13 UNIVERSIDADE DO VALE DO TAQUARI – UNIVATES CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO EM ENSINO AS METODOLOGIAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: O TRABALHO DE UMA PROFESSORA NO MUNICÍPIO DE GOIANÉSIA DO PARÁ-PA EM TURMA MULTISSERIADA Lindomar Pereira de Souza Lajeado, dezembro de 2021 Lindomar Pereira de Souza AