (MAPA, 2006). Ainda coube a essa comissão, estimular e apoiar a constituição e o fortalecimento de fóruns e redes da e com a sociedade civil; propor mecanismos para viabilizar e estimular a formação dos quadros dos órgãos federais envolvidos e propor estratégias de articulação de programas, projetos e atividades desenvolvidos no âmbito dos órgãos federais envolvidos (MAPA, 2006). A Instrução Normativa nº 64/2008 (alterada pela IN nº 46/2011, que teve alterações pela IN nº 17/14), aprova o Regulamento Técnico para os Sistemas Orgânicos de Produção Animal e Vegetal, que estabelece as normas técnicas a serem seguidas por toda pessoa física ou jurídica responsável por unidades de produção em conversão ou por sistemas orgânicos de produção (MAPA, 2008). Os demais regulamentos específicos foram construídos, a partir de então, como: Extrativismo Sustentável Orgânico, aprovado pela INC MAPA-MMA nº 17/2009; Processamento, Armazenamento e Transporte de Produtos Orgânicos pela INC MAPA-MS nº 18/2009, alterada pela INC MAPA-MS nº 24/2011); Mecanismos de Controle e Informação da Qualidade Orgânica (IN MAPA nº 19/2009); Produção de Produtos Têxteis Orgânicos Derivados do Algodão (IN MAPA nº 23/2011); Sistemas Orgânicos de Produção Aquícola (INI nº 28/2011); Produção de Cogumelos Comestíveis Orgânicos (IN MAPA nº 37/2011); Produção de Sementes e Mudas em Sistemas Orgânicos de Produção (IN MAPA nº 38/2011) (MAPA, 2023). Em 2009, por meio do Decreto nº 6.913, foi criada a categoria de produtos 26 fitossanitários, com uso aprovado para a agricultura orgânica, decreto este que também acrescentou dispositivos ao Decreto nº 4.074/2002 (BRASIL, 2009). A Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) foi instituída em 2012, pelo Decreto nº 7.794, com o objetivo de integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica e de base agroecológica, contribuindo para o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida da população, por meio do uso sustentável dos recursos naturais e da oferta e consumo de alimentos saudáveis (BRASIL, 2012). Sua implementação foi realizada pela União, em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal e Municípios, organizações da sociedade civil e outras entidades privadas, tendo como instâncias de gestão, a Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica - CNAPO; e a Câmara Interministerial de Agroecologia e Produção Orgânica – CIAPO (BRASIL, 2012). Para facilitar a identificação dos produtos com certificação orgânica pelos consumidores, foi instituído, em 2014, através da IN nº 18 do MAPA, o selo único do Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica, que estabelece requisitos para a sua utilização (MAPA, 2014). A estrutura paritária da composição e as atribuições da Subcomissão Temática de Produção Orgânica (STPOrg) e das Comissões da Produção Orgânica nas Unidades da Federação (CPOrg-UF), composta por representantes do setor público e de entidades da sociedade civil, em 2015, estabelecida pela IN nº 13, ampliou o poder e a responsabilidade da sociedade no funcionamento e alcance dos objetivos das comissões (MAPA, 2015). Ainda, em termos de atualizações, seguiu o Decreto nº 9.784, de 2019, que revogou partes do decreto nº 7.794/2012, o que acabou com as instâncias de gestão da PNAPO. Com a extinção da CNAPO, restou somente a continuidade de algumas ações que estavam dentro dessa política para as quais existem outras obrigações legais a serem executadas. Já em 2023, o Decreto nº 11.397/2023 revigorou o Decreto nº 7.794/2012 (BRASIL, 2019; BRASIL, 2023). Partindo desta abordagem sobre a agricultura orgânica, a próxima seção descreve a produção orgânica no Estado de Mato Grosso, com o objetivo de contextualizar o tema no local em que foi abordado o estudo. 27 2.2 Produção orgânica no Estado de Mato Grosso O Estado de Mato Grosso, representado pelo Secretário de Trabalho e de Desenvolvimento Social Antônio Alberto Shommer, participou do II Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa, realizado em Petrópolis/RJ, no ano de 1984, e do protocolo de intenções na Carta de Petrópolis, que manifestava apoio para redirecionar a pesquisa, diagnosticar problemas ecotoxicológicos, elaborar legislação, criar instância de coordenação, criar um conselho interestadual de articulação e destinar meios e recursos necessários para o efetivo cumprimento das medidas propostas (EBAA, 1984). Em abril de 1987, a capital Cuiabá sediou o terceiro Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa, promovido pela Federação das Associações de Engenheiros Agrônomos do Brasil (FAEAB), Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB), Associação dos Engenheiros Agrônomos do Mato Grosso (AEAMT), Centro Acadêmico de Agronomia da Universidade Federal do Mato Grosso (CAAUFMT), contando com apoio da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Mato Grosso (EMATER -MT), Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e o Governo do Estado do Mato Grasso (EBBA, 1987). Os mais de três mil participantes do III EBBA foram às ruas de Cuiabá, expressar seu protesto contra projetos como o projeto nuclear da Serra do Cachimbo; o projeto Calha Norte; o projeto hidrelétrico na bacia do Rio Uruguai; o projeto hidrelétrico do Xingu; a destruição do Pantanal; a devastação Amazônica; a desertificação de áreas agrícolas; a contaminação generalizada do solo e da água por agrotóxicos; a expulsão e a morte dos índios; a expulsão dos seringueiros na Amazônia (EBBA, 1987). A FASE Mato Grosso atua no estado, desde 1987, na defesa dos bens comuns e dos direitos territoriais, promovendo a soberania, a segurança alimentar e nutricional, por meio da agroecologia, incentivando a organização de mulheres como sujeitos de direitos (FASE, 2023). O programa da FASE no Mato Grosso integra redes e fóruns como o GIAS (Grupo de Intercâmbio em Agroecologia de MT); ANA (Articulação Nacional de Agroecologia); Formad (Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento); FTSANES (Fórum territorial de segurança alimentar e nutricional e 28 economia solidaria); Comitê Popular em defesa do Rio Paraguai; FDHT (Fórum de Direitos Humanos e da Terra); Campanha Nacional em Defesa do Cerrado; Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida e Articulação Agro É Fogo (FASE, 2023). Em 2020, o Superintendente Federal da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no Estado de Mato Grosso, através da Portaria nº 02, aprovou o Regimento Interno da Comissão da Produção Orgânica de Mato Grosso (CPOrg/MT), que tem por objetivo definir sua composição de forma paritária por representantes do setor público e de entidades da sociedade civil (setor privado) de reconhecida atuação no âmbito da produção orgânica e de outras áreas afins (MATO GROSSO, 2020). O Estado de Mato Grosso é composto por 141 municípios, dos quais, 21 estão cadastrados no MAPA com produção orgânica. De acordo com o Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, o Estado de Mato Grosso conta com 246 produtores de orgânicos, distribuídos em escopos diferentes, conforme Quadro 1. Quadro 1 – Municípios produtores de orgânicos por escopo ESCOPO QUANTIDADE DE PRODUTOR POR MUNICÍPIO Extrativismo (Castanha do Brasil) 01 Aripuanã – 04 Juara – 61 Juína – 20 Juruena POA – Produtos de Origem Animal (mel) 01 Barra do Garças POV – Produtos de Origem Vegetal (spirulina) 02 Diamantino PPA – Produtos de Produção Animal (mel) 01 Barra do Garças PPV – Produto de Produção Vegetal (spirulina) 01 Diamantino PROCESSAMENTO (Castanha do Brasil) 02 Sinop – 01 Juína – 01 Juruena PROCESSAMENTO PRODUTOS ORIGEM VEGETAL (Olerícolas) 01 Várzea Grande PRODUÇÃO PRIMÁRIA ANIMAL (mel) 33 Feliz Natal – 32 Querência – 05 Marcelândia – 13 São Felix do Araguaia PRODUÇÃO PRIMÁRIA VEGETAL (olerícolas e frutas) 06 Alta Floresta – 02 Chapada dos Guimarães – 01 Cuiabá – 06 Mirassol D´Oeste – 04 Poconé – 19 Porto Esperidião – 06 Santo Antonio do Leveger – 03 São José do Quatro Marcos – 07 Sorriso – 01 Várzea Grande PRODUÇÃO PRIMÁRIA VEGETAL E ANIMAL (olerícolas, frutas, mel, leite e aves) 02 Alta Floresta – 05 Mirassol D´Oeste – 01 Poconé – 04 Santo Antonio do Leveger Fonte: Adaptado do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos (MAPA, 2022). Analisando os escopos apresentados, observa-se que dos 246 produtores cadastrados, 86 são extrativistas da castanha do Brasil; 83 são produtores de mel; 10 atuam no processo de diversos produtos e 67 produtores atuam na produção vegetal e ou na produção vegetal e animal. A produção vegetal tem uma representação de 55 produtores inscritos, enquanto a produção vegetal conjuntamente com a animal soma 29 uma quantidade de 12 produtores. A maioria desses produtores são assentados e povos indígenas, conforme indicam os aspectos regionais e históricos das localidades onde ocorre a maior concentração dos produtores orgânicos mato-grossenses. O extrativismo da castanha do Brasil advém, principalmente, dos municípios de Juruena e Juína, na macrorregião noroeste do estado, onde se encontram espécies vegetais características dessa região, que têm alto valor econômico, tanto para a comercialização da madeireira, como para o aproveitamento de produtos florestais não madeireiros, como a castanha do Brasil (CAMPOS, 2013). Esta região é ocupada por doze Terras Indígenas e sete Unidades de Conservação, onde habitam seis sociedades indígenas pertencentes a importantes grupos linguísticos-culturais: Aruak (Enawene-Nawe), Macro-Jê (Rikbaktsa), Tupi (Arara) e TupiMondé (Cinta-Larga, Suruí e Zoró), além de outros quatro grupos de índios isolados (CAMPOS, 2013). Além desses povos, existem na região duas comunidades de seringueiros, uma no rio Roosevelt e a outra no rio Guariba, habitantes da Reserva Extrativista Estadual Guariba - Roosevelt –, que ocupam uma área de 138 mil hectares. A região também é ocupada por 13 assentamentos de reforma agrária, totalizando cerca de 4.500 famílias, num total de mais de 22 mil pessoas (CAMPOS, 2013). Em Juruena, a atividade extrativista da castanha do Brasil ocorre através da Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer (COOPAVAM), em uma área de 7.200 hectares de Floresta Amazônica, com alto potencial para o extrativismo. A cooperativa trabalha com produtos da sociobiodiversidade, envolvendo agricultores familiares de assentamentos e aldeões de três Terras Indígenas. O Vale do Amanhecer é um dos poucos assentamentos do Mato Grosso que possui reserva legal comunitária bem conservada e com licença ambiental única aprovada na Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA) (COOPAVAM, 2023). A COOPAVAM possui uma rede de parceiros em suas atividades: INCRA, CONAB, MDA, GEF, PNUD, SEMA-MT, FUNAI, Sindicato de Trabalhadores Rurais de Juruena, Associação do Povo Indígena Cinta Larga de Aripuanã, Associação do Povo Indígena Caiaby, Instituto Munduruku, Associação do Povo Indígena Apiacá, Associação de Desenvolvimento Rural de Juruena, Associação de Mulheres Cantinho da Amazônia, Jasmine Alimentos Orgânicos, Frutos da Terra, NATURA Indústria de Cosméticos e diversas organizações (LIMA et.al, 2019). Ainda, conforme os autores, 30 as atividades da cooperativa, com características da economia solidária, beneficiam mais de 500 famílias coletoras de castanha. Em Juína, na década de 1970, as atividades madeireiras e de extração mineral trouxeram crescimento populacional para a cidade, mas, por outro lado, o desmatamento das florestas, que foi reduzido a partir de 2008, após o Decreto nº 6.321/07, alterado pelo Decreto nº 6514/2008, cuja finalidade era enfrentar o desmatamento ilegal da região amazônica (CAMPOS, 2013). Nesse contexto, surgiu a necessidade de repensar a atividade econômica, tornando-se a profissionalização da extração e do beneficiamento da castanha do Brasil, numa oportunidade para o desenvolvimento local, uma vez que, além de ser abundante no território, a extração favorece a sustentabilidade e a geração de renda (CAMPOS, 2013). A unidade processadora de castanha do Brasil Floresta em Pé, sediada em Juína, busca preservar o meio ambiente e a cultura das comunidades locais, por meio da compra de matéria-prima de florestas com origem de um extrativismo sustentável. Sua área é de aproximadamente 10.213ha, com mais de 3.865 castanheiras produtivamente ativas (FLORESTA EM PÉ, 2023). A produção primária de mel é realizada por povos indígenas da Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX), representante de 16 povos indígenas que vivem no Território Indígena do Xingu: Aweti, Ikpeng, Kalapalo, Kamaiurá, Kawaiweté, Kisêdjê, Kuikuro, Matipu, Mehinako, Nahukuá, Naruvotu, Tapayuna, Trumai, Wauja, Yawalapiti, Yudja (XINGU+, 2023). Desde sua fundação, em 1995, a ATIX assumiu o desafio da construção da autonomia multiétnica na gestão do território xinguano, localizado nas macrorregiões norte e nordeste do Estado de Mato Grosso. Ao longo de sua história, a associação busca trabalhar questões de interesse comum aos diferentes povos do Xingu, principalmente, a proteção e a fiscalização territorial (ATIX, 2023). A associação coordenou a construção do Protocolo de Consulta do Xingu e do Plano de Gestão do Xingu; atualmente, está trabalhando nas implementações. A ATIX, além de comercializar o mel dos índios do Xingu, é um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OPAC), desempenhando também a função de coordenar a certificação orgânica da produção (ATIX, 2023). O mel dos índios do Xingu foi o primeiro projeto indígena habilitado a acessar o Serviço de Inspeção Federal (SIF) do Ministério da Agricultura, imprescindível à 31 regularização e ao