1 UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI – UNIVATES PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM ENSINO O ENSINO NA CLASSE HOSPITALAR: PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO HOSPITAL DA CRIANÇA SANTO ANTÔNIO EM BOA VISTA (RORAIMA) Elizene Aparecida Rodrigues da Luz Lajeado/RS, 17 de dezembro de 2020 2 Elizene Aparecida Rodrigues da Luz O ENSINO NA CLASSE HOSPITALAR: PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO HOSPITAL DA CRIANÇA SANTO ANTÔNIO EM BOA VISTA (RORAIMA) Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino da Universidade do Vale do Taquari – Univates, como parte da exigência para a obtenção do título de Mestre em Ensino, na linha de pesquisa Formação de Professores, Estudo do Currículo e Avaliação. Orientadora: Profa. Dra. Suzana Feldens Schwertner Lajeado/RS, 17 de dezembro de 2020 3 Elizene Aparecida Rodrigues da Luz O ENSINO NA CLASSE HOSPITALAR: PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO HOSPITAL DA CRIANÇA SANTO ANTÔNIO EM BOA VISTA (RORAIMA) A Banca examinadora abaixo aprova a dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação de Mestrado em Ensino da Universidade do Vale do Taquari – Univates, como parte da exigência para a obtenção do título de Mestre em Ensino na linha de pesquisa Formação de Professores, Estudo do Currículo e Avaliação: Profa. Dra. Suzana Feldens Schwertner – orientadora Universidade do Vale do Taquari – Univates Profa. Dra. Joelma Fernandes de Oliveira Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Roraima – IFRR Profa. Dra. Leuda Evangelista de Oliveira Universidade Federal de Roraima – UFRR Profa. Dra. Morgana Domênica Hattge Universidade do Vale do Taquari – Univates Lajeado/RS, 17 de dezembro de 2020 Dedico este trabalho a todos os alunos por mim atendidos na Classe Hospitalar – HCSA, que foram minha grande inspiração para o desenvolvimento deste estudo. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus que me concedeu durante todo esse período saúde e perseverança para o desenvolvimento deste trabalho. Em especial ao meu esposo, Gedeson Cruz, que acreditou em minha escolha e esteve presente nesta caminhada sendo amigo e companheiro, incentivando em todas as etapas e principalmente nos momentos mais difíceis deste estudo. Aos professores, a orientadora e amigos que proporcionaram momentos de alegria e troca de conhecimento. À colega Lígia Cavalcante que o mestrado me apresentou. Reconheço a interferência de suas contribuições deixando sua marca inscrita para minha essência profissional e pessoal. A todos manifesto minha eterna gratidão. RESUMO Com esta dissertação objetivou-se compreender a relevância do atendimento pedagógico da classe hospitalar. A pesquisa teve como aporte teórico autores como: Adriana Loss (2014), Elizete Matos e Maria Mugiatti (2014), Eneida Fonseca (2008), José Carlos Libâneo (2002), Maurice Tardif (2007) e outros que contribuíram sobre o conhecimento do objeto de estudo. Apoiado na abordagem qualitativa do tipo descritiva, o trabalho teve como foco de discussão os saberes necessários ao trabalho docente na Classe Hospitalar e a relevância do mesmo na continuidade dos estudos para os alunos hospitalizados. Assim, surgem os objetivos específicos: analisar a interação entre Educação e Saúde e sua importância no contexto pedagógico na classe hospitalar; verificar se o atendimento pedagógico na classe hospitalar condiz com as legislações vigentes no país acerca das políticas públicas educativas; compreender a atuação e perfil do professor da Classe do HCSA; analisar os fatores relevantes que precisam ser levados em consideração diante do atendimento pedagógico hospitalar. As participantes foram duas profissionais da rede municipal de educação que atuam na classe hospitalar do Hospital da Criança Santo Antônio (HCSA), na cidade de Boa Vista, do Estado de Roraima. A produção de dados aconteceu por meio de entrevista semiestruturada com essas profissionais do ambiente hospitalar, interpretadas a partir da Análise Textual Discursiva (MORAES; GALIAZZI, 2013). Os resultados foram agrupados em categorias: O professor no ambiente hospitalar – práticas pedagógicas: nessa categoria destaca- se o professor e suas práticas pedagógicas como parte essencial para o atendimento ao aluno hospitalizado; Aluno hospitalizado – um direto à escolarização: o aluno hospitalizado está afastado da escola em uma condição de fragilidade com algumas limitações impostas por questões de saúde, porém não incapacitado e assim realiza atividades pedagógicas de acordo com suas especificidades; Espaços e rotinas: os espaços de atendimento pedagógico podem ser na sala da classe hospitalar ou no leito de internação, onde a rotina das professoras é organizada de forma que contribui na organização do trabalho pedagógico; Planejamento flexível – atendendo as particularidades: o planejamento é flexível atendendo a parte curricular e as especificidades do aluno de acordo com sua enfermidade; Formação inicial e continuada: por formação continuada compreende-se o constante aperfeiçoamento necessário aos saberes profissionais. O aperfeiçoamento para as profissionais da classe hospitalar se deu pela prática diária. Foi possível compreender que o trabalho da classe hospitalar está associado aos conteúdos da escola regular, porém, com adaptações e adequações necessárias. Assim, o professor contribui para o crescimento pedagógico, social, emocional e intelectual da criança. Palavras-chaves: Classe Hospitalar. Prática pedagógica. Pedagogia hospitalar. Roraima. RESUMEN Com esta disertación tuvo como objetivo comprender la relevancia de la asistencia pedagógica de la clase hospitalaria. La investigación tuvo como contribución teórico autores como: Adriana Loss (2014), Elizete Matos e Maria Mugiatti (2014), Eneida Fonseca (2008), José Carlos Libâneo (2002), Maurice Tardif (2007) y otros que contribuyeron al conocimiento del objeto de estúdio. Apoyado en el enfoque cualitativo del tipo descriptivo, el estudio tuvo como foco de discusión los conocimientos necesarios para la labor docente en el aula hospitalaria y su relevancia para continuidad de los estúdios de los estudiantes hospitalizados. Así, surgen los objetivos específicos: analizar la interaccíon entre Educación y Salud y su importancia em el contexto pedagógico em la clase hospitalaria; verificar si la asistencia pedagógica en el aula hospitalaria cumple con la legislación vigente en el país en materia de políticas educativas públicas; comprender el papel y el perfil del maestro de clase de HCSA; analizar los factores relevantes que deben tenerse en cuenta al considerar la atención pedagógica hospitalaria. Los participantes fueron dos profesionales de la educación municipal que trabajan en la clase hospitalaria del Hospital da Criança Santo Antônio (HCSA), en la ciudad de Boa Vista, Estado de Roraima. La producción de datos se realizó a través de uma entrevista semiestructurada con estos profesionales del ámbito hospitalario, interpretada a partir del análisis textual discursivo (MORAES; GALIAZZI, 2013). Los resultados se agruparon en categorias: El docente en el ámbito hospitalario – prácticas pedagógicas: en esta categoria, el docente y sus prácticas pedagógicas se destacan como parte esencial de la atención al alumno hospitalizado; Alumno hospitalizado – un derecho a la educación: el estudiante hospitalizado está fuera de la escuela en una condición frágil con algunas limitaciones impuestas por la enfermedad, pero no discapacitado y por lo tanto realiza actividades pedagógicas de acuerdo con sus especificidades; Espacios y rutinas: los espacios de servicio pedagógico pueden ser en el aula del hospital o en la cama del hospital, donde la rutina del docente, contribuyendo a la organización del trabajo pedagógico; Planificación flexible – teniendo en cuenta las particularidades: la planificación es flexible teniendo la planificación en cuenta el plan de estudios y las especificidades del alumno ante su enfermedad; Formación inicial y continua: la formación continua significa la mejora constante necesaria para el conocimiento profesional. La mejora para los profesores de la clase del hospital se debió a la práctica diara. Se pudo entender que el trabajo de la clase del hospital esta asociado con los contenidos de la escuela regular, sin embargo, con las adaptaciones y ajustes necesarios. Así, el maestro contribuye al crecimiento educativo, social, emocional e intelectual del niño. Palavras-chaves: Clase de hospital. Práctica pedagógica. Pedagogía hospitalaria. Roraima LISTA DE ILUSTRAÇÕES LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Localização do HCSA ........................................................................... 41 Figura 2 – Placa de inauguração do HCSA ............................................................ 42 Figura 3 – Fachada principal HCSA ....................................................................... 43 Figura 4 – Fachada Urgência e Emergência HCSA ............................................... 43 Figura 5 – Corredor do Bloco B .............................................................................. 45 Figura 6 – Placa de reinauguração do HCSA ......................................................... 46 Figura 7 – Painel .................................................................................................... 46 Figura 8 – Porta de entrada da Classe Hospitalar/HCSA ....................................... 48 Figura 9 – Parte interna da Classe Hospitalar/HCSA ............................................. 48 Figura 10 – Professora pesquisadora .................................................................... 69 Figura 11 – Professora pesquisadora com aluna indígena ..................................... 75 Figura 12 – Parte da enfermaria indígena .............................................................. 76 Figura 13 – Enfermaria indígena com leito/rede ..................................................... 76 Figura 14 – Indígenas sentados no corredor .......................................................... 77 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Distribuição regional das pesquisas do estudo de caso ....................... 38 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Lista final dos estudos encontrados na BDTD ..................................... 29 Quadro 2 – Tempo de docência na Classe Hospitalar do HCSA ............................ 49 Quadro 3 – Normas para transcrição de entrevista gravada .................................. 55 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AEE APAE Atendimento Educacional Especializado Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais BDTD CEP Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações Comitê de Ética e Pesquisa CF Constituição Federal CNE Conselho Nacional de Educação CNS Conselho Nacional de Saúde CONANDA Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente ECA Estatuto da Criança e do Adolescente EJA Educação de Jovens e Adultos HCSA IBGE IFRR Hospital da Criança Santo Antônio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas Instituto Federal de Roraima LDB Lei de Diretrizes e Bases MEC ONGS Ministério da Educação e Cultura Organizações Não Governamentais PNHAH PUC Política Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar Pontifícia Universidade Católica SEMSA Secretaria Municipal de Saúde SUS TAI Sistema Único de Saúde Termo de Anuência Institucional TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TFD Tratamento Fora do Domicílio NEP Núcleo de Educação Permanente e Qualidade no Serviço de Saúde UCP Unidade de Cuidados Permanentes UEFS Universidade Estadual de Feira de Santana UERR Universidade Estadual de Roraima UFG Universidade Federal de Goiás UFMT Universidade Federal do Mato Grosso UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFSC Universidade Federal de São Carlos UFSM Universidade Federal de Santa Maria UnB Universidade de Brasília UNIVATES Universidade do Vale do Taquari UTI Unidade de Tratamento Intensivo SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11 2 PEDAGOGIA E PEDAGOGIA HOSPITALAR ...................................................... 19 2.1 Pedagogia ......................................................................................................... 19 2. 2 Pedagogia Hospitalar – Classe Hospitalar/Atendimento pedagógico hospitalar e sua legislação .................................................................................... 22 2.3 Estado da arte .................................................................................................. 28 2.3.1 Descrevendo as pesquisas .......................................................................... 30 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................. 39 3.1 Local da pesquisa ............................................................................................ 40 3.2 Histórico do Hospital da Crinaça Santo Antônio ........................................... 42 3.3 Surgimento da classe hospitalar HCSA ......................................................... 47 3.4 Participantes da pesquisa ............................................................................... 48 3.5 Experiência de trabalho ................................................................................... 49 3.6 Intrumentos de pesquisa ................................................................................. 52 3.7Procedimentos metodológicos de autorização .............................................. 53 3.8 Entrevista semiestruturada e a transcrição ................................................... 54 3.9 Análise dos dados ........................................................................................... 58 4 CLASSE HOSPITALAR: ENTRE MEDICAÇÕES E ESTUDOS ........................... 60 4.1 O professor no ambiente hospitalar – práticas pedagógicas ....................... 61 4.2 O alunos hospitalizado – um direito à escolarização .................................... 65 4.3 Espaços e rotinas ............................................................................................ 67 4.4 Planejamento flexível – atendendo às particularidades ................................ 78 4.5 Formação inicial e continuada ........................................................................ 82 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 86 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 889 APÊNDICES ............................................................................................................ 93 ANEXOS .................................................................................................................. 98 11 1 INTRODUÇÃO O trabalho do professor no contexto escolar, especificamente na sala de aula, é mediar o ensino oportunizando diferentes estratégias para que o aluno consiga aprender de forma significativa o que lhe foi ensinado. O papel do professor na modalidade da classe hospitalar não difere do trabalho da sala de aula da escola comum, o que muda é o ambiente e adaptação de alguns recursos para que o aluno realize a atividade atendendo suas especificidades. A Educação é um processo importante e necessário na vida do ser humano, pois busca formar indivíduos críticos e atuantes na sociedade. No Brasil, o sistema educacional tem como norte e legalidade a Constituição Federal – CF, de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB, Lei nº 9.394 de 1996. O Ministério da Educação – MEC e o Conselho Nacional de Educação – CNE são órgãos Federais responsáveis pelo sistema educacional brasileiro. A Educação Brasileira é dividida em dois níveis, o nível básico e o nível superior. Quanto ao ensino básico, este é estruturado em etapas de ensino, cada qual composta de objetivos que visam o desenvolvimento integral de um indivíduo, permitindo-lhe alcançar o nível superior. As etapas de ensino são assim denominadas: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. A Educação Infantil é a etapa de ensino que atende as crianças até cinco anos de idade. Na sequência vem a etapa do Ensino Fundamental que tem a duração de nove anos com a seguinte subdivisão: anos iniciais (1° ao 5º ano) e anos finais (6º ao 9º ano). Em seguida, o Ensino Médio é composto do 1º ao 3º ano. 12 Além das etapas de ensino, existem também diferentes modalidades como: Educação de Jovens e Adultos – EJA, Educação do Campo, Educação Indígena, Educação Profissional e Tecnológica, Educação Quilombola e Educação Especial. A modalidade da Educação Especial, que perpassa por todos os níveis de ensino, será abordada com maior ênfase no decorrer deste projeto de pesquisa. A educação formal, como um processo contínuo de ensino e de aprendizagem, faz parte de um currículo escolar que, no geral, é desenvolvido dentro de um ambiente convencional de ensino. Entretanto, o estudo em ambiente não formal, complementar ao Ensino formal, é garantido por Lei e viabilizado através das políticas públicas educacionais. Toda criança tem direito adquirido à Educação por meio do Art. nº 205 da Constituição Federal de 1988, sendo-lhe garantido direito à matrícula, ingresso e permanência na escola. Desta forma, é obrigatório o assegurar esse direito, seja no ambiente escolar ou fora dele. Conforme a LDB 9.394/96, a Educação Especial é compreendida na perspectiva de um atendimento complementar aos alunos com algum tipo de necessidade específica. Nessa visão, os alunos da classe hospitalar estão englobados nesta modalidade, uma vez que estes, temporariamente, estão numa condição específica devido à sua enfermidade. No tocante à aproximação com o tema estudado, durante o transcorrer de minha vida, presenciei e convivi por dois momentos em que foi necessária a atuação dos profissionais da educação fora do ambiente escolar. A primeira ocorreu em 1982, quando, na aula de Educação Física, uma colega de sala fraturou sua perna em um acidente na quadra esportiva. Desde o momento do acidente, a aluna recebeu todo o apoio dos profissionais da escola, sendo que uma professora foi orientada para fazer o acompanhamento escolar no domicílio da referida discente para que a mesma pudesse dar continuidade aos seus estudos. Já a segunda situação ocorreu anos mais tarde, quando eu já era adulta e lecionava aulas na Educação Básica. Tenho um filho com transtorno psicológico de comportamento obsessivo em arrancar seus próprios cabelos (tricotilomania CID -10 F63.3), o qual fazia acompanhamento clínico no Hospital da Criança Santo Antônio – HCSA. Devido à rotina frequente de levá-lo ao supracitado hospital para a realização de suas consultas, o que fazia com que me ausentasse bastante de meu trabalho, acabei conhecendo e descobrindo que no hospital é fornecido o acompanhamento 13 pedagógico. Foi então que percebi a possibilidade em trabalhar atendendo outros alunos e acompanhar meu filho no mesmo ambiente. Diante dessa vivência, levantei alguns questionamentos sobre a atribuição docente: é possível o professor exercer sua função principal fora do ambiente educacional formal? Qual é a importância do processo de ensino e aprendizagem formal estando o educando afastado do ambiente escolar? Qual é o amparo legal e como é desenvolvido o processo de ensino e aprendizagem formal fora do ambiente escolar, como em hospitais ou em domicílio? O professor exerce sua função fora do espaço escolar por dedicação ou dever? Todas essas questões me mobilizaram, pois no meu entendimento o docente era um profissional que lecionava somente na escola. Hoje percebo que aquele momento que fez parte de minha infância, mesmo sem que eu tivesse consciência, foi meu primeiro contato com a classe hospitalar e o atendimento domiciliar. Concluí o magistério do nível médio no ano de 2000 e sem experiência profissional para trabalhar nessa área, foi relevante eu aceitar um convite para atuar na docência numa escola do interior, num município vizinho da capital. A partir deste convite, iniciei minha carreira de docente no ano de 2001, na rede municipal de Mucajaí–RR, que fica aproximadamente 50Km da capital Boa Vista, onde resido desde então. Mesmo sem experiência, fui bem aceita pela comunidade escolar e consequentemente elogiada pelo trabalho que ali desenvolvi. Em seguida, no segundo semestre do mesmo ano, participei e passei em um processo seletivo para professores na escola do SESC, na capital roraimense. Desta forma, retornei para Boa Vista conseguindo conciliar o trabalho com estudos da faculdade (Pedagogia) e com a família. Minha formação acadêmica foi em Pedagogia cursada na Universidade Estadual de Roraima – UERR, em 2007. Em seguida ingressei na carreira docente por meio de concurso público e atuei no ensino regular por mais de uma década e neste período conheci uma pessoa que trabalha na classe hospitalar. A princípio fui tomada pela curiosidade em saber como poderia um professor realizar seu trabalho no ambiente hospitalar. Logo imaginei que para mim seria impossível trabalhar neste ambiente não escolar por falta de afinidade. Nunca gostei de ver ferimentos, principalmente com sangramentos. Sempre tive medo de injeções e até hoje lembro que na época das vacinas em pistolas eu desmaiava quando recebia uma aplicação. Contudo, minha 14 história de vida e construção de identidade como profissional da pedagogia na classe hospitalar se deu por meio da necessidade em ter que trabalhar neste ambiente. Com o passar do tempo e por questão familiar, percebi que trabalhar na classe hospitalar seria a alternativa mais coerente para que eu pudesse cuidar da saúde de meu filho e desenvolver meu trabalho em um único ambiente sem prejuízos para ambas as partes. Desta forma, mesmo sabendo que eu não me identificava com o trabalho da saúde, especificamente no ambiente hospitalar, compreendi que era necessário pedir minha transferência da escola para o hospital e vencer essa barreira. Não foi fácil entrar para o quadro de profissionais da classe hospitalar. Foi um processo que durou em média dois meses, pois foi solicitada a apresentação dos laudos de acompanhamentos que meu filho fazia naquele hospital para eu receber da Secretaria de Educação a autorização da minha transferência. Nos primeiros meses foi tranquilo: eu realizava atendimento recreativo na parte ambulatorial dos retornos aos especialistas, como: ortopedia, fonoaudiologia, psicologia, cardiologia, neurologia entre outros. Neste caso, meu contato maior era somente com as crianças pós-internação nas consultas de acompanhamento, por um período determinado até a alta definitiva. Desta forma não tinha muito contato com crianças feridas e debilitadas. Após uns seis meses, a aflição e a angústia tomaram conta de mim. Fui redirecionada para atender as crianças internadas nos blocos com as mais diferentes patologias. Encontrar com crianças acidentadas, feridas e ensanguentadas começou a fazer parte da minha rotina. Foi desafiador, pois quando procurei a docência como profissionalização não imaginava ter que passar por esse tipo de situação. Eu desconhecia totalmente as leis que amparam o estudo dentro do hospital e a importância do processo de ensino e aprendizagem formal estando o educando afastado do ambiente escolar. No início, se por acaso estivesse atendendo uma criança no leito e chegasse um técnico de enfermagem para fazer o curativo eu imediatamente me retirava do leito e aguardava na recepção da enfermaria até que terminasse o procedimento. Em 2012, vivi uma situação inesquecível: atendi uma criança diagnosticada com câncer no fígado que aguardava tratamento fora do domicílio – TFD. Ele gostava de pintar desenhos de super-heróis. Tinha dias em que ele gritava de dor, 15 mas não perdia a esperança de se tratar e conseguir vencer a doença. Certo dia, quando fui atendê-lo, percebi que estava muito debilitado e que possivelmente sem o TFD teria pouco tempo de vida. Enquanto fazia o atendimento pedagógico, tentei passar o máximo de confiança para ele, porém quando saí da enfermaria, não suportei tamanha dor e as lágrimas desceram em meu rosto. Para minha surpresa, uma psicóloga entrou na minha sala e me encontrou com os olhos cheios de lágrimas. Esta profissional conversou comigo dizendo que eu não podia deixar meu emocional ultrapassar o lado profissional. Foi difícil, pois como pode um ser humano com sentimentos e emoções não se comover diante de tanto sofrimento de uma criança que luta pela vida? Num processo constante de transformação, aos poucos fui superando as barreiras e construindo minha identidade profissional diante do pedagógico no ambiente hospitalar. Aprendi a lidar com as situações terminais sabendo equilibrar o emocional com o sentimento de compaixão. Angustiada pela incerteza em como trabalhar na classe hospitalar, aos poucos fui me adaptando à nova realidade e, quando dei por mim, já estava apaixonada por este trabalho. Fui em busca de aprofundamentos sobre as legislações que amparam a pedagogia hospitalar e o papel do professor diante do processo de ensino e aprendizagem formal no ambiente hospitalar. No decorrer do tempo os ferimentos passaram a ser um motivo de aproximação com o aluno, pois sempre conversamos sobre a evolução do tratamento. Os dias foram passando e compreendi que, além de contribuir para a continuidade da vida escolar desses alunos, eu também fazia parte do momento histórico de recuperação da saúde, momento em que cada um apresenta suas particularidades. É uma vivência única na qual muito se aprende ao ensinar a essas crianças hospitalizadas, pois é uma troca de saberes e energia entre saúde e a aprendizagem. É gratificante ser professor no ambiente hospitalar, pois mesmo diante das diferentes patologias, as crianças nos recebem com um sorriso no rosto para realizar as atividades propostas. Isso foi me fortalecendo para que eu superasse o medo e a angústia que sentia. Em diversas oportunidades, tive o prazer de ser bem recebida pelas crianças que aguardavam ansiosas para o momento escolar. Acredito que, por meio da classe hospitalar, estamos contribuindo para que não haja interrupção no processo escolar de ensino e de aprendizagem, de maneira 16 que a criança possa retornar para a escola sem prejuízo nos conteúdos curriculares. Desta forma, ao retornar à escola, após a alta médica, conseguirá acompanhar o andamento dos estudos. São muitas histórias vividas que nos afetam: crianças que acidentalmente acabam ficando deficientes; crianças que perdem seus pais em acidentes de trânsito; pais angustiados pela espera de diagnósticos demorados; crianças com patologia renal que mais residem no hospital do que em seu próprio ambiente familiar. Entre o trabalho pedagógico e o trabalho humano social estão: a possibilidade de ajudar o próximo; desenvolver a escuta sensível, seja com o aluno ou com seus familiares; lidar com diferentes sentimentos, entre eles: dor, raiva, angústia, gratidão; fazer novas amizades. Neste contexto, o professor atua em seu trabalho com dedicação e empatia. Uma das desvantagens em trabalhar no hospital é que estamos em um ambiente com as mais diversas patologias e assim ficamos vulneráveis aos diferentes agentes transmissores das doenças. Como prevenção, é necessário buscar a imunização por meio das vacinas que devem estar sempre em dia e usar os paramentos descartáveis de proteção (luva, máscara, touca e avental). Esses acessórios devem ser utilizados corretamente e descartados em lugares apropriados para que não sirvam de fontes e veículos de transmissão de microrganismos. Atualmente, a aflição que sinto está relacionada com o desconhecimento relacionado à preparação profissional, um dos motivos que me levou a desenvolver esta pesquisa de mestrado. Sei que quanto mais aprofundar meus conhecimentos, estarei melhor preparada para a atuação profissional pedagógica com meus alunos no ambiente hospitalar. Apesar de não ter tido nenhum preparo para lidar com situações terminais do paciente e com o sofrimento das famílias, é evidente que a rotina diária hospitalar ainda me comove, mas não me amedronta mais. A cada paciente-aluno atendido é uma renovação de energia para enfrentar os obstáculos da vida. A formação acadêmica me capacitou para a competência do ensinar enquanto que o ambiente hospitalar me fortaleceu para conviver com situações emocionais. Com esse amadurecimento houve um aprimoramento na capacidade de lidar com as situações rotineiras hospitalares dentro da ética profissional. 17 Com a classe hospitalar, o aluno estando enfermo e fora do ambiente escolar tem a oportunidade de continuar estudando os conteúdos do ensino regular obrigatório normalmente. Este campo de atendimento educacional tem características próprias, com fatores que interferem e contribuem para o desenvolvimento cognitivo do aluno. Nesse contexto, algumas questões norteadoras guiaram essa investigação: Como acontece o processo de ensino e aprendizagem no contexto hospitalar? Qual a importância do professor no processo de escolarização no ambiente hospitalar? O que torna a Classe Hospitalar uma modalidade da Educação Especial? Quais os fatores relevantes que precisam ser levados em consideração diante do atendimento pedagógico hospitalar? Ao refletir sobre o hospital como campo de atuação pedagógica, busco com esta pesquisa a compreensão de algumas angústias profissionais relacionadas à escolarização das crianças enfermas e internadas em unidades hospitalares. Neste contexto, busco abordar a temática: O Ensino na Classe Hospitalar: Práticas Pedagógicas no Hospital da Criança Santo Antônio em Boa Vista (Roraima). Para tanto, é importante compreender o surgimento do acompanhamento pedagógico dentro dos hospitais, bem como seu funcionamento legal. Sendo assim, delimito a pesquisa ao trabalho docente, às adaptações necessárias e às legislações específicas dentro deste processo de escolarização e aos aspectos importantes que devem ser levados em consideração para este tipo de atendimento. A problemática central que embasa este projeto é: quais as contribuições do ensino e das práticas pedagógicas no ambiente hospitalar, levando em consideração as Políticas Inclusivas? Como forma de responder às inquietudes profissionais e à problemática central, foi eleito como objetivo geral: investigar as contribuições e a importância do atendimento pedagógico no processo contínuo de escolarização na classe hospitalar. Seguindo ao objetivo geral, para que se alcance as respostas referentes à problemática da pesquisa, surgiram os objetivos específicos: 18 Analisar a interação entre Educação e Saúde e sua importância no contexto pedagógico na classe hospitalar; Verificar se o atendimento pedagógico na classe hospitalar condiz com as legislações vigentes no país acerca das políticas públicas educativas; Compreender a atuação e perfil do professor da Classe do HCSA; Analisar os fatores relevantes que precisam ser levados em consideração diante do atendimento pedagógico hospitalar. Apresento a dissertação organizada em capítulos. O primeiro capítulo foi composto pela introdução, no qual se realiza uma breve discussão sobre as ideias principais do trabalho, abrangendo o motivo pela busca desta pesquisa, perpassando pela justificativa, problemática, questões norteadoras, objetivo geral e os objetivos específicos. No segundo capítulo, apresento o aporte teórico com a abordagem sobre Pedagogia e a Classe Hospitalar na modalidade de Educação Especial, políticas públicas. No terceiro capítulo, estão os procedimentos metodológicos, exibindo o caminho percorrido para o desenvolvimento da pesquisa. Enquanto que, no quarto capítulo, apresento a análise dos dados produzidos durante a pesquisa. E, por fim, seguem as considerações finais. 19 2 PEDAGOGIA E PEDAGOGIA HOSPITALAR Ensinar, orientar e educar são ofícios da pedagogia que é entendida como a parte da ciência que se preocupa com a melhoria no processo educacional de aprendizagem dos sujeitos podendo ser desenvolvida no campo docente ou no administrativo, auxiliando-os de forma mais sistematizada para enfrentar os diferentes desafios. 2.1 Pedagogia Quando se fala em Pedagogia, logo vem à mente a imagem de um professor que realiza seus trabalhos com crianças nos anos iniciais da educação básica; contudo, os pedagogos têm uma área de atuação que vai além da tradicional sala de aula. O pedagogo é um profissional formado com saberes que o torna capaz de desenvolver atividades escolares com alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental I, na educação Inclusiva, pedagogia empresarial, presídios, organizações não governamentais como também desenvolver trabalhos na área da gestão, coordenação e/ou orientação pedagógica e atuação junto a disciplinas pedagógicas do curso Normal Superior e Educação de Jovens e Adultos. Desta forma, seus conhecimentos não se limitam somente à área escolar. Neste contexto, conforme Almeida e Soares (2010): A pedagogia, portanto, é a ciência que tem como preocupação a mediação entre o senso comum e o conhecimento elaborado/científico. Ressaltamos, porém, que o conhecimento não é o fim nele mesmo, mas sim o meio para a humanização. Ao pedagogo, em seus diversos campos de atuação (empresas, órgãos públicos, sindicatos, escolas, organizações não 20 governamentais – ONGs, movimentos sociais, hospitais, etc.), cabe discutir os conhecimentos necessários à formação humana em cada determinado momento histórico, bem como as formas metodológicas para a sua socialização. Ou seja, ele se preocupa com as relações indissociáveis – conteúdo/forma, conhecimento/metodologia, as quais estão sempre presentes no processo de ensino-aprendizagem e são indispensáveis para a sua efetivação (ALMEIDA; SOARES, 2010, p.16). A pedagogia ganhou diferentes espaços ganhando mais foco e ênfase neste novo século, no qual o pedagogo também pode desenvolver atividades relacionadas a atendimentos socioeducativos em diferentes ambientes não escolares, com atividades preventivas e educativas, ultrapassando o ensino formal. Como, por exemplo, atividades de planejamento, formação pessoal, orientação, coordenação e criação de projetos educacionais, sociais e culturais para empresas, em departamento de trânsito, tribunais de justiça, sistema penitenciário, na área empresarial, incentivando as pessoas a desenvolver seu potencial criador e a troca de conhecimentos em grupos. No ambiente hospitalar, o professor é de suma importância para incentivar os alunos a continuarem seus estudos interrompidos pela enfermidade. Seja na escola ou fora dela, o professor desenvolve seu saber pedagógico. No contexto da atuação do professor nesse espaço, Rodrigues (2012) descreve: O professor da escola que tenha como norte a diversidade, em uma sala de aula em um hospital, reconhece seu fazer e saber pedagógico, assumindo, explorando e estimulando as potencialidades dos seus alunos. Valoriza a identidade sociocultural e étnica, atende aos desafios de reunir alunos diferentes, tornando-se aquele mediador, que garante espaços de ensino e de aprendizagem para todos (RODRIGUES, 2012, p. 21). Por meio de sua formação e conhecimentos, o campo profissional do pedagogo está cada vez mais diversificado. Seu trabalho visa o desenvolvimento da aprendizagem e está ligado a projetos podendo, assim, ensinar, ministrar formações continuadas, intermediar conflitos ou até mesmo gerir e administrar certos setores com dinamismo e um olhar distinto de outros profissionais, desenvolvendo seu trabalho com eficácia. Em relação à formação e atuação do pedagogo, Libâneo (2002), afirma: Que o curso de Pedagogia se destina a formar o pedagogo especialista, isto é, um profissional qualificado para atuar em vários campos educativos, para atender demandas socioeducativas (de tipo formal, não formal e informal) decorrentes de novas realidades [...]. A caracterização de pedagogo- 21 especialista é necessária para distingui-lo do profissional docente. Importa formalizar uma distinção entre trabalho pedagógico (atuação profissional em um amplo leque de práticas educativas) e o trabalho docente (forma peculiar que o trabalho pedagógico assume na escola). Caberia, também, entender que todo trabalho docente é pedagógico, mas nem todo trabalho pedagógico é docente. Há uma diversidade de práticas educativas na sociedade, assim, podemos definir para o pedagogo duas esferas de ação educativa; escolar e extra-escolar (LIBÂNEO, 2002, p.58). As atividades pedagógicas desenvolvidas dentro de espaços escolares são conhecidas como atividades em espaços formais, enquanto que as atividades pedagógicas desenvolvidas em ambiente não escolar, fora dela, são conhecidas como atividades em espaços não formais. O fato de o processo ensino e aprendizagem acontecer fora do espaço formal não o diminui e nem retira a importância do processo feito em um espaço não formal, posto que ambos possibilitam o aprendizado. Conforme Gastal e Oliveira (2009): Uma distinção possível diz respeito aos espaços onde se dá o processo educativo. Fala-se de espaços ou ambientes formais de educação como sendo aqueles vinculados à escola, instituição mais conhecida pelo seu papel social de prestar educação básica em nossa sociedade. Por outro lado, locais que não são sedes destinadas especificamente para o funcionamento da instituição escolar são denominadas espaços ou ambientes não-formais de educação. Assim, podemos considerar como espaços não-formais todos aqueles situados fora dos limites geográficos da escola, tais como uma praça, uma avenida, uma quadra comercial e/ou residencial, centros comerciais, uma indústria, centros de pesquisa, reservas naturais, museus, centros de ciências, feiras, parques, entre outros ambientes urbanos, rurais e naturais (GASTAL; OLIVEIRA, 2009, p. 02). O trabalho que enfocamos aqui se direciona para as práticas pedagógicas desenvolvidas no hospital. Para melhor compreender o trabalho pedagógico no ambiente hospitalar, vale lembrar que a pedagogia é compreendida como a área de estudo que tem como objeto a educação e o processo de ensino e aprendizagem do ser humano de forma sistematizada. Conforme Ghiraldelli (2006), o termo pedagogia tem sua origem no grego: Paidagogia designava, na Grécia antiga, o acompanhamento e a vigilância do jovem. O paidagogo (o condutor da criança) era o escravo cuja atividade específica consistia em guiar as crianças à escola, seja a didascaléia, onde recebiam as primeiras letras, seja o gymnásion, local de cultivo do corpo (GHIRALDELLI, 2006, p. 8). Buscando o significado etimológico da palavra ―pedagogia‖, vê-se que a mesma era inicialmente composta pelas palavras ―paidos‖ (criança) e ―gogía‖ 22 (conduzir ou acompanhar). O conceito fazia, portanto, referência ao escravo que levava os meninos à escola. Era um acompanhamento à escola, diferenciando da atualidade, na qual o pedagogo é o docente que media o processo de ensino e aprendizagem. Na atualidade, a pedagogia é compreendida como ciência da educação na qual o ser humano percorre um caminho de ensino que o conduz para o conhecimento, aprendizagem e habilidades. A sua formação integral é visada para competências além dos muros da escola. A esse respeito, Loss (2014, p. 25) afirma: ―A Pedagogia é a ciência da educação que investiga a prática educativa e tem condições de contribuir epistemológica e pedagogicamente para o desenvolvimento da educação no que se refere à práxis pedagógica‖. Sendo assim, nesse sentido, o pedagogo deve trabalhar a prática na sala de aula com metodologias de ensino visando estratégias de aprendizagem, interligando teoria e prática. 2. 2 Pedagogia hospitalar – classe hospitalar/atendimento pedagógico hospitalar e sua legislação A pedagogia hospitalar é um ramo da educação que faz parte da educação inclusiva e ocorre em ambientes da saúde para atender pedagogicamente aos alunos que estão afastados da escola devido a uma enfermidade ou tratamento de saúde. Teve seu início marcado desde quando professores ajudaram no atendimento a crianças vítimas da Segunda Guerra Mundial (ESTEVES, 2008). Posteriormente, foram adotadas formas de adaptação do espaço e proposta de estudos teóricos. A primeira intervenção pedagógica em ambiente hospitalar tem seu registro datado em 1935, quando Henri Sellier inaugurou a primeira escola em Paris, para atender crianças e jovens tuberculosos e com problemas de doenças respiratórias. Os primeiros registros de atendimento pedagógico têm marco histórico mundial associado à Segunda Guerra Mundial, quando muitas crianças e adolescentes foram vítimas desse grande conflito, ficando impossibilitados de ir à escola, devido aos ferimentos e mutilações. 23 Após a Segunda Guerra Mundial, houve uma preocupação maior em relação às crianças mutiladas e com as mais diversas doenças, vítimas desse fato histórico, surgindo assim, uma continuidade ao trabalho de Sellier. Nesse sentido, o início da classe hospitalar é retratado por Esteves (2008): A Classe Hospitalar tem seu início em 1935, quando Henri Sellier inaugura a primeira escola para crianças inadaptadas, nos arredores de Paris. Seu exemplo foi seguido na Alemanha, em toda a França, na Europa e nos Estados Unidos, com o objetivo de suprir as dificuldades escolares de crianças tuberculosas (ESTEVES, 2008, p. 02). A partir desse registro, cada país foi organizando seu atendimento e suas legislações de acordo com a demanda e assim, professores foram contratados para realizar atendimentos pedagógicos em hospitais específicos. No que tange ao Brasil, registros apontam o início da classe hospitalar em 14 de agosto de 1950, quando foi implantada no Hospital Jesus, que fica localizado no Rio de Janeiro. O trabalho do profissional de pedagogia nos hospitais é um desafio e vem sendo difundido aos poucos dentro dos hospitais brasileiros: [...] a presença de professores em hospitais para a escolarização das crianças e jovens internados segundo os moldes da escola regular, contribuindo para a diminuição do fracasso escolar e dos elevados índices de evasão e repetência que acometem freqüentemente essa clientela em nosso país. Esse atendimento tem sido o modelo adotado desde 1950 pela primeira classe hospitalar do Brasil, a Classe Hospitalar Jesus, vinculada ao Hospital Municipal Jesus, no Rio de Janeiro, que foi uma das oitenta classes representadas no 1º Encontro Nacional sobre Atendimento Escolar Hospitalar, acontecido em 2000 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, sob a coordenação geral da professora Dra. Eneida Simões da Fonseca (FONTES, 2005, p. 121). A pedagogia hospitalar faz parte da educação como uma forma de auxiliar o aluno em seu desenvolvimento com atividades pedagógicas e recreativas, com o intuito de prevenir que não haja atrasos ou ocorra a evasão escolar. Ainda, favorece o acompanhamento dos conteúdos escolares, assim como auxilia nas relações interpessoais dos discentes, reforçando os laços afetivos e sociais, além de corroborar para um bom desenvolvimento cognitivo ao se organizar um ambiente acolhedor e mais humanizado no ambiente hospitalar durante o período em que o aluno esteja distante de sua rotina escolar formal. Em relação a este espaço, Matos e Mugiatti (2014, p. 41) afirmam: ―[...] todas as crianças têm direito ao ensino escolar; mas para isso é necessário criar espaço 24 de ensino nos hospitais pediátricos, ou correlatos, onde estejam hospitalizados crianças ou adolescentes em idade de escolarização‖. O atendimento pedagógico hospitalar, também denominado de classe hospitalar, assegura à criança em condição de hospitalização o direito da continuidade aos estudos dentro do hospital. A pedagogia hospitalar é amparada diante de algumas bases legais brasileiras que trazem o direito à educação com igualdade de condições de acesso e permanência na escola. A Lei de Diretrizes e Bases da educação brasileira – LDB (Lei n°9394 de 20/12/1996), que estabelece em seu artigo 2° a educação como dever da família e do Estado com finalidade ao pleno desenvolvimento do educando. E pela Lei nº 13.716, de setembro de 2018, que assegura o atendimento educacional ao aluno da Educação Básica para alunos que fiquem ou estejam internados por um longo período, seja em sua casa ou em uma rede hospitalar: Art. 1º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), passa a vigorar acrescida do seguinte Art. 4º-A: Art. 4º- A. Assegurado atendimento educacional, durante o período de internação, ao aluno da educação básica internado para tratamento de saúde em regime hospitalar ou domiciliar por tempo prolongado, conforme dispuser o Poder Público em regulamento, na esfera de sua competência federativa (BRASIL, 2018). Conforme definição constante no texto ―Classe Hospitalar e Atendimento Pedagógico Domiciliar: Estratégias e orientações‖, disponibilizado pelo Ministério da Educação – MEC (2002, p. 13), fica então determinado o atual conceito de Classe Hospitalar: Denomina-se classe hospitalar o atendimento pedagógico educacional que ocorre em ambientes de tratamento de saúde, seja na circunstância de internação, como tradicionalmente conhecida, seja na circunstância do atendimento em hospital-dia e hospital-semana ou em serviços de atenção integral à saúde mental. Atendimento pedagógico domiciliar é o atendimento educacional que ocorre em ambiente domiciliar decorrente de problema de saúde que impossibilite o educando de frequentar a escola ou esteja ele em casas de apoio da sociedade (BRASIL, 2002, p. 13). Na Constituição Federal Brasileira de 1988 estão expressas as leis que regem nosso país, servindo como garantia dos direitos e deveres dos cidadãos brasileiros. A garantia da educação a todos está resguardada no Artigo nº 205 da supracitada Constituição Federal: 25 Art. 205 – A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988, p.123). A Constituição Federal de 1988 criar um Art. específico da garantia da Educação a todos os cidadãos brasileiros, em 1990, no ECA, novamente é dado ênfase ao asseguramento do acesso e permanência à educação de crianças e adolescentes. Em seu Capítulo IV, que trata do direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer, especificamente no Artigo nº 53, deixa claro que: Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - direito de ser respeitado por seus educadores; III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores; IV - direito de organização e participação em entidades estudantis; V - acesso à escola pública e gratuita, próxima de sua residência, garantindo-se vagas no mesmo estabelecimento a irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo de ensino da educação básica. Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais (BRASIL, 1990, p.27). O ECA/1990 é um importante instrumento muito relevante para o Estado Brasileiro, uma vez que visa transformar a realidade da criança e do adolescente, no decorrer do seu desenvolvimento e na garantia de seus direitos. Em 12 de outubro de 1991 foi instituída a Lei nº 8.242, que cria e regulamenta o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA. Em 1995 houve uma preocupação com as crianças em idade escolar que se encontravam hospitalizadas, e assim criou-se a Resolução nº 41, de 13 de outubro do referido ano, no qual é aprovado na íntegra o texto provindo da Sociedade Brasileira de Pediatria, que destaca entre os direitos das crianças e adolescentes internados e amparos específicos como: 8. Direito a ter conhecimento adequado de sua enfermidade, dos cuidados terapêuticos e diagnósticos a serem utilizados, do prognóstico, respeitando sua fase cognitiva, além de receber amparo psicológico, quando se fizer necessário. 