UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI - UNIVATES CURSO DE DIREITO A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 2º DA LEI DA FICHA LIMPA E O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA NÃO-CULPABILIDADE Edgar Meneghetti Junior Lajeado, dezembro de 2017 Edgar Meneghetti Junior A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 2º DA LEI DA FICHA LIMPA E O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA NÃO-CULPABILIDADE Monografia apresentada na disciplina de Trabalho de Curso II, do Curso de Direito, da Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES, como parte da exigência para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Me. André E. S. Prediger Lajeado, dezembro de 2017 Edgar Meneghetti Junior A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 2º DA LEI DA FICHA LIMPA E O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA NÃO-CULPABILIDADE A Banca examinadora abaixo aprova a Monografia apresentada na disciplina de Trabalho de Curso II, na linha de formação do Curso de Direito, da Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES, como parte da exigência para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Prof. Dr. André Eduardo Schröder Prediger Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES Profa. Dra. Luciana Turatti Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES Dra. Maiara Scartezini Stacke Advogada Lajeado, 04 de dezembro de 2017 AGRADECIMENTOS Agradeço a meus pais pela compreensão, pelo incentivo e pelos esforços realizados não só durante a elaboração deste trabalho, mas em toda a graduação. Vocês têm parte nesta conquista! A Daniela, minha namorada, por me apoiar incondicionalmente e por entender que os momentos de ausência se fizeram necessários para que esta etapa fosse concluída. E agradeço a Deus pelas oportunidades que me surgiram nesta caminhada, bem como pela luz e coragem para enfrentar os desafios que pareciam ser insuperáveis. RESUMO O legislador constituinte, ao elevar a moralidade administrativa como princípio constitucional que visa proteger a lisura do pleito eleitoral, considerando a vida pregressa dos candidatos a cargos políticos, autorizou a criação de legislação complementar para regrar tal disposição prevista na Carta Magna. Deste modo, foi editada a Lei da Ficha Limpa (LC 135/2010), a qual foi alvo de críticas por fazer surgir a inelegibilidade por condenação criminal não transitada em julgado, pondo em questionamento outro princípio fundamental: o da não-culpabilidade. Desta forma, com a presente pesquisa busca-se evidenciar a existência de constitucionalidade na Lei da Ficha Limpa, visto que a proteção da moralidade administrativa possui grau de proteção mais elevado Direito Eleitoral, eis que visa proteger o pleito eleitoral e a sociedade como um todo. Para alcançar tal compreensão, serão abordados neste trabalho o conceito de Direito Eleitoral e suas fontes, buscando-se a evolução dos direitos políticos e sua concepção na atual Constituição. Posteriormente, serão levados a destaque os requisitos que devem ser preenchidos por quem deseja candidatar-se a cargo político, bem como as situações que acarretam inelegibilidade aos cidadãos, com ênfase às alterações proporcionadas pela Lei da Ficha Limpa. Por fim, será analisada a colisão de princípios constitucionais (moralidade administrativa x presunção de inocência), com menção ao entendimento do STF sobre a matéria, para posterior análise da constitucionalidade da Lei Complementar 135/2010. A pesquisa foi realizada pelo tipo qualitativo, por meio do método dedutivo, tendo sido utilizado como instrumentais técnicos a pesquisa bibliográfica e documental. Palavras-chave: Direito eleitoral. Inelegibilidade. Presunção de inocência. Inconstitucionalidade. Ficha Limpa. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ADC Ação Direta de Constitucionalidade ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade ADPF Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental ART Artigo CC Código Civil CF Constituição Federal CF/88 Constituição Federal de 1988 CNPL Confederação Nacional dos Profissionais Liberais DF Distrito Federal EC Emenda Constitucional HC Habeas Corpus INC Inciso LC Lei Complementar MCCE Movimento Contra a Corrupção Eleitoral OAB Ordem dos Advogados do Brasil PPS Partido Popular Socialista RE Recurso Extraordinário STF Superior Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça TRE Tribunal Regional Eleitoral TSE Tribunal Superior Eleitoral SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 7 2 SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO ................................................................... 11 2.1 Noções de Direito Eleitoral ............................................................................... 11 2.2 Fontes de direito eleitoral ................................................................................. 17 2.2.1 A importância dos princípios como fonte de direitos ................................. 19 2.3 A evolução dos direitos políticos e a Constituição Federal de 1988 ............ 21 2.4 A garantia constitucional de votar e ser votado ............................................. 24 3 A ELEGIBILIDADE NO DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO .............................. 29 3.1 Condições de elegibilidade .............................................................................. 29 3.1.1 Nacionalidade brasileira ................................................................................ 32 3.1.2 Pleno exercício dos direitos políticos .......................................................... 34 3.1.3 Alistamento e domicílio eleitoral .................................................................. 34 3.1.4 Filiação partidária ........................................................................................... 35 3.1.5 Faixa etária ...................................................................................................... 36 3.2 Hipóteses de inelegibilidade ............................................................................ 38 3.2.1 Hipóteses constitucionais de inelegibilidade .............................................. 41 3.2.2 Hipóteses infraconstitucionais de inelegibilidade ...................................... 42 3.3 As mudanças legislativas ocasionadas pela Lei da Ficha Limpa ................. 45 4 A CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 2º DA LEI COMPLEMENTAR 135/2010 ................................................................................................................... 49 4.1 O confronto entre os princípios da moralidade e da não-culpabilidade ...... 49 4.2 O posicionamento do STF no julgamento da ADI 4578 ................................. 54 4.3 A possibilidade de inelegibilidade em face de condenação criminal não transitada em julgado ............................................................................................. 60 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 66 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 70 7 1 INTRODUÇÃO A Constituição Federal de 1988 é a principal fonte de normas da República Federativa do Brasil, se tornando um instrumento de garantia de direitos e responsabilidades dos cidadãos, que com o passar dos anos, deu maior enfoque aos direitos humanos e sociais, tendo em vista as transformações dos anseios sociais. Entre os direitos fundamentais por ela garantidos consta a impossibilidade de um réu em procedimento penal ser considerado culpado pelo suposto crime cometido sem que, contra ele, exista decisão judicial da qual não mais caiba recurso, ou seja, qualquer pessoa que esteja submetida a um processo criminal deverá ser presumida como inocente durante o trâmite processual. Ainda, a Carta Magna, no título concernente aos direitos fundamentais, no que tange aos direitos políticos, assegura a participação dos cidadãos brasileiros no processo de escolha dos representantes políticos, ou seja, de a própria população eleger os candidatos que julgam ser aptos à carreira pública, de forma a efetivar a democracia como sistema político de nossa nação, fixando, ademais, critérios positivos e negativos que devem ser atendidos por aqueles que almejam alcançar o posto de representante do povo. Todavia, como é de conhecimento geral da população brasileira, a última década será lembrada na história deste país como aquela em que os maiores escândalos de corrupção vieram a conhecimento público, iniciando-se pelo ‘Mensalão’, e tendo seu ápice na atual ‘Operação Lava-Jato’, tendo grandes figurões 8 políticos investigados, e condenados, por crimes de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, formação de quadrilha, entre outros. Neste sentido, o anseio popular por representantes com conduta ética, enquanto ocupantes de cargos político-eletivo, cresceu, principalmente com a criação do Movimento Contra Corrupção Eleitoral (MCCE), demonstrando que os brasileiros têm conhecimento, e não mais irão admitir os atos de ‘amizade’ entre os políticos, como as trocas de favores, de votos por emendas parlamentares, sempre com o famoso ‘jeitinho brasileiro’, típicos do já enraizado sistema eleitoral brasileiro, o presidencialismo de coalisão. O ápice da insatisfação com o sistema representativo brasileiro resultou em projeto de lei de iniciativa popular, que após passar pelo Congresso Nacional, deu vida à Lei Complementar 135/2010, popularmente conhecida como Lei da Ficha Limpa. Tal dispositivo legal alterou a redação da Lei de Inelegibilidades (LC 64/1990), aumentando o rigor desta em relação às situações que ensejam perda da capacidade eleitoral passiva. Dentre as principais mudanças, merece destaque a desnecessidade de trânsito em julgado para que determinadas condenações criminais proporcionem inelegibilidade. Entretanto, tal mudança legislativa foi, e ainda é, alvo de críticas e ações judiciais que buscam a inconstitucionalidade do diploma legal alterador por colocar em xeque a garantia individual da presunção de inocência, também conhecida como princípio da não-culpabilidade. Nesse contexto, objetiva-se com o presente trabalho analisar se há incompatibilidade com a Constituição Federal de 1988 no texto da Lei Complementar 135/2010, analisando as mudanças e consequências proporcionadas por esta, principalmente no colisão entre os princípios da não-culpabilidade e da moralidade administrativa. Para tanto, pergunta-se: o princípio da não-culpabilidade torna inconstitucional o artigo 2º, da Lei Complementar 135/2010, que modificou o artigo 1º, inciso I, alínea e, da Lei Complementar 64/1990, uma vez que aquela passou a prever a inelegibilidade por condenações criminais não transitadas em julgado? 9 A possível hipótese de resposta para o questionamento é que a Lei Complementar 135/2010, que inovou ao criar a hipótese de suspensão da capacidade eleitoral passiva mesmo em decisões de órgãos judiciais colegiados não transitadas em julgado, teve o objetivo de assegurar que candidatos a cargos dos Poderes Executivo e Legislativo tenham uma vida pregressa digna, sendo capazes de manter tal postura durante a ocupação de mandato eletivo. Tal modificação legislativa mostra-se capaz de garantir a aplicação efetiva do princípio da moralidade, um dos norteadores da Administração Pública, sendo sua não-aplicação em virtude de eventual colisão com o princípio da não-culpabilidade (em que pese seja este igualmente importante), algo que pode proporcionar prejuízos aos entes públicos e, consequentemente, à totalidade dos cidadãos. Assim, no primeiro capítulo da presente pesquisa serão descritas noções sobre o sistema eleitoral brasileiro. Inicialmente, serão tecidos apontamentos sobre o direito eleitoral brasileiro, seguindo-se com a análise e descrição das fontes de direito eleitoral, enfatizando a importância dos princípios no mundo jurídico. Por fim, será abordada a evolução histórica dos direitos políticos na história da República Federativa do Brasil, com sua colocação na atual Carta Magna como garantia fundamental. No segundo capítulo será realizada explanação acerca das condições de elegibilidade, ou seja, de quais requisitos devem ser preenchidos pelo cidadão que deseja candidatar-se a cargo político-eletivo. Ainda, serão analisadas as hipóteses constitucionais e infraconstitucionais (Lei Complementar 64/1990) de inelegibilidade, concluindo-se com o levantamento das principais alterações na Lei de Inelegibilidades ocasionadas pela edição da Lei Complementar 135/2010. Por fim, no último capítulo será demostrado o confronto entre os princípios constitucionais da não-culpabilidade e da moralidade administrativa, dissertando-se acerca da resolução da colisão. Ainda, será realizada explanação sobre o julgamento da ADI 4.578/DF e das ADCs 29 e 30 pelo Supremo Tribunal Federal, ações cujo objeto era a verificação de constitucionalidade da Lei Complementar 135/2010 e sobre a compatibilidade do texto da Lei da Ficha Limpa com os preceitos constitucionais. 10 Por fim, com a pesquisa realizada, se buscará comprovar que a Lei Complementar 135/2010 guarda respaldo constitucional ao proteger a moralidade administrativa para exercício de mandato eletivo, e possível relativização de outros princípios fundamentais em favor da proteção de toda a sociedade não possui o efeito de tornar inconstitucional a legislação alteradora, de maneira que esta surgiu por própria exigência da Constituição Cidadã. O modo de abordagem utilizado para o desenvolvimento do presente trabalho monográfico será o quantitativo, eis que se pretende coletar dados, assimilando-os e interpretando-os de maneira ampla, conforme explicam Mezzaroba e Monteiro (2014), de modo a aprofundar aspectos inerentes à possibilidade de suspensão dos direitos políticos em virtude de decisão judicial não transitada em julgado. Segundo tais doutrinadores, o tipo de pesquisa ‘coleta de dados’ descreve e interpreta conteúdos que já foram examinados por outros pesquisadores. O método a ser utilizado para o desenvolvimento do trabalho monográfico será o dedutivo, partindo de premissas gerais e de fundamentação genérica, até alcançar uma dedução mais específica (MEZZAROBA; MONTEIRO, 2014). Assim, o estudo iniciará descrevendo noções sobre o sistema eleitoral brasileiro, identificando o acesso aos direitos políticos no Brasil e os respectivos princípios constitucionais inerentes, passando pelo exame os requisitos de elegibilidade e hipóteses de inelegibilidade, analisando aspectos sobre as mudanças legislativas proporcionadas pela Lei da Ficha Limpa, até chegar ao foco principal do trabalho, que é identificar a constitucionalidade da Lei Complementar 135/2010, examinando o confronto entre os princípios constitucionais da moralidade e da não-culpabilidade. 11 2 SISTEMA ELEITORAL BRASILEIRO A importância do Direito Eleitoral em um Estado Democrático de Direito possui grau extremamente elevado, eis que, como a própria Constituição Federal de 1988 estabeleceu, todo poder emana do povo, por meio de representantes por ele escolhidos. Assim, pode-se considerar que o Direito Eleitoral torna-se instrumento primordial para efetivação da soberania popular no Brasil. Nesse sentido, o presente capítulo visa descrever conceitos sobre o Direito Eleitoral, tecendo considerações sobre sua estrutura, bem como acerca dos direitos políticos previstos na Constituição Federal, identificando o acesso a estes na história do Brasil. 2.1 Noções de Direito Eleitoral A organização da República Federativa do Brasil como um Estado Democrático de Direito necessita, por óbvio, do exercício da soberania pelos cidadãos, o que, consequentemente, passa pelo crivo do Direito Eleitoral. Entretanto, para uma melhor compreensão do sistema político-eletivo brasileiro, necessário observar a conceituação e a função deste ramo jurídico, juntamente com sua forma de organização. Assim, o Direito Eleitoral pode ser compreendido como o conjunto de normas que visam regrar o procedimento eleitoral brasileiro, protegendo o regime democrático e assegurando que a vontade do povo, escolhida nas urnas, seja realmente efetivada. 12 Existem diversos doutrinadores pátrios que desenvolvem variados conceitos de Direito Eleitoral, como Santana e Guimarães (2004, p. 25), para quem se trata do “ramo do Direito Público Interno (pois trata de interesses de ordem coletiva) que regra os direitos e deveres do cidadão no tocante aos institutos da representação política e o processo eleitoral”, e como Ramayana (2008, p. 27), segundo quem se trata de: [...] ramo do Direito Público que disciplina o alistamento eleitoral, o registro de candidatos, a propaganda política eleitoral, a votação, apuração e diplomação, além de regularizar os sistemas eleitorais, os direitos políticos ativos e passivos, a organização judiciária eleitoral, dos partidos políticos e do Ministério Público, dispondo de um sistema repressivo penal especial. No mesmo sentido é a conceituação formulada por Pinto (2008, p. 14), o qual afirma que o Direito Eleitoral trata-se do “ramo do direito público que disciplina a criação dos partidos, o ingresso do cidadão no corpo eleitoral para a fruição dos direitos políticos, o registro das candidaturas, a propaganda eleitoral, o processo eletivo e a investidura no mandato”, buscando afastar a desconfiança existente nos processos eleitorais. Contudo, diante da diversidade de conceitos existentes acerca da matéria, para sua melhor absorção é necessário compreender a função primordial deste ramo do direito, ou seja, qual o objetivo da existência de regras específicas concernentes ao processo político-eletivo. Novamente, Ramayana (2008, p. 26) é feliz ao afirmar que o Direito Eleitoral “tem por função regulamentar a distribuição do eleitorado, o sistema eleitoral, a forma de votação, a apuração, a diplomação e garantir a soberania popular [...]”, uma vez que cabe a seara eleitoral efetivar a democracia. Da mesma forma, no que tange a importância deste ramo no ordenamento jurídico brasileiro, necessário destacar que: O Direito Eleitoral constitui-se em ramo do direito público, cujo desiderato primordial é proporcionar e assegurar que a conquista do poder pelos grupos sociais seja efetuada dentro de parâmetros legais preestabelecidos, sem o uso da força ou de quaisquer subterfúgios que interfiram na soberana manifestação da vontade popular. Assim, o Direito Eleitoral resta edificado em conceitos de soberania, democracia, participação popular, voto, sufrágio, mandato e representação (ZILIO, 2012, p. 17). 13 Acrescenta Gomes (2017, p. 28) que a importância do Direito Eleitoral se eleva quando se põe em destaque os bens jurídicos por ele tutelados, quais sejam “a democracia, a legitimidade do acesso e do exercício do poder estatal, a representatividade do eleito, a sinceridade das eleições, a normalidade do pleito e a igualdade de oportunidades entre os concorrentes”. Diante da explanação dos doutrinadores pátrios, pode-se verificar que a existência de uma área do direito específica para regulamentar o exercício da soberania, com ferramentas e instrumentos que possibilitam assegurar a lisura do pleito eleitoral, proporciona maior segurança jurídica à escolha dos representantes populares, legitimando o mandatário público, de maneira a efetivar o regime democrático (VELLOSO; AGRA, 2009). E para proporcionar a incidência prática do direito eleitoral na fruição dos direitos políticos pelos cidadãos, se mostra necessário analisar o conceito de dois institutos por ele abrangidos: o sufrágio e o voto, os quais, muitas vezes utilizados como sinônimos possuem diferentes significados. Neste sentido, o sufrágio pode ser entendido como o direito subjetivo do cidadão em participar do processo democrático de determinado local, enquanto que o voto é o ato solene por meio do qual se efetiva a citada participação. Sob tal perspectiva, o voto é considerado mero instrumento, e não como um direito em si (SANSEVERINO, 2008). Ainda, entende Sanseverino (2008) que o sufrágio pode ser considerado como um direito-dever, tendo em vista que o sistema jurídico brasileiro o torna, via de regra, obrigatório. Assim, implicaria ao cidadão uma garantia de poder participar da escolha dos representantes políticos ao mesmo tempo em que seria um dever, consubstanciado na manutenção do regime democrático. E para alcançar total compreensão acerca da diferença entre ambos os institutos, mister relembrar os ensinamentos de Almeida (2016, p. 84), segundo quem “[...] o sufrágio é o direito público e subjetivo de participar ativamente dos destinos políticos da nação; o voto nada mais é do que o exercício concreto do direito de sufrágio [...]”. 14 Todavia, somente a existência do regime democrático e de direitos e instrumentos para sua efetivação não são suficientes para sua total fruição pelos cidadãos, fazendo-se necessária a existência de uma estrutura estatal organizada para tais fins, papel desempenhado pela Justiça Eleitoral. A Justiça Eleitoral foi criada como órgão independente e pertencente ao poder judiciário, desvinculando-se do poder legislativo, com a reforma eleitoral que culminou no Código Eleitoral de 1932, sendo replicada na Constituição Federal de 1934 pela primeira vez. Tal situação ocorreu pelo objetivo da Revolução de 1930, que era de “combater e eliminar as fraudes eleitorais ocorridos no período da República Velha” (SANSEVERINO, 2008, p. 81). Tal parcela do judiciário somente não esteve presente na Constituição Federal de 1937, uma vez que “o Congresso foi dissolvido juntamente com a suspensão da liberdade política, sendo a Justiça Eleitoral considerada inativa” (VELLOSO; AGRA, 2009, p. 15), tendo o então presidente Getúlio Vargas concentrado toda a responsabilidade política (RAMAYANA, 2008). Entretanto, em 1946, com a outorga de nova Constituição, o poder judiciário voltou a abarcar a Justiça Eleitoral, a qual manteve-se presente em todas as Constituições posteriores, atingindo seu clímax na atual Carta Magna, participando da organização do poder judiciário. A estrutura judiciária da esfera eleitoral, estabelecida pela Constituição Federal de 1988 (artigos 92, V, e 118 a 121), possui estrutura semelhante daquela encontrada nas justiças estaduais, contando com Varas Eleitorais (1º grau de jurisdição), com Tribunais Regionais Eleitorais (2º grau de jurisdição) e com o Tribunal Superior Eleitoral (órgão máximo da Justiça Eleitoral). Todavia, nesta área especial do direito inexiste uma magistratura de carreira, sendo utilizados magistrados de outros tribunais (da justiça estadual, federal e membros do STF e do STJ), advogados e cidadãos em sua composição, sendo, assim, classificada como híbrida (CÂNDIDO, 2016). Assim, o TSE é composto por sete membros, dentre os quais três são Ministros do Supremo Tribunal Federal, dois são membros do Superior Tribunal de 15 Justiça e dois são advogados de notório saber jurídico e idoneidade moral, com no mínimo dez anos de atividade profissional efetiva, escolhidos pelo STF (ALMEIDA, 2016). Relembra Almeida (2016) que ao Tribunal Superior Eleitoral, além das funções jurisdicional e administrativa, necessário destacar que lhe cabem as funções normativa, podendo tal órgão expedir resoluções que permitam o bom cumprimento da legislação ordinária, e consultiva, respondendo indagações em matéria eleitoral. Os Tribunais Regionais Eleitorais têm sua composição formada por sete membros, sendo eles dois Desembargadores Estaduais, dois Juízes Estaduais, um Desembargador Federal e dois advogados, os quais devem preencher os mesmos requisitos para ser membro do TSE, como supracitado. Por fim, a função de Juiz Eleitoral será exercida por um Juiz Estadual, nomeado pelo TRE, obedecendo sua jurisdição (ALMEIDA, 2016). Ainda, acerca da diversidade da justiça eleitoral com as demais esferas do Poder Judiciário, mister destacar que grande parte dos membros daquela não possuem vitaliciedade em seus cargos/funções, atuando por limite determinado de tempo: Os juízes da Justiça Eleitoral são cedidos dos demais órgãos do Poder Judiciário, não possuindo um quadro próprio de magistrados – a despeito de possuir funcionários próprios. Esses magistrados são nomeados por tempo determinado, sendo a duração do exercício de suas funções de dois anos – princípio da temporalidade –, podendo ser renovável apenas por mais dois anos [...] (VELLOSO; AGRA, 2009, p. 17). Entretanto, tal forma de organização recebe algumas críticas por parte da doutrina, a qual defende a existência de carreira específica para magistratura eleitoral. Neste sentido, ensina Cândido (2016), que a cessão de servidores de outras áreas do poder judiciário só poderia ocorrer em ocasiões especiais, em períodos de maior trabalho, por tempo determinado. Assim, conclui o renomado autor que a Justiça Eleitoral, “instituição fundamental à normalidade da ordem democrática e essencial ao Estado de Direito, está a merecer, de pronto, reforma institucional [...]” (CÂNDIDO, 2016, p. 44). 16 Entretanto, entende-se que a manutenção da atual forma estrutural da Justiça Eleitoral tende a uma maior imparcialidade dos julgadores, evitando-se eventuais ‘sequelas e interesses contrariados’ de uma eleição para outra, proporcionando maior credibilidade à instituição (ANDRADE NETO apud GOMES, 2017, p. 78). Outrossim, voltando a analisar as disparidades existentes entre a justiça Eleitoral e a Justiça Comum, nesta compreendidas a Estadual e a Federal, pode-se observar que estas põem em prática sua função típica com maior incidência, o que significa que ambas se preocupam, na maior parte de sua atuação, com o exercício da jurisdição. A Justiça Eleitoral, por sua vez, conforme Zilio (2012) divide-se em quatro funções, a típica, de exercer a jurisdição, e as atípicas, que se subdividem em administrativa, consultiva e legislativa, as quais merecem ser levadas a destaque, visto que fogem ao usual do poder judiciário. Neste sentido, cabe relembrar que a função administrativa é típica quando exercida pelo Poder Executivo, e atípica quando exercida pelos demais poderes para sua própria organização. Todavia, quando realizada pela Justiça Eleitoral, a função de administrar foge à alçada da organização interna, abarcando todo o procedimento eleitoral, deste o alistamento, até a determinação de locais de votação, por exemplo. Por fim, as funções consultiva e legislativa são exercidas, via de regra, pelo Tribunal Superior Eleitoral, respectivamente com a emissão de respostas a questionamentos em matéria predominantemente eleitoral, exteriorizando o entendimento adotado pela Corte, e com a edição de Resoluções que visem dar fiel atendimento à legislação eleitoral. Assim, resta notório que a função primordial da Justiça Eleitoral, como já mencionado anteriormente quando citados os bens jurídicos por ela protegidos, é a de regular, organizar todo o procedimento eleitoral brasileiro, garantindo a efetivação da soberania popular. 17 2.2 Fontes de direito eleitoral No meio jurídico, o termo ‘fonte’ possui o significado de estabelecer a origem do direito, ou seja, a fundamentação, ou a procedência de determinado preceito normativo. Conforme ensina Gomes (2017), as fontes podem ser divididas entre materiais e formais, sendo as primeiras o universo de influências que atuam sobre o legislador no momento de criação das normas positivadas, enquanto que as fontes formais indicam os meios pelos quais determinada regra é posta no sistema jurídico nacional. As fontes formais são divididas pelo citado doutrinador em estatais e não estatais, havendo maior ênfase sobre aquelas oriundas do Estado, eis que, quando positivadas, possuem incidência cogente e generalizada sobre um maior universo de pessoas. Nesse sentido, é entendimento uníssono da doutrina pátria que a principal fonte do direito eleitoral consiste na Constituição Federal de 1988, diploma legal que engloba desde os princípios fundamentais, passando pela forma de organização do Estado, bem como tecendo considerações acerca de nacionalidade, direitos e partidos políticos, organização da Justiça Eleitoral (GOMES, 2017). Cabe destacar, desta forma, a importância do direito constitucional não só na seara eleitoral, mas em todo ordenamento jurídico: A disciplina básica do Direito Público interno é o Direito Constitucional, que fixa as normas fundamentais de organização jurídica e condiciona, debaixo de seus princípios, os demais ramos do Direito Público, com os quais se relaciona (BONAVIDES, 2006, p. 43). No mesmo sentido, destaca Zilio (2012, p. 20) que o “legislador constituinte, já no preâmbulo, ao optar pela instituição de um Estado Democrático de Direito, deu veementes indicativos de que o Direito Eleitoral [...] recebe forte influência do norte constitucional”. Assim, sendo o direito eleitoral integrante do direito público, como mencionado nos conceitos já levados a destaque anteriormente, a incidência da normatividade da CF/88 sobre ele é indiscutível. E, por conseguinte, os princípios constitucionais, bem como os princípios gerais de direito e aqueles específicos desta 18 área especial do ordenamento jurídico também são considerados como fontes (GUASTINI apud BONAVIDES, 2006). No mesmo sentido é a lição de Bonavides (2006, p. 294) ao afirmar que os princípios são responsáveis pela “[...] congruência, o equilíbrio e essencialidade de um sistema jurídico legítimo. Postos no ápice da pirâmide normativa eleva-se, portanto, ao grau máximo de norma das normas, de fonte das fontes”. Portanto, possuindo a principiologia um caráter especial, atuando ora como fonte de direitos, ora como fundamento para interpretação e complementação às normas eleitorais, será dedicado subtítulo específico para o referido assunto. Continuamente, conforme ensina Gomes (2017) necessário levar a destaque os tratados e convenções internacionais como fontes do direito eleitoral, e isso se deve à existência da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, os quais preveem a participação do povo no processo político-eletivo. Ambos possuem status de norma constitucional no Brasil, visto que ingressaram em seu ordenamento jurídico pelo mesmo método de aprovação das Emendas Constitucionais. De outra banda, não só as normas com patamar constitucional ou de ordem principiológica podem ser consideradas fontes do direito eleitoral. A Legislação Ordinária Federal1, específica da matéria, também tem papel fundamental na construção da base normativa da seara eleitoral. Nesse diapasão, dentre todo ordenamento jurídico, merece ser destacada a existência do Código Eleitoral (Lei 4.737/65), que foi recepcionado pela CF/88, bem como da Lei das Eleições (Lei 9.504/97), da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei 9.096/96) e das Leis Complementares 64/1990 e 135/2010, conhecidas popularmente como Lei das Inelegibilidades e Lei da Ficha Limpa, respectivamente. Cada diploma citado acima é classificado como fonte direta do Direito Eleitoral (ALMEIDA, 2016) e possui incidência em parte específica da matéria por ele abrangida, contribuindo para a formação desse microssistema jurídico, do qual 1 O artigo 22, inciso I, da Constituição Federal estabelece que é competência privativa da União legislar sobre matéria especializada. 19 também fazem parte as resoluções emitidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, no exercício de sua função legislativa. Portanto, as Resoluções do TSE também são consideradas fontes do Direito Eleitoral, uma vez que possuem o objetivo de expedir instruções acerca da melhor execução da legislação infraconstitucional, bem como de regulamentar todo processo eletivo, respeitadas as exigências de cada legislação: Art. 105. Até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral, atendendo ao caráter regulamentar e sem restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas nesta Lei, poderá expedir todas as instruções necessárias para sua fiel execução, ouvidos, previamente, em audiência pública, os delegados ou representantes dos partidos políticos. [...] § 3º Serão aplicáveis ao pleito eleitoral imediatamente seguinte apenas as resoluções publicadas até a data referida no caput (BRASIL, 1997, texto digital). Art. 23. Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior: [...] IX – expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código; (BRASIL, 1965, texto digital). E os ensinamentos de Zilio (2012, p. 25) corroboram tal conclusão quando o autor afirma que as Resoluções possuem o condão de “interpretar e/ou esmiuçar a legislação eleitoral”. Ainda, observa o renomado doutrinador que o TSE não exerce a função típica do Poder Legislativo, mas somente, de forma atípica, exerce a função legislativa “com o desiderato de dirimir dúvidas e prestar esclarecimentos”. Da mesma forma, a doutrina e a jurisprudência também são citadas por Zilio (2012) como fontes desse ramo do direito, eis que, respectivamente, se ocupam da análise interpretativa da legislação, com os respectivos desdobramentos, e do entendimento dos juízes e tribunais acerca de controvérsias jurídicas. No que tange à jurisprudência, esta encontra-se em maior relevância quando oriunda do Tribunal Superior Eleitoral, grau recursal máximo na jurisdição especializada. 2.2.1 A importância dos princípios como fonte de direitos Os princípios merecem destaque quando tratados como fonte de direitos, tendo em vista que sua aplicação se dá sobre qualquer área do mundo jurídico. Neste sentido, pode-se dizer que os princípios são base para a edição da própria 20 Constituição Federal de um Estado, como ocorre no caso brasileiro, ao vislumbrar-se os artigos 1º a 4º da Carta Magna de 1988. Tal posição de destaque também ocorre pela diferença entre a aplicação dos princípios e das leis (regras), uma vez que estas, quando aplicam-se a determinado caso concreto, excluem a incidência de qualquer outra sobre o mesmo fato. Já os princípios não tem sua aplicação excluída, “mas graduada à vista das circunstâncias representadas por outras normais ou por situações de fato” (BARROSO apud LENZA, 2015, p. 172). Ainda, Lenza (2015) conclui que os princípios são mandamentos de otimização, que auxiliam tanto o legislador quanto o julgador na interpretação das regras, atuando como uma base valorativa na ponderação entre qual princípio terá maior incidência em cada situação singular, não excluindo-se a aplicação dos mesmos. Portanto, toda cadeia principiológica incide sobre toda área jurídica, fazendo com que, no Direito Eleitoral, não só os princípios específicos deste microssistema jurídico sejam levados em consideração na interpretação das normas. Desta forma, ab initio, imperioso citar os princípios de patamar constitucional que tem maior incidência na seara eleitoral, como o Princípio da Soberania Popular, o Princípio da Democracia, o Princípio da Igualdade e o Princípio da Moralidade, os quais servem como base para elaboração da legislação infraconstitucional específica deste ramo jurídico. Partindo para os princípios específicos do Direito Eleitoral, não há como deixar de mencionar o princípio da anualidade, o qual estabelece que a legislação que alterar o procedimento eleitoral não se aplicará à eleição que ocorrer a menos de um ano de sua vigência2. A importância do mencionado princípio encontra guarida no fato de afastar a possibilidade de mutação no trâmite de um pleito eleitoral em momento muito próximo a sua realização, evitando-se ferir outro princípio: o da lisura das eleições. 2 O artigo 16 da CF/88 prevê expressamente o princípio da anualidade eleitoral. 21 Previsto no artigo 23, da Lei Complementar 64/1990 (Lei das Inelegibilidades), o princípio da lisura das eleições busca, conforme Ramayana (2008, p. 35) “a preservação da intangibilidade dos votos e da igualdade de todos os candidatos”, evitando-se fraudes no decorrer do pleito, o que, consequentemente, afetaria a soberania popular. O renomado doutrinador ainda cita o princípio do aproveitamento do voto, comparando sua aplicação ao princípio in dubio pro reo, em uma espécie de, no caso de alegação de nulidade em determinada eleição, seria aplicado o entendimento de “na dúvida, em favor do voto”. Neste sentido, explica Ramayana (2008), em não havendo demonstração de prejuízo em determinado acontecimento contestado do pleito eleitoral, deve ser aplicado o mencionado princípio, com a manutenção do resultado obtido nas urnas. Outro princípio que possui incidência significativa na seara eleitoral é o princípio da celeridade. Segundo tal preceito, a Justiça Eleitoral, quando provocada a exercer a função jurisdicional, deve dar andamento ao processo com prioridade, quase que imediatamente, de modo a evitarem-se decisões que mudem o cenário eleitoral proferidas após a diplomação dos candidatos eleitos, provocando uma alteração dos já diplomados. Por fim, não se pode olvidar de tecer considerações acerca do princípio da responsabilidade solidária entre candidatos e partidos políticos, o qual, conforme Almeida (2016, p. 53) estabelece que no caso de ocorrência de conduta ilícita, tanto candidato quanto o partido político ao qual aquele se vincula serão punidos. Todavia, o renomado doutrinador reforça que “[...] eventual responsabilidade penal por crime eleitoral será individual do infrator (sempre pessoa física) [...]”, estando o partido político, que é pessoa jurídica, isento de punição por ausência de previsão legal. 2.3 A evolução dos direitos políticos e a Constituição Federal de 1988 A Carta Política de 1988, após consulta popular, definiu em seu artigo 1º, parágrafo único, a democracia semidireta como forma de governo a vigorar na 22 República Federativa do Brasil. Tal regime é definido por Almeida (2016, p. 82) como aquele em que “a população politicamente ativa participa ora direta ora indiretamente nos destinos governamentais estatais”. Assim, o regime político brasileiro agrega a participação indireta (eleições dos representantes) e direta (plebiscito, referendo e iniciativa popular) dos cidadãos. Entretanto, para os direitos políticos, hoje considerados garantias fundamentais, conseguirem alcançar a importância no processo eleitoral e democrático que possuem atualmente, passaram por diversas mudanças, de modo a acompanhar as evoluções sociais, conforme explicam Cerqueira e Cerqueira (2014, p. 81): [...] o Direito Eleitoral é o ramo do Direito Público que mais sofre mudanças legislativas, que mais se aperfeiçoa na seara tecnológica, o que dificulta uma sistematização legal e um estudo mais aprofundado, exigindo da doutrina e da jurisprudência uma mudança valorativa radical, para efeito de acompanhar as mudanças sociais, políticas e econômicas de uma sociedade. Nesse sentido, as constantes alterações na legislação eleitoral brasileira desde a primeira eleição geral, ocorrida em 1821, fazem com que as regras políticas hoje existentes sejam consideradas recentes, pois, conforme esclarecem os mesmos autores, “[...] a democracia brasileira, com o hiato que sofreu em períodos intercalados da história, caminha para a juventude, não tendo ainda se firmado em sua fase adulta” (CERQUEIRA; CERQUEIRA, 2014, p. 85). Portanto, para melhor compreender a relevância que os direitos políticos possuem atualmente, se faz necessário relembrar sua evolução ao longo da história da República Federativa do Brasil, levando-se em consideração, principalmente, as disposições constitucionais a respeito da matéria. Assim, o primeiro marco histórico a ser destacado é a Constituição de 1824, outorgada em 25/03/1824, na qual havia centralização do poder na pessoa do monarca, tendo os cidadãos direito a voto para escolha dos integrantes do Poder Legislativo. Todavia, só gozava de direitos políticos quem se enquadrasse em determinada faixa econômica, sendo o sufrágio censitário o comando que imperava na época (RAMAYANA, 2008). 23 Ainda conforme Ramayana (2008), o ius honorum deveria ser sancionado pelo imperador, e os analfabetos poderiam exercer sua capacidade eleitoral ativa, mas sem gozar do benefício do sigilo. Com a proclamação da República, ocorrida em 1889, foi promulgada a Constituição de 1891, alterando o regime de governo da monarquia para o modelo republicano. No novo texto, os direitos políticos deixaram de ser censitários, mas continuaram não-secretos. Ainda, eram excluídos do alistamento eleitoral os mendigos, os analfabetos e os conscritos. Outro ponto que merece destaque é a previsão de inelegibilidades para cargos de Presidente e Vice-Presidente (CÂNDIDO, 2016). Acerca das principais mudanças ocorridas no processo histórico-eleitoral durante a vigência da Constituição de 1891, necessário mencionar a lição de Teles e Teixeira (2016), segundo quem a edição do Código Eleitoral de 1932 inovou ao criar a Justiça Eleitoral como órgão independente, integrante do Poder Judiciário, instituindo também a possibilidade de alistamento das mulheres como eleitoras e o sufrágio universal, direto e secreto. A constitucionalização dos direitos supracitados ocorreu com a promulgação da Constituição de 1934, cujo texto adicionou a Justiça Eleitoral como integrante do Poder Judiciário. Ainda, em seu teor houve previsão de “hipóteses de incompatibilidades e impedimentos, [...] da irreelegibilidade, do sufrágio universal, igual e direto, [...] consagrando o instituto da inelegibilidade, perda e suspensão dos direitos políticos” (RAMAYANA, 2008, p. 34). Todavia, com o golpe ditatorial liderado por Getúlio Vargas em 1937, houve enfraquecimento dos direitos fundamentais, entre eles, os direitos políticos. Neste sentido, conforme ensina Lenza (2015), houve a extinção da Justiça Eleitoral, a volta do sufrágio indireto e das eleições indiretas. Tal regime de governo perdurou até a Constituição de 1946, momento em que a Justiça Eleitoral foi novamente reintegrada ao Poder Judiciário, e os direitos políticos, ativos e passivos, foram restabelecidos, com sufrágio direto, voto secreto e universal, bem como com “a consagração dos institutos da perda e suspensão dos 24 direitos políticos, inelegibilidades incompatibilidades e impedimentos” (RAMAYANA, 2008, p. 13). Com o Golpe Militar de 1964, houve a criação de novo texto constitucional que se adequasse ao regime então praticado no Brasil. O novo caderno constitucional, instituído em 1967, bem como em suas posteriores alterações, com destaque ao Ato Institucional nº 2, de 1969, não proporcionou mudanças significativas no que tange aos direitos políticos, a não ser pela grande extensão da pena de suspensão destes, que se dava pelo prazo de 10 anos. Entretanto, conforme ensina Lenza (2015), com a proliferação do movimento conhecido como “Diretas Já”, iniciado em 1983, que buscava a volta das eleições diretas para os cargos de Presidente e Vice-Presidente, houve a convocação da Assembleia Nacional Constituinte e, consequentemente, a promulgação da Constituição de 1988. Esta, em seu texto, manteve a Justiça Eleitoral como parte integrante do Poder Judiciário, reestabeleceu a democracia como forma de governo, autorizou o pluripartidarismo, inclusive com união dos partidos em coligações e concedeu aos direitos políticos o caráter de direitos fundamentais. 2.4 A garantia constitucional de votar e ser votado A opção pelo regime democrático representativo e participativo como forma de governo da República Federativa do Brasil ensejou a participação da sociedade nas decisões políticas, eis que tal regime atribui ao povo à titularidade máxima do poder de formação do Estado (ZILIO, 2016). Gomes (2017, p. 6), ao dissertar sobre o papel exercido pelo povo no processo político-eletivo, conceitua-o como “conjunto dos indivíduos a que se reconhece o direito de participar na formação da vontade estatal, elegendo ou sendo eleitos, ou seja, votando ou sendo votados”. Portanto, torna-se clara a importância do exercício dos direitos políticos por parte dos cidadãos na formação da classe representativa nos poderes Executivo e Legislativo. 25 A Carta Política de 1988, em seu Capítulo IV, do Título II, reservou espaço para os Direitos Políticos, tendo o então ministro Teori Zavaski, citado pelo Tribunal Superior Eleitoral, assim os conceituado: Direitos políticos ou direitos de cidadania é o conjunto dos direitos atribuídos ao cidadão, que lhe permite, através do voto, do exercício de cargos públicos ou da utilização de outros instrumentos constitucionais e legais, ter efetiva participação e influência nas atividades de governo. Estar no gozo dos direitos políticos significa, pois, estar habilitado a alistar- se eleitoralmente, habilitar-se a candidaturas para cargos eletivos ou a nomeações para certos cargos públicos não eletivos, participar de sufrágios, votar em eleições, plebiscitos e referendos, apresentar projetos de lei pela via da iniciativa popular e propor ação popular. Quem não está no gozo dos direitos políticos não poderá filiar-se a partido político e nem investir-se em qualquer cargo público, mesmo não eletivo (ZAVASCKI apud TSE, 2016, texto digital). Pinto (2008, p. 68), por sua vez, ao dissertar acerca da importância dos direitos políticos, acrescentou: Através deles é possível uma efetiva participação de cada cidadão na soberania popular, quer exercendo pessoalmente o poder político, quer participando da escolha dos governantes ou fiscalizando as ações destes. A exteriorização mais nítida dos direitos políticos se dá através do direito de votar e de ser votado, ou seja, do direito de fazer parte do poder político. Verifica-se que, conforme supracitado, a efetivação dos direitos políticos se subdivide no direito dos cidadãos de votarem e serem votados, colocando em prática a soberania popular, prevista no artigo 1º, parágrafo único, da CF/88, o qual assegura a democracia como regime de governo. Nesse interim, analisando-se inicialmente a capacidade eleitoral ativa, cumpre ressaltar que esta não se externa somente pelo voto, também sendo praticada pela participação em plebiscitos, referendos ou por projeto de lei de iniciativa popular. Por meio dos três institutos retro mencionados, efetiva-se a democracia participativa (ZILIO, 2016). Todavia, a principal forma de os cidadãos usufruírem da capacidade eleitoral ativa é pelo sufrágio, o qual é exercido pelo ato de votar, ou seja, pela faculdade3 que possuem de escolher para ocupar cargos político-eletivos quem melhor os representa. Neste sentido, Velloso e Agra (2009) destacam que, para o exercício da 3 Zilio (2016, p. 93) disserta que o voto não pode ser considerado “mera faculdade, já que existe sanção pelo não-comparecimento” dos maiores de 18 e menores de 70 anos, quando não justificado. 26 capacidade eleitoral ativa, deve o eleitor efetuar o alistamento eleitoral, o qual deve ser requerido ao magistrado competente pelo seu domicílio. E com a aquisição da capacidade eleitoral ativa, surge aos cidadãos, consequentemente, a possibilidade de ser eleito como representante do povo, conhecida como capacidade eleitoral passiva, ou negativa. Segundo Zilio (2016, p. 108), a busca por um cargo de representação política consiste “no ápice da caracterização do conceito de cidadania”. Em tal aspecto, relembrando o ensinamento de Cerqueira e Cerqueira (2014), de que a democracia brasileira ainda não se encontra em sua fase adulta, necessário destacar os pensamentos de Velloso e Agra (2009, p. 50), segundo quem “enquanto prevalecer o predomínio do poder econômico e a falta de consciência política da população, não existirá sistema político que possa aperfeiçoar nossa democracia”. E neste sentido, verifica-se a importância da plena fruição dos direitos políticos, assegurados constitucionalmente, para a efetivação do regime de governo adotado na Carta Magna de 1988. O poder de escolha dos rumos de toda uma nação reside na mão dela própria, uma vez que é ela quem escolhe qual candidato, e consequentemente qual partido político e estilo de governo, irá comandar os poderes Executivo e Legislativo. Portanto, necessário levar a destaque as situações que ensejam a privação dos direitos políticos pelos cidadãos, por motivo de perda ou suspensão. Todavia, cabe ressaltar que a CF/88, em seu artigo 15, veda a cassação dos direitos políticos, situação que teve seu ápice durante o governo militar (GOMES, 2017). O próprio dispositivo legal supra citado, em seus incisos, elenca as razões pela qual alguma pessoa seja privada de exercer seu direito fundamental de votar e ser votado, nos seguintes termos: Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: I - cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; II - incapacidade civil absoluta; III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; 27 IV - recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos termos do art. 5º, VIII; V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º (BRASIL, 1988, texto digital). Analisando-se individualmente cada caso de suspensão/perda, percebe-se, incialmente, a necessidade de vínculo entre o indivíduo e o Estado onde fixar domicílio eleitoral, não havendo, neste ponto, distinção entre brasileiros natos e naturalizados. Assim, conforme Gomes (2017), a obstrução do liame jurídico entre o cidadão e o Estado acarreta na perda dos direitos políticos por aquele. No que tange à capacidade civil, o Código Civil de 2002 (CC/2002) adotou o sistema cronológico, estabelecendo que seu alcance se dá, de forma relativa, ao atingir-se 16 anos e, de forma plena, ao completar-se 18 anos. Assim, tomando-se por base a legislação civilista, o indivíduo que não completou 16 anos é considerando absolutamente incapaz. Todavia, com a edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), restaram revogadas as hipóteses de incapacidade civil por enfermidade, deficiência mental ou por impossibilidade de expressão de vontade, anteriormente previstas no artigo 3º, II e III, do CC/2002. Assim, os portadores de necessidades especiais somente terão seus direitos políticos suspensos no caso de completa impossibilidade de expressão da vontade, confirmada por competente ação de interdição perante juiz cível, o qual prestará tal informação à Justiça Eleitoral (GOMES, 2017). O terceiro caso de privação de direitos políticos previsto na CF/88 é originado pela condenação criminal transitada em julgado, enquanto perdurarem seus efeitos. Velloso e Agra (2009) ensinam que a suspensão dos direitos políticos é efeito da própria sentença penal, a qual é autoaplicável. Neste ponto, ainda, mister relembrar que em determinados casos estabelecidos pela Lei Complementar 64/1990, o período de suspensão dos direitos políticos se estende por mais 8 anos após a extinção da pena (BRASIL, 1990, texto digital). Ainda sobre a suspensão dos direitos políticos por condenação criminal transitada em julgado, cabe destaque ao fato de não haver divergência quanto ao tipo de crime praticado, podendo até ser contravenção penal (GOMES, 2017). 28 Portanto a única diferença acarretada por uma maior ou menor gravidade do crime será o tempo de privação dos direitos políticos. Seguindo a análise do artigo 15, da CF/88, tem-se a possibilidade de suspensão dos direitos políticos ocasionada pela “recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa”. Acerca do assunto, necessário destacar as disposições do artigo 5º, VIII, da Carta Magna: Art. 5º. [...] VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei. [...] Do teor dos dispositivos legais supracitados, extrai-se o entendimento de que, no caso de um cidadão recursar-se a cumprir comando legal, ou de prestação alternativa fixada por autoridade competente, terá seus direitos políticos suspensos. Exemplos de situações de obrigações que ensejariam tal sanção são citados por Almeida (2016) como o exercício da função de jurado e a prestação de serviço militar obrigatório. Por fim, a última hipótese de suspensão do direito de votar e ser votado prevista no rol do artigo 15 da Constituição Federal é a prática do ato de improbidade administrativa. De fato, conforme observa Gomes (2017), a ação ímproba, de desonestidade e ofensa à moralidade administrativa, cujo fundamento jurídico encontra-se na Lei 8.429/92, confere ao agente a suspensão dos direitos políticos por até 10 anos. Ipso facto, resta notória a relevância da moralidade e da honestidade para o âmbito eleitoral. Não incorrendo em qualquer hipótese de perda ou suspensão dos direitos políticos previstos no artigo 5º, o cidadão está no pleno gozo de tal garantia fundamental, podendo exercer sua capacidade eleitoral ativa. Todavia, para efetivação da capacidade eleitoral passiva, ou seja, para candidatar-se a representante do povo, o indivíduo tem uma série de requisitos para preencher, bem como uma série de hipóteses nas quais não poderá incorrer, conhecidos como condições de elegibilidade. 29 3 A ELEGIBILIDADE NO DIREITO ELEITORAL BRASILEIRO Uma vez escolhida a democracia como forma de governo, bem como assegurado o direito de os cidadãos participarem dos processos eleitorais (art. 14, CF/88), como forma de efetivar-se a garantia constitucional de ser votado, a Carta Magna estabeleceu requisitos de elegibilidade e hipóteses de inelegibilidade, definindo quais critérios devem ser obedecidos para que um cidadão possa concorrer a mandatos eletivos. Desta forma, no presente capítulo se buscará examinar as condições que necessitam ser preenchidas para possibilitar a candidatura a cargo político eletivo, descrevendo aspectos sobre as mudanças legislativas proporcionadas pela Lei Complementar 135/2010. 3.1 Condições de elegibilidade Já tendo sido levados a destaque os direitos políticos e, por conseguinte, a capacidade eleitoral passiva, necessário esmiuçá-la a ponto de compreender como se efetiva o seu exercício por quem deseja candidatar-se a ocupar cargo político. Todavia, antes de serem trazidas à tona as condições impostas pela CF/88, necessário compreender o conceito de elegibilidade, a qual, segundo Pinto (2008, p. 157), “é o credenciamento do cidadão para postulação do registro de sua candidatura”. Ainda, acerca da elegibilidade, assevera Gomes (2017, p. 177) que “elegível é o cidadão apto a receber votos em um certame, que pode ser escolhido para ocupar cargos político-eletivos”. No mesmo sentido ensina Mendes apud Zílio (2012, p. 142) 30 que “[...] elegível é o cidadão apto a ser eleito, isto é, receber votos. Portanto, trata- se de aptidão do cidadão de apresentar-se candidato [...]”. Todavia, mostra-se mais adequada a linha de pensamento formalizada pelo Ministro Moreira Alves, citado por Sanseverino (2008, p. 109), segundo quem as imposições para um brasileiro ser elegível são requisitos positivos, os quais devem estar plenamente satisfeitos para autorizarem o cidadão a concorrer nas eleições. Assim, pode-se perceber que para um possível candidato registrar-se como tal, o mesmo já deve estar preenchendo todas as condições necessárias, ou seja, a perfectibilização dos requisitos de elegibilidade devem anteceder o registro de candidatura, sendo postos em exercício por meio deste. Nesse sentido: Uma coisa é ter capacidade eleitoral passiva, outra é exercê-la. O exercício desta se dá com a efetiva postulação do mandato através do registro da candidatura realizado pela Justiça Eleitoral. Sem registro de candidatura, ninguém pode postular mandato eletivo no Brasil. Vale dizer, sem essa providência é impossível o exercício da capacidade eleitoral passiva (PINTO, 2008, p. 147). Assim, não se pode considerar o registro de candidatura como condição de elegibilidade, mas sim como pedido de inscrição como candidato por quem já preencheu todas as imposições legais para fazer uso da capacidade eleitoral passiva. Tal corrente doutrinária, conhecida como Teoria Clássica, é fortemente defendida por Niess (2000, p. 27), segundo quem: [...] A presença das condições de elegibilidade deve ser sempre comprovada por ocasião do pedido de registro de candidatura. A ausência de causa de inelegibilidade será objeto de prova de acordo com as circunstâncias do caso concreto. Acrescenta, ainda, o doutrinador, que o ato de registro de candidatura possui o efeito de fazer surgir a figura do candidato, e não a elegibilidade, somente nascendo esta, via de regra, quando preenchidos os requisitos legais para tanto (NIESS, 2000). Partilham do mesmo entendimento renomados estudiosos do Direito Eleitoral, como Pinto (2008, p. 173), o qual afirma que as condições de elegibilidade devem 31 ser preenchidas antes do prazo para registro de candidatura, sendo este somente ato formal onde se faz sua verificação, concluindo que “o registro é o certificado de habilitação que credencia o cidadão a participar do processo eleitoral. Sem ele poderá haver elegibilidade, jamais candidatura”, e Zilio (2016, p. 179), que enfatiza a distinção entre requisitos de elegibilidade e de registrabilidade: As condições de registrabilidade são requisitos instrumentais que visam a implementação do procedimento do registro de candidatura. Apresentam um caráter eminentemente formal e burocrático, mas o não cumprimento desses requisitos importa o indeferimento do registro de candidatura. Contudo, isso não significa a incidência de uma causa de inelegibilidade ou a não implementação de um pressuposto de elegibilidade, embora a coincidência de efeitos de ordem prática. Em contraponto à Teoria Clássica, houve a difusão no meio doutrinário da Teoria do Fato Jurídico, segundo a qual a regra geral que vigoraria no ordenamento brasileiro é a inelegibilidade, somente sendo superada com o preenchimento de todos os requisitos legais, inclusive o registro de candidatura (PASSAIA, 2014). Defensor ferrenho da Teoria do Fato Jurídico, Costa (1998, texto digital) afirma que: As chamadas condições de elegibilidade [...] são reconhecidas como os únicos pressupostos estipulados para que o eleitor obtenha o direito de ser votado. Embora a realidade seja diferente, pois, como veremos, há outras condições legalmente exigidas, o certo porém, é que tais pressupostos são fixados para que o nacional possa ter sua candidatura registrada perante a Justiça Eleitoral. É pelo registro de candidatura que nasce o direito de ser votado. Neste sentido, conclui Costa (1998) que “o registro de candidatura é o fato jurídico que faz surgir a elegibilidade”. Posicionamento semelhante é adotado por Stoco e Stoco (2012), os quais, seguidores da Teoria do Fato Jurídico, entendem a condição de elegível como exceção no ordenamento jurídico brasileiro, sendo a elegibilidade um efeito jurídico do ato de registro de candidatura. Todavia, a Teoria Clássica se mostra mais aceitável, tendo em vista que o registro de candidatura se trata de procedimento formal de verificação da existência de condições de elegibilidade e de ausência de hipóteses de inelegibilidade, nascendo, neste ponto, a figura do candidato. Por fim, acerca da divergência de correntes, concluem Velloso e Agra (2009) que o registro de candidatura é o meio pelo qual o cidadão torna explícita sua condição de elegível. 32 As condições de elegibilidade, que serão individualmente analisadas, estão insculpidas nos incisos do parágrafo 3º, artigo 14, da Constituição Federal, e consistem em: Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: [...] § 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: I - a nacionalidade brasileira; II - o pleno exercício dos direitos políticos; III - o alistamento eleitoral; IV - o domicílio eleitoral na circunscrição; V - a filiação partidária; VI - a idade mínima de: a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para Vereador (grifo acrescido). Diferentemente do que ocorre com as hipóteses de inelegibilidade, como se verá adiante, o legislador não autorizou a ampliação do rol de condições de elegibilidade para além do texto constitucional. 3.1.1 Nacionalidade brasileira No que tange ao primeiro requisito, cabe destacar que nem toda pessoa residente no Brasil pode candidatar-se a cargos eletivos, mas somente aqueles que são brasileiros natos ou naturalizados, cuja sentença de naturalização já tenha transitado em julgado. Isso se deve à necessidade de vinculação entre o indivíduo e a nação, não sendo suficiente o simples fato de residir em determinada localidade. Tal exigência busca “bem tutelar os interesses nacionais” (PEREIRA, 2000, p. 31), evitando-se que estrangeiros assumam cargos político-eletivos e tomem decisões que contrariem o senso comum dos cidadãos brasileiros. No mesmo sentido é o ensinamento de Pinto (2008, p. 159): A exigência da nacionalidade originária ou adquirida guarda sintonia com a própria soberania. O destino de uma nação não pode ser decidido por estrangeiros, ou por pessoas sem vínculo com ela, sem afinidade com os ideais comuns de seus integrantes. 33 Nesta senda, ensina Almeida (2016) que a nacionalidade pode ser adquirida por dois meios: o territorial (ius soli) e o sanguíneo (ius sanguinis). Neste, se considera nacional o indivíduo que possui descendência de brasileiros, enquanto àquele exige que o nascimento ocorra em território da República Federativa do Brasil. Acerca do sistema adotado no Brasil, afirma o renomado doutrinador que: A Constituição Federal de 1988 adotou, simultaneamente, os critérios do ‘jus soli’ e do ‘jus sanguinis’ para a fixação da nacionalidade brasileira originária. Nos termos do seu inc. I do art. 12, são brasileiros natos apenas os nascidos: No Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que não estejam a serviço de seu país (jus soli); No estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil (jus sanguinis + atividade funcional); e No estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que registrados em repartição brasileira competente (consulados ou embaixadas) ou que venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira (jus sanguinis + critério residencial + vontade do indivíduo) (ALMEIDA, 2016, p. 65). No que tange aos estrangeiros que desejam nacionalizar-se brasileiros, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 12, inciso II, estabelece que pode ser naturalizado: Art. 12. São brasileiros: [...] II - naturalizados: a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral; b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. A diferenciação entre brasileiro nato ou naturalizado, que só pode ser feita pelo próprio texto constitucional, possui relevância na seara eleitoral no momento da escolha do cargo ao qual o cidadão quer candidatar-se, visto que alguns cargos (Presidente e Vice-Presidente da República, Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, Ministro do STF, servidores de carreira diplomática, Oficial das Forças Armadas e Ministro de Estado da Defesa) são exclusivos de brasileiros natos. Uma vez adquirida à nacionalidade, via de regra, adquire-se também a cidadania, permitindo ao nacional o exercício dos direitos políticos a ela inerentes. 34 3.1.2 Pleno exercício dos direitos políticos Acerca do exercício dos direitos políticos, verifica-se que o preenchimento de tal condição é a regra geral do sistema jurídico brasileiro, uma vez que, conforme ensina Cândido (2016), estes somente são perdidos ou suspensos em estritos casos, previstos no artigo 15 da CF/88. Segundo Almeida (2016), a privação definitiva dos direitos políticos somente ocorre em duas hipóteses, ambas relacionadas com a perda da nacionalidade brasileira, seja por cancelamento de naturalização por sentença transitada em julgado, por prática de ato nocivo ao interesse nacional ou pela opção por outra nacionalidade que não a brasileira. Acerca da perda da nacionalidade brasileira, já há entendimento firmado pelo STF de que: [...] somente pode ocorrer nas hipóteses taxativamente definidas na Constituição da República, não se revelando lícito, ao Estado brasileiro, seja mediante simples regramento legislativo, seja mediante tratados ou convenções internacionais, inova nesse tema, quer para ampliar, quer para restringir, quer, ainda, para modificar os casos autorizados da privação – sempre excepcional – da condição política-jurídica de nacional do Brasil (Habeas Corpus n° 83.113 – Rel. Celso de Mello – j. 26.03.2003) (BRASIL apud ZILIO, 2012, p. 114). De outra banda, a suspensão dos direitos políticos ocorre com condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos, com recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou de prestação alternativa, ou com condenação em ação de improbidade administrativa, como já disposto acima, no item 2.3. 3.1.3 Alistamento e domicílio eleitoral Como consequência do pleno gozo da capacidade eleitoral, o cidadão poderá alistar-se como eleitor em sua circunscrição eleitoral, preenchendo, respectivamente, os requisitos dos incisos III e IV, do § 3º, do artigo 14, da CF/88. Sobre o alistamento eleitoral, ensina Zilio (2012, p. 124) que “é o ato que qualifica o indivíduo como parte do corpo eleitoral e o eleva à condição de cidadão”. 35 Cabe destacar, ainda quanto ao alistamento eleitoral, que o mesmo é obrigatório para os cidadãos maiores de 18 anos, conforme dispõe o artigo 14, § 1º, inciso I, da CF/88. Todavia, no que tange ao domicílio eleitoral, ensina Gomes (2017) que, no Brasil, o cidadão somente poderá se candidatar a cargo político-eletivo na circunscrição onde estiver alistado, ou seja, o local do alistamento servirá, também, como fixação do domicílio eleitoral do brasileiro. Acrescenta Zilio (2012, p. 125) que: [...] a conceituação de domicílio eleitoral abarca, segundo interpretação dos tribunais, não apenas a residência ou moradia do eleitor, abrangendo, também, aquela localidade com a qual o eleitor tenha uma vinculação específica seja na forma de exercício profissional (vínculo profissional), interesse patrimonial (vínculo patrimonial), reconhecida notoriedade no meio social daquela comunidade (vínculo social, político e afetivo). A mesma linha de raciocínio é seguida por Almeida (2016, p. 90), segundo quem “o domicílio eleitoral não se confunde com o domicílio civil”. Neste ponto, se mostra correta tal afirmação, uma vez que, muitas vezes, o vínculo político se sobressai em relação ao vínculo territorial, sendo mais vantajoso para o candidato concorrer a cargo político não onde possui sua residência, mas sim aonde possui vínculo afetivo ou social. Assim, resta superada a definição de domicílio fixada pelo Código Eleitoral, em seu artigo 42, parágrafo único, como sendo o local de residência do eleitor, uma vez que não é a única hipótese possível de determinação da circunscrição eleitoral de um cidadão. 3.1.4 Filiação partidária A filiação partidária, requisito insculpido no inciso V, do artigo 15, da CF/88, possui regramento menos rígido, uma vez que, nos termos dos ensinamentos de Almeida (2016, p. 91), “caberá ao estatuto partidário definir as regras para filiação partidária”. Da mesma forma, acrescenta o citado doutrinador que para cumprimento deste requisito de elegibilidade, é necessário observar as regras gerais estabelecidas na Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.504/1997), como o prazo para filiação e a realização de convenção. 36 Ainda, cabe destacar que a filiação partidária possui relevância de ponto de vista ideológico, uma vez que cada partido político possui diferentes interesses e concepções de como governar o Estado, e a identificação da sigla partidária à qual o candidato pertence é imprescindível para a escolha pelos eleitores, que via de regra, deveriam optar por partido que tenha a mesma linha de raciocínio que as suas (VELLOSO; AGRA, 2009). No mesmo sentido, conclui Sanseverino (2008, p. 112): De maneira mais ampla, é lícito afirmar que os partidos políticos colocam-se como instituições políticas intermediárias entre o povo e seus representantes na democracia representativa brasileira. Não admite o sistema brasileiro a figura do denominado candidato avulso, ou seja, que não tenha violação partidária. Portanto, a filiação partidária não se trata somente de um ato que visa preencher uma condição de elegibilidade, mas sim de um instituto que vincula um cidadão a determinada agremiação política, enraizando-o nos ditames estatutários e ideais daquela instituição. 3.1.5 Faixa etária Por fim, tem-se o requisito etário como condicionante à obtenção da elegibilidade, o qual, inclusive, não é preenchido instantaneamente, uma vez que cada cargo político-eletivo possui uma idade mínima a ser preenchida. Acerca da matéria, ensinam Velloso e Agra (2009, p. 54) que “partiu o legislador constituinte do princípio de que o passar dos anos assegura a seu detentor maturidade para enfrentar com maior sapiência os problemas e angústias do cotidiano”. Assim, a elegibilidade para cada função do Legislativo ou do Executivo necessita-se de uma idade diferente, iniciando-se pelo Vereador (18 anos) e completando-se plenamente ao atingir 35 anos, faixa etária necessária para o cidadão ser elegível como Presidente da República ou Senador. Entre as idades supracitadas, a CF/88, em seu artigo 14, § 3º, VI, ainda fixa como idade mínima 30 anos para Governador e Vice-Governador, e 21 anos para 37 Deputado Federal, Deputado Estadual, Prefeito, Vice-Prefeito, Juiz de Paz e Ministro de Estado. Entretanto, há algo a respeito da idade mínima que foge à regra geral das demais condições: o momento de sua aferição. Enquanto os requisitos de elegibilidade insculpidos nos incisos I a V do § 3º, do artigo 14, da CF/88, são analisados no momento do registro de candidatura junto à Justiça Eleitoral, o preenchimento da exigência etária somente se verificará no momento da posse. E tal exceção provém da própria Lei 9.504/1997 (Lei das Eleições), que em seu artigo 11, § 2º, estabelece a verificação da idade mínima no momento do registro de candidatura somente ocorre no marco inicial, ou seja, para apurar se o futura candidato já possui 18 anos completos. Todavia, embora havendo disposição legal expressa quanto ao momento de aferição do preenchimento do requisito etário, alguns doutrinadores possuem entendimento diverso: Não podemos nos esquecer que a exigência de uma idade mínima para se eleger a determinado cargo constitui matéria de ordem pública e, por consequência, não admite interpretação extensiva. Por outro lado, condição de elegibilidade nada mais é do que uma restrição à disputa do cargo eletivo e não uma restrição ao exercício do mandato. Pois bem, habilita-se à disputa eleitoral aquele que tem seu registro deferido, gerando efeitos jurídicos a partir do respectivo pedido. É esse, portanto e ao nosso ver, o momento em que devem ser atendidas todas as exigências para concorrer ao pleito eleitoral, ou seja, na ocasião do pedido de registro de candidatura (STOCO; STOCO, 2012, p. 196). Contudo, tal posicionamento não é majoritário, uma vez que renomados doutrinadores expõem seus conhecimentos e conclusões acompanhando a legislação acima mencionada, como Pazzaglini Filho (2014, p. 8), o qual afirma que “[...] a idade mínima constitucionalmente exigida como condição de elegibilidade é verificada tendo por referência a data da posse (início do exercício da função pública)”. Na mesma linha de raciocínio: Em certos casos, poderá o candidato contar com idade inferior à exigida quando do registro de candidatura, desde que a complete até a data da posse. Assim, por exemplo, uma pessoa com 20 anos poderá ser candidata a Prefeito (GOMES, 2017, p. 185). 