trânsito dos produtos de origem animal. Em 2003, obteve a certificação como orgânico pela Associação de Certificação Instituto Biodinâmico (IBD); em 2015, a ATIX tornou-se a primeira associação indígena certificadora de produção orgânica, e assim, foi inaugurado o primeiro Sistema Participativo de Garantia (SPG) exclusivamente indígena do mundo (XINGU+, 2023). O trabalho com o mel se consolidou como uma importante alternativa de geração de renda articulada com o modo de vida dos povos indígenas, com objetivo de organizar e assegurar a segurança alimentar dos povos e canalizar os excedentes das produções para um mercado formalizado, com responsabilidade social e ambiental (XINGU+, 2023). O projeto é uma das maiores referências quando se fala em alternativa de renda compatível com os povos da floresta, em 2017, a ATIX recebeu o Prêmio Equatorial, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), pelo trabalho pioneiro na autocertificação do mel, com um trabalho que envolve mais de 100 apicultores de 39 aldeias dos povos Kawaiwete, Yudja, Kîsêthjê e Ikpeng (XINGU+, 2023). A produção primária vegetal é encontrada em diversos locais do estado, com uma concentração maior nos municípios de Porto Esperidião, Mirassol D´Oeste e São José dos Quatro Marcos, localizados na macrorregião oeste do estado. Dos 55 produtores, 28 estão nesta região, e o município de Mirassol D´Oeste conta com mais de cinco produtores de produção primária e animal (MAPA, 2022). No município de Porto Esperidião, todos os produtores são exclusivamente de olerícolas e frutas, certificados pela Associação Niorsch Hauquina - Associação Produtiva Indígena Chiquitana (MAPA, 2022). Até o ano de 2017, residiam 1.200 índios Chiquitano na Terra Indígena Portal do Encantado, localizada no município de Porto Esperidião, que vivem da coleta, da caça, da pesca e da agricultura orgânica (NERY; SECCHI, 2017). Há, também, uma população de Chiquitanos urbanizados nas cidades de Porto Espiridião, Cáceres e Vila Bela da Santíssima Trindade, cujo número se desconhece (QUEIROZ; RIBEIRO, 2020). A expulsão do povo Chiquitano dos seus territórios tradicionais foi motivada pelo crescimento econômico do Estado de Mato Grosso, que visava ao capitalismo por meio da mineração, da modernização da pecuária e do avanço do agronegócio. Atualmente, vivem em uma área cercada por latifúndios e ambientes colonialistas, da sociedade dominante, representada pelos fazendeiros da região (QUEIROZ; 32 RIBEIRO, 2020). Com objetivo de fortalecer os ensinamentos dos seus antepassados, os chiquitanos investiram principalmente na agricultura, para conseguirem revitalizar e fortalecer todo o povo, dentro da aldeia. Em 2009, foi criada a Associação Niorsch Haukina (Semente Crioula), essa Associação Chiquitana sem fins lucrativos objetiva trabalhar com agricultura tradicional, sementes crioulas, cultura, educação, esporte e lazer; acolhe homens e mulheres, jovens e anciões, para fortalecer seu povo, inclusive, elaborando projetos para capacitações e formações (ANA, 2015). Os produtores dos municípios de Mirassol D´Oeste e de São José dos Quatro Marcos são certificados pela Associação Regional de Produtores Agroecológicos (ARPA), com sede no assentamento Roseli Nunes, no município de Mirassol D´Oeste (MAPA, 2022). O assentamento Roseli Nunes iniciou em 17 de março de 1997, na ocupação da fazenda Facão, por mais de 600 famílias vindas de diversas regiões, e em abril de 1998, foi assinado o contrato de comodato das áreas da Fazenda Santana, no município de São José dos Quatro Marcos, denominada Assentamento Florestan Fernandes, onde foram assentadas 155 famílias (ARAÚJO, 2015). A ARPA iniciou em 06 de setembro de 1997, a história da associação e a do assentamento Roseli Nunes são intrínsecas, desde o início da sua constituição, ela mantém parcerias com ONG´s de educação popular, como a FASE/MT, e seu quadro de associados é formado por agricultores e famílias que se desafiam no manejo de transição para a agricultura orgânica (SANTOS, 2015). Na macrorregião Centro-Sul, os municípios de Poconé, Santo Antônio do Leveger, Cuiabá, Várzea Grande e Chapada dos Guimarães compreendem produtos orgânicos de produção primária vegetal e animal. Em Poconé, as atividades da produção orgânica são oriundas da Horta Agroana e da Cooperativa dos Pequenos Produtores do Assentamento Agroana Girau – COOPERANGI (MAPA, 2023). O assentamento tem origem exatamente no nome das duas fazendas desapropriadas em 1997, Agroana e Girau, com a divisão dos 5.500 hectares em 172 lotes, de 25 ou 35 hectares, além de uma reserva de 700 hectares, e com o objetivo de promover o acesso e a integração dos moradores, o assentamento foi dividido em três núcleos: São João, São Pedro e Santo Antônio (PUGER et al., 2019). A fundação da Cooperativa dos Pequenos Produtores do Assentamento Agroana Girau – COOPERANGI, em 2003, foi motivada pelo interesse em participar 33 de políticas públicas voltadas à agricultura familiar, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), contudo, a produção com manejo orgânico iniciou após 10 anos de existência da cooperativa, em 2013 (PUGER et al., 2019). No município de Santo Antônio do Leveger, a certificação ocorre por meio da OCS Grupo Semeando – COOPAMSAL. A Cooperativa Agropecuária Mista de Santo Antônio de Leveger, fundada em 28 de abril de 2013 e localizada a 20 km da capital Cuiabá, conta com 32 cooperados cotistas e 30 associados não-cotistas. É uma cooperativa pequena, cuja gestão é feita por mulheres de comunidades tradicionais, que buscam uma renda para o seu sustento e o de suas famílias (EVANGELISTA; CASTRO, 2022). A COOPAMSAL desenvolve as seguintes ações: a organização da produção local para fins comercias, a organização do pessoal em feiras locais, curso de formação, visitas a outras entidades, participação em redes de cooperação, participação da subcomissão temática de produção orgânica – STPOrg, em fóruns de alimento da baixada cuiabana (EVANGELISTA; CASTRO, 2022). Os produtores dos municípios de Chapada dos Guimarães, Cuiabá e Várzea Grande são produtores individuais de olerícolas em hortas, certificados pela Certificadora Instituto Chão Vivo de Avaliação da Conformidade, e não participam de cooperativas, nem são oriundos de assentamentos ou de povos indígenas (MAPA, 2022). Outros municípios produtores primários de vegetal e animal são Alta Floresta, com seis produtores somente de vegetal e dois de vegetal e animal (mel); Sorriso, com sete produtores exclusivos de produção vegetal (MAPA, 2022). O município de Alta Floresta está localizado no norte do Estado, e dos seus oito produtores, apenas um possui certificação por certificadora, os demais utilizam a OCS Pedra do Índio e comercializam seus produtos na localidade e em cidades próximas como Carlinda e Paranaíta. Os produtores ficam localizados na comunidade de Nossa Senhora do Guadalupe, a 12 km da cidade, que é formada por aproximadamente 50 famílias, que compraram lotes de um hectare (ANDRADE; SOUZA; MACEDO, 2019). Em 2014, foi criada a Associação Guadalupe Agroecológica (AGuA), com o objetivo de possibilitar um espaço de mobilização social frente aos desafios da região de fronteira agrícola dominada pela pecuária extensiva e pelo agronegócio. A AGuA 34 é dividida em três diretorias: 1) executiva; 2) produção; 3) educação, cultura e saúde. Em feiras e espaços na cidade de Alta Floresta, as famílias comercializam seus produtos, dentre os quais destacam-se o café, o mel e hortaliças (SANTOS, 2021). Os produtores do município de Sorriso, localizado no médio-norte do Estado, são certificados pela OCS Associação de Produtores Orgânicos de Sorriso (APOS), constituída em 2017. Depois que os quatro produtores pioneiros receberam a declaração do MAPA, eles têm autorização para a venda direta de produtos orgânicos. A associação, formada por produtores, acadêmicos e técnicos, tem como objetivos a capacitação, a divulgação e a comercialização dos produtos, bem como aproximar o consumidor do agricultor familiar (CAT, 2023). Os produtores de Sorriso iniciaram suas atividades orgânicas por fazerem parte do projeto Agroecologia do Clube Amigos da Terra, o CAT Sorriso, seus participantes são pequenos agricultores dos assentamentos Jonas Pinheiro e Casulo. Todos recebem acompanhamento técnico e aprendem conceitos da agroecologia como a rotação de cultura, a compostagem, a adubação verde, iscas naturais, caldas alternativas e cobertura de solo, objetivam que os produtores avancem para sistemas mais produtivos e sustentáveis e potencializem os seus negócios (CAT, 2017). A produção orgânica no Estado de Mato Grosso se configura como um mercado em crescimento; porém, o cenário produtivo do estado não tem viabilizado a inserção de maiores incentivos à produção orgânica, pois não se identificam quaisquer políticas públicas estaduais de incentivo à expansão da produção orgânica, implantadas junto aos produtores levantados neste estudo, no estado (ANDRADE; SOUZA; MACEDO, 2019). A agricultura orgânica é considerada uma opção viável para a agricultura familiar, conforme defendem os autores Blace, Cuka e Siljkovic (2020) e Forster et al. (2013), assim partindo desta proposição, foi pesquisado o universo da agricultura familiar, definido no tema da tese. 2.3 Agricultura familiar A agricultura familiar pode ser definida a partir de características como a gestão da unidade produtiva e os investimentos realizados por pessoas com ligação de sangue ou matrimônio; ter a posse da propriedade e dos meios de produção; a maior parte do trabalho ser realizado por membros da família (MAIA, 2009). 35 De acordo com a Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006, regulamentada pelo Decreto nº 9.064, de 31 de maio de 2017, pode ser considerado como agricultor familiar aquele que pratica atividades no meio rural, sem deter qualquer título e área maior do que quatro módulos fiscais; que utiliza predominantemente mão de obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; o percentual mínimo da renda familiar advém de atividades do próprio estabelecimento ou empreendimento; a direção do estabelecimento está sob a responsabilidade da família (BRASIL, 2006; BRASIL, 2017). A partir da década de 1990, a agricultura familiar foi mais claramente definida, pois até então, não existia nenhuma política pública dirigida a suas necessidades e eram chamados de pequenos produtores, agricultores de baixa renda, agricultores de subsistência, agricultores familiares, entre outras denominações (GRISA; SCHNEIDER, 2015). Com o objetivo de fortalecer suas capacidades institucionais, produtivas e comerciais, um conjunto de políticas e iniciativas começam a ser implantadas para esse grupo de produtores, como a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), em 1996, o principal programa do governo federal, que apoia o desenvolvimento rural sustentável e busca a garantia da segurança alimentar (MULLER, 2010). O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), criado em 2003, e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), a partir da Lei nº 11.947/2009, são outras importantes iniciativas implementadas pelo governo federal, que buscam estimular e fortalecer a agricultura familiar, através de compras institucionais (MULLER, 2010). O Pronaf, criado em 1995, foi instituído por meio do decreto nº 1.946, de 28 de junho de 1996, mas foi revogado diversas vezes, atualmente, foi incorporado pelo decreto nº 9.784, de 07 de maio de 2019. Esse programa tem como objetivo o fortalecimento e a integração do produtor à cadeia dos agronegócios, proporcionando renda e agregando valor ao produto, com prioridade para a modernização do sistema produtivo e a profissionalização dos produtores familiares (SABOURIN, 2017). O Crédito Rural do Pronaf, nas últimas cinco safras, passou por uma significativa expansão: na safra 2018/19, foram destinados 27 bilhões de reais; nas safras de 2019/20 e de 2020/21, o valor subiu para 31,22 e 33 bilhões, respectivamente; na safra de 2021/22, o aumento foi de mais de 19%, com um montante de 39,34 bilhões destinados à agricultura familiar, através do Pronaf (MAPA, 36 2022). Mecanismos de proteção e de garantia de renda, de produção e de financiamentos foram desenvolvidos em conjunto com o Pronaf, como, por exemplo, o Seguro da Agricultura Familiar (SEAF), o Garantia Safra e o Programa de Garantia de Preços da Agricultura Familiar (PGPAF). Além disso, foi recuperada e reorientada a assistência técnica, por meio da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER), que, em 2010, cobria aproximadamente dois milhões de agricultores familiares (SABOURIN, 2017). O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), criado pelo art. 19 da Lei nº 10.696, de 02 de julho de 2003, no âmbito do Programa Fome Zero, permite que as compras públicas sejam realizadas diretamente com os agricultores familiares, sem necessidade de licitação. Esta Lei foi alterada pela Lei nº 12.512, de 14 de outubro de 2011, e regulamentada por diversos decretos. O que está em vigência é o Decreto nº 7.775, de 4 de julho de 2012, cuja finalidade é o acesso à alimentação e o incentivo à agricultura familiar (BRASIL, 2003; BRASIL, 2011; BRASIL, 2012). Os alimentos adquiridos pelo programa PAA são destinados a entidades da rede socioassistencial, a famílias em situação de vulnerabilidade social, à formação de cestas de alimentos distribuídas a grupos populacionais específicos e ao mercado institucional de alimentos, promovendo o abastecimento alimentar, por meio de compras governamentais de alimentos. O Programa fortalece circuitos locais e regionais e redes de comercialização; valoriza a biodiversidade e a produção orgânica e agroecológica de alimentos; incentiva hábitos alimentares saudáveis e estimula o cooperativismo e o associativismo (MINISTÉRIO DA CIDADANIA, 2021). A execução do programa PAA pode ser feita por meio de seis modalidades: compra com doação simultânea; compra direta; apoio à formação de estoques; incentivo à produção e ao consumo de leite; compra institucional e aquisição de sementes. O programa vem sendo executado por estados e municípios, em parceria com o Ministério da Cidadania e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) (MINISTÉRIO DA CIDADANIA, 2021). O programa PAA aproximou a agricultura familiar do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). O PNAE ocorre por meio da transferência de recursos financeiros aos estados, municípios e Distrito Federal, para a aquisição de alimentação escolar para os alunos de educação básica (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos), matriculados em escolas 37 públicas, filantrópicas e comunitárias. A Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009, garante que 30% do valor repassado ao programa deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar, essa medida estimula o desenvolvimento econômico sustentável das comunidades (FNDE, 2021). Os agricultores familiares que pretendem vender para o programa PNAE devem possuir a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), física ou jurídica, de acordo com o art. 35 da Resolução CD/FNDE nº 06/2020: no caso de DAP Física - entende- se por local, o município indicado na DAP; no caso de DAP Jurídica - entende-se por local o município onde houver a maior quantidade, em números absolutos, de DAP’s Físicas registradas, no extrato da DAP Jurídica (FNDE, 2021). O PAA e o PNAE possibilitam que o governo compre diretamente dos produtores da agricultura familiar, desde que os preços sejam compatíveis com o mercado local e os produtos atendam às exigências de qualidade, sem uso de intermediários e com a dispensa de licitação, assim os produtores familiares têm acesso ao mercado e à regulação de preço, sem competição direta com as grandes empresas (CAMARGO; BACCARIN; SILVA, 2016). O PNAE foi vinculado à agricultura familiar com o objetivo de melhorar a qualidade da alimentação escolar, com o fornecimento de alimentos frescos e regionais, mesmo sem ser esse o intuito, o programa promoveu a comercialização dos produtos em circuitos locais, fortalecendo o desenvolvimento local através da agricultura familiar (CAMARGO; BACCARIN; SILVA, 2016). As políticas agrícolas para a agricultura familiar desencadeadas pelo Pronaf resultaram fundamentalmente de proposições e de negociações entre gestores públicos e representantes da agricultura familiar, que, a partir de 2003, asseguraram mais um canal de diálogo com o governo federal, para a definição dos Planos Safra da Agricultura Familiar (GRISA; SCHNEIDER, 2015). A prática da agricultura orgânica é vista como uma alternativa eficiente para a agricultura familiar, conforme BLACE, CUKA E SILJKOVIC (2020) argumentam que o cultivo agrícola orgânico, melhora os meios de subsistência do pequeno produtor, devido à redução da aquisição de insumos externos e o preço de comercialização dos produtos acima do praticado no mercado convencional. Forster et al. (2013) acrescentam ainda a esta combinação, que o manejo do cultivo agrícola envolve tecnologias de baixo custo e conservação ambiental. Perante estas argumentações a pesquisa versou buscando analisar o 38 desempenho do sistema agrícola orgânico em propriedades da agricultura familiar no Estado de Mato Grosso, no âmbito social, financeiro e econômico, e para essa investigação foram desenvolvidas as seções 2.4 e 2.5. 2.4 Desempenho econômico e financeiro Esta tese abre uma discussão sobre a agricultura orgânica praticada por pequenos produtores, nas dimensões social, econômica e financeira, que interferem na continuidade dos sistemas produtivos conforme discorrem Ramankutty et al. (2019), assim, a decisão de continuidade depende da viabilidade desta atividade. Para investigar a viabilidade das unidades agrícolas da agricultura familiar no cultivo orgânico, desenvolve-se esta seção sobre o desempenho econômico e financeiro. 2.4.1 Controle gerencial O conhecimento das condições de mercado e dos recursos naturais dá ao produtor rural os elementos básicos para o desenvolvimento da sua atividade econômica, cabe a ele agora decidir o que, o quanto e como produzir, bem como controlar a ação após iniciar a atividade e, por último, avaliar os resultados alcançados e compará-los com os previstos inicialmente (CREPALDI, 2019). O controle gerencial é o conjunto de atividades que facilita aos produtores rurais a tomada de decisões, no nível de sua unidade de produção, ou seja, a empresa agrícola tem o intuito de obter o melhor resultado econômico, mantendo a produtividade da terra, sob esse enfoque do controle, a segregação de funções cria independência entre a execução operacional, a custódia de bens patrimoniais e a respectiva contabilização (NAKAO, 2017). A filosofia de fazenda-empresa baseia-se numa gerência moderna e eficiente, onde dentro da administração geral de uma Empresa Rural, a gerência corresponde ao coração de todo o sistema, e tem a responsabilidade de funcionamento de toda a máquina produtiva, pois o controle gerencial está relacionado com as atividades definidas sobre decisões a respeito do que deve ser realizado dentro das restrições gerais das estratégias (ANTHONY; GOVINDARAJAN, 2011). A gestão das propriedades rurais é focalizada geralmente nos fatores do trabalho agrícola, zootécnico e agroindustrial, concentrando técnicas de produção e 39 conceitos operacionais das atividades específicas desenvolvidas (CREPALDI, 2019). A atualização dos meios de gerenciamento das propriedades rurais é uma necessidade fundamental para alcançar resultados de produção e de produtividade que garantam o sucesso do empreendimento (CREPALDI, 2019). As atividades administrativas são classificadas nas seguintes categorias (NAKAO, 2017): a) a operacional – relacionada às ações que propiciam o alcance dos objetivos da entidade; b) a contábil – relacionada à veracidade e à fidedignidade dos registros e das demonstrações contábeis; e c) a normativa – relacionada à observância da regulamentação pertinente. A administração de um empreendimento envolve práticas e habilidades que permitem o uso adequado dos recursos disponíveis e a gestão de riscos para a tomada de decisão, mesmo diante da importância de utilizar as ferramentas da administração na gestão de um empreendimento, Crepaldi (2019) enfatiza ser justamente nesse aspecto que a empresa rural brasileira apresenta uma de suas mais visíveis carências. A administração rural no Brasil ainda se desenvolve dentro de critérios bastante tradicionais ou com um padrão de desempenho inaceitável, o que não é uma característica apenas de pequenas propriedades rurais, o setor rural é caracterizado principalmente pela instabilidade e pelos riscos de fatores climáticos, do mercado e da variação dos preços dos produtos e insumos (MARION, 2020). O controle e o acompanhamento da propriedade rural têm como objetivo auxiliar na aplicação de estratégias que possibilitem resultados rentáveis e contínuos (CREPALDI, 2019). A contabilidade é um dos principais sistemas de controle e de informação das empresas, e com a análise do Balanço Patrimonial e da Demonstração do Resultado do Exercício, é possível verificar a situação da empresa, como análises de: estrutura, de solvência; de garantia de capitais próprios e de terceiros e; de retorno de investimentos. Os relatórios contábil-financeiros representam um fenômeno econômico em palavras e números, e foram utilizados para analisar o desempenho econômico e financeiro das unidades agrícolas participantes desta pesquisa. 40 2.4.2 Balanço Patrimonial O desenvolvimento das atividades produtivas e de investimentos em infraestrutura na propriedade rural utiliza recursos financeiros que podem ser oriundos de fontes próprias (reinvestimento dos lucros ou sobras) e ou externas (financiamentos ou empréstimos bancários) (LOURENZANI, 2006). A administração dos recursos financeiros em uma propriedade rural tem como objetivo avaliar a viabilidade dos investimentos produtivos, considerando os recursos disponíveis (SANTOS; MARION; SEGATTI, 2009). O balanço patrimonial é a organização sistemática de tudo que é “possuído” e “devido” por uma empresa ou pessoa em um dado momento (KAY; EDWARDS, 2014). Por meio de contas demonstradas no balanço patrimonial, é possível conhecer a situação econômica e financeira de uma empresa (MARION, 2020). O balanço compõe-se de três partes essenciais: ativo, passivo e patrimônio líquido. Cada uma dessas partes apresenta suas diversas contas classificadas em “grupos”, os quais, por sua vez, são dispostos em ordem decrescente de grau de liquidez para o ativo e em ordem decrescente de exigibilidade para o passivo (ASSAF NETO, 2023). No ativo, relacionam-se todas as aplicações de recursos efetuadas pela em- presa, e esses recursos podem estar distribuídos em ativos circulantes, assim de- nominados por apresentarem alta rotação, como valores em caixa, valores a receber a curto prazo, etc.; e ativos não circulantes, que possuem os seguintes grupos de contas: realizável a longo prazo, investimentos, imobilizado e intangível (MARION, 2020). Somente compõem o ativo de uma entidade, os itens que prometem a geração de benefícios econômicos futuros, por exemplo, bens nos quais não se visualiza nenhum comprador potencial no mercado e que não possam representar um benefício para a empresa não são classificados no ativo, nesse conceito, a essência econômica prevalece sobre a forma jurídica (MARION, 2020). O passivo identifica as exigibilidades e obrigações da empresa, cujos valores encontram-se investidos nos ativos, esses recursos dos passivos são classificados como curto e longo prazo, sendo definidos, respectivamente, por passivo circulante e passivo não circulante, assim o passivo é composto de todas as obrigações atuais da entidade, geradas por eventos ocorridos no passado, cuja liquidação futura exigirá um 41 desembolso de caixa da empresa (PADOVEZE, 2010). O patrimônio líquido é representado pela diferença entre o total do Ativo e do Passivo em determinado momento, identificando os recursos próprios da empresa, é formado pelo capital investido pelos acionistas (ou sócios), mais os lucros gerados nos exercícios e que foram retidos na empresa (lucros não distribuídos) (ASSAF NETO, 2023). O patrimônio líquido é constituído por Capital Social, Reservas de Capital, Ajustes de Avaliação Patrimonial, Reservas de Lucros, Ações em Tesouraria e Prejuízos Acumulados (PADOVEZE, 2010). 2.4.3 Demonstração do Resultado do Exercício As informações a respeito das receitas e das despesas da propriedade rural devem ser identificadas, analisadas e interpretadas para facilitar a escolha entre alternativas de produção mais viáveis (SANTOS; MARION; SEGATTI, 2009). A DRE indica como a empresa gerou lucro ou prejuízo, ela é apresentada de forma dedutiva, iniciando pelas receitas e delas deduzindo os custos e despesas, até chegar ao resultado do exercício, se o cálculo final resultar em valor positivo, será lucro líquido, porém se resultar em valor negativo, será prejuízo líquido (HOJI; LUZ, 2019). A demonstração de resultados do exercício (DRE) visa fornecer, de maneira esquematizada, os resultados (lucro ou prejuízo) auferidos pela empresa em de- terminado exercício social, os quais são transferidos para contas do patrimônio líquido. O lucro (ou prejuízo) é resultante de receitas, custos e despesas da empresa no período e apropriados segundo o regime de competência, ou seja, independentemente de que tenham sido esses valores pagos ou recebidos (ASSAF NETO, 2023). Os relatórios contábeis podem ser analisados, além da técnica de análise vertical, por índices como o apresentado na próxima seção, e são utilizados para avaliar o desempenho financeiro e econômico. 2.4.4 Análise Econômica e Financeira Uma propriedade rural pode ter lucro, mas não dispor de dinheiro para saldar compromissos com os credores, uma vez que pode apresentar uma excelente 42 situação econômica em termos de posse de imóveis, maquinários, equipamentos, entre outros, mas ter deficiências na entrada e na saída de dinheiro no caixa (CREPALDI, 2019). Nas propriedades rurais, também podem ocorrer resultados negativos, para evitá-los, a gestão deve manifestar-se por meio da tomada de decisões racionais (OLIVEIRA, 2015). O conhecimento do negócio é imprescindível para o processo de tomada de decisões, nesse sentido, o uso de ferramentas para verificar o desempenho econômico e financeiro auxilia os agricultores no processo de gestão da propriedade rural (BATALHA; SILVA, 2014). Para a elaboração do estudo do desempenho de uma propriedade rural, faz-se a análise econômica e financeira por meio de indicadores (CREPALDI, 2019). A análise consiste em calcular indicadores financeiros e econômicos, que são valores quantitativos, os resultados são utilizados para identificar a situação e o desempenho da propriedade rural (BATALHA; SILVA, 2014). As demonstrações contábeis Balanço Patrimonial (BP) e Demonstração de Resultado do Exercício (DRE), permitem compreender as transações empresariais e analisar a situação financeira e econômica, bem como o desempenho das empresas (HOJI; LUZ, 2019). A análise econômica refere-se à solidez da empresa, representada pelo patrimônio líquido, enquanto a análise financeira zela pela capacidade de pagamento da empresa como forma de saldar as dívidas (HOJI; LUZ, 2019). A análise financeira é uma ferramenta de avaliação do contexto operacional e estratégico, que trata da movimentação dos valores monetários, da situação financeira de uma empresa e remete exclusivamente à sua liquidez, à sua movimentação de caixa e à sua capacidade de gerar dinheiro para saldar seus compromissos (CREPALDI, 2019). Os índices de estrutura de capital e liquidez evidenciam a situação financeira da empresa. Os Índices de Estrutura de Capital buscam demonstrar como a empresa está estruturada, conforme a relação entre o capital próprio (Patrimônio Líquido) e o capital de terceiros (Passivo Exigível), ou seja, seu endividamento. Os índices, Participação de Capital de Terceiros, Composição do Endividamento, Imobilização do Patrimônio Líquido e Imobilização dos Recursos Não Correntes, são utilizados para a análise da estrutura patrimonial, estabelecendo relações entre as fontes de financiamento próprio e de terceiros, visando evidenciar a dependência da entidade em relação aos recursos de terceiros (Martins; Diniz; Miranda, 2020); (Marion, 2020): 43 • O índice de Participação de Capitais de Terceiros busca indicar quanto representa o capital tomado de terceiros em relação ao capital próprio investido pelas unidades agrícolas. A fórmula de cálculo é: Participação de Capitais de Terceiros = (Capital de Terceiros / Patrimônio Líquido) x 100 (1) Caso o resultado obtido seja maior do que 100%, a participação do capital de terceiros indica que a empresa possui mais capital de terceiros do que capital próprio. • O índice da Composição do Endividamento identifica a relação entre o capital de terceiros de curto prazo (Passivo Circulante) e o Capital de Terceiros (Passivo Circulante + Passivo Não Circulante). A fórmula de cálculo é: Composição do Endividamento = (Passivo Circulante / Capital de Terceiros) x 100 (2) Dentro do quadro de endividamento, é recomendável que as dívidas estejam mais concentradas no longo prazo. • O investimento em ativos de baixa liquidez (imobilizado, investimentos e intangíveis) pelas unidades agrícolas, foi investigado através do índice de Imobilização do Patrimônio Líquido. A fórmula de cálculo é: Imobilização do Patrimônio Líquido = (Ativo Permanente / Patrimônio Líquido) x 100 (3) • O índice de Imobilização dos Recursos Não Correntes amplia as constatações do índice de imobilização do patrimônio líquido, pois analisa o quanto dos recursos de longo prazo está imobilizado. A fórmula de cálculo é: Imobilização dos Recursos Não Correntes = (Ativo Permanente / Patrimônio Líquido + Passivo não Circulante) x 100 (4) Os Índices de Liquidez são utilizados para avaliar a capacidade de pagamento da empresa, isto é, constituem uma apreciação sobre se a empresa tem capacidade para saldar seus compromissos. Essa capacidade de pagamento pode ser avaliada, considerando o longo prazo, o curto prazo ou o prazo imediato (MARION, 2020). Os índices, Liquidez Imediata, Liquidez Seca, Liquidez Corrente e Liquidez Geral são utilizados para avaliar a capacidade de pagamento da empresa (ASSAF NETO, 2023). • Liquidez Imediata indica a capacidade de pagamento de todas as obrigações de curto prazo com os recursos que estão imediatamente 44 disponíveis, formados essencialmente por caixa, bancos e investimentos de curtíssimo prazo. A fórmula de cálculo é: Liquidez Imediata = Disponível / Passivo Circulante (5) • Liquidez Seca representa o quanto as unidades agrícolas possuem das contas do disponível e valores a receber, sem considerar a venda dos estoques, em condições da capacidade de pagamento. A fórmula de cálculo é: Liquidez Seca = Ativo Circulante – Estoque – Despesa Antecipada / Passivo Circulante (6) • Liquidez Corrente demonstra a capacidade de geração de recursos para o pagamento das dívidas da empresa no curto prazo (até o final do próximo período corrente), ou seja, para cada R$ 1,00 de dívida, quanto a empresa possui disponível para quitá-la. A fórmula de cálculo é: Liquidez Corrente = Ativo Circulante / Passivo Circulante (7) • Liquidez Geral das unidades agrícolas demonstra a capacidade de pagamento das dívidas no curto e no longo prazo. A fórmula de cálculo é: Liquidez Geral = Ativo Circulante + Realizável a longo prazo / Passivo Circulante + Passivo Não Circulante (8) Nesses indicadores, quanto maior o resultado da liquidez, melhor para a empresa, que possui recursos para pagar suas dívidas. O resultado maior que 1 é positivo; igual a 1, nulo; menor que 1 é negativo (MARION, 2020). O objetivo da análise econômica é auxiliar o processo de tomada de decisões da propriedade rural, transformando os dados em informações que possibilitem ao agricultor verificar a capacidade da empresa de gerar ou não lucros e honrar com seus compromissos financeiros (CREPALDI, 2019). A situação econômica de uma Empresa Rural diz respeito à sua variação patrimonial, ao lucro, caso essa variação for a maior, ou ao prejuízo, caso o patrimônio estiver descrevendo uma curva decrescente (CREPALDI, 2019). Os índices de rentabilidade, com frequência, relacionam os resultados obtidos pela empresa com algum valor que expresse a dimensão relativa do mesmo, ou seja, valor de vendas, ativo total, patrimônio líquido ou ativo operacional (ASSAF NETO, 2023). 45 Dessa forma, torna-se mais visível o desempenho econômico da entidade, independentemente do seu tamanho. Taxa de Retorno de Investimento, Taxa de Retorno do Patrimônio Líquido, Margem do Lucro Bruto e Líquido são alguns índices utilizados na mensuração da rentabilidade da empresa. • A Taxa de Retorno de Investimento demonstra uma proporção entre o lucro obtido e os investimentos realizados. Para cada R$ 100,00 investidos na empresa, o lucro será de um determinado percentual (MARION, 2020). A fórmula de cálculo da rentabilidade do ativo é: Taxa de Retorno de Investimento = (Lucro Líquido / Ativo) x 100 (9) • A Taxa de Rentabilidade do Patrimônio Líquido calcula que, para cada R$ 100,00 investidos pelos sócios na empresa, podemos observar o lucro obtido com um percentual deste valor (MARION, 2020). A fórmula de cálculo da rentabilidade do patrimônio líquido é: Taxa de Rentabilidade do Patrimônio Líquido = (Lucro Líquido / Patrimônio Líquido) x 100 (10) • As Margens do Lucro Líquido e Bruto são calculadas para verificar a lucratividade das vendas, indicando o quanto, em média, obtiveram de lucro na venda de suas mercadorias. A fórmula de cálculo é: Margem Lucro Líquido = (Lucro Líquido / Vendas) x 100 (11) Buscando a proporção entre as vendas e os investimentos, é calculado o índice de giro do ativo, que segundo Assaf Neto (2023), quanto maior for o valor encontrado para esse índice, melhor será para a empresa. 