UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI - UNIVATES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO E DOUTORADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE CIÊNCIAS EXATAS O ENSINO DE HISTÓRIA DAS CIÊNCIAS EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DE UMA INSTITUIÇÃO FEDERAL DO SERTÃO PERNAMBUCANO Mônica Dias de Souza Almeida Lajeado, dezembro de 2020 Mônica Dias de Souza Almeida O ENSINO DE HISTÓRIA DAS CIÊNCIAS EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DE UMA INSTITUIÇÃO FEDERAL DO SERTÃO PERNAMBUCANO Dissertação submetida ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu, Mestrado e Doutorado Profissional em Ensino de Ciências Exatas, da Universidade do Vale do Taquari – Univates, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre. Orientadora: Profa. Dra. Eniz Conceição Oliveira Lajeado, dezembro de 2020 Mônica Dias de Souza Almeida O ENSINO DE HISTÓRIA DAS CIÊNCIAS EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA DE UMA INSTITUIÇÃO FEDERAL DO SERTÃO PERNAMBUCANO A Banca Examinadora abaixo aprova a Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu, Mestrado e Doutorado em Ensino de Ciências Exatas, da Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES, como parte da exigência para a obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências Exatas. Profa. Dra. Eniz Conceição Oliveira - Orientadora Universidade do Vale do Taquari - Univates Prof. Dr. Marcelo Franco Leão IF Mato Grosso Prof. Dr. Rogério José Schuck Universidade do Vale do Taquari - Univates Prof. Dr. José Cláudio Del Pino Universidade do Vale do Taquari - Univates Lajeado, 17 de dezembro de 2020 AGRADECIMENTOS O Mestrado em Ensino de Ciências foi um sonho que pude, enfim, realizar por considerá-lo fundamental à minha formação. Assim, agradeço: Primeiramente a Deus, por ter me possibilitado chegar até o final, sempre colocando no meu caminho as pessoas certas. Ao meu amado esposo, Luis Carlos Pita de Almeida, pela dedicação à nossa família. Aos meus queridos filhos, Lais, Lívia e Edgar José, que diziam estar aproveitando ao máximo minha ausência para “aprontar” tudo que eu não permitiria. Aos meus pais, Maria Dias e José Rodrigues, por terem me proporcionado educação básica escolar, mas também os ensinamentos do respeito, educação e caráter. Aos meus amigos de mestrado do PPGECE 2019, turma maravilhosa! Muito obrigada pelos momentos de produção e diversão, Denise, Kafú, Carlos, Colari, Paulo e os demais. Às minhas amigas, Danielle, Kamilla e Socorro Freitas, pela força, coragem e ajuda. Aos meus alunos que cursaram a disciplina de História das Ciências do semestre 2020.1, por participarem ativamente da minha pesquisa, sempre dispostos a mergulhar comigo na História das Ciências. 4 À minha querida orientadora, Dra. Eniz Conceição Oliveira, pela compreensão e sabedoria em conduzir as orientações e por ser sempre humana. Por fim, àqueles que não estão citados aqui, mas contribuíram para a conclusão deste trabalho. RESUMO Compreender minimamente a Ciência é saber que o conhecimento cientifico demanda um caminhar, um processo; portanto, não nasce pronto; é construído no decorrer de anos, décadas ou mesmo séculos e de forma não vertical. Compreender esse processo e enxergá-lo no nosso cotidiano é ser alfabetizado cientificamente. Assim, essa dissertação teve como objetivo promover ações pedagógicas visando levar os alunos a reconhecerem a importância do estudo da História das Ciências e da Alfabetização Científica na formação inicial de professores de Química. A temática abordada foi referendada com os estudos de Chassot (2018, 2004, 2003), Gil Pérez e et. al (2001), Sasseron e Carvalho (2011), Sasseron e Machado (2017), Carvalho e Gil Pérez (2011), entre outros. Como procedimento metodológico, optou-se pela abordagem qualitativa, na modalidade estudo de caso. Os sujeitos participantes da pesquisa foram 24 (vinte e quatro) alunos matriculados na disciplina de História das Ciências, Curso de Licenciatura em Química do IF Sertão Pernambucano no semestre 2019.2. Como técnicas de investigação e coleta de dados, foram utilizados: mapa mental, nuvem de palavras, formulário eletrônico, elaboração de uma cartilha e diário de campo. Como procedimento de análise dos dados, foi feita uma aproximação com os pressupostos da técnica de análise de conteúdo, em que as informações obtidas foram categorizadas e chegamos a três categorias: a importância da HC para o futuro professor conhecer como se deu a evolução da Ciência ao longo da história, AC como apropriação do conhecimento científico e como habilidade de criticar e solucionar problemas do dia a dia e HC como possibilidade de facilitar a AC. Os resultados evidenciam que os alunos compreenderam a importância do estudo da História das Ciências, mas que não conheciam o termo Alfabetização Científica. Em relação à elaboração da cartilha, houve uma participação ativa dos investigados. Por fim, comprovou-se a necessidade de ensino nos eixos da abordagem da Alfabetização Científica de forma mais explicita durante o curso. Palavras-chave: Alfabetização Científica. Formação de Professores. História das Ciências. ABSTRACT If one minimally understands Science, one knows that scientific knowledge requires treading a path, going through a process. It is not something ready; it is built along the years, decades, and even centuries in a non-vertical manner. Understanding this process and seeing it in our daily lives means being scientifically literate. In this light, this is a thesis of a study whose purpose was to promote teaching activities that lead students to acknowledge the relevance of studying the History of Sciences (HS) and the Scientific Literacy (SL) at the beginning of the chemistry teacher education. The theme approached was supported by studies of Chassot (2018, 2004, 2003), Gil Pérez et al. (2001), Sasseron and Carvalho (2011), Sasseron and Machado (2017), and Carvalho and Gil Pérez (2011), among others. The methodologic procedure used was the qualitative approach to a case study. The subjects of the research were 24 students enrolled in the course of History of Sciences in the Chemistry Teaching Training Program of the IF Sertão Pernambucano (countryside of Pernambuco, Brazil) in 2019/2. The investigation and data collection techniques were a mental map, word cloud, electronic form, design of a booklet, and a journal. To analyze the data, an approach with the assumptions of the content analysis technique was carried out in which the information obtained was categorized in three: the relevance of the HS for the awareness of the teachers-to-be on the evolution of Science along history; SL as acquiring scientific knowledge and as an ability to critique and solve daily problems; and HS as a facilitator for SL. The outcomes showed that the students understood the relevance of studying the History of Sciences, but were not familiar with SL. In regards to designing the booklet, students participated actively. Finally, it has become clear that there is a need for teaching the principles to approach Scientific Literacy in a more transparent manner in this program. Keywords: History of Sciences. Scientific Literacy. Teacher Education. LISTA DE ILUSTRAÇÕES LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Mapas mentais elaborados pelos alunos .................................................. 60 Figura 2 - Nuvem de palavras elaboradas pelos alunos: (a) 7 alunos; (b) 9 alunos; (c) 14 alunos ................................................................................................................... 62 Figura 3 - Modelo da capa da cartilha ....................................................................... 76 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Trabalhos recentes sobre o ensino de História das Ciências na formação de professores ........................................................................................................... 40 Quadro 2 - Artigos sobre o ensino de História das Ciências e a formação de professores................................................................................................................ 45 Quadro 3 - Etapas e atividades da proposta pedagógica .......................................... 54 Quadro 4 - Categorização do formulário eletrônico....................................................65 Quadro 5- Identificação dos alunos participantes dos grupos para a elaboração da cartilha ....................................................................................................................... 74 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AC Alfabetização Científica BNCC Base Nacional Comum Curricular CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CTS Ciência Tecnologia e Sociedade CTSA Ciência Tecnologia Sociedade e Meio Ambiente HFC História Filosofia da Ciência IF Instituto Federal MEC Ministério da Educação OCN Orientações Curriculares Nacionais PIBEX Programa Institucional de Bolsas de Extensão PIBIC Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica PIBID Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência PIBIT Programa Institucional de Bolsas de Inovação e Tecnologia PPC Projeto Pedagógico de Curso PPP Projeto Político Pedagógico SISU Sistema de Seleção Unificada SUAP Sistema de Unificação da Administração Pública TIC Tecnologias da Informação e Comunicação UFBA Universidade Federal da Bahia UNED Unidade Decentralizada de Ensino UPE Universidade de Pernambuco SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12 1.1 Trajetória pessoal e a disciplina de História das Ciências do Curso de Licenciatura em Química do IF Sertão Pernambucano ....................................... 12 1.2 Problema ............................................................................................................ 14 1.3 Objetivos ............................................................................................................ 14 1.3.1 Objetivo geral ................................................................................................. 15 1.3.2 Objetivos específicos ..................................................................................... 15 1.4 Justificativa ........................................................................................................ 15 1.5 Estrutura da dissertação .................................................................................. 17 2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................. 19 2.1 História das Ciências ........................................................................................ 19 2.2 Evolução da Ciência.......................................................................................... 22 2.3 O Ensino de História das Ciências .................................................................. 25 2.4 Alfabetização Científica .................................................................................... 27 2.4.1 Os termos Alfabetização Científica e Alfabetização Científica Tecnológica...............................................................................................................27 2.4.2 Alfabetização Científica e o Ensino de Ciências ......................................... 31 2.5 Formação de professores ................................................................................. 35 2.6 Pesquisas recentes sobre o ensino de História das Ciências na formação de professores .............................................................................................................. 39 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS............................................................... 50 3.1 Tipo de pesquisa ............................................................................................... 50 3.2 Local e sujeitos da pesquisa ............................................................................ 51 3.3 Coleta e análise de dados ................................................................................. 