26 9. Direito a desfrutar de alguma forma de recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar, durante sua permanência hospitalar (BRASIL, 1995, 01). É visível a quantidade de aparatos legais existentes no Brasil que visam assegurar o pleno desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. É de responsabilidade de toda a sociedade e do poder público fazer com que estes direitos sejam cumpridos. Para que seja respeitado o direito à escolarização de crianças e adolescentes afastados da escola por problemas de saúde, é necessário que se tenha conhecimento de alguns aspectos relevantes e que sejam feitas adaptações das atividades conforme a enfermidade do aluno para conduzir a aplicação e realização dos conteúdos escolares. Como exemplo, podemos citar uma criança com os membros superiores engessados que neste caso precisará de apoio da pedagoga para fazer a transcrição da atividade. Compreender esses aspectos torna o trabalho pedagógico mais significativo e prazeroso. Nessa circunstância, o aluno enquanto paciente hospitalar pode ter na própria enfermaria onde está internado o desenvolvimento de atividades pedagógicas e recreativas que permitem de forma mais dinamizada à criança ou adolescente enfermo o seu integral desenvolvimento, além de contribuir de certa forma para amenizar seu sofrimento. Nesse contexto, podemos compreender a necessidade do profissional da pedagogia no ambiente hospitalar para dar continuidade aos estudos das crianças hospitalizadas. Para Fonseca (2003), a atuação adequada do professor no ambiente hospitalar vai além do favorecimento do processo de ensino-aprendizagem: Na escola hospitalar, cabe ao professor criar estratégias que favoreçam o processo de ensino-aprendizagem, contextualizando-o com o desenvolvimento e experiências daqueles que o vivenciam. Mas, para uma atuação adequada, o professor precisa estar capacitado para lidar com as referências subjetivas das crianças, e deve ter destreza e discernimento para atuar com planos e programas abertos, móveis, mutuantes, constantemente reorientados pela situação especial e individual de cada criança, ou seja, o aluno da escola hospitalar (FONSECA, 2003, p.26). Segundo Thoma e Kraemer (2017) historicamente a educação inclusiva vem mudando ao longo do tempo, que inicialmente foi marcado por um período de exclusão e abandono. No Rio de Janeiro, em 1854, foi criado o instituto para atender 27 os cegos e três anos depois, em 1857, foi criado o instituto dos surdos mudos para atender os deficientes auditivos, porém ainda precisava ser feito algo em prol das pessoas deficientes mentais e físicos. Em meados do século XX, com a articulação de uma política de educação especial, período no qual surgiram as instituições brasileiras da APAE e da Pestalozzi. Instituições que foram fundamentais para as pessoas com deficiências. Em 1969, já havia mais de 800 escolas especializadas para atender as pessoas com deficiências intelectuais. Nos anos 80, a educação especial começa a ganhar mais força e espaço. Em 1996 é publicada a Lei n° 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional vem confirmar que a educação deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino devendo haver serviços de apoio especializados. No senso comum, muitas pessoas acabam confundindo Educação Inclusiva com Educação Especial, porém é importante que se diferencie uma da outra. A Educação Inclusiva surge para acolher e promover o desenvolvimento e aprendizagem de todos na escola regular, principalmente do seu público alvo que são os deficientes, pessoas com transtorno global do desenvolvimento, altas habilidades e/ ou superdotação. Por outro lado, a Educação Especial é uma área de conhecimento que serve para avaliar, buscar novas ofertas, eliminar barreiras, complementar ou suplementar o atendimento com recursos adequados, de forma a contribuir para o desenvolvimento deste aluno da escola inclusiva. A inclusão pressupõe que todas as crianças possam desfrutar do ambiente escolar para lhe proporcionar o desenvolvimento de suas capacidades, o que está expresso na Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994). O princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresente. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação com as respectivas comunidades. É preciso, portanto, um conjunto de apoios e de serviços para satisfazer o conjunto de necessidades especiais dentro da escola (p. 11-12). Apesar das mudanças ocorridas no decorrer histórico da Educação Especial, ainda não temos o atendimento adequado e necessário a todos. Ainda existem 28 escolas sem estrutura física para atender algumas das pessoas com limitações físicas. O ambiente físico, os recursos pedagógicos e os recursos humanos são algumas barreiras que encontramos diante do atendimento ao aluno com necessidades específicas. Novos horizontes da educação nos levam a trabalhar diante das diversidades humanas, adaptando e desenvolvendo atividades significativas, rompendo as barreiras existentes para caminharmos rumo à escola inclusiva. É nesse sentido que visualizo que o atendimento pedagógico hospitalar vai ao encontro daqueles que ficam excluídos da sala de aula comum para a inclusão escolar no ambiente hospitalar. A seguir apresento o Estado da Arte com o qual foi realizada a busca de escritos relacionados à minha pesquisa. 2.3 Estado da arte A fim de se verificar o que já foi produzido sobre o assunto desta pesquisa foi realizada uma busca do Estado da Arte. Este estudo, de caráter exploratório, contribui para a sistematização e avaliação diante de uma área específica de conhecimento e com um período previamente estabelecido. De acordo com Ferreira (2002, p.258), a pesquisa estado da arte: ―[...] se caracteriza por possuir um levantamento bibliográfico, analítico e crítico da produção acadêmica de um determinado tema‖. Com o propósito de mapear e compreender o conteúdo da pesquisa foi realizado um levantamento de dados investigativos que se deu por meio da ferramenta de busca no site da BDTD (Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações), por meio das palavras-chave: Classe Hospitalar, Pedagogia e Pedagogia Hospitalar. Inicialmente, através da busca por assunto com as palavras-chave designadas foram encontrados 59 resultados que, quando refinados por período dos últimos cinco anos (2014 a 2019), os resultados diminuíram para 24. De acordo com os títulos, percebi que alguns não estavam relacionados com a temática do meu estudo, portanto os desconsiderei. Os trabalhos eliminados traziam em seu contexto: a formação de alguns profissionais da saúde (assistente social, enfermeiro); o papel dos periódicos na 29 organização política dos trabalhadores rurais; estomia intestinal; visitas ao setor de radiologia hospitalar e o ensino de radiações ionizantes; perfil auditivo de crianças atendidas em Serviço de Alta Complexidade na cidade de Aracajú; a formação em serviço no Programa Residência Integrada Multiprofissional em Saúde do Hospital de Clínicas de Porto Alegre; atitudes e concepções de professores dos anos iniciais do ensino fundamental em relação ao ensino de Estatística em escolas públicas e privadas em Uberlândia (MG); o trabalho em saúde nos hospitais de gestão terceirizada: o caso do estado de Goiás; produzindo uma disciplina de bioquímica em uma faculdade de medicina; relação entre as táticas de influência e os resultados da liderança na enfermagem. Desta forma, restaram onze trabalhos para serem analisados, sendo dez dissertações e uma tese, os quais se aproximam da minha pesquisa. Tais trabalhos apresentam em seu contexto questões relacionadas com o ensino, recursos utilizados no processo pedagógico dos alunos internados, o trabalho docente, a relação entre a classe hospitalar e a escola regular, desafios e possibilidades desse ensino e as práticas pedagógicas em ambiente hospitalar. As pesquisas estão elencadas no quadro a seguir nos permitindo identificar o título, autor, instituição, ano e nível acadêmico da pesquisa: Quadro 1 – Lista final dos estudos encontrados na BDTD: N° Título do trabalho Autor Titulação Instituição Ano 01 As tecnologias como apoio à mediação pedagógica na classe hospitalar: desafios e possibilidades no ensino multisseriado Maria das Neves Silva Dissertação UnB 2014 02 O ensino de ciências na classe hospitalar: uma reflexão sobre a experiência do HUJM-UFMT Alessandro Rodrigues da Silva Dissertação UFMT 2014 03 O papel do jogo nos processos de aprendizagem de crianças hospitalizadas Paula Pereira Alves Dissertação UFMT 2015 04 Ensino da linguagem escrita no contexto da classe hospitalar: um enfoque metalinguístico Valéria Batista Tese PUC-SP 2015 05 O corpo entre o riso e o choro na classe hospitalar Júlio César Rodrigues Dissertação UFTM 2016 06 Classe Hospitalar: Acessibilidade na estrutura e organização para o Angélica Regina Schmengler Dissertação UFSM- RS 2016 http://bdtd.ibict.br/vufind/Author/Home?author=Silva%2C+Maria+das+Neves http://bdtd.ibict.br/vufind/Author/Home?author=Batista%2C+Val%C3%A9ria http://bdtd.ibict.br/vufind/Author/Home?author=RODRIGUES%2C+J%C3%BAlio+C%C3%A9sar 30 atendimento público-alvo da Educação Especial 07 A utilização dos recursos tecnológicos no processo pedagógico de crianças e adolescentes hospitalizados Jaqueline Müller Dissertação UFSM- RS 2016 08 Trabalho docente e identidade nas classes hospitalares em Goiás Luciana Vaz dos Reis Dissertação UFG 2017 09 Práticas pedagógicas em ambiente hospitalar: a contação de histórias na perspectiva das crianças de um centro de oncologia Osdi Barbosa dos Santos Ribeiro Dissertação UEFS-BA 2018 10 Entre a classe hospitalar e a escola regular: o que nos contam crianças com doenças crônicas Senadath Barbosa Baracho Rodrigues Dissertação UFRN 2018 11 Olhares e narrativas de crianças hospitalizadas sobre a vida escolar Ana Maria Lino Dissertação UFSC-SP 2019 Fonte: Da autora 2.3.1 Descrevendo as pesquisas A pesquisa intitulada As tecnologias como apoio à mediação pedagógica na classe hospitalar: desafios e possibilidades no ensino multisseriado, foi realizada por Silva (2014) sendo parte integrante do Mestrado em Educação à Universidade de Brasília – UnB, com eixo de pesquisa: Educação especial e inclusiva. Numa abordagem qualitativa, se enquadra no nível de pesquisa-ação, tendo por finalidade investigar o uso das tecnologias como apoio à mediação pedagógica na classe hospitalar do Hospital Ceilândia do Distrito Federal. Diante da análise, é possível compreender que a coleta de dados aconteceu por meio de observação, diário de bordo e entrevista semiestruturada e foi realizada dentro de quatro etapas: levantamento preliminar; planejamento da ação educativa; implementação do projeto educativo e avaliação dos resultados da ação. Oito professores participaram como sujeitos da pesquisa. Como efeito da avaliação educativa proposta, a autora conclui que o uso das tecnologias como apoio à mediação pedagógica pode facilitar na individualização dos atendimentos educativo no contexto multisseriado e ainda se destacam como recursos de acessibilidade diante das barreiras pela mobilidade reduzida dos http://bdtd.ibict.br/vufind/Author/Home?author=Lino%2C+Ana+Maria 31 estudantes hospitalizados. Além de proporcionar aprendizagem dos conteúdos curriculares, os jogos educativos também auxiliam nos processos terapêuticos. Silva (2014) realizou a pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso intitulada: O ensino de ciências na classe hospitalar: uma reflexão sobre a experiência do HUJM-UFMT, apresentada ao Instituto de Educação da Universidade Federal do Mato Grosso. Seu objetivo foi analisar a prática pedagógica desenvolvida na Classe Hospitalar do Hospital Universitário Júlio Muller, buscando compreender o ensino de ciências naturais neste lugar. Desta forma, visou analisar aspectos históricos, administrativos e pedagógicos. Para a coleta de dados foram realizadas observações, entrevistas semiestruturada e questionários. Quatro profissionais da Educação participaram como sujeitos da pesquisa. Para análise e interpretação dos dados, o autor destacou o ambiente físico; rituais e regras presentes; prática pedagógica das professoras; relacionamento interpessoal entre alunos, profissionais da saúde e da educação; abordagem dos conteúdos voltados ao ensino de ciências. O amparo teórico para compreensão dos aspectos históricos e experiências relacionadas com a classe hospitalar, está pautado em Goffman (2005), Foucault (1982), Fonseca (1999, 2002, 2008) entre outros. O espaço da Classe Hospitalar do Hospital Universitário Júlio Muller está integrado à pediatria, não fazendo restrição quanto ao público-alvo. É frequentada por alunos hospitalizados que manifestam interesse em dar continuidade aos estudos e demais pacientes e acompanhantes que fazem uso do espaço para leituras, brincadeiras e uso dos brinquedos disponíveis. Os recursos destinados a esta classe hospitalar são viabilizados principalmente por meio de projetos desenvolvidos pelos profissionais que ali atuam. No tocante ao ensino de ciências naturais são desenvolvidas atividades relacionadas com saúde, doença, partes do corpo humano, alimentação, higiene entre outras temáticas que fazem parte do currículo de ciências naturais e favorecem para que as crianças compreendam a importância dos procedimentos médicos a que elas são submetidas. Ou seja, prioriza o ensino da educação à saúde. Alves (2015) realizou a pesquisa com abordagem qualitativa descritiva, com a qual buscou compreender o papel do jogo nos processos de aprendizagem de 32 crianças hospitalizadas analisando a relação do papel do jogo e os processos educativos na classe hospitalar. Seu amparo teórico para compreensão do contexto da pesquisa está em Morgado (2014), que defende as atividades lúdicas; Vygotsky (1998) com o desenvolvimento proximal; entre outros. Os processos de aprendizagem ocorrem tanto no ambiente da classe hospitalar como na brinquedoteca, que se mostrou como um espaço de aprendizagem, lazer e desenvolvimento, auxiliando no enfrentamento de situações às doenças. Desta forma, estudar no hospital requer alguns cuidados devido à condição física e emocional da criança. O jogo no hospital permite à criança o mundo da imaginação, da criatividade possibilitando a interação com outras crianças e assim, se aproxima do mundo externo, ou seja, o jogo é um elemento fundamental nos processos de aprendizagem. Batista (2015) realizou sua pesquisa qualitativa descritiva, como parte integrante do Doutorado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. A autora teve como foco o ensino da linguagem escrita no contexto do atendimento educacional na classe hospitalar, objetivando garantir a autonomia na leitura e escrita das crianças atendidas. No tocante ao título da pesquisa, é notório que o atendimento pedagógico na classe hospitalar, por acontecer de forma individualizada ou em pequenos grupos, facilita ao professor contribuir com a superação das dificuldades de aprendizagem, tornando o ensino e a aprendizagem mais eficientes. Desta forma, o ensino metalinguístico na classe hospitalar contribui para amenizar a defasagem escolar. Rodrigues (2016) desenvolveu a pesquisa qualitativa do tipo descritiva em nível de Mestrado em Educação Física pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro, com objetivo de analisar a percepção do professor em relação ao corpo da criança hospitalizada, verificando como esse profissional considera o corpo em seu trabalho. Para a coleta de dados foi utilizada a entrevista semiestruturada e a observação não participante. As análises da entrevista foram realizadas a partir da técnica de elaboração e análise de unidades de significados, sendo utilizadas duas perguntas geradoras: ―Como você vê o corpo de seu aluno da classe hospitalar? E Como você trabalha o corpo do aluno na classe hospitalar?‖. 33 Diante do resultado da análise foi constatado que 75% dos sujeitos envolvidos na pesquisa entendem o corpo do aluno da classe hospitalar como fragilizado e dependente dos procedimentos clínicos. E respondendo a segunda pergunta 50% discorrem sobre o cuidado, respeito e habilidades cognitivas. O autor ainda observa que os profissionais da classe hospitalar entendem a fragilidade dos alunos, porém o foco da sua atuação é no desenvolvimento das atividades pedagógicas com transmissão dos conteúdos curriculares, mas sempre respeitando a enfermidade e a individualidade de cada aluno. Nesse sentido, existe um cuidado em relação à fragilidade do aluno, mas o cuidado com a restauração do corpo saudável é prioritariamente da equipe da saúde. A inserção do profissional de Educação Física no ambiente hospitalar é vista pelo autor como uma possibilidade, na qual poderia trabalhar através dos jogos, brincadeiras, esportes e danças, sempre respeitando a fragilidade do corpo. Por outro lado, o espaço físico e a falta de conhecimento das patologias que acometem as crianças são algumas barreiras a serem vencidas por este profissional. Schmengler (2016) realizou a pesquisa qualitativa de dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação da Universidade Federal de Santa Maria, RS, intitulada: Classe Hospitalar Acessibilidade na estrutura e organização para o atendimento ao público-alvo da Educação Especial. Cinco pessoas foram sujeitos da pesquisa, entre elas a coordenadora pedagógica do setor educacional do Hospital Universitário de Santa Maria, duas bolsistas e dois alunos representados por suas mães. Ressaltando que esses dois alunos (um com baixa visão e o outro com altas habilidades/superdotação) foram escolhidos por apresentarem características do público alvo da educação especial. O suporte legal é no contexto que todo sujeito tem direito à educação. Desta forma, o ideal é promover o ensino nos mais diferentes ambientes possíveis, sendo necessário fazer adaptações de acessibilidade de acordo com as especificidades da demanda. O objetivo principal foi verificar a estruturação e organização para o atendimento dos alunos. Para alcançar seu objetivo a autora contemplou como procedimentos a entrevista semiestruturada e observação no espaço destinado ao atendimento pedagógico. Ficou constatado que existem alguns aspectos deficitários de acessibilidade arquitetônica e de comunicação dentro do espaço hospitalar que precisam ser 34 adequadas, os quais não dependem apenas dos profissionais da educação. Como direito a inclusão a autora finaliza sua dissertação fazendo uma observação da importância em promover a inclusão sem restrição de espaço específico e assim, fazer valer o direito a esse público num contexto social. Müller (2016) realizou a pesquisa qualitativa intitulada: ―A utilização dos recursos tecnológicos no processo pedagógico de crianças e adolescentes hospitalizados‖, em nível de Mestrado em Tecnologias Educacionais em Rede, pela Universidade Federal de Santa Maria – RS. No que tange aos objetivos, a autora visou analisar as possíveis contribuições que os recursos tecnológicos móveis podem proporcionar à prática dos professores e aos alunos hospitalizados. Ainda propõe capacitar os professores para o uso dos recursos tecnológicos, construindo atividades que contribuam para o ensino e aprendizagem dos alunos da ala pediátrica aos do Centro de Tratamento da Criança e Adolescente com Câncer. Na visão da autora, os diferentes instrumentos tecnológicos servem como meio de pesquisa e entretenimento. Desta forma, compreende que com a criação de softwares se tem a possibilidade de realizar tarefas, editando textos e imagens, criando planilhas, tornando assim a simplificação das tarefas. Neste contexto, pode também auxiliar durante as atividades escolares, influenciando na aquisição de conhecimento. Apresentou recursos tecnológicos a serem usados no espaço não formal de ensino, tornando as atividades cada vez mais interessantes. Reis (2016) desenvolveu sua pesquisa de Mestrado em Educação pela Universidade Federal de Goiás/Regional Catalão, intitulada: Trabalho Docente e Identidade nas Classes Hospitalares em Goiás, com o objetivo de caracterizar o trabalho docente e a constituição da identidade do professor da classe hospitalar. No decorrer da pesquisa foram observados as rotinas e espaços da Classe Hospitalar; foram analisadas as condições físicas e emocionais do aluno; as especificidades do atendimento pedagógico. Nesse sentido, os resultados mostram que o professor da Classe hospitalar cria sua identidade e toma consciência do seu papel, viabilizando no hospital a continuidade dos estudos do aluno, respeitando sua rotina dentro do hospital. Na escola regular geralmente o planejamento é quinzenal e na Classe Hospitalar é feito de forma flexível, de acordo com o tempo de hospitalização do aluno. Os professores envolvidos na pesquisa relatam que o planejamento é feito 35 diariamente devido à rotatividade dos alunos atendidos, mas ainda tem o planejamento flexível para aqueles alunos com uma previsão média de internação. No tocante aos cuidados essenciais entre um atendimento e outro, as professoras demonstraram usar os procedimentos adequados: higienização das mãos entre um atendimento e outro; ter precaução no contato físico com alunos; a utilização de luvas, capote e máscara quando necessário. A formação continuada também foi pontuada como uma prática dessas profissionais. Ribeiro (2018) desenvolveu sua pesquisa de Mestrado em Educação pela Universidade Estadual de Feira de Santana (BA) e objetivou com sua pesquisa de abordagem qualitativa compreender o sentido que as crianças do Centro Oncológico do Hospital Estadual da Criança dão à contação de histórias, paralelamente às práticas pedagógicas já desenvolvidas neste ambiente hospitalar. Os estudos tiveram como aporte teórico de referência Matos e Mugiatti (2008, 2011,2014). Onze crianças participaram da entrevista, relatando que as atividades pedagógicas no ambiente hospitalar são relevantes por proporcionar o bem-estar e ajudar a lidarem melhor com a situação que estão vivendo. Ainda, solicitaram que esse tipo de atividade seja realizado com mais frequência. As crianças se identificam com a professora, uma vez que esta desenvolve práticas pedagógicas envolvendo o lúdico, a brincadeira e a contação de história, que lhes proporcionam momentos alegres diferente dos procedimentos médicos que lhes causam medo e às vezes até a dor, porém necessários para o tratamento de sua saúde. Há necessidade da implantação de uma classe hospitalar para atender essas crianças de forma mais pontual no contexto do estudo curricular, pois são atendidas no espaço da brinquedoteca. Essa pesquisa difere das demais pela patologia que acomete as crianças, ocasionando, assim, um afastamento do seu convívio familiar, escolar e social. Independentemente da situação clínica, a criança se sente valorizada ao desenvolver suas habilidades. Rodrigues (2018) desenvolveu sua pesquisa qualitativa (Dissertação de Mestrado), com o título: ‗Entre a Classe hospitalar e a escola regular: o que nos contam crianças com doenças crônicas‘, traz uma investigação baseada na narrativa autobiográfica de crianças em tratamento de doenças crônicas, com seus modos de perceber o processo de afastamento e retorno à escola regular. 