38 Todos esses requisitos inerentes à condição de elegibilidade devem ser demonstrados quando do registro de candidatura. Contudo, a idade mínima, uma das condições de elegibilidade, configura-se exceção, apenas precisando ser aferida na data da posse por ser o marco inicial que o cidadão começa a exercer sua função pública (VELLOSO; AGRA, 2009, p. 54). Portanto, resta superada a divergência doutrinária, vigorando o texto legislativo, pelo qual o preenchimento da exigência de idade mínima ocorre no momento da posse do cargo público pelo candidato eleito, o que, inclusive, exposto pelo TSE na Consulta 554, de 1999, com relatoria do Ministro Édson Vidigal (BRASIL, 2000, texto digital). 3.2 Hipóteses de inelegibilidade A Constituição Federal, além de estabelecer critérios para que o cidadão seja apto a receber votos, também fixou situações nas quais alguém que deseja ser candidato não deva incorrer, sob pena de tornar-se inelegível. Neste prisma, desde já pode-se perceber que os conceitos de não-elegível e de inelegível são diferentes, mesmo diante da proximidade dos institutos. Neste sentido, ensina Cândido (2016, p. 108) que: Não basta, para uma pessoa, poder concorrer a qualquer cargo eletivo que possua as condições de elegibilidade que foram examinadas. É mister, ainda, que não incida ela em qualquer causa de inelegibilidade. Estas, ao contrário daquelas que figuram em lei ordinária, só podem ser fixadas na própria Constituição Federal ou em lei complementar, tão somente”. Assim, uma vez compreendido o alcance do conceito de elegibilidade, conforme item 3.1, de bom alvitre trazer à tona a conceituação de inelegibilidade feita pelo doutrinador, o qual alega se tratar de “[...] restrições aos direitos políticos e à cidadania, já que por inelegibilidade se entende a impossibilidade, temporária ou definitiva, de uma pessoa ser eleita para um ou mais cargos eletivos” (CÂNDIDO, 2016, p. 108). Todavia, há eleitoralistas com entendimento diverso, dissertando sobre a possibilidade de inelegibilidade por ausência de condição de elegibilidade, conceituando-a simplesmente como a incapacidade de concorrer a mandato eletivo (PINTO, 2008). 39 Contudo, tal posicionamento não se mostra majoritário na doutrina pátria, tendo em vista que a verificação da possibilidade do exercício do ius honorum ocorre em etapas, as quais se complementam, ou seja, somente após preenchidos os requisitos de elegibilidade será averiguado se o postulante a mandato político-eletivo não incorre em nenhuma hipótese de inelegibilidade. Ainda, sendo as condições de elegibilidade requisitos positivos, conforme Ministro Moreira Alves, citado por Sanseverino (2008, p. 109), necessário destacar que as “inelegibilidades, no plano eleitoral, configuram normas negativas, restritivas de direitos, pois impedem o cidadão de ser eleito para cargo público” (DAL POZO apud CAVALCANTE, 2016, p. 78). Portanto, mais uma razão para distinguir-se os institutos, embora ambos proporcionem o mesmo efeito: restringir os direitos políticos, enfaticamente no que tange à capacidade eleitoral passiva. Gomes (2017, p. 193), além de partilhar da mesma linha de raciocínio de Dal Pozo e Cândido, conceituando inelegibilidade como fator negativo que retira o ius honorum do cidadão brasileiro, com a consequência de sua inaptidão para ser votado/escolhido como representante do povo, afirma que “tal impedimento é provocado pela ocorrência de determinados fatos previstos na Constituição ou em lei complementar”. Desta forma, verifica-se que as situações que proporcionam perda ou suspensão dos direitos políticos passivos, diferentemente dos requisitos de elegibilidade, não encontram-se presentes somente na CF/88, mas também em legislação infraconstitucional. Conhecida como Lei das Inelegibilidades, a Lei Complementar 64/1990 foi o texto normativo responsável pelo rol de atos/fatos que acarretam tal efeito à capacidade de ser candidato a cargo político-eletivo. Todavia, antes de adentrar uma breve análise acerca de algumas hipóteses de inelegibilidade, imperioso mencionar alguns critérios utilizados pela doutrina para classificá-las, como forma de melhor compreendê-las. Neste sentido, Niess (2000) utiliza-se de quatro critérios ao dissertar sobre a matéria: quanto à origem, quanto à abrangência, quanto à duração e quanto ao conteúdo. Os mesmos critérios são citados por boa parte da doutrina eleitoralista, o que demonstra o êxito do escritor ao tratar do tema. 40 Dentre os critérios mencionados, necessário tecer considerações em relação à abrangência, tendo em vista que alguns casos de inelegibilidade são considerados absolutos, ou seja, nas palavras de Gomes (2017, p. 202), causam “impedimento para o exercício de quaisquer cargos político-eletivos, independente da circunscrição em que ocorra a eleição”, enquanto que outros casos são classificados como relativos, nos quais há impossibilidade de ser votado somente em determinada eleição, seja por motivo territorial, funcional, de parentesco ou em virtude de impossibilidade de nova reeleição (RAMAYANA, 2008). E sobre a abrangência das inelegibilidades, concluem Velloso e Agra (2009, p. 57): As inelegibilidades também podem ser classificadas em absolutas ou relativas. As primeiras consistem em impedimento eleitoral para o exercício de qualquer cargo eletivo, independente de qual seja o ente federativo. As segundas são um obstáculo ao exercício de certos cargos eletivos em decorrência de condições especiais do cidadão, o que faz com que esses impedimentos tenham de ser suprimidos para a recuperação de sua cidadania passiva. Outrossim, no que tange à origem da retirada do ius honorum, parâmetro usual em classificações, é entendimento pacífico que as inelegibilidades estão previstas na própria CF/88, ou em lei complementar, subdividindo-se, assim, em constitucionais e infraconstitucionais (ALMEIDA, 2016). As hipóteses previstas na Constituição Federal possuem menor número, mas não menor importância, quando comparadas à legislação infraconstitucional, estando àquelas insculpidas nos parágrafos 4º a 7º, do artigo 14, da CF/88, in verbis: Art. 14. [...] § 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos. § 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente. § 6º Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito. § 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. 41 Cada situação acima citada, que são consideradas inelegibilidades absolutas (com exceção do parágrafo 7º, eis que se refere somente à jurisdição do titular), merecem maior aprofundamento, com análise individual de cada hipótese. 3.2.1 Hipóteses constitucionais de inelegibilidade Inicialmente, a Carta Magna estabelece a impossibilidade de candidatar-se a representante do povo aqueles que não podem se alistar – e, por óbvio, tampouco poderão exercer a capacidade eleitoral ativa – e os analfabetos. Estes, contudo, tem seu alistamento facultativo (CF/88, art. 14, inc. I, alínea a) para exercício do direito ao voto. Na condição de inalistáveis, o texto constitucional arrola os estrangeiros e os indivíduos que se encontram prestando serviço militar obrigatório. Todavia, como bem explica Zilio (2012), a terminologia adotada pelo legislador constituinte não se mostra a mais adequada para a hipótese em apreço, eis que os inalistáveis, por não ostentarem a condição de eleitores, sequer cumprem com o requisito de elegibilidade do art. 14, § 3º, inc. III. Assim, não há que se falar em inelegibilidade, mas sim em ausência de elegibilidade. Da mesma forma conclui Gomes (2017, p. 207): É assente que o alistamento eleitoral condiciona a própria cidadania. Enquanto o inalistável não apresenta capacidade eleitoral ativa nem passiva, o inelegível encontra-se privado da segunda. Assim, a tautológica dicção constitucional afirma ser inelegível aquele que, por ser inalistável, já não o seria de qualquer forma. Portanto, os conscritos e os estrangeiros não gozam de seus direitos políticos no Brasil, estes definitivamente (ou até se naturalizarem), enquanto que aqueles provisoriamente, até concluírem o serviço militar obrigatório. Quanto ao analfabeto, diante da inexistência de um conceito uníssono que o defina, doutrinadores pátrios adotaram o entendimento de que goza do ius honorum o cidadão que tenha uma breve noção de leitura, escrita e compreensão textual (ZILIO, 2012). Tal linha de raciocínio também é seguida por Velloso e Agra (2009, p. 60), os quais concluem que “se o cidadão não sabe ler e escrever, não possui condições mínimas de enfrentar e solucionar os problemas que pululam na sociedade”. 42 Outros casos de inelegibilidade previstos pela CF/88 abrangem os Chefes do Poder Executivo dos três níveis da federação (Nacional, Estadual e Municipal). Acerca da matéria, dispõe o parágrafo 5º, do artigo 14, do mencionado diploma legal, que somente é permitida uma reeleição para os cargos retro citados. Tal iniciativa do legislador constituinte buscou evitar a perpetuação de políticos no poder utilizando-se da máquina pública (ZILIO, 2012). Ainda, a CF/88 (Art. 14, § 5º e 6º) obsta a capacidade eleitoral passiva no caso de ausência de renúncia pelos Chefes do Poder Executivo, ou de quem os tenha substituído, no período de seis meses antes do pleito a que pretendem concorrer, salvo hipótese de reeleição. Tal condição busca evitar que o prestígio de ocupar cargo público interfira na lisura do procedimento eleitoral, causando disparidade na disputa pelo voto dos eleitores. Sobre a renúncia, explica Zilio (2012, p. 160) que: Não se trata de mero e temporário afastamento; assim, finda a eleição, qualquer que seja o resultado do pleito, é vedado ao titular do Executivo, que pleiteou acesso a outro cargo, o retorno ao mandato anteriormente exercido. Outra situação que envolve inelegibilidade abarcando os Chefes do Executivo é a por parentesco. Neste sentido, são inelegíveis, na circunscrição eleitoral do Presidente da República, do Governador e do Prefeito, seu cônjuge, parente consanguíneo ou afim, até o segundo grau, ou por adoção. Regra de fácil compreensão, não exige muitas delongas acerca de sua aplicabilidade, diante de não ser o foco principal deste trabalho. 3.2.2 Hipóteses infraconstitucionais de inelegibilidade O legislador constituinte determinou que os casos de inelegibilidade não seriam somente aqueles previstos nos parágrafos do artigo 14 da CF/88, fixando que outras situações que retirassem o ius honorum, mesmo com o preenchimento dos requisitos de elegibilidade, seriam estabelecidos por meio de lei complementar. Nesta senda, as inelegibilidades infraconstitucionais provem da regulamentação do artigo 14, § 9º, da CF/88, o qual dispõe que: 43 Art. 14. [...]. § 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta (grifo acrescido) (BRASIL, 1988, texto digital). Nesse sentido, restou editada a Lei Complementar 64/1990, a qual fixou inúmeras situações que, por afrontarem os princípios enunciados no dispositivo legal supracitado (inseridos pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994), retiram do cidadão a capacidade eleitoral passiva, ou seja, a possibilidade de concorrer a cargos político-eletivos. A principal diferença entre as hipóteses de inelegibilidade quanto a sua origem, segundo Gomes (2017, p. 207), é a inocorrência de preclusão naquelas dispostas no texto constitucional, podendo serem arguidas em qualquer fase do processo eleitoral, enquanto que as hipóteses previstas na legislação infraconstitucional “sujeitam-se à preclusão se não forem levantadas na fase de registro de candidaturas”. Ainda, acrescenta o doutrinador, no que tange à Lei das Inelegibilidades, que: [...] o elenco legal é extenso, como se pode constatar de seu artigo 1º. O critério da abrangência ou extensão fundamenta a primeira grande divisão acolhida nessa matéria, porquanto as inelegibilidades são repartidas em absolutas e relativas (GOMES, 2017, p. 229). De fato, observando-se apenas o inciso I, do artigo 1º, da Lei Complementar 64/1990, percebe-se que possui 17 alíneas, o que prejudica uma análise pormenorizada de cada situação que enseja inelegibilidade na presente monografia. Cavalcante (2016, p. 94), de maneira sucinta, elenca as causas que possuem o condão de retirar do cidadão a possibilidade de concorrer a cargo político-eletivo: (i) os inalistáveis e os analfabetos; (ii) a perda do mandato parlamentar; (iii) a renúncia; (iv) a perda do mandato executivo; (v) o abuso do poder político ou econômico; (vi) a condenação por certos crimes; (vii) a indignidade para o oficialato; (viii) a rejeição de contas; (ix) a inelegibilidade dos administradores por abuso de poder político ou econômico; (x) a inelegibilidade dos administradores de instituição em liquidação judicial ou extrajudicial; (xi) a condenação em representações eleitorais (por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gasto ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma); (xii) a renúncia para evitar processo de cassação/ (xiii) a condenação por improbidade administrativa; (xiv) a proibição do exercício 44 de profissão, por decisão sancionatória do órgão profissional competente; (xv) a fraude na dissolução do vínculo conjugal; (xvi) a demissão do serviço público; (xvii) as doações eleitorais tidas por ilegais; (xviii) a aposentadoria forçada ou exoneração de magistrados e promotores de justiça na pendência de processo administrativo disciplinar [...]. Nas hipóteses de inelegibilidade expostas pelo doutrinador já estão inseridas as mudanças introduzidas na Lei das Inelegibilidades pela Lei Complementar 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), que mudou substancialmente a redação daquela. Assim, perante o grande número de situações que ensejam inelegibilidade e diante das controvérsias e debates jurídicos referentes à constitucionalidade da legislação alteradora, ocasionados em parte pela mudança na redação do artigo 1º, inciso I, alínea e), da Lei Complementar 64/1990, proporcionada pelo artigo 2º da Lei da Ficha Limpa, é neste ponto que o presente estudo irá se ater. A condenação criminal como hipótese de inelegibilidade passou a ser prevista na LC 64/90, caderno legislativo editado com o objetivo de substituir a legislação anterior que tratava da matéria (LC nº 5/1970), cujo texto encontrava-se em desconformidade com a CF/88. Em seu texto, a LC 5/70 considerava inelegível o cidadão que tinha contra si denúncia recebida, sem qualquer decisão judicial acerca do mérito da ação penal (GOMES, 2017). Segundo Zilio (2016, p. 222): O desiderato do legislador, ao eleger a hipótese de inelegibilidade em causa, visou a afastar da vida pública todo aquele que tenha praticado crime – e não mera contravenção – que denote a incompatibilidade de agente para com o mandato eletivo, eis que punido na esfera subsidiária do direito Penal. Entretanto, acerca da matéria assevera Almeida (2016) que, analisando-se o parágrafo 4º do supra colacionado dispositivo legal, é possível concluir que não ocasiona inelegibilidade a condenação penal por crimes culposos, de ação penal privada ou classificados como de menor potencial ofensivo. Todavia, com a atual redação da Lei de Inelegibilidades, não se mostra mais exigível o trânsito em julgado da decisão judicial que condenou o pretenso candidato pela prática de um dos crimes elencados como passíveis de gerar inelegibilidade. A expressão “ou proferida por órgão colegiado”, acrescentada à alínea em análise pressupõe a suspensão do ius honorum mesmo na pendência de recurso. 45 3.3 As mudanças legislativas ocasionadas pela Lei da Ficha Limpa Uma melhor compreensão das alterações introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010) ocorre quando analisadas as incompatibilidades existentes na Lei Complementar 64/1990 em relação aos anseios sociais da população brasileira, as quais geravam dois problemas graves: [...] O primeiro era o prazo exíguo de inelegibilidade: três anos. Com esse prazo, o candidato eleitor tornava-se novamente elegível antes mesmo que seu mandato acabasse [...]. O segundo problema era a exigência de trânsito em julgado da condenação por certos crimes, para só então ocorrer a geração da inelegibilidade [...] (GONÇALVES apud CAVALCANTE, 2016, p. 145). No mesmo sentido explica Zilio (2016, p. 205) que: Além da criação e alteração de hipóteses materiais de restrição à capacidade eleitoral passiva, a LC nº 135/2010 ainda, trouxe outras modificações substanciais em relação às inelegibilidades. Neste passo, a nova lei alterou a redação dada ao art. 15, modificou o inciso XIV, revogou o inciso XV, criou o XVI do art. 22 da Lei das Inelegibilidades, além de acrescentar os artigos 26-A, 26-B e 26-C ao mesmo diploma legal. Por fim, a nova lei trouxe, no art. 3º, previsão de caráter transitório em relação aos recursos já em andamento quando de sua publicação. Portanto, de início já se pode ter uma noção de quais foram, entre todas, as principais inovações legislativas trazidas pela Lei da Ficha Limpa. Tais mudanças restaram insculpidas em diversos artigos da Lei de Inelegibilidade, sendo oportuno destacar, por ora, a criação de dois tipos de inelegibilidade: um de caráter provisório, com condenação criminal proferida por órgão colegiado, e outro de caráter definitivo, de decisão judicial transitada em julgado (CAVALCANTE, 2016). No que tange às inovações materiais proposta pela lei de iniciativa popular, Passaia (2014), em seu trabalho monográfico, é feliz ao elencar a mudança de prazo de suspensão da cidadania passiva de três para oito anos, a ampliação do rol de condenações que geram inelegibilidade, e a possibilidade desta ocorrer mesmo nos casos de decisões judiciais sem trânsito em julgado, situação que, concentrou boa parte das críticas em face à nova legislação. Todavia, a suspensão do ius honorum em virtude de condenação criminal proferida por órgão colegiado é considerada como regulamentação do próprio texto 46 constitucional, que em seu artigo 14, § 9º, prioriza “a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato” (BRASIL, 1988, texto digital). Diante dos efeitos resultantes da modificação do texto da Lei de Inelegibilidades, necessário tecer maiores esclarecimentos acerca da alteração do período pelo qual o cidadão permanece inelegível, o qual foi ampliado de três para oito anos, contados a partir da decisão de órgão colegiado, ou do trânsito em julgado. Ainda, em determinadas situações, a impossibilidade de ser eleito é mantida por até oito anos após a extinção da pena. Neste ponto, conclui-se que buscou o legislador dar maior efetividade ao comando legal, de modo a evitar a perpetuação de processos e recursos judiciais que acabam por ser decididos quando já cumprido o mandato do candidato inelegível, tornando a aplicação da sanção de suspensão dos direitos políticos ineficaz. Outro ponto que ensejou intensos debates jurídicos diz respeito à aplicabilidade da Lei Complementar 135/2010, publicada em 07/06/2010, às eleições daquele mesmo ano, diante da exigência constitucional de que eventual mudança no processo eleitoral deverá respeitar o princípio da anualidade. Tal discussão foi plenamente elucidada pelo STF, em julgamento do RE n° 630147 - DF, restando esclarecido que, por modificar regra eleitoral há menos de um ano da eleição, a Lei da Ficha Limpa não seria aplicável ao pleito de 2010. O julgamento, cuja votação terminou em 6 votos a 5, foi desempatado pelo então recém Ministro Luiz Fux (ALMEIDA, 2016). Por fim, a Lei Complementar 135/2010 acrescentou os artigos 26-A, 26-B e 26-C à Lei das Inelegibilidades, alterações atinentes, respectivamente, ao restabelecimento dos direitos políticos, à forma de atuação da Justiça Eleitoral e do Ministério Público Eleitoral em relação a prazos e à análise de recursos, e à suspensão da inelegibilidade temporária por órgãos hierarquicamente superiores aquele que proferiu a decisão que ensejou a sanção. Cada um dos institutos tem maior conotação de direito processual, de modo a não frustrar o andamento do processo eletivo, o qual possui curto prazo de duração, se analisada a quantidade de exigências legais e atos formais a serem praticados. 47 Contudo, merece destaque a iniciativa do legislador de garantir, no mesmo diploma legal que criou a inelegibilidade por decisão de órgão colegiado, a possibilidade de sua suspensão cautelar (artigo 26-C), por meio de recurso com pedido específico, nos casos que seja plausível sua concessão. Sobre a matéria destaca Zilio (2016, p. 207) que “tecnicamente, não se trata de suspensão da inelegibilidade, mas sim de obtenção de provimento jurisdicional que obsta parcialmente os efeitos do acórdão colegiado [...]”. Especificamente no que tange à condenação criminal, a redação original da Lei Complementar 64/90 previa que eram inelegíveis: [...] os que forem condenados criminalmente, com sentença transitada em julgado, pela prática de crime contra a economia popular, a fé pública, a administração pública, o patrimônio público, o mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais [...] (grifo original) (RAMAYANA, 2008, p. 232). Já com as mudanças propostas pela Lei da Ficha Limpa, além de ser incluída a possibilidade de um cidadão perder a capacidade eleitoral passiva já com decisão de órgão colegiado (mesmo que cabível recurso), o rol de condutas criminosas foi alongado, para abranger os crimes: Art. 1° São inelegíveis: I – para qualquer cargo: [...] e) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes: 1. contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público; 2. contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência; 3. contra o meio ambiente e a saúde pública; 4. eleitorais, para os quais a lei comine pena privativa de liberdade; 5. de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública; 6. de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores; 7. de tráfico de entorpecentes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos; 8. de redução à condição análoga à de escravo; 9. contra a vida e a dignidade sexual; e 10. praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando; Assim, as críticas pela rigorosidade da LC 135/2010 não se adstringiram somente à exclusão da exigência de trânsito em julgado de condenação criminal para nascer à inelegibilidade, mas também pelo novo rol de condutas criminosas, bem mais extensas que a legislação modificada. Tal iniciativa do legislador 48 complementar atende às expectativas sociais, aumentando o número de atos que prejudiquem a moralidade administrativa e, consequentemente, o fiel e ético cumprimento da representação popular. 49 4 A CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 2º DA LEI COMPLEMENTAR 135/2010 A Lei da Ficha Limpa, ao alterar a redação da Lei de Inelegibilidades, objetivou disciplinar e assegurar a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato, levando-se em consideração a vida pregressa do candidato e a lisura do pleito eleitoral. Dentre as mudanças proporcionadas pela LC 135/2010, a hipótese de ineleg