52 3.4 Proposta de trabalho ou intervenção pedagógico ......................................... 54 3.4.1 Primeira etapa ................................................................................................. 55 3.4.2 Segunda etapa ................................................................................................ 55 3.4.2 Terceira etapa ................................................................................................. 56 3.4.3 Quarta etapa ................................................................................................... 56 3.4.4 Quinta etapa .................................................................................................... 56 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 58 4.1 Mapa mental ....................................................................................................... 58 4.2 Nuvem de palavras ............................................................................................ 61 4.3 Categorias emergentes do formulário ............................................................. 64 4.3.1 A importância da HC para o futuro professor conhecer como se deu a evolução da Ciência ao longo da História ............................................................. 65 4.3.2 Alfabetização Científica como apropriação do conhecimento científico e como habilidade de criticar e solucionar problemas do dia a dia ...................... 67 4.3.3 História das Ciências como possibilidade de facilitar a Alfabetização Científica .................................................................................................................. 72 4.4 Impressões da elaboração da cartilha............................................................. 74 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 78 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 80 APÊNDICES ............................................................................................................. 86 APÊNDICE A - Roteiro do formulário eletrônico aplicado com os alunos do Curso de Licenciatura em Química ................................................................................... 87 APÊNDICE B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para os alunos do Curso de Licenciatura em Química ....................................................................... 88 APÊNDICE C - Termo de Anuência da Instituição participante da pesquisa ..... 89 ANEXO ..................................................................................................................... 90 ANEXO A - Plano de Disciplina de História das Ciências .................................... 91 12 1 INTRODUÇÃO Neste capítulo, apresentamos a trajetória profissional, a disciplina de História das Ciências do IF Sertão-PE Campus Petrolina, a justificativa pela escolha da temática, o problema, os objetivos traçados para investigá-lo para a elaboração do produto educacional e a estrutura da dissertação. 1.1 Trajetória profissional e a disciplina de História das Ciências do Curso de Licenciatura em Química do IF Sertão Pernambucano Cursei o Ensino Médio profissionalizante na antiga Escola Técnica Federal de Pernambuco-UNED (Unidade de Ensino Descentralizada) de Petrolina, uma conquista que foi bastante comemorada por minha família, pois se tratava de uma escola de referência e de qualidade que nos preparava para o mundo do trabalho, como também, para o vestibular. Entre os cursos ofertados, escolhi o Técnico em Química. Assim, ao término do Ensino Médio Profissionalizante, estagiei por um ano na Empresa de Abastecimento de Água da cidade de Petrolina, a Compesa (Companhia Pernambucana de Saneamento e Água), e ministrava aulas em uma Escola Estadual, como professora substituta de Química. Foi um período de muita aprendizagem, pois vinha de um ensino conteudista e tecnicista, como também nunca havia tido qualquer experiência, até então, em sala de aula. Logo me encantei pela profissão. Em 2002, ingressei no curso de Pedagogia na Universidade de Pernambuco (UPE); contudo, meu sonho era o Bacharelado ou a Licenciatura em Química, mas 13 não pode ser possível na ocasião devido a problemas pessoais. Após quatro anos concluí o curso com a sensação de que algo necessitava ser preenchido. No ano de 2006, o Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia Campus Petrolina implantou a Licenciatura em Química, curso esse pioneiro na Região do Vale do São Francisco. Já no ano seguinte, iniciei o curso, realizando, enfim, meu sonho. Em 2010, graduei-me em Licenciatura em Química, cujas disciplinas envolviam unicamente teorias e cálculos, sem permitir discussões, trocas de ideias, exceto a de Metodologia do Ensino de Química. No final do Curso, no oitavo módulo, deparei-me com a disciplina de História das Ciências (HC), presente no Projeto Pedagógico do Curso (PPC), que tive um imenso prazer de estudar. Logo de início me chamou atenção a forma como o professor nos sensibilizava para compreender a HC com um olhar mais amplo e questionador, essa abordagem me fez enxergar à componente curricular não apenas como mais uma a ser cursada e sim uma importante componente do curso que contribuiria de forma bastante significativa para a minha formação como professora pesquisadora além de contribuir para a compreensão de muitas outras. Conhecer a Ciência é ter um olhar diferenciado sobre as coisas; estudar como se deu o conhecimento; refazer concepções; relacionar contextos sociais com determinadas invenções e realizar novas descobertas. Estas foram abordagens discutidas e analisadas nas minhas aulas de HC na graduação. A componente denominada ‘História das Ciências’ faz parte dos 57 (cinquenta e sete) componentes curriculares obrigatórios do Curso de Licenciatura em Química do IF Sertão-PE, Campus Petrolina. Ela é ofertada no oitavo módulo aos alunos que ingressaram antes de 2018 e, no quarto módulo, para os matriculados nesse ano, pois houve uma reformulação do PPC para atender à Resolução nº 02 de julho de 2015 (BRASIL, 2015). Assim, atualmente, existem duas matrizes no Curso em questão. A disciplina de HC escolhida para desenvolver a investigação tem como ementa Estudar a Ciência na antiguidade, modernidade e contemporaneidade. Ela contempla um estudo geral sobre a história, a natureza e as concepções das Ciências, enfatizando a História da Química. Há seis anos, leciono a citada disciplina no Curso de Licenciatura em Química; logo, posso afirmar que conheço um pouco a sua 14 realidade. No entanto, alguns entraves permeavam o desenvolvimento da mesma. Na matriz antiga, era ofertada no último módulo, contribuindo para o desinteresse dos alunos por esse estudo em função de eles estarem sobrecarregados e/ ou terem sido reprovados em outras disciplinas. Ademais, poderiam estar envolvidos em Estágios Curriculares Supervisionados (400h); projetos institucionais, como o Projeto Institucional de Bolsas Iniciação Científica (PIBIC), Projeto Institucional de Bolsas de Iniciação Tecnológica (PIBIT), Projeto de Bolsas de Extensão (PIBEX), Projeto Institucional de Iniciação à Docência (PIBID) e/ou a Residência Pedagógica. Na nova matriz, implantada em 2018, alunos que estavam no segundo ano do Curso (duração de nove módulos ou quatro anos e meio), ainda não haviam incorporado a formação de professores em suas vidas. O fato é que, para muitos deles, a Licenciatura em Química foi a única opção para serem selecionados pelo Sistema de Seleção Unificada (SISU), o que lhes impossibilitou cursar o que realmente desejavam. O SISU é a plataforma desenvolvida pelo Ministério da Educação do Brasil (MEC) utilizada para indicar os alunos que entrarão nas instituições públicas de Ensino Superior e nos Institutos Federais. Esse cenário impede que parte significativa dos alunos tenha motivação para aprender. 1.2 Problema Diante disso, a questão de pesquisa que buscamos responder é esta: Como contribuir para que os alunos da disciplina de História das Ciências do Curso de Licenciatura em Química Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano, Campus Petrolina, percebam a importância deste estudo para a sua formação inicial e quais as suas concepções em relação à Alfabetização Científica? 1.3 Objetivos Com base no problema de pesquisa, elencamos os objetivos geral e 15 específicos, abaixo descritos. 1.3.1 Objetivo geral Promover ações pedagógicas que levem os alunos da disciplina de História das Ciências do Curso de Licenciatura em Química Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano, Campus Petrolina, a reconhecerem a importância do estudo da História das Ciências e da Alfabetização Científica na formação inicial de professores de Química. 1.3.2 Objetivos específicos − Propor aos alunos participantes a realização de uma pesquisa bibliográfica para apresentar a evolução das Ciências e sua relação com o cenário social de cada época. − Identificar a concepção de Alfabetização Científica dos alunos matriculados na disciplina de História das Ciências do Curso de Licenciatura em Química do IF Sertão-PE no semestre 2019.2. − Refletir com os alunos, por meio de diferentes metodologias de ensino, sobre a importância do estudo da História das Ciências para a formação inicial de professores. − Construir com os alunos uma cartilha com temas pré-estabelecidos. Apresentando algumas descobertas da Ciência, os cientistas, o contexto histórico destas descobertas e a sua importância para a sociedade. 1.4 Justificativa Compreendemos que conhecer minimamente a Ciência é saber que o conhecimento científico demanda um caminhar, um processo; portanto, não nasce pronto; é construído no decorrer de anos e de forma não vertical. Dependendo de vários fatores e das investigações e comprovações da comunidade científica, ele também pode ser mutável, estando, desse modo, em constante construção, o que 16 torna importante o estudo da HC. Para Beltran, Saito e Trindade, A História da Ciência vem sendo valorizada por professores e educadores envolvidos nos diversos níveis de ensino. Tal interesse fundamenta-se nas possibilidades que a abordagem da História da Ciência oferece para reflexão e discussão da gênese e da transformação de conceitos sobre a natureza, as técnicas e as sociedades, bem como, na análise dos diversos modelos de elaboração de conhecimentos. Nesse sentido, a relevância da História da Ciência tem sido particularmente considerada na formação de professores (2014, p. 101). De acordo com os autores supracitados, um breve levantamento apontou que, no Brasil, tem havido um aumento significativo no número de Cursos de Pós- Graduação relacionados à temática História e Filosofia da Ciência (HFC). Alguns programas se referem especificamente a essa relação, como o da Universidade Federal da Bahia (UFBA), no Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História da Ciência; Universidade Federal do ABC (UFABC); Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); Universidade de São Paulo (USP); Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), entre outros. O estudo da HC é fundamental à formação de professores, pois oportuniza ao futuro docente conhecer melhor a Ciência que vier a ensinar, compreender fatos históricos que ocorreram na antiguidade e sua relação com os contextos religiosos, sociais e econômicos, bem como a influência que tais fatos exerceram na organização da Ciência. Como afirma Chassot, Conhecer a ciência tem demonstrado ser uma enorme aventura intelectual. Conhecer sua história constitui, muitas vezes, um gostoso garimpar nos rascunhos do passado, vendo o quanto cada civilização se desenvolveu até um determinado estágio para poder enfrentar os desafios da natureza. Hoje, da mesma maneira que para os nossos ancestrais, a ciência está sempre presente. A tecnologia envolvida na construção de uma faca de pedra polida foi tão desafiadora quanto a inteligência posta a serviço do desenvolvimento de um supercomputador no final do século XX (2004, p. 9). Isso significa que , cabe a nós, professores, sabermos como se dá a construção do conhecimento e fazermos com que os alunos também conheçam essa construção de maneira prazerosa. Segundo Moura (2014), a compreensão da Natureza da Ciência é considerada um dos preceitos fundamentais à formação de alunos e professores, tornando-os mais críticos à medida que os estudos trazem elementos que melhor apresentam o conhecimento científico e os fatores internos e externos que 17 o influenciam. Em seu trabalho, Martins menciona que Vários cursos de licenciatura das áreas científicas, nos últimos anos, têm contemplado essa questão, seja por intermédio de uma disciplina específica que trate do conteúdo histórico e filosófico, seja de um modo mais “disperso”, em que esses elementos encontram-se presentes nos róis de conteúdos de outras disciplinas, em seminários, etc. Dessa forma, espera-se dar conta, minimamente, dessa necessidade formativa dos professores, com reflexo em suas práticas (2007, p. 115). A importância dessa temática pode ser percebida no aumento dos cursos de pós-graduação como visto anteriormente ou até mesmo no números de trabalhos que são destinados a essa temática, assim sendo necessário sua discussão desde a formação inicial de professores, como citado acima. Essa abordagem pode se dar de forma explicita nas disciplinas ou em trabalhos com temáticas transversais. Muitas pesquisas realizadas na Área do Ensino de Ciências mostram como alunos e até professores têm concepções distantes do fazer científico, fato que demonstra a necessidade de estudo. “Assim, a História e Filosofia da Ciência surge como uma necessidade formativa do professor, na medida em que pode contribuir para evitar visões distorcidas sobre o fazer científico [...] e proporcionar uma intervenção mais qualificada em sala de aula” (MARTINS, 2007, p. 115). Além dos pontos colocados anteriormente, a falta de motivação dos alunos pela aprendizagem de HC tem inquietado a pesquisadora, motivo pelo qual optou por esta temática. Outra justificativa para a escolha deste assunto, está relacionada ao seu encantamento pela HC, além de sentir a necessidade de uma formação mais específica para lecionar com mais qualidade a disciplina. 1.5 Estrutura da dissertação A seguir, apresentamos a dissertação de mestrado, que está organizada em cinco capítulos que são: introdução, revisão de literatura, procedimentos metodológicos, resultados e discussão e por fim as considerações finais elaborada após a realização de todas as demais. Essa está dividida da seguinte forma: No primeiro capítulo - introdução, já apresentada -, expomos as ideias centrais desta pesquisa, o cenário na qual se deu a investigação, as motivações que levaram pra escolha dessa temática, a justificativa, a questão de pesquisa e os objetivos. 18 No segundo – a revisão de literatura -, apresentamos a fundamentação teórica que embasou este trabalho, com os subitens: História das Ciências, Alfabetização Científica, formação de professores e, por fim, as pesquisas recentes sobre o Ensino da História das Ciências na formação de professores. No terceiro - procedimentos metodológicos -, esse capítulo é dividido em quatro sessões sendo elas; tipo de pesquisa, sujeitos da pesquisa, coleta de dados, proposta de trabalho ou intervenção pedagógica descrevemos os caminhos traçados para desenvolver a pesquisa e os sujeitos participantes. No quarto, analisamos os resultados elaborados a partir dos instrumentos utilizados tais como o mapa mental, nuvem de palavras e do formulário eletrônico preenchido pelos participantes além das observações coletadas via diário de campo e as intervenções realizadas durante a pesquisa. No último - considerações finais do trabalho -, fazemos um relato das análises realizadas durante a intervenção e a investigação traçados como objetivos do estudo apresentando todos os resultados obtidos e apontando futuras pesquisas . 19 2 REVISÃO DE LITERATURA Para dar suporte teórico à pesquisa, buscamos realizar um estudo bibliográfico contemplando os seguintes temas: HC, AC e formação de professores. Em seguida, apresentamos características das pesquisas recentes que trazem como temática o ensino da HC na formação de professores. 2.1 História das Ciências Ao descobrir o fogo, o homem primitivo realizou um dos maiores marcos da HC, pois impulsionou significativamente a evolução. Segundo Chassot (2004), essa descoberta gerou grandes benefícios aos indivíduos; por outro lado, a tarefa foi considerada bastante perigosa por se tratar de algo relacionado a forças sobre- humanas. Assim, iniciou o percurso do avanço da Ciência. Atualmente, deparamo-nos com conceitos de Ciência, método científico, conhecimento científico. Mas o que é conhecimento? O que é Ciência? “Conhecimento é a ação de entender por experiência, informação ou Ciência” (BUENO, 2007, p. 189). “Ciência, conjunto de conhecimentos coordenados relativamente a determinado objeto, estudo sistematizado” (BUENO, 2007, p. 166). A questão é se podemos defini-la de forma tão precisa como encontramos em muitos dicionários ou é um conceito tão complexo que dificilmente se consegue elaborar. Para Sasseron e Machado, Ciência é um modo de ver compreender os fenômenos naturais; que a lógica e a objetividade costumam ser as bases que fundamentam sua construção; e que as proposições científicas, bem como os processos para chegar a elas, 20 estão embrenhados de característica sócio-histórico e culturais (2017, p. 14). A Ciência traz em sua constituição diversos fatores que influenciam sua construção como questões sociais, econômicas, religiosas e culturais, portanto não é feita do acaso ou mesmo neutra, mas sim em uma rede de interligação Tão complexa é a Ciência e sua estrutura que, na Química, temos como exemplo a teoria do flogisto, que, por muito tempo, dominou as explicações das reações químicas de combustão, sendo, anos depois, substituída pelas explicações de Lavoisier. Essa teoria, elaborada do George Ernest Stahl, afirma que a queima dos materiais emite a combustão, tornando-os mais leves, mas sem explicar quando a massa aumenta. Desse modo, outras rupturas importantes ocorreram no decorrer da HC, como do geocentrismo para o heliocentrismo, criacionismo para o evolucionismo, entre outras, como afirma Chassot (2004). De acordo com Chassot (2018), a Ciência não contém a verdade, mas lhe cabe o papel de diminuir o trabalho do homem e melhorar a sua qualidade de vida. Até o século XIX, ela representou a certeza; no XX, a incerteza. Mas, além disso, causou muito mal ao planeta e à natureza. Infelizmente, essas oscilações tendem a provocar uma instabilidade, pois concedem espaço à pseudociência ou falsas Ciências. Chalmers (1993), em sua obra clássica O que é ciência, afinal?, afirma que ela desfruta de alta credibilidade em nossa sociedade; entretanto, o método indutivo, por meio do qual as leis científicas são elaboradas mediante observações, é uma forma ingênua, pois pode levar ao engano. No decorrer da leitura, ele revela que os estudos da Filosofia da Ciência identificam muitos problemas e dificuldades dessa visão simplificada. O autor sustenta também que “uma característica importante da ciência é sua capacidade de explicar e prever” (CHALMERS, 1993, p. 22), o que lhe garante a confiança da sociedade. Em relação ao conhecimento científico, o citado pesquisador defende que é preciso vê-lo não como algo comprovado, mas que é provavelmente verdadeiro. Acrescenta que A ciência é como um corpo de conhecimento historicamente em expansão e que uma teoria só pode ser adequadamente avaliada se for prestada a devida atenção ao seu contexto histórico. A avaliação da teoria está intimamente ligada às circunstâncias nas quais surge (1993, p. 53). Consequentemente, podemos afirmar que a Ciência constrói modelos, 21 conceitos, leis, métodos, além de se transformar ao longo do tempo e de acordo com o contexto social e histórico de cada época. Nesse sentido, busca sempre manter a sua credibilidade. Gil Pérez et al. (2001) apontam que docentes com formação em Ciências, seja de Química, Física, Biologia, entre outras, ainda não adquiriram a noção adequada para representarem uma forma correta da construção do conhecimento científico. Em suas pesquisas, que tiveram como metodologia a aplicação de workshops com grupos de professores, os autores analisaram as concepções desses profissionais em relação ao trabalho científico e à Ciência. Diante disso, Gil Pérez et al. (2001) citaram sete visões, segundo eles, “deformadas”, ou seja, não adequadas a indivíduos que lecionam disciplinas científicas (Química, Física e Biologia). São elas: concepção empírica indutivista e ateórica - trata a Ciência como neutra; visão rígida do conhecimento científico (algoritmia, exata, infalível) - o método científico é apresentado como uma sequência de etapas definidas, rigoroso e exato; visão problemática e histórica- elabora os conhecimentos sem mostrar os problemas que os geraram; visão da Ciência, que é exclusivamente analítica -, trata a divisão do conhecimento de forma fragmentada e não como interdisciplinar; visão acumulativa de crescimento linear; visão do pensamento indutivista e elitista da Ciência- o conhecimento científico aparece como uma obra de gênios isolados e, por fim, a visão socialmente neutra- é a ideia de Ciência como soberana, isolada da sociedade e que apenas exerce um papel benéfico. A última, atualmente, está sendo desmontada, de acordo com os nomeados autores, em função de correntes que procuram apresentar a Ciência interligada à sociedade. O exemplo maior seria o movimento Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), que vem confrontando as relações da Ciência com as tecnologias e as sociedades. Nessa vertente de pensamento, é possível considerar que a Ciência é mutável e dinâmica, e o seu objetivo é buscar explicar os fenômenos naturais sem que sejam verdades absolutas, fixas e concretas. Em outras palavras, não existe um método científico único, mas várias metodologias que dão margem a desacordos; porém, dentro de uma coerência científica. A teoria não é consequência da observação/experimento e vice-versa. Ainda segundo Gil Pérez et al. (2001), vários 22 autores têm combatido essa ideia errônea da Ciência, enraizada no senso comum, de que a experimentação prova a teoria. Essa ideia nos levou a entender que a Ciência é influenciada pelo contexto social, cultural, político no qual é construída. Sendo assim, nela não há neutralidade, já que o cientista não está isolado dessa conjuntura. Ele tem crenças pessoais, recebe influências externas, pois, como os demais, é humano e comete erros. Sendo assim, é necessário que o conhecimento seja levado a todos na forma de Ciência, de maneira democrática e desmistificada conforme coloca Chassot: Há duas dimensões que demandam estudos e investigações: a primeira, o quanto o conhecimento científico é uma instância privilegiada de relações de poder e esse conhecimento, como patrimônio mais amplo da humanidade, deve ser socializado; a segunda, o quanto há cada vez mais exigências de que migremos do esoterismo ao exoterismo, para que se ampliem as possibilidades de acesso à ciência (2003, p. 96). Em conformidade com essas ideias, a Ciência precisa ser levada a todas as pessoas visando à compreensão dos fenômenos naturais, sociais, políticos e religiosos. O indivíduo que a ela tem acesso e a compreende no seu mínimo contexto é capaz de exercitar a cidadania de maneira consciente, sentindo-se, assim, alfabetizado cientificamente (CHASSOT, 2018); (SASSERON; CARVALHO, 2011); (SASSERON; MACHADO 2017); (DEMO, 2014); (AULER, 2003). 2.2 Evolução da Ciência O conhecimento nem sempre esteve organizado como o entendemos e chamamos hoje: Científico ou da Ciência. Para receber essa denominação, percorreu um longo caminho; quebrou várias barreiras, iniciando sua consolidação a partir do século XVII, com a “Revolução Científica (CHASSOT, 2004). Os historiadores consideram os séculos XV, XVI e XVII como os períodos de transição entre duas expressões de Ciência: a antiga e a moderna. Beltran, Saito e Trindade enfatizam que, […] contudo, deve-se ressaltar que isso não significa que a passagem de uma expressão de conhecimento a outra se fez porque a ciência antiga era inferior, imprecisa e menos verdadeira em relação à moderna. Devemos aqui observar que a ciência moderna não é um aprimoramento de uma ciência antiga, visto que elas não só colocam diferentes questões, mas também expressam diferentes preocupações referentes à natureza, às técnicas e ao 23 homem. De modo geral, considera-se que essa passagem deu-se por causa de uma Revolução Científica (2014, p. 82). Assim sendo, podemos afirmar que a revolução, na qual a Ciência antiga cede seu lugar à moderna, inicia com a passagem do teocentrismo para o antropocentrismo. O primeiro tem a religião como tema central, filosofia ou doutrina que considera o divino como explicação para as coisas do mundo. Já o segundo é uma concepção que coloca a humanidade no centro do pensamento sociológico, o que configura uma grande quebra de paradigma na ótica de Chassot (2004). Dos filósofos que defendiam a corrente do antropocentrismo, estavam Nicolau Copérnico, que deu início à quebra do paradigma teocentrismo/antropocentrismo. Ele foi o responsável pela importante virada na HC. Para Chassot (2004, p. 137), foi Um estudante de direito canônico e astronomia. Nos setenta anos de vida de Copérnico, a humanidade viveu um de seus períodos mais excitantes: Colombo descobriu novas terras, Magalhães circun-navegou a terra, Vasco da Gama chegou pelos mares à Índia, Lutero fez a Reforma, Michelangelo brilhou nas artes; a medicina, com Paracelso e Andre Vesálio, teve suas bases definidas; Leonardo da Vinci foi a síntese da genialidade. Notoriamente, Copérnico viveu tempos relevantes para a história tanto da Ciência como do desenvolvimento da humanidade. “A astronomia de Copérnico era audaciosa em 1534 porque se opunha à suposição prévia de que a Terra era estacionária no centro do universo” (CHALMERS, 1993, p. 76). Em meio a esse importante período, Copérnico, com receio da Igreja, nunca publicou oficialmente suas ideias; contudo, em seus estudos, havia explicações, “hipóteses”, sobre o movimento da Terra, que revolucionaria a Ciência. Assim, ele foi considerado o idealizador do sistema heliocêntrico. “É importante destacar que o universo Copérnico não apresenta, ainda, a inovação que poderia distinguir mais radicalmente o proposto por Aristóteles” (CHASSOT, 2004, p. 140). Após a morte do filósofo antropocentrista, nasceu outro estudioso e curioso a respeito da astronomia: Galileu Galilei (1564-1642), italiano nascido em Pisa, é considerado um dos criadores da Ciência moderna. Desde sua infância, recebeu uma educação que valorizava as artes, acolhendo as novas ideias com entusiasmo (CHASSOT, 2004, p. 145). Entre outras atividades, dedicou-se à construção de telescópios. “Foi a Roma mostrar os céus com o telescópio, quando, nas igrejas, principalmente, na dos dominicanos, pregava-se contra o copernicanismo, que era comparado àqueles que 24 praticavam a 1 cabala e a numerologia” (CHASSOT, 2004, p. 146). Com o desenvolvimento do telescópio, bem como a teoria ótica, Galileu pôde, então, confirmar que, de fato, o sol é o centro do universo e que não se move. Por causa dessa afirmação, foi preso, torturado e obrigado pela Igreja a desfazer suas concepções diante da sociedade. Nesse contexto, após longa caminhada, a Ciência moderna se estabeleceu. Para Beltran, Saito e Trindade (2014, p. 79), A ciência moderna, portanto, não surgiu de um dia para o outro, nem a partir de uma única proposta. Desde suas origens, ela foi se moldando lenta e gradativamente em meio a diversos debates em que questões de natureza “científica” e “extracientífica” (ou seja, que não estão necessariamente relacionadas ao conhecimento científico no sentido estrito, tal como hoje entendemos) se entrelaçam, formando um rico tecido sobre o qual se debruça o historiador da ciência. Com o passar do tempo, especialmente a partir de acontecimentos, como a Revolução Industrial, o Iluminismo e a Revolução Francesa, a Ciência se fortaleceu cada vez mais, consolidando-se no século XVIII, que ficou conhecido como o Século das Luzes. De acordo com Chassot (2004), no XIX, com variadas tecnologias, surgiram novos e modernos produtos, e a Ciência passou a responder às interrogações da humanidade e interferir na natureza sem nenhuma preocupação ambiental e social. Entretanto, no século XX, a Ciência moderna, de estrutura sólida, teve sua base abalada, sendo, portanto, questionada. Conforme os autores Beltran, Saito e Trindade (2014, p. 97), [...] a teoria da relatividade, as teorias da genética e da robótica e outros desdobramentos em que a ciência e a tecnologia estavam envolvidas desenvolveram diferentes maneiras de se fazer ciência. Começa aí, tal como vimos anteriormente, o grande debate sobre os fundamentos da ciência moderna em que participam matemáticos, químicos, físicos e toda sorte de filósofos da ciência, tais como Schlick, Carnap, Bacherlard, Popper, Kuhn, entre muitos outros. Além disso, a própria ciência moderna passaria a ser questionada em virtude dos inúmeros desastres ambientais e humanos provocados não só pela indústria, mas também pelas duas grandes guerras no início do século XX. Entre outros fatores, fica evidente que a Ciência não é neutra e nem feita por gênios, podendo ser influenciada por razões externas, tais como: humanas, religiosas e econômicas, colocadas de forma oculta ou, em alguns casos, explicita. Portanto, “a 1 Cabala: Ciência oculta que pretende estabelecer comunicação com os espíritos. Numerologia Análise do significado oculto dos números e da forma como eles podem influenciar a vida, o comportamento e o destino das pessoas (BUENO, 2007). 25 História da Ciência é o estudo da forma de elaboração, transformação e transmissão de conhecimentos sobre a natureza, as técnicas e as sociedades, em diferentes épocas e culturas” (BELTRAN; SAITO; TRINDADE, 2014, p. 15). Sendo assim, para a formação de professores de qualquer área, é fundamental que a Ciência não seja apenas estudada, mas, principalmente, compreendida; e seus benefícios e malefícios, conhecidos. 2.3 O Ensino de História das Ciências A existência do Ensino de HC, que viabilize o rompimento de concepções inadequadas da Ciência, se faz cada vez mais necessária. Esse tema, como também a possibilidade de um ensino que se “concretizaria mais facilmente” com abordagem histórica, frequentemente está sendo debatido em simpósios, congressos e na área de Pós-Graduação. No Brasil, documentos norteadores, como as orientações curriculares para o Ensino Médio (OCN) de 2006, já enfatizavam a necessidade da interligação da História com os conteúdos para que houvesse uma melhor compreensão. Assim, O reconhecimento e compreensão da ciência e da tecnologia químicas como criação humana, inseridas, portanto na história e na sociedade em diferentes épocas. Compreensão do papel desempenhado pela Química no desenvolvimento tecnológico e a complexa relação entre ciência e tecnologia ao longo da história (BRASIL, 2006, p.113). Nessa perspectiva, os OCN´s já orientavam os professores a trabalharem o Ensino de Química mediante a introdução da HC, perpassando pela disciplina de forma interdisciplinar, sempre apresentando a característica dinâmica na qual o conhecimento é concretizado. Atualmente, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é o documento que norteia o trabalho de docentes, pedagogos e escritores de livros didáticos. Nela, também se encontram referências ao Ensino da HC na Educação Básica. A contextualização histórica não se ocupa apenas da menção a nomes de cientistas e a datas da História da Ciência, mas de apresentar os conhecimentos científicos como construção socialmente produzidas, com seus impasses e contradições, influenciando sendo influenciadas por condições políticas, econômicas, tecnológicas, ambientais e sociais de cada local, época e cultura (BRASIL, 2015, p. 550). Sob o mesmo ponto de visto, ambos os documentos - OCN e BNCC - orientam 26 o Ensino da HC como fator que poderá auxiliar na melhoria da compreensão das teorias e conceitos do fazer científico, de forma que a construção do conhecimento se faça num contexto que proporcione a análise das diferentes épocas. Mas não é o que geralmente tem acontecido nas salas de aulas, haja vista os professores trabalharem os conteúdos com os alunos sem estabelecer qualquer tipo de conexão, como a Histórica, ou contextualizar uma metodologia interdisciplinar. “Quando utilizados se referem a aspectos históricos “internos” da Ciência (ênfase na visão internalista da Ciência), como biografias, anedotas, inventos técnicos, ou de alguma área conceitual específica” (LOGUERCIO, DEL PINO; , 2006, p. 67). O estudo da HC nas disciplinas poderia tornar a aprendizagem mais significativa, possibilitando a compreensão das teorias e/ou as leis com mais solidez. Dessa forma, teríamos o parâmetro do contexto no qual se gerou determinado conhecimento (MATTHEWS, 1995). Visando à relação do Ensino de Ciências, aliada à abordagem da HFC, Matthews (1995) desenvolveu seus argumentos amparado nas propostas do Currículo Nacional Britânico e nas recomendações contidas no Projeto 2061 da Associação Americana para o Progresso da Ciência (AAAS). O autor sustenta que o Ensino da HC contribuiria para a melhoria da compreensão e aprendizagem, pois (1) motiva e atrai os alunos; (2) humaniza a matéria; (3) promove uma compreensão melhor dos conceitos científicos por traçar seu desenvolvimento e aperfeiçoamento; (4) há um valor intrínseco em se compreender certos episódios fundamentais na História da Ciência -a Revolução Científica, o darwinismo, etc.; (5) demonstra que a ciência é mutável e instável e que, por isso, o pensamento científico atual está sujeito a transformações que (6) se opõem a ideologia cientificista; e, finalmente, (7) a história permite uma compreensão mais profícua do método científico e apresenta os padrões de mudança na metodologia vigente (1995, p. 172). Dessa forma, Matthews enfatiza que um ensino fundamentado na HC oportuniza aos alunos uma compreensão mais clara sobre o método científico e motivá-los à aprendizagem. Para alcançarmos esses objetivos, precisamos de professores preparados para trabalhar essa abordagem. Conforme apontam Loguercio e Del Pino tão importante quanto entender a História, é também a Filosofia. Em relação à filosofia da ciência há um reconhecimento de sua importância em sala de aula e que se traduz naturalmente na necessidade de introduzir os conteúdos metacientíficos no currículo de formação inicial e continuada de profissionais da área de ciências. Entre tantas razões, a filosofia das ciências ajuda os professores a explicitar, comunicar e estruturar suas ideias sobre a 27 natureza da ciência, consequentemente, pode gerar uma melhora no seu desempenho profissional (2006, p. 72). Essa relação à História e à Filosofia, devem ser trabalhadas em conjunto, quando bem compreendidas, evitam o que autores, como Gil Pérez et al. (2001), Cachapuz et al. (2011) e Loguercio e Del Pino (2006), chamam de visões inapropriadas que muitos professores têm do fazer científico. Para Cachapuz et al. (2011), a presença dessas possíveis “visões deformadas” – incluindo descontextualização, concepção individualista e elitista, empírico-indutivista e ateórica, visão rígida, algorítmica, infalível a-problemática e a-histórica, vão ao encontro das ideias de Gil Perez et al. (2001), expressas em resultados de suas pesquisas. Portanto, na formação docente, necessitam ser rebatidas, tendo em vista que podem ser perpetuadas nas salas de aulas. Consequentemente, para reconstruir essas perspectivas, por meio da quais os professores apresentam a Ciência, em suas salas de aula, como sendo uma formação linear, de caráter fixo, definitivo, verdadeiro e alheio à sociedade, podem ser contestadas por não serem mais concebidas no XXI (GIL PÉREZ et al. 2001). Para isso, durante todo o Curso de Licenciatura, a HC deveria ser trabalhada em várias disciplinas, pois “uma disciplina de História da Química não alcançaria magnitude para a construção deste conhecimento científico o que impõe que este eixo da dimensão histórico esteja presente em outras disciplinas” (LOGUERCIO; DEL PINO; 2006, p. 68). É uma tarefa que precisa ser realizada durante toda a formação docente seja inicial ou continuada. 2.4 Alfabetização Científica A seguir, fizemos uma breve discussão sobre o que os autores comentam sobre a Alfabetização Científica (AC) e sua inserção no Ensino de Ciências. Ademais, relatamos a maneira como a entendemos. 2.4.1 Os termos Alfabetização Científica e Alfabetização Científica Tecnológica O termo AC abrange diversos significados e sentidos, como compreender a Ciência, desenvolver o pensamento crítico, formar o cidadão cientificamente, ser 28 responsável socialmente e, por fim, por que não dizer, saber conectar-se ao conhecimento. “Ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que está escrita a natureza. É um analfabeto científico aquele incapaz de fazer uma leitura do universo” (CHASSOT, 2003, p. 91). Ao mesmo tempo, o autor (CHASSOT, 2018) assevera que saber quantificar essa alfabetização da Ciência é uma tarefa bastante complexa. Atualmente, na literatura, há outros termos relacionados à AC, como por exemplo, Letramento Científico e Enculturação Científica. Assim, realizando-se um breve levantamento no Google Acadêmico, encontramos noventa e oito mil e duzentos artigos usando a expressão AC; três mil e quinhentos e trinta trabalhos, com Enculturação Científica e três mil duzentos e cinquenta estudos de Letramento Científico. Os termos utilizados pela maioria dos pesquisadores brasileiros têm sido nessa ordem. Viecheneski, Lorenzetti e Caretto (2015) pesquisaram trabalhos que abordaram a AC, nos Encontros Nacionais de Ensino de Ciências (ENPEC), no período de 1997 a 2013. Nessa busca, encontraram, em 1997, apenas um; todavia, até chegarem ao ENPEC de 2013, foram noventa e um, uma ampliação bastante significativa. Com isso, pode-se afirmar que a AC vem ganhando proporções cada vez maiores, visto que a investigação, realizada de forma simples, no Google Acadêmico, obteve, no corrente ano, um total de cento e quatro mil, novecentos e oitenta trabalhos contabilizando as três denominações. Segundo as pesquisadoras Sasseron e Carvalho (2011), o conceito se mostra bastante amplo, sendo, atualmente, muito abordado em trabalhos do Ensino de Ciências. Em outros idiomas, como Na língua espanhola, por exemplo, costumam utilizar a expressão “Alfabetización Científica” para designar o ensino cujo objetivo seria a promoção de capacidades e competências entre os estudantes capazes de permitir-lhes a participação nos processos de decisões do dia-a-dia (SASSERON; CARVALHO, 2011, p. 60). Assim como na Espanha, aqui no Brasil, como vimos, também existe a adoção das três escritas, possivelmente em virtude das traduções realizadas para nossa língua, sendo que a mais utilizada é AC. Também Sasseron e Carvalho (2011), referências nacionais, em seus estudos, optaram por essa denominação. Elas justificam a escolha alicerçadas na ideia de alfabetização concebida por Paulo Freire. Desse modo, entendem que ela (AC) pode proporcionar o crescimento do indivíduo 29 com um olhar crítico sobre as coisas que o cerca. As autoras ainda esclarecem que Usaremos o termo “alfabetização científica” para designar as ideias que temos em mente e que objetivamos ao planejar um ensino que permita aos alunos interagir com uma nova cultura, com uma nova forma de ver o mundo e seus acontecimentos, podendo modificá-los e a si próprio através da prática consciente propiciada por sua interação cerceada de saberes de noções e conhecimentos científicos, bem como das habilidades associadas ao fazer científico (SASSERON; CARVALHO, 2011, p. 61). Como as pesquisadoras, entendemos que a AC consiga proporcionar o crescimento do indivíduo com um olhar crítico sobre as coisas que o cercam. Esse olhar proporcionará a compreensão da Ciência e as suas relações com a sociedade, podendo até modificar o meio em que o sujeito vive, razão pela qual escolhemos a AC. No mesmo levantamento, realizado e apresentado anteriormente no Google Acadêmico, investigamos os autores com destaque no estudo dessa área do conhecimento. Nessa busca, verificamos que Auler e Delizoicov (2001); Lorenzetti e Delizoicov (2001); Chassot (2003); Demo (2014) e Sasseron e Machado (2017) utilizam “AC”. Por sua vez, Santos (2007); Cunha (2017); Mamede e Zimmerman (2005), usam “Letramento Científico; já para “Enculturação Científica”, o site apontou Carvalho (2007); Fejes et al. (2012); Carvalho, Penha e Vianna (2015). Para Auler, a Alfabetização Científica e Tecnológica (ACT), como a denomina o autor, “abarca um espectro bastante amplo de significados, traduzidos através de expressões como popularização da Ciência, divulgação científica, entendimento público da Ciência e democratização da Ciência” (AULER, 2003, p. 69). Ele ainda aponta que podemos fazer ACT de duas maneiras: reducionista ou ampliada. A primeira seria um simples incremento ao atual Ensino de Ciências; já na segunda, o indivíduo buscaria uma compreensão mais ampla do conhecimento e da relação CTS. Sendo assim, apenas trabalhando de forma ampliada é que se chegaria a ter uma leitura crítica do mundo, potencializando uma possível transformação. Como citado anteriormente, Santos foi um dos pesquisadores que utilizam o termo Letramento Científico, o segundo mais empregado nos artigos científicos atualmente. Para o autor (2007), o Letramento Científico busca a função social do conhecimento científico. “O letramento dos cidadãos vai desde o letramento no sentido do entendimento de princípios básicos de fenômenos do cotidiano até a 30 capacidade de tomada de decisão” (SANTOS, 2007, p. 480). Essa tomada de decisão citada por Santos se refere a uma alfabetização em nível pessoal que afeta a vida de um indivíduo e vai até as (decisões) da sociedade. O autor afirma ainda que, “busca- se enfatizar a função social da educação científica contrapondo-se ao restrito significado de alfabetização escolar” (SANTOS, 2007, p. 479). Nesse sentido, para Santos (2007), o termo Letramento Científico remete ainda a um letramento que ultrapassa o Científico, o Letramento Cultural. Para isso, os conteúdos científicos deveriam ser abordados de forma contextualizada e alicerçada na CTS, o que passaria a fazer sentido para o aluno. Nas variadas concepções, de acordo com Sasseron e Carvalho, residem o mesmo propósito: Podemos perceber que no cerne das discussões levantadas pelos pesquisadores que usam um termo ou outro estão as mesmas preocupações com o Ensino de Ciências, ou seja, motivos que guiam o planejamento desse ensino para a construção de benefícios práticos para as pessoas, a sociedade e o meio ambiente (2011, p. 60). Para as autoras, independente do termo utilizado, o objetivo é conseguir êxito na aprendizagem de Ciências. Ambas acrescentam que o termo AC é múltiplo, mas, além de tudo, muito mais amplo do que simplesmente conhecer o conceito em si; trata-se de um (conceito) interdisciplinar, reflexivo e participativo. Neste trabalho, como anteriormente citado, usamos o termo AC, corroborando, dessa forma, as ideias de Sasseron e Carvalho (2011). Ao mesmo tempo, Chassot (2018) afirma que saber quantificar a alfabetização em Ciência é bastante complexo e que não se pode medir a AC de um indivíduo para saber se ele está alfabetizado no mundo das palavras, pois ela vai muito além; é um olhar amplo. Em efeito, entende-se “a alfabetização científica como conjunto de conhecimentos que facilitariam aos homens e mulheres fazer uma leitura do mundo onde vivem” (CHASSOT, 2018, p. 84). Assim, com base em Chassot (2018), Sasseron e Carvalho (2011), Auler (2003) e Santos (2007), a AC pode ser entendida como a possibilidade de o cidadão compreender a sociedade da qual faz parte; além de entender os fenômenos naturais e sociais, não em sua profundidade científica, mas, minimamente, saber posicionar- se em relação à utilização da Ciência na vida. 31 Para as autoras desse trabalho, AC é alcançada quando os indivíduos conseguem enxergar a Ciência em sua vida e sua limitação na solução dos problemas da humanidade, causados por ela mesma, já que é construída por humanos; por isso traz embutidos interesses econômicos, sociais, religiosos, entre outros. O alfabetizado cientificamente é o cidadão que se almeja formado nas escolas de Ensino Básico e nas universidades. Dos três termos encontrados, neste estudo, usamos o AC por ser o que mais se aproximou das nossas ideias. Com ele, pretendemos que a formação científica, social e cultural possa se complementar, e que cada aluno consiga ler, compreender e interagir com sociedade em que vive. Um outro aspecto que contribuiu para essa escolha é que ela beneficia os futuros leitores deste trabalho no que concerne à sua compreensão, pois, como afirmam Sasseron e Carvalho, todos os termos têm como fim um Ensino de Ciências com “benefícios práticos” (2011, p. 60). 2.4.2 Alfabetização Científica e o Ensino de Ciências No Brasil, o Ensino de Ciências nem sempre foi marcado por discussões acerca da sua importância. Segundo Santos (2007), isso não havia acontecido apesar de Francis Bacon (1561-1626) apontar, ainda naquele tempo, a necessidade de a Ciência estar a serviço da humanidade. Na Europa e Estados Unidos, o currículo de Ciências só foi incorporado no século XIX. Segundo o autor, nessa mesma época, já se encontravam livros e artigos sobre Ciência; mas apenas no século XX a AC começou a ser deliberada. Ainda de acordo com Santos (2007), com a chegada aos anos 50, o conhecimento científico passou a ser supervalorizado a ponto de a temática se tornar um grande slogan. Outro aspecto importante mencionado pelo autor é que no Brasil, esse interesse chegou muito mais tarde mesmo com o incentivo de Dom Pedro II no século XIX. Para Auler (2003), a degradação ambiental nas décadas de 60 e 70, junto com a pós-guerra, contribuiu fortemente para que a Ciência e a tecnologia sofressem 32 críticas. Esse olhar questionador sobre a Ciência foi reforçado na década de 60 pelos lançamentos de dois clássicos literários: A Estrutura das Revoluções Científicas, de Thomas Kuhn (1962) e Primavera Silenciosa, da bióloga Raquel Carson (1962). Foi nesse cenário que também surgiu o movimento CTS, fundamental para a concretização da AC, que permanece até os dias de hoje. Assim, de acordo com Santos (2007), o ensino tem se ajustando de acordo com as mudanças ocorridas na sociedade. Estas têm sido responsáveis pelos desdobramentos curriculares tanto na Educação Básica como na Educação Superior. Na concepção de Sasseron e Machado, O que se ensina na escola precisa, pois, ser repensado. Não só ensinar conceitos e noções científicas que fazem parte do rol de temas abordados em aulas de Ciências, mas também ensinar sobre Ciências, que se torna tarefa do professor. Descortina-se assim uma extensa gama de possibilidades: ensinar sobre Ciências demanda um trabalho com aspectos históricos e filosóficos das Ciências e também como práticas científicas. Chegamos assim à proposição de que ensinar Ciências deve ser uma atividade que permita aos alunos fazerem uso das ideias científicas em outros contextos (2017, p. 13). Dessa forma, ensinar Ciências é conhecê-la de fato; colocar o aluno para descobrir sua utilização e entender sua constituição, conforme colocação das autoras, relacionando o presente com o passado. Assim, chegaríamos ao ensino pautado na AC. Santos (2007) aponta três estratégias para um ensino baseado no AC/Letramento Científico: 1) Natureza da Ciência- introdução de conteúdos de HFC para compreendê-la e a suas implicações sociais, além de entendê-la como atividade humana e não neutra, 2) Linguagem Científica- ensinar a ler sua linguagem e a construir uma argumentação do senso comum, pois o Ensino da Ciência tem limitado a memorização, 3) Aspectos Sócio científicos - inclusão de seus aspectos que sejam concernentes às temáticas, como meio ambiente, política, economia, ética, problemáticas sociais e culturais relativas à Ciência e Tecnologia, com o objetivo de problematizar questões que façam parte da vivência social do aluno. O autor acima mencionado sustenta que não são necessários laboratórios sofisticados, aumento de carga horário das aulas, novos conteúdos, mas sim uma mudança de propósitos. Segundo ele, livros didáticos são sobrecarregados de conteúdos socialmente descontextualizados e que apenas ilustram descobertas 33 científicas, sendo, portanto, imprescindível avaliá-los para formar alunos críticos. Em seu artigo “Alfabetização Científica/Tecnológica. Para Quê?, Auler e Delizoicov (2001) investigam concepções de professores de Ciências sobre as interações CTS. Nesse sentido, apontam a existência de três mitos na formação desses profissionais: Superioridade do Modelo de Decisões Tecnocráticas - tudo aquilo que é comprovado é sempre verdadeiro e estático; perspectiva salvacionista da Ciência e Tecnologia - a Ciência está à disposição para solucionar todos os problemas para o bem da humanidade; Determinismo Tecnológico - a sociedade progrediu de acordo com o desenvolvimento da tecnologia sem ter qualquer influência sobre ela (a tecnologia). Esses mitos, segundo os autores, podem ter relação apenas com o ensino conceitual da Ciência. Os autores ainda reforçam a necessidade de um currículo que não enfatize conceitos científicos, mas um ensino CTS problematizador, multidisciplinar, que ressalte a dimensão social da Ciência e da Tecnologia. Essa abordagem estaria relacionada ao que eles chamam de perspectiva ampliada, visto que o ensino reducionista é um simples incremento ao que já existe nas escolas. É indicado que o Ensino de Ciências parta de atividades científicas, problematizadoras, investigadoras, desafiadoras, que envolva a realidade do aluno. Dessa forma, precocemente, ele fará ciência e a aprenderá, de fato, como sustentam Sasseron e Machado (2017, p. 13): Construir pontes entre a ciência que se apresenta aos alunos e o mundo em que eles vivem é um dos propósitos da escola nos dias de hoje. Nós, professores de Ciências, devemos construir essas pontes de forma a levar cada aluno a ver o mundo também sob a ótica científica. A Ciência explica os fenômenos naturais por meio das leis científicas, cálculos, teorias, todos elaborados pela comunidade científica. Porém, é possível irmos além e não apenas ensinar as fórmulas, as leis, as teorias, muitas vezes só memorizadas. Dessa maneira, a escola poderá proporcionar um ensino aplicado à realidade do aluno. Conforme Sasseron e Machado (2017), existem três eixos estruturantes que podem direcionar as aulas de Ciências para quem almeja alcançar a AC: 1) Compreensão de termos, conceitos e conhecimentos científicos fundamentais- é a 34 aplicação de conceitos a situações do dia a dia, contemplados quando trabalhados em sala de aula; 2) Compreensão da Natureza das Ciências e dos fatores éticos e políticos que circundam a sua prática- a Ciência, em constante transformação, pode ser abordada em situações problemáticas investigativas; 3) Entendimento das relações existentes entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Meio Ambiente (CTSA)- é a compreensão das aplicações da Ciência. Sasseron e Machado (2017, p. 14) sublinham que [...] trabalhar Ciências em sala de aula deve privilegiar não apenas os produtos trazidos pela comunidade científica, mas também o processo pelo qual se chega a tais produtos e o entorno dessa produção. Isso significa dar ênfase às práticas científicas e aos seus aspectos sociais e culturais. Construir conhecimento sobre conceitos científicos é também construir conhecimento sobre como a própria Ciência se organiza e de que modo ela impacta nossa vida. Assim, fazer educação baseada na AC é essencial e urgente para que o aluno tenha facilidade de compreender a Ciência no seu cotidiano, além de perceber que ela não é inatingível, tampouco praticada só em laboratórios fechados por profissionais extremamente preparados, o que a tornaria inquestionável. Em síntese, o aluno precisa conhecer as inter-relações entre o conhecimento, a Ciência, o cotidiano e todas as relações históricas e sociais envolvidas nesse processo. Chassot (2018) sustenta que, para que seja efetiva e tenha qualidade, a AC deveria começar a ser desenvolvida com as crianças no Ensino Fundamental e se estender ao Ensino Médio em todas as disciplinas científicas naturais: Biologia, Geografia, Química e Física. Coloca-nos, ainda, a possibilidade de abordagem interdisciplinar, relacionando os conteúdos no currículo CTS. Para o currículo CTS, propõe-se uma educação em Química com foco no compromisso com a cidadania. Esta “(...) só pode ser exercida plenamente se o cidadão ou a cidadã tiver acesso ao conhecimento e aos educadores cabe fazer esta educação científica” (CHASSOT, 2018, p. 96). Sendo assim, faz-se necessária uma adequação nas práticas pedagógicas e, assim, explorar e interpretar o currículo oculto que está presente em cada conteúdo. Ainda para Chassot, “a História da Ciência é uma facilitadora da Alfabetização Científica do cidadão e da cidadã” (2018, p. 78). Ou seja, de forma mais interligada, ambas mantêm uma relação direta e recíproca. Logo, “não é possível ensinar História 35 da Ciência a quem não tem uma Alfabetização Científica mínima” (CHASSOT, 2018, p. 79). Portanto, a abordagem da AC, possivelmente, trará uma aprendizagem motivadora, interdisciplinar e mais ampla do conhecimento desde conceitos científicos até suas relações históricas. Por meio dela, o aluno poderá identificar a aplicabilidade do que estuda, pensar criticamente e ter um desenvolvimento conceitual, interligando todas as Ciências. 2.5 Formação de professores Sabemos que, desde que a instituição escola foi fundada, a sociedade vivenciou muitas mudanças, principalmente, em relação ao avanço da Ciência e da Tecnologia. De fato, atualmente nós necessitamos de uma escola dinâmica e significativa para que todos os protagonistas desempenhem seu papel da melhor forma possível. Entre eles, estão os professores. Mas, como deve ser a sua formação? A formação dos professores, na atualidade, exige que eles pautem diversas ações nos saberes profissionais (TARDIF, 2000); na reflexão (SCHÖN, 1992); na pesquisa (DEMO, 2011); no trabalho coletivo (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011) e no conhecimento da Ciência que ensina (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011). Ou seja, precisam desempenhar várias atividades em sua profissão; a de transmissor de conhecimento não é mais compatível com sociedade tecnológica, dinâmica e globalizada. Nesse sentido, Harari (2018, p. 322) afirma que, Num mundo assim, a última coisa que um professor precisa dar a seus alunos é informação. Eles já têm informações demais. Em vez disso, as pessoas precisam de capacidade para extrair um sentido da informação, perceber a diferença entre o que é importante e o que não é e, acima de tudo, combinar os muitos fragmentos de informação num amplo quadro do mundo. Nessa perspectiva o que se deve ter como objetivo na escola é fazer com que o aluno se torne ativo e independente, para saber abstrair o conhecimento em sua vida e compreendendo onde encontramos os fenômenos da Ciência. Várias ações fazem parte da epistemologia da prática docente. Entende-se por “epistemologia da prática profissional, o estudo do conjunto dos saberes utilizados 36 realmente pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano para desempenhar todas as tarefas” (TARDIF, 2000, p. 10). Tardif afirma que professores são pessoas que se colocam no universo da profissão no momento em que iniciam a sua escolarização. Assim, já carregam consigo os saberes que os formaram no decorrer de suas carreiras. São conhecimentos pessoais que provêm da sua história de vida e cultura, mas também adquiridos no ambiente escolar. O autor reforça essa ideia ao proclamar que Os saberes dos professores não são mensuráveis entre si. Agir conforme as normas, agir conforme os fatos, agir conforme os afetos, agir conforme os papéis, saber argumentar, etc., são tipos de ação que exigem dos professores competências que não são idênticas e mensuráveis (2002, p. 176). Nesse cenário, a formação profissional se dá pela teoria e prática. “Dessa maneira, a teoria seria então os conhecimentos especializados que devem ser adquiridos por meio de uma longa formação de alto nível, a maioria das vezes, de natureza universitária ou equivalente” (TARDIF, 2000, p. 6). Por sua vez, a prática ocorrerá quando “o professor precisa mobilizar um vasto cabedal de saberes e de habilidades, porque sua ação é orientada por diferentes objetivos” (TARDIF, 2000, p. 15). Também é necessário, conforme Tardif e Lessard (2011), que o saber produzido e ressignificado por meio da prática dos professores seja contemplado e valorizado em pesquisas, inclusive por eles. Muitas vezes, aquele produzido pela experiência docente tem sido desprezado ou menosprezado. Na atual conjuntura educacional, Donald Schön também é citado por muitos pesquisadores em virtude de suas ideias relevantes para a área de formação de professores, já que necessitam analisar frequentemente suas ações no ambiente escolar. Para Schön (2000), a reflexão-na-ação no processo de formação docente é fundamental para que haja a interação teoria/prática em diferentes situações didáticas, ressaltando que há um conflito entre o saber escolar e a reflexão-na-ação dos docentes e alunos. Esses momentos engrandecem o trabalho do professor como sujeito das transformações, que passa a ser útil na escola e na sociedade. O citado autor também salienta que Podemos refletir sobre a ação, pensando retrospectivamente sobre o que 37 fizemos, de modo a descobrir como nosso ato de conhecer-na-ação pode ter contribuído para um resultado inesperado. Podemos proceder dessa forma após o fato, em um ambiente de tranquilidade, ou podemos fazer uma pausa no meio da ação para fazer o que Hannah Arendt (1971) chama de “parar e pensar”. Em ambos os casos, nossa reflexão não tem qualquer conexão com a ação presente. Como alternativa, podemos refletir no meio da ação, sem interrompê-la. Em presente-da-ação, um período de tempo variável com o contexto, durante o qual ainda se pode interferir na situação em desenvolvimento, nosso pensar serve para dar nova forma ao que estamos fazendo, enquanto ainda o fazemos. Eu diria, em casos como este, que refletimos-na-ação (SCHÖN, 2000, p. 32). Destarte, quando se pensa num ensino reflexivo, todos os envolvidos nesse processo devem analisar sua própria ação e, em segundo plano, a coletiva. Não havendo experiência reflexiva, dificilmente se chega a uma significativa. Entre as várias dificuldades que permeiam a profissão docente, está o isolamento pedagógico, que é um dos desafios que devem ser vencidos. “Grupos de professores realizam contribuições de grande riqueza quando abordam coletivamente o que se devem ‘saber’ e ‘saber fazer’ por parte dos professores de Ciências para ministrar uma docência de qualidade” (CARVALHO; GIL PÉREZ, 2011, p. 16). Nas escolas, o que mais se tem verificado é a ausência da interdisciplinaridade, por meio da qual os professores, em conjunto, trocariam experiências e saberes. Os citados autores sublinham que tal prática traria mais qualidade à docência; porém, o que se tem assistido, na maioria das vezes, é o individualismo. Carvalho e Gil Pérez (2011, p. 19) acrescentam que [...] o trabalho docente tampouco é, ou melhor, não deveria ser, uma tarefa isolada, e nenhum professor deveria se sentir vencido por um conjunto de saberes que, com certeza, ultrapassam as possibilidades de um ser humano. O essencial é que possa ter-se um trabalho coletivo em todo o processo de ensino/aprendizagem: da preparação das aulas até a avaliação. Nesse sentido de coletividade, os saberes socializados no ambiente escolar são uma fonte enriquecedora para a prática docente, pois, na “formação regular, funciona a especialização fragmentada, que oferece aos alunos disciplinas de 40 a 50 horas (Psicologia, Filosofia, Didática, etc), que