36 Para dialogar com as crianças foram utilizadas algumas perguntas pré- definidas e um boneco com o qual as crianças interagiam contando para ele como era e o que gostavam de fazer na escola em que elas estudavam. Por meio da interação com o boneco, as crianças tiveram a oportunidade de relatar sua visão diante da escola, refletindo e compreendendo os desafios que enfrentam fazendo um paralelo com os estudos no ambiente hospitalar, que na visão deles é um momento que representa a normalidade da vida fora do hospital. Lino (2019) realizou a pesquisa de Dissertação de Mestrado em Educação apresentada à Universidade Federal de São Carlos, com abordagem qualitativa intitulada: ―Olhares e narrativas de crianças hospitalizadas sobre a vida escolar‖. O objetivo do estudo foi analisar e compreender o que as crianças contam sobre as práticas escolares. Sob o olhar das crianças, a escola é descrita com características conteudistas e espaço de interação entre os amigos. Demonstram aceitar estudar no ambiente hospitalar. Diante da análise dos trabalhos relacionados, pode se concluir que o atendimento pedagógico hospitalar tem o objetivo de assegurar o atendimento educacional ao aluno hospitalizado de acordo com a legislação vigente como a LDB 9394/96, que trata das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica e o documento de estratégias e orientações da Classe hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar elaborado pelo MEC/2002, onde é assegurado o atendimento educacional especializado – AEE, fora do espaço escolar. O atendimento escolar no ambiente hospitalar tem características diferentes da escola regular devido à diferença de série, idade e fragilidade das crianças; desta forma, permite um planejamento flexível e/ou individualizado, atendendo às especificidades dos alunos internados. A análise qualitativa com observações e entrevistas semiestruturadas dos sujeitos da pesquisa se fez presente em geral nos trabalhos. Quanto à titulação oito das dissertações são de Mestrado em Educação: Silva (2014 a), Silva (2014b), Alves (2015), Schmengler (2016), Reis (2017), Ribeiro (2018), Rodrigues (2018), Lino (2019); uma em mestrado de Educação Física: Rodrigues (2016); uma de Mestrado Profissional em Tecnologias Educacionais em Rede: Müller (2016); e por fim uma tese de Doutorado em Educação: Batista (2015). Discutindo a inclusão e a humanização em ambiente hospitalar, diversos autores dão suas contribuições. Silva (2014 a) e Müller (2016) descrevem sobre o 37 uso das tecnologias como recurso de acessibilidade aos alunos hospitalizados, favorecendo a inclusão digital e social. Silva (2014b) busca discutir o ensino de ciências na Classe Hospitalar, priorizando o ensino da educação para a saúde. Alves (2015) expõe a importância do jogo como um elemento mediador no processo de aprendizagem. Ribeiro (2018) expõe a relevância da prática de contação de história, defendendo a promoção do entretenimento e aprendizado tornando o ambiente mais prazeroso e humanizado. Os estudos de Lino (2019) e Rodrigues (2018) se aproximam pelo objetivo da pesquisa, pois ambos buscam, de forma mais lúdica, analisar a visão das crianças sobre as práticas escolares, nos mostrando que as atividades escolares contribuem para que a criança se sinta mais fortalecida para o enfrentamento à sua condição de saúde. São diferenciadas pelos recursos utilizados. A maioria dos autores aprofundou suas discussões sobre o tema da educação hospitalar fundamentados nas concepções de alguns teóricos, mas entrelaçados por fundamentação teórica específica em: Fonseca (1999, 2008) Matos e Mugiatti (2008, 2011, 2014). São eles: Silva (2014 b); Batista (2015), Lino (2019) e Ribeiro (2018). Enquanto que os fundamentados em Fonseca (2003) e Matos (2009) são: Silva (2014 a); Rodrigues (2016). Já Schmenger (2016) e Reis (2017) fundamentaram-se em Fonseca (1999, 2008, 2012, 2015, 2016). Encorajada pelos estudos relacionados nessa análise, percebo que foi relevante para o desenvolvimento de minha pesquisa no HCSA, pois a parceria entre a classe hospitalar e a escola regular é fundamental para a continuidade da escolarização, de forma que o aluno se sinta valorizado. Duas das pesquisas elencadas trazem os alunos internados como sujeitos da pesquisa, diferentemente da minha pesquisa que foca nos docentes da classe hospitalar. Em geral, a diferenciação com minha pesquisa está relacionada com a educação inclusiva. A busca pela prática pedagógica desenvolvida na classe hospitalar, aspectos históricos, administrativos, pedagógicos, o amparo teórico e a abordagem qualitativa aproxima minha pesquisa das pesquisas elencadas no estado da arte. Em relação às regiões em que os artigos foram publicados, ficam assim distribuídos: 03 (três) trabalhos da Região Sul; 02 (dois) da Região Sudeste; 04 (quatro) da Região Centro Oeste e 02 (dois) da Região Nordeste. Estes dados provavelmente se ratificam devido estas três primeiras regiões concentrarem o maior 38 número de universidades brasileiras, tanto em nível público como privado com programas de pós-graduação. Na Região Nordeste há uma grande preocupação com esse tipo de pesquisa, especificamente desenvolvidas pela Universidade Federal da Bahia. Nenhum trabalho da Região Norte foi contemplado, o que nos mostra que este tema ainda precisa ser mais expandido pelo Brasil, reforçando a importância destes estudos. Graficamente ficam assim distribuídas as pesquisas relacionadas no estudo de caso: Gráfico 1 – Distribuição regional das pesquisas do estudo de caso Fonte: Da autora (2020) Seguindo a escrita da dissertação, apresentamos o capítulo dos procedimentos metodológicos, com detalhamento da produção dos dados para análises e resultados da pesquisa. 2 4 2 3 Regiões Nordeste Centro - Oeste Sudeste Sul 39 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Os procedimentos metodológicos para concretização desta pesquisa estão baseados numa pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso, com abordagem qualitativa descritiva. Para tanto, foram necessárias algumas inter-relações com as profissionais da Educação, que são sujeitos parte integrante da pesquisa, aprofundamento bibliográfico e entrevista semiestruturada relacionada com a prática educativa desenvolvida no ambiente hospitalar objetivando a compreensão da relevância do atendimento pedagógico e os saberes necessários ao trabalho docente na classe hospitalar. Desta forma, este estudo aborda a prática pedagógica hospitalar no HCSA, sendo esse capítulo composto pela caracterização do local da pesquisa e das participantes, apresentação da abordagem metodológica e instrumentos utilizados na produção de dados analisados. Com o estudo de caso é possível ampliar o conhecimento e a compreensão sobre o processo organizacional e questionamentos a serem pesquisados. Nesse sentido é investigado o processo de ensino e aprendizagem e a importância do professor nesse processo, buscando compreender os fatores que precisam ser levados em consideração para esse atendimento e o que torna a classe hospitalar uma modalidade da Educação Especial no ambiente hospitalar. Conforme Gil: O estudo de caso é uma modalidade de pesquisa amplamente utilizada nas ciências sociais. Consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou poucos casos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento; tarefa praticamente impossível mediante outros delineamentos já considerados (GIL, 2017, p. 34). Durante a ação de pesquisar foi permitido ampliar o olhar profissional no campo não formal de ensino dando ressignificação específica ao trabalho 40 pedagógico no ambiente hospitalar. Dessa forma, foi possível a busca de informações sobre o histórico e funcionamento da Classe Hospitalar, o que permitiu descrever os resultados e melhorar na atuação da prática profissional. Nesse contexto, Tardif (2007) afirma que: Professores são como atores competentes, sujeitos de conhecimento (...) é um ator no sentido forte do ermo, isto é, um sujeito que assume sua própria prática a partir de significados que ele mesmo lhe dá, um sujeito que possui conhecimentos e um saber-fazer provenientes de sua atividade a partir dos quais ele a estrutura e orienta (...) a pesquisa sobre o ensino deve se basear num diálogo fecundo com os professores sujeitos competentes que detêm saberes específicos ao seu trabalho (TARDIF, 2007, p. 230). Com a pesquisa bibliográfica é possível fazer levantamentos e estudos de materiais já publicados, para assim dar embasamento teórico à pesquisa. Conforme Gil (2017): A pesquisa bibliográfica é elaborada com base em material já publicado. Tradicionalmente, esta modalidade de pesquisa inclui material impresso, como livros, revistas, jornais, teses, dissertações, anais de eventos científicos. Todavia, em virtude da disseminação de novos formatos de informação, estas pesquisas passaram a incluir outros tipos de fontes, como discos, fitas magnéticas, CDs, bem como o material disponibilizado pela Internet (GIL, 2017, p. 28). Compreendendo que o professor no ambiente hospitalar desenvolve atividades escolares com o aluno hospitalizado, buscou-se elementos que integram a pesquisa com o relato das professoras, para uma análise do funcionamento da Classe Hospitalar da unidade. Esta análise aconteceu por meio de leitura de livros e publicações periódicas sobre a temática e dos dados coletados por meio da entrevista. 3.1 Local da pesquisa A pesquisa foi realizada com profissionais da educação que realizam seu trabalho no Hospital da Criança Santo Antônio - HCSA, geograficamente localizado em Boa Vista, capital roraimense da Região Norte do Brasil. De acordo com dados divulgados em 27 de agosto de 2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sua população era de 419 652 habitantes em 2020. 41 Segundo Freitas (2009), Boa Vista é a capital do Estado de Roraima, que está localizada a 212 km da fronteira com a Venezuela, à margem direita do Rio Branco. Destaca-se pelo traçado urbano em forma de leque planejado pelo engenheiro civil Darcy Aleixo Derenusson. Com clima quente e úmido, apresenta apenas duas estações climáticas predominantes: inverno e verão. O inverno é o período chuvoso que vai de abril a setembro enquanto que o verão entre os meses de outubro a março apresenta temperaturas na média dos 38°C. É a única capital totalmente ao norte da linha do Equador e a mais distante de Brasília, capital brasileira. Sua população é composta por brancos, negros, pardos e indígenas. A escolha por este hospital se deu pelo fato de ser o único hospital do Estado que oferta esse tipo de atendimento e por eu fazer parte dessa equipe de profissionais. Com a imagem no mapa do Brasil, podemos nos situar geograficamente quanto à localização regional do HCSA. Figura 1 – Localização do hospital HCSA, onde está localizada a Classe Hospitalar Fonte: Da autora (2019) Na Figura 1 temos a representação visual do mapa do Brasil no qual o Estado de Roraima está destacado ao Norte em vermelho e no seu interior consta um ponto 42 azul indicando a localização da capital e seu mapa urbano. No mapa urbano indicado com um ponto alaranjado está a localização do HCSA acompanhado de sua vista aérea. 