2.5 Desempenho socioeconômico O trabalho é a condição da existência humana, pois, por meio dele, o ser humano (ou humanidade) obtém alimento, sustento, casa e tudo o que for necessário para subsistir e prosperar, quer seja no sentido econômico, intelectual e cultural, seja nas relações com seus pares, e para viabilizar o emprego do trabalho, é necessário o meio físico para aplicar seu esforço, bem como necessita-se de condições físicas (saúde) para realizá-lo com eficiência (GALANTE, 2016). A conquista do bem-estar e o manejo do estresse são contemplados na análise de seis aspectos, representado no “Hexágono Vital”, que descreve o estilo de vida 46 integralmente saudável em seis pontos (KERTESZ, 2013): a) Alimentação (consumir o saudável e o necessário e eliminar o tóxico); b) Atividade física regular; c) Tempo de repouso adequado; d) Espaço para lazer e diversão, hobbies, preferencialmente, ativos; e) Trabalho que permita a realização; f) Inserção num grupo social (de apoio) e assertividade social. A Qualidade de Vida (QV) é um termo de complexa conceituação, pois inúmeros cientistas, filósofos, políticos e especialistas de áreas diferentes tentam estabelecer um consenso em relação a esse conceito (DINIZ, 2013). O fato que reforça seu valor é que o conceito de QV é tão antigo como a Grécia, de Aristóteles, que já tratava do assunto no século IV a.C., e tão atual quanto o processo de desenvolvimento tecnológico (CONSTANTINO, 2007). O Grupo de QV da Organização Mundial de Saúde define-a como a percepção do indivíduo da sua posição na vida, no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais ele vive, em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (WHOQOL GROUP, 1995). O termo QV é utilizado por profissionais do contexto da pesquisa científica em diferentes campos do saber, como na medicina, na enfermagem, na psicologia, no serviço social, na economia, na sociologia, na educação, na odontologia, no marketing, por gestores organizacionais e motivacionais e gestores ambientalistas, com diversificados enfoques, quando se investiga e se pratica QV (FRANÇA, 2012). Ainda, conforme a autora, esse constructo permite diferentes objetivos, práticas e perspectivas como a econômica, a demográfica, a antropológica, a bioética e, mais recentemente, a ambiental e a da saúde pública. Deve-se destacar, entretanto, um denominador comum para quem tem como objetivo geral a Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS) ou a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT): considerar, nas avaliações e práticas específicas de cada área, a influência da percepção do indivíduo em relação aos aspectos biopsicossociais presentes, tornando esse construto multidimensional e subjetivo (DINIZ, 2013). Quanto mais saudáveis os colaboradores estiverem no ambiente de trabalho e fora dele, maiores e mais consistentes serão as perspectivas de êxito do empreendimento no seu mercado de atuação (DINIZ, 2013). O contexto ocupacional passou a inserir programas de Qualidade de Vida no trabalho QVT, como parte de ações estratégicas para alcançar produtividade, saúde do trabalhador, clima organizacional efetivo e menos custos (FERREIRA, 2017). 47 A QVT teve sua origem associada ao surgimento da abordagem sociotécnica, pelos idos de 1950, contudo, em 1960, passou a ter maior foco de atenção, pois ocorreram iniciativas de cientistas sociais, líderes sindicais, empresários e governantes, em busca de melhores formas de organizar o trabalho, a fim de minimizar os efeitos negativos do emprego na saúde e no bem-estar geral dos trabalhadores (FERREIRA, 2017). Na década de 1970, o professor Louis Davis, ampliando seu trabalho sobre o projeto de delineamento de cargos, introduziu publicamente o conceito de QVT (FERREIRA, 2017). A QVT tem como objetivo principal a busca do equilíbrio psíquico, físico e social dos empregados, dentro do contexto organizacional, considerando as pessoas como seres integrados nessas três dimensões, através de ações que impactem o aumento da produtividade e a melhoria da imagem da empresa, tanto no contexto interno, quanto no externo, a fim de atingir o crescimento pessoal e organizacional (ARELLANO, 2017). A QVT busca uma visão integral e ética do ser humano no seu relacionamento com as organizações. Ela tem sido utilizada como indicador das experiências humanas no local de trabalho e do grau de satisfação das pessoas que desempenham o trabalho. O conceito de QVT implica profundo respeito pelas pessoas e representa o grau da capacidade dos membros da organização de satisfazerem suas necessidades pessoais, por meio do seu trabalho na organização e de se sentirem satisfeitos e felizes (CHIAVENATO, 2020). A produtividade e a competitividade da organização podem ser afetadas pela qualidade de vida no trabalho. A satisfação no trabalho eleva sua motivação e seu comprometimento para realizar suas funções laborais. Não faz sentido falar em qualidade do produto, sem considerar a qualidade do ambiente de trabalho (FERREIRA, 2017). 48 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Neste capítulo, são apresentados os procedimentos metodológicos utilizados para definir o tipo de pesquisa, a caracterização espacial da área de estudo e o método utilizado. Também é abordada a forma como ocorreu a coleta e o tratamento de dados ao longo do desenvolvimento da pesquisa. 3.1 Tipificação da pesquisa A pesquisa, quanto à abordagem do problema, caracteriza-se como qualiquantitativa, pois investigou-se em maior profundidade a situação socioeconômica, econômica e financeira do grupo de produtores da agricultura familiar, que cultivam alimentos orgânicos, analisando a opinião não de um agricultor, mas de um grupo de agricultores. Além disso, na abordagem quantitativa foram interpretados, discutidos e correlacionados os dados obtidos estatisticamente, com o intuito de conhecer em profundidade e avaliar o grupo pesquisado (MICHEL, 2015). A classificação da pesquisa, quanto ao objetivo geral, é descritiva, já que o objetivo foi descrever as características das unidades agrícolas, dos agricultores e familiares, sem interferir no ambiente, bem como, explicar os fenômenos relacionados com as unidades de análise (MARCONI; LAKATOS, 2017). Os procedimentos técnicos vincularam-se ao levantamento (survey), com interrogação direta aos agricultores pesquisados (GIL, 2018), por meio de entrevistas estruturadas, justificada pelo propósito de coletar as informações acerca dos agricultores e familiares no que tange aos aspectos socioeconômico, e às unidades 49 agrícolas quanto aos aspectos econômico e financeiro (CRESWEL, 2010). A pesquisa foi desenvolvida por meio do procedimento técnico survey, com coleta de dados e informações a partir de características e opiniões do grupo de agricultores familiar da produção primária vegetal pe