não têm relação entre elas, mas constituem unidades autônomas fechadas sobre si mesmas[...]” (TARDIF, 2012, p. 240). Dessa forma, o professor sai da sua formação com o conhecimento fragmentado e assim, reproduz um ensino também fragmentado Conhecer bem aquilo que se ensina é fundamental para a formação do 38 professor, o que é reforçado por Carvalho e Gil Pérez (2011, p. 22): Uma falta de conhecimento científico constitui a principal dificuldade para que professores afetados se envolvam em atividades inovadoras. Todas os trabalhos investigativos existentes mostram a gravidade de uma carência de conhecimento da matéria, o que transforma o professor em um transmissor mecânico dos conteúdos do livro de texto. Sendo assim, quando falamos em conhecer a matéria a ser ensinada, estamos dizendo que professores precisam aprender a ensinar Ciência, mas também sobre Ciência, o que vai muito além dos conteúdos a serem ensinados nas disciplinas. Para Carvalho e Gil Pérez (2011, p. 23), resume-se em: A. Conhecer os problemas que originaram a construção dos conhecimentos científicos. Conhecer, em especial, quais foram as dificuldades e obstáculos epistemológicos ; B. Conhecer as orientações metodológicas empregadas na construção dos conhecimentos, isto é, a forma como os cientistas abordam os problemas, as características mais notáveis de sua atividade, os critérios de validação e aceitação das teorias científicas; C. Conhecer as interações Ciências/Tecnologia/Sociedade, associadas à referida construção, sem ignorar o caráter, em geral, dramático, do papel social das Ciências; a necessidade da tomada de decisão; D. Ter algum conhecimento dos desenvolvimentos científicos recentes e suas perspectivas, para poder transmitir uma visão dinâmica, não fechada, da Ciência. Adquirir, do mesmo modo, conhecimento de outras matérias relacionadas, para poder abordar problemas afins, as interações entre os diferentes campos e os processos de unificação; E. Saber selecionar conteúdos adequados que deem uma visão correta da Ciência e que sejam acessíveis aos alunos e suscetíveis de interesse; F. Estar preparado para aprofundar os conhecimentos e para adquirir outros novos. Em sua enunciação, acima reescrita, os nomeados autores enfatizam que o professor precisa, conhecer a HC para saber relacionar os conhecimentos científicos com os problemas que deram origem à sua construção; entender as orientações metodológicas empregadas na construção dos conhecimentos e como os cientistas abordam os problemas; compreender o tripé CTS e o papel social das Ciências, como também mostrar que o trabalho dos homens e das mulheres da Ciência é idêntico a qualquer atividade humana. Enfim, ele necessita ter consciência da perspectiva dinâmica e integrada da Ciência, ter um bom conhecimento da matéria, selecionar bem os conteúdos e estudá-los com abordagem em temas atuais. “Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino” (FREIRE, 1996, p. 29). Nesse sentido, a pesquisa é outra habilidade necessária aos professores, que, na prática, devem ser os primeiros a se beneficiarem com as realizadas nos ambientes das grandes universidades, ou melhor, serem os pesquisadores da sua prática. A sala de aula é um ambiente rico de possibilidades de investigação e de pesquisa-ação. 39 Segundo Tardif (2012), a pesquisa educacional entrou nas salas de aula na década de 1990, espaço rico de investigação. De lá para cá, só tem aumentado e ganhado outras áreas afins, como a Psicologia e a Sociologia. Por conseguinte, um ensino e uma formação de professores voltados à transmissão de conhecimento não cabem mais na educação do século XXI. Carvalho e Gil Pérez salientam que A iniciação do professor à pesquisa transforma-se assim em uma necessidade formativa de primeira ordem. Não se trata, é claro, de outro componente da preparação à docência, a ser adicionado àquelas que vínhamos considerando, mas de orientar a formação do professor como uma (re) construção dos conhecimentos docentes, quer dizer, como uma pesquisa dirigida (2011, p. 64). Sendo assim, é essencial que o professor desempenhe o papel de pesquisador, que busque constantemente renovar sua prática, que seja um profissional pesquisador e questionador, pois, nas salas de aula, ele tem um universo rico para pesquisar. Nesse sentido, Demo (2011, p. 12) proclama que A educação pela pesquisa consagra o questionamento reconstrutivo, com qualidade formal e política, como traço distintivo da pesquisa. Numa parte, é mister superar a visão unilateral de considerar como pesquisa apenas seus estágios sofisticados, representados pelos produtos saberes do mestre ou do doutor. Noutra parte, pesquisa precisa ser internalizada como atitude cotidiana, não apenas como atividade especial, de gente especial para momento e salários especiais [...]. Logo, uma prática voltada à reflexão e à pesquisa é de suma importância, pois refletirá na prática do professor, na escola, na convivência com os demais integrantes da equipe pedagógica e, principalmente, nos alunos. Os saberes docentes apontados por Tardif (2012) são primordiais e devem ser considerados ao nos referirmos à formação dos professores, pois a inicial, a continuada, requerem uma constante mobilização dos saberes adquiridos em diversas situações de vivência pelo docente. 2.6 Pesquisas recentes sobre o ensino de História das Ciências na formação de professores Para desenvolver este item, procuramos artigos, dissertações e teses publicadas nos últimos dez anos e que estivessem relacionados ao tema O Ensino de História das Ciências na Formação de Professores. Quanto às teses e dissertações, pesquisamos na Biblioteca Nacional de Teses e Dissertações (BNTD), 40 já os artigos, na Plataforma de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES). Em ambas, utilizamos um recorte temporal de 2010 a 2020. O critério de busca delimitou os acrônimos ‘História da Ciência’ e ’Formação de Professores’. Assim, encontramos sessenta e três teses e quarenta dissertações. De posse desses dados, lemos os títulos e, posteriormente, os resumos. Ao fazermos a análise qualitativa do material por meio dos resumos, percebemos que muitos deles foram selecionados por terem a palavra-chave no nome da linha de pesquisa na qual se encontravam, mas não contemplavam o nosso objetivo. Diante disso, selecionamos os trabalhos cujos objetivos estavam qualitativamente alinhados aos nossos com base no resumo. Dentre as teses e dissertações encontradas, destacamos seis, delimitadas no Quadro 1 e organizadas em título, autor, objetivo e metodologia. Quadro 1 – Trabalhos recentes sobre o Ensino de História das Ciências na formação de professores Título Autor Objetivo geral Metodologia 1. Dificuldades e possibilidades da utilização da História da Ciência no ensino de Química: um estudo de caso com professores em formação inicial. Deividi Marcio Marques. Tese. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2010. Avaliar como professores e também futuros professores de Química elaboram uma proposta didática, utilizando como recurso didático a História da Ciência, mediante a apresentação de pesquisas da área e o acesso a informações inerentes ao tema. Pesquisa qualitativa. Categoria Estudo de Caso. 2. História da Ciência na educação científica: uma abordagem epistemológica de Paul Feyerabernd procurando promover aprendizagem significativa crítica. Felipe Damasio. Tese. Universidade de Santa Catarina. Florianópolis, 2010. Articular um aporte epistemológico da ciência com o ensino subversivo visando uma aprendizagem significativa crítica para abordar episódios históricos durante a formação de professores. A História da Ciência contribuiria para constituir um currículo e contexto e, assim, facilitar a implementação da versão crítica da teoria da aprendizagem significativa. Pesquisa qualitativa. 41 3. Concepções de ciência e educação: contribuições da História da Ciência para a formação de professores. Gabriela Marko. Dissertação. Universidade de São Paulo-Faculdade de Educação. São Paulo, 2018. Evidenciar contribuições do contato com a perspectiva da história da formação desses educadores, enfatizando especialmente os estudantes de pedagogia, dando-lhe voz de modo a ampliar debates do Ensino de Ciências para os fundamentos da educação. Pesquisa qualitativa. 4. A História das Ciências no Ensino de Química: implicações para uma abordagem CTS na formação continuada de professores. Rosangela Rodrigues de Oliveira Dissertação. Universidade Federal do ABC. São Bernardo do Campo SP, 2016. Analisar de que forma uma experiência didática centrada na História das Ciências em uma perspectiva CTS pode contribuir para a formação de professores de química críticos, reflexivos e transformadores. Pesquisa qualitativa. Categoria Estudo de Caso. 5. Concepções de professores atuantes e em formação sobre a História da Química e a natureza da ciência. Anderson de Oliveira Dissertação. Universidade Federal de Sergipe, 2016. Investigar como a História da Química e a Natureza da Ciência são entendidas pelos professores em formação inicial. Pesquisa qualitativa do tipo exploratório. 6. História e filosofia da ciência no Ensino de Química: um estudo de caso em duas escolas públicas estaduais de (continua) ensino médio na cidade de Campina Grande – PB. João Pessoa Pires Neto. Dissertação. Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2013. Analisar como são abordadas a História e a Filosofia da Ciência no Ensino de Química no Ensino Médio, em duas escolas públicas estaduais, na cidade de Campina Grande – PB. Pesquisa qualitativa. Categoria Estudo de Caso. Fonte: Elaborado pela autora (2020) O primeiro estudo é uma tese da Universidade Estadual Paulista (UNESP), intitulada, “Dificuldades e possibilidades da utilização da HC no Ensino de Química: um estudo de caso com professores em formação inicial”. Seu autor, Deividi Marcio Marques (2010), por meio da pesquisa qualitativa e estudo de caso, teve o objetivo de avaliar como os professores – estendendo-se aos futuros - de Química elaboravam suas propostas didáticas, utilizando, como recurso didático, a HC, mediante a apresentação de pesquisas da área e acesso a informações inerentes ao tema. Assim, ele conclui ser insignificante o Ensino de HC em uma única disciplina, sugerindo que outras também fossem estudadas, como Estágio e Prática Pedagógica. Ademais, salienta que os investigados não possuíam aporte filosófico, possivelmente uma lacuna do curso de formação inicial de professores. Estes, ao elaborarem a proposta didática, não conseguiram sair da dicotomia cronologia/biografia. O nomeado 42 pesquisador encerra suas considerações com uma frase: “história e filosofia da ciência no ensino: há muitas pedras nesse caminho” (MARTINS, 2007, p. 112). O segundo estudo, uma tese da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), intitula-se “História da Ciência na educação científica: uma abordagem epistemológica, de Paul Feyerabernd procurando promover aprendizagem significativa crítica”. O autor, Felipe Damasio (2017), inicia seu trabalho afirmando que uma educação científica voltada unicamente à resolução de problemas típicos se caracteriza por um perfil dogmático, fechado e a-histórico. Ele sugere um ensino baseado na teoria da Aprendizagem Significativa Crítica, proposta por Marcos Antônio Moreira, para se chegar à educação útil e formar o cidadão na sociedade contemporânea. Na concepção de Damasio (2017), essa teoria não se baseia apenas na Teoria de Ausubel, mas também nas ideias dos educadores americanos Neil Postman e Chales Weingartier. A pesquisa foi realizada a partir de estudo de caso com professores. O autor conclui que os participantes da formação reconheciam a necessidade de a escola mudar seu ensino e que, com o ensino tradicional, ela perderia a sua utilidade na sociedade. A proposta de um ensino subversivo para uma aprendizagem significativa crítica foi bem recebida pelos docentes em formação; entretanto, apontaram empecilhos para implantá-lo, como a dificuldade de despertar a predisposição em aprender dos alunos, a falta de tempo para preparar as aulas em função da alta carga horária e a obrigatoriedade de cumprir ementas extensas. Em relação ao ensino baseado na educação científica, Damasio (2017) afirma ter, pelo menos, dois questionamentos distintos: o primeiro, chamado de engenharia da educação – refere-se às maneiras de ensinar Ciência, aos métodos, aos equipamentos didáticos, entre outros. Quanto ao segundo, denominado metafísico, “pergunta quais os motivos para os jovens estarem em sala de aula” (DAMASIO, 2017, p. 193). Ele também sublinha que a educação científica deve formar um cidadão capaz de não ser subjugado pela sociedade contemporânea, e que essa educação também pode contribuir para a valorização da diversidade cultural, desconstruindo o mito da Ciência isolada. O terceiro estudo é uma dissertação da Universidade de São Paulo (USP), 43 intitulada “Concepções de ciência e educação: contribuições da HC para a formação de professores”, de Gabriela Marko (2018). Neste estudo, a autora, qualitativamente, analisa a disciplina de HC de forma optativa para pedagogos e obrigatória para alunos de licenciatura de outros cursos. Ademais, investiga se uma disciplina de HC contribuiria para formação desses futuros professores. Nesse sentido, Marko afirma que uma única disciplina de HC é insuficiente para atingir a emancipação e o pensamento crítico do professor, mas já oferece um “olhar atento” e analítico para o mundo, para a Ciência e para educação. O quarto estudo, uma dissertação da Universidade Federal do ABC (UFABC), intitulada, “Analisar de que forma uma experiência didática centrada na HC em uma perspectiva CTS pode contribuir para a formação de professores de química críticos, reflexivos e transformadores”, foi desenvolvido por Rosangela Rodrigues de Oliveira (2016). A autora coloca que um aspecto positivo evidenciado foi um aumento significativo das pesquisas na área, principalmente sobre concepções da Natureza da Ciência e a contextualização das aulas de Química por meio do enfoque CTS. Apesar de vários estudos apontarem as vantagens da utilização da HC e educação CTS na formação docente, muitos trabalhos as abordam apenas como complemento. Os professores de formação continuada consideraram muito importante a participação na pesquisa, pois lhes possibilitou realizar a conexão com o que é discutido na academia e, além disso, pensar sobre suas práticas e disposição para mudá-las. Assim, demonstraram uma postura crítica e reflexiva sobre as Ciências a partir de uma perspectiva histórica e processual, compreendendo-a como atividade não neutra, sujeita às intempéries sociais, políticas, ambientais e tecnológicas. Quanto aos aspectos negativos, os pesquisados citaram a dificuldade de os professores transformarem o conhecimento teórico em prático. Em efeito, durante as leituras, eles apresentaram discursos que mostravam certo grau de amadurecimento da HC; porém, ao realizarem a transposição para as aulas, não conseguiam alcançar seus objetivos. Outro problema observado, foi a escassez de materiais didáticos em HC e CTS. A superação dessas dificuldades e de outras, como de ordem política, estrutural, cultural, só serão superadas quando os docentes forem protagonistas de sua formação. 44 A quinta pesquisa, de cunho qualitativo, intitulada “Concepções de professores atuantes e em formação sobre a História da Química e a natureza da ciência”, foi desenvolvida por Oliveira (2016), que buscou saber as concepções de licenciandos em Química sobre a natureza da Ciência. O autor conclui afirmando que as concepções dos pesquisados – com exceção de um - eram inadequadas para a educação científica e ressaltou que nenhum deles havia cursado a disciplina de História da Química, que fazia parte das disciplinas optativas do curso. O aluno que realmente tinha conhecimento sobre o fazer científico estava envolvido em projetos de extensão, além de ser bolsista do PIBID, podendo, segundo o pesquisador, ser esse o motivo de ser o único com concepções corretas em relação à Natureza da Ciência. A sexta dissertação analisada, cujo título é “História e filosofia da ciência no Ensino de Química: um estudo de caso em duas escolas públicas estaduais de Ensino Médio na cidade de Campina Grande – PB”, de Pires Neto (2013), destaca a dificuldade de pesquisar sobre a literatura da História da Química quando comparada à Física e à Biologia, que possuem maior quantidade de materiais. Assim Neto destaca que, nos currículos das Licenciaturas em Química, pouco ou nada se tem avançado quanto às questões epistemológicas da Ciência, o que torna as práticas científicas separadas do contexto social e cultural. Nesse sentido, o autor percebeu, nas estratégias de ensino dos professores pesquisados, a inexistência de um ambiente dialógico, com a presença frequente de aulas expositivas. Estas, baseadas no monólogo dos professores, mostraram-se a- históricas, empiristas e marcadas por um discurso de argumento de autoridade. Portanto, não se observa qualquer abordagem da HC ou da Química. O Professor A, em sua entrevista, colocou como justificativa o tempo de magistério e a desmotivação, chegando a afirmar a possibilidade de mudar de área: Olha...eu...eu penso seriamente em mudar disso daí...embora eu seja um cara que já tenha uma certa experiência...mas não sou uma pessoa...relativamente jovem...tenho uma boa cabeça...aberta...e eu acho que tenho condições de fazer um trabalho melhor em outra área... embora eu nunca dependi de educação pública...não é nem uma questão de contar vantagens...graças a Deus quando estudei o curso...era pago (se referindo à universidade) a não ser o de engenharia que era um curso na Universidade Federal...não cheguei a concluir...mas todos os demais cursos que fiz...todos eles foram pagos...então o que eu poderia dizer exatamente isso...não só 45 eu... mas uma boa parte dos colegas que tenho hoje e muitos colegas que eu já tive...seguiram outras carreiras...porque para a educação não tem como...você procura...a gente tá pedindo socorro...procura...mas...(NETO, 2013, p. 8) Por sua vez, o Professor B declarou não ter formação suficiente para lidar com questões históricas e filosóficas, pois não fizera nenhuma leitura relacionada a essa temática na sua formação inicial. Além disso, argumentou ser impossível realizar uma abordagem histórica em função da quantidade de assuntos a serem trabalhados nas aulas. Afirmando que: Não...eu acho que hoje...com essa grade...com essa política pública que nós temos...né? com essa quantidade...com essa gama de assuntos que nós temos...eu acho que não...claro...o professor também não vai usar isso como uma...como uma arma...dá sim...mas não dá pra abordar do jeito que tem que ser...infelizmente... você pode pincelar uma coisinha por cima...mas hoje...eu creio que não dá pra você trabalhar em paralelo bem bacana...com a História e o assunto...História e Filosofia e o assunto...eu acho que não dá...” (NETO, 2013, p. 91) A segunda parte da pesquisa envolve a análise documental dos Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) das escolas. Nesse sentido, o autor constatou que eles eram marcados por abordagens superficiais, não participativos e fora dos contextos social e cultural, sendo utilizados apenas para necessidades legais e burocráticas da Secretaria de Educação do Estado. Para a realização das análises dos artigos científicos, optamos por realizar o levantamento do periódico da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) como colocado anteriormente. Dos mil quinhentos e oitenta e um, selecionamos dez, dos quais analisamos os resumos. Quatro deles estão expostos no Quadro 2, organizados em título, autor, objetivo e metodologia. Quadro 2 - Artigos sobre o Ensino de História das Ciências e a formação de professores Título Autor Metodologia Revista da Publicação História da Ciência através do cinema: dispositivo pedagógico na formação de professores de ciências. Silvia Nogueira Chaves (2012). Pesquisa qualitativa. Revista de Educação em Ciência e Tecnologia. A disciplina de História da Ciência e da Técnica: contribuições para o ensino e a formação de professores de Simone Barreto Santos, Héctor Santiago Odetti, Ester Mercedes Adriana Pesquisa qualitativa. Educación Química. 46 Química. Emilia (2014). A História da Ciência na formação de professores. Alexandre Mattos Pires Ferreira e Maria Elisa de Mattos Pires Ferreira (2010). Pesquisa qualitativa. História da Ciência e Ensino- construindo interfaces. História, Filosofia, Ensino de ciências e formação de professores: desafios, obstáculos e possibilidades. André Ferrer P. Martins (2012). Pesquisa qualitativa. Educação: teoria e prática. Fonte: Elaborado pela autora (2020) O primeiro artigo, intitulado “História da Ciência através do cinema: dispositivo pedagógico na formação de professores de ciências”, discute a utilização da HC veiculada pela mídia cinematográfica na formação de professores de Ciências. A análise da produção midiática objetivou pôr em suspeição os lugares sociais ocupados pela Ciência instituídos pelas narrativas cinematográficas. Neste sentido, Chaves (2012) analisou três filmes, a saber: E a vida continua, A história de Louis Pasteur e Madame Curie. Nessa análise, Chaves (2012) destacou quatro aspectos, considerando que as abordagens históricas da Ciência podem contribuir para o redimensionamento do Ensino de Ciências, sendo eles: i) Determinação de conceitos estruturantes das disciplinas científicas; ii) Desmistificação da Ciência e da produção do conhecimento científico; iii) Detecção e antecipação de obstáculos epistemológicos à aprendizagem de conceitos científicos; iv) Facilitação do processo de compreensão de conceitos científicos. Assim, comentou trechos em que cita as características dos cientistas e da Ciência, destacando os pontos relevantes visando à realização de um estudo crítico a respeito. “A disciplina de História da Ciência e da Técnica: contribuições para o ensino e a formação de professores de Química” é o título do segundo artigo. A pesquisa, de cunho qualitativo, teve como objetivo analisar a disciplina denominada História da Ciência e das Técnicas, no Curso de Formação de Professores da Universidade Nacional Del Litoral, em Santa Fé Argentina. Seus autores buscaram saber como essa temática se estruturava em um componente curricular nos cursos de formação inicial de professores e de que forma os docentes formadores se apropriavam dos co- nhecimentos históricos e filosóficos da Química para o ensino que desenvolviam (SANTOS et al., 2014). 47 Assim, eles observaram que a disciplina estava baseada na antiga historiografia da Ciência, com a predominância de uma visão positivista, sendo que os documentos, como plano de disciplina, apontavam que esta foi pensada para incorporar conhecimentos sobre o que se entende por Ciência, a problemática do método, a relação com a evolução da Química e sua relação com a sociedade. Ademais, na categoria “Expectativa dos estudantes”, os participantes colocaram que o perfil da disciplina deveria estar mais de acordo com a realidade do curso de professores de Química. Os pesquisadores constataram a existência de uma preocupação em integrar aspectos da epistemologia da Química apesar de o programa continuar se apresentando no contexto do reducionismo. O debate, envolvendo a Filosofia da Química, considerado relevante, ainda não integrava o programa da disciplina. Em seu artigo, “A História da Ciência na formação de professores”, os autores Ferreira e Ferreira (2010), defendem a ideia de introduzir o estudo sobre a HC nos currículos de formação de professores, o que refletiria na melhoria do ensino. Entre os argumentos citados, estão: contribuir para aproximar a escola das exigências nascidas da contemporaneidade; problemas com os quais nos defrontamos poderão ser, senão resolvidos, ao menos minimizados, tais como elevadas taxas de abandono e de reprovação, provocadas pela falta de compreensão de se estudar um dado conteúdo; formação continuada àqueles que trabalham no Ensino Básico. Todos os aspectos, s