3.2 Histórico do Hospital da Criança Santo Antônio No final da década dos anos 90, com o aumento significativo da população roraimense, as autoridades políticas constataram a necessidade da construção de um hospital infantil com médicos especialistas, estrutura e equipamentos adequados para atender esta demanda; pois, até então, crianças, adolescentes e adultos eram atendidos no único hospital de emergência e urgência do Estado. Diante dessa realidade, no ano 2000 foi inaugurado o Hospital da Criança Santo Antônio – HCSA. O hospital fica localizado na Avenida das Guianas, nº 1645, bairro 13 de Setembro, na área urbana do município de Boa Vista, capital do Estado de Roraima. Figura 2– Placa de Inauguração do HCSA Fonte: Da autora (2019) Na Figura 2 consta a representação retangular da placa em bronze com o nome do hospital e o nome das autoridades políticas com seus referidos cargos 43 políticos atuantes em 2000, ano no qual foi inaugurado o hospital. Na Presidência da República Brasileira: Fernando Henrique Cardoso; Ministro da Saúde: José Serra; Prefeito Municipal de Boa Vista: Brigadeiro Ottomar de Sousa Pinto; Secretária Municipal de Saúde: Marisa Natália Pinto; Secretária Municipal de Obras: Cel. Aécio Medeiros Duarte Ramos. Abaixo dos nomes consta o mês e ano de reinauguração (agosto de 2000). O HCSA foi inaugurado em 13 de agosto de 2000, pelo então prefeito Ottomar de Sousa Pinto. O hospital tem uma área de 2000m2, com 1.400m2 de construção, sendo o único hospital infantil de médio porte do Estado. O mesmo fica sob a responsabilidade da Prefeitura Municipal de Boa Vista No nome do hospital já indica que é um local para atender crianças. De acordo com o ECA, Lei 8.069/1990 (BRASIL, 1990), em seu art. 2°, considera-se criança, para efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. O hospital tem como referência o ECA, porém, de acordo com a política interna, os atendimentos na emergência e urgência, são estendidos para atender crianças com até treze anos incompletos, com argumentos do período da transição de criança para adolescente. As imagens da estrutura física do ambiente hospitalar apresentadas servem para ajudar na visualização e construção mental do cenário da pesquisa. Figura 3 – Fachada principal HCSA Figura 4 – Fachada Urgência e Emergência HCSA Fonte: Da autora (2019) 44 Na Figura 3, podemos observar a fachada da entrada principal localizada no Bloco A, na qual fica o serviço de marcação de consultas e a entrada dos funcionários, dos visitantes e dos acompanhantes das crianças que estão nos blocos de internação. Na Figura 4, é possível visualizar a entrada na qual os responsáveis buscam o atendimento de urgência e emergência. Esses dois serviços têm o funcionamento de 24 horas diariamente. A entrada da urgência é destinada aos casos mais graves, principalmente aqueles que chegam de ambulância. O HCSA fica sob a responsabilidade da Prefeitura Municipal de Boa Vista e ali se realizam procedimentos de média e alta complexidade em Roraima destinados ao público infantil e infanto-juvenil. Atualmente, conta com 51 leitos distribuídos na emergência sendo 05 leitos para o Trauma; 15 leitos na Unidade de tratamento Intensivo - UTI; 08 leitos na Unidade de Cuidados Permanentes – UCP; 69 leitos distribuídos entre os blocos F, G e H. Assim, no total, são disponibilizados 143 leitos neste hospital. Desde 2016, o HCSA vem passando por reformas. Já foi reformado até o momento (Outubro/2020) o bloco A (administrativo), onde fica a direção geral e direção administrativa, coordenações, ambulatórios de especialistas, brinquedoteca ambulatorial e recepção para entrada aos blocos de internação. Também os blocos B, C e D, onde ficam o Laboratório de Análises Clínicas, o Setor de Imagem (Raio X e ultrassonografia), Emergência, Trauma e UTI. Os blocos de internação F e H, e o bloco E, que comporta a lavanderia, cozinha, refeitório, farmácia, entre outros setores, também foram contemplados com a reforma. Por fim, o bloco de internação G está sendo contemplado com a reforma e seus pacientes foram realocados para o bloco H. Com as reformas houve melhoria na estrutura física, ambiente, climatização, decoração, equipamentos, mobiliários, hidráulica e elétrica. Nos blocos de internação as torneiras são com acionamento automático, o que ajuda na prevenção de contato diante da pandemia do Covid-19. As paredes dos corredores são decoradas com quadros de desenhos e super-heróis infantis. Para diminuir o intenso calor do Norte, a novidade é a nova cobertura termoacústica, que diminui o calor reduzindo os custos com climatização. 45 Figura 5 – Corredor do Bloco B – HCSA Fonte: Da autora (2020) Na figura 5, podemos observar o corredor do bloco B, que recentemente foi reformado e decorado com quadros infantis, luminárias ao teto que refletem no chão e ao fundo a entrada que dá acesso para a sala do RX e para a sala do laboratório. Além de realizar atendimentos de emergência e urgência, oferece também atendimento de regime ambulatorial, pronto socorro, internação hospitalar, cirurgias eletivas e tratamento clínico geral e especializado. Tais procedimentos são garantidos por Lei. Podemos encontrar na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 196, por meio da Lei nº 8.080/1990, o atendimento gratuito à saúde pelo Sistema Único de Saúde – SUS, que foi uma grande conquista do cidadão brasileiro. A maioria dos funcionários da saúde são concursados, enquanto que outros são do processo seletivo de contratação temporária, com alguns terceirizados para o serviço de lavanderia, limpeza, portaria e segurança, e ainda há as professoras pertencentes à SMEC, cedidas pela secretaria da Educação para desenvolver seus trabalhos no hospital. No total, aproximadamente novecentos servidores, distribuídos entre os três turnos (matutino, vespertino e noturno), fazem parte da equipe profissional do hospital. Na entrada do bloco ‗A‘ está fixada a placa de reinauguração do hospital e um painel informativo da unidade contendo a visão, missão e valores do hospital, como podemos observar nas figuras a seguir: 46 Figura 6 – Placa de Reinauguração HCSA Figura 7 – Painel: Visão, Missão e valores HCSA Fonte: Da autora (2020) A Figura 6 é a representação retangular da placa em aço inox com o símbolo da prefeitura, o nome do hospital e o nome das autoridades políticas com seus referidos cargos políticos atuantes em 2017, no momento da reforma e reinauguração do Bloco A deste hospital. Na Presidência da República Brasileira: Michel Temer; Prefeita de Boa Vista: Teresa Surita; Secretário Municipal de Saúde: Cláudio Galvão dos Santos; Secretaria Municipal de Obras-interina: Cremildes Duarte Ramos. Abaixo dos nomes consta um pensamento ―O nosso sucesso é proporcional ao tamanho do nosso sonho‖, de autoria desconhecida e/ou não informada e, ainda, o mês e ano de reinauguração. Na Figura 7 consta a ilustração de quatro hexágonos com cores diferentes: alaranjado (visão), verde (missão), azul claro (valores) e o azul escuro com o símbolo da prefeitura em forma de leque com o slogan ―Trabalhar e cuidar das pessoas‖. Segundo esse material, o hospital tem como visão: ―ser uma referência médico-assistencial, através da participação dos servidores e da população, visando prestar um serviço de excelência e qualidade, pautado na ética, transparência e 47 comunicação‖; e missão: ―prestar atendimento em saúde às crianças e adolescentes em nível de média e alta complexidade, abrangendo serviços de urgência e emergência, ambulatoriais, internações e cirurgias, incluindo outras variadas atividades de suporte terapêutico (farmacêutica, laboratorial, escolar, social, psicológica, entre outras)‖; e também como valores: ―Humanização e solidariedade; compromisso com o trabalho; resolutividade; colaboração; qualidade na assistência; transparência e honestidade‖. 3.3 Surgimento da classe hospitalar no HCSA O projeto da Classe Hospitalar no HCSA tem seu histórico de criação no ano de 2007, quando foi elaborado por três pessoas: uma psicóloga, uma pedagoga e a coordenadora do setor de Humanização. Em funcionamento há 13 anos, inicialmente a classe hospitalar contava com uma pedagoga que atendia pedagogicamente as crianças em seus leitos ou com atividades recreativas no espaço da brinquedoteca. O atendimento pedagógico era destinado às crianças de escolas municipais da capital Boa Vista-RR. O projeto da classe hospitalar, nesta instituição, surgiu a partir de estudos da política pública de Humanização e de uma proposta em realizar o atendimento pedagógico no HCSA pautado em três conceitos: Pedagogia Hospitalar, Classe Hospitalar e Recreação, atendendo ao Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar – PNHAH (BRASIL, 2001) que: [...] propõe um conjunto de ações integradas que visam mudar substancialmente o padrão de assistência ao usuário nos hospitais públicos do Brasil, melhorando a qualidade e a eficácia dos serviços hoje prestados por estas instituições (BRASIL, 2001, p.07). As imagens da classe hospitalar do Hospital da Criança Santo Antônio em Boa Vista, Roraima, nos oportunizam a entrada para o mundo visual do espaço pedagógico neste hospital, destinado à realização das atividades escolares. 48 Figura 8 – Porta de entrada da Classe Hospitalar/HCSA Figura 9 – Parte interna da Classe Hospitalar/HCSA Fonte: Da autora (2019) A Figura 8 nos apresenta a porta fechada da entrada para a Classe Hospitalar, onde se vê um cartaz indicativo com o nome da Sala Pedagógica e um desenho de uma criança estudando e sendo medicada num hospital. Por outro lado, a Figura 9 nos mostra a parte interna da sala pedagógica, na qual é possível visualizar alguns mobiliários da sala: mesas, cadeiras, armários, quadro branco melamínico, cartaz com alfabeto, brinquedos, bebedouro e impressora. 3.4 Participantes da pesquisa A pesquisa foi realizada com duas professoras que desenvolvem seu trabalho pedagógico no ambiente hospitalar do HCSA. Estas forneceram informações de seu campo e atuação profissional que são importantes para compreender suas ações e suas atividades neste ambiente. A participação de cada profissional estava condicionada à aceitação e autorização para a realização da pesquisa, por meio de assinatura do TCLE, que é um documento importante e obrigatório quando a pesquisa é realizada diretamente com pessoas. Através da resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 466/12, o 49 termo é o documento que garante ao sujeito da pesquisa a proteção e o respeito aos seus direitos. Um critério de inclusão da amostra para a entrevista constitui no tempo mínimo de dois anos de docência na Classe Hospitalar, o que foi atendido pelas entrevistadas, conforme mostra o quadro 2: Quadro 2 – Tempo de docência na Classe Hospitalar/ HCSA: Tempo de docência Quantidade de pedagogas Porcentagem 2 a 4 anos 00 0% 5 a 9 anos 01 50% 10 ou mais 01 50% Total 02 100% Fonte: Da autora 3.5 Experiência de trabalho Ressalto aqui que faço parte desta equipe de trabalho pedagógico, sendo que minha atuação no momento é como pesquisadora. Conforme minha experiência de trabalho há mais de dez anos no HCSA, destaco que alguns elementos básicos foram deixados de ser explorados no ato da entrevista, e assim não pode fazer parte do material da análise. Mas, acredito ser relevante para a compreensão do processo pedagógico hospitalar, logo aqui deixo registrados: Tempo de permanência na internação para receber o atendimento pedagógico: de acordo com o projeto interno da Classe Hospitalar para a criança receber o atendimento pedagógico é necessário que ele permaneça internado pelo menos por três dias. Esse período serve para que possam ser feitos todos os trâmites com a escola de origem. Caso o período de internação seja inferior a três dias, a criança é atendida somente com atividades lúdicas, como passatempos, jogos, desenho e pintura. Faixa etária para atendimento no HCSA: este hospital oferece atendimento de urgência e emergência com internações para pacientes com no mínimo 30 dias de vida e no máximo 12 anos e 11 meses e 29 dias, ou seja, 13 anos incompletos. No ambulatório são atendidos pacientes com até 16 anos incompletos, ou seja, 15 anos e 11 meses e 29 dias. No caso, se precisarem de internação para possíveis 50 procedimentos médicos, esses pacientes são encaminhados para o Hospital Coronel Mota ou ainda para o Hospital Geral de Roraima - HGR. As crianças com menos de 30 dias são atendidas no Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth em Boa Vista/RR - HMINSN. É válido destacar que num caso de emergência ou urgência, num modelo de cuidado centrado na saúde da pessoa, independentemente da idade, o paciente que adentrar no hospital receberá atendimento médico. Neste caso, os médicos realizam os procedimentos necessários estabilizando o paciente e em seguida encaminham para o hospital adequado. Como exemplo desse tipo de atendimento, temos a realização de dois partos no HCSA: um parto, normal, realizado no ano de 2018 e outro cesáreo, em 2019. As gestantes chegaram sentindo fortes contrações e imediatamente foram atendidas pelas equipes médica de plantão no trauma (sala específica para situações de urgências). Nos dois casos, em seguida as mães com seus recém-nascidos foram transferidas ao HMINSN para acolhimento e atendimento adequado. As duas gestantes eram de origem venezuelanas residentes ao abrigo localizado próximo ao hospital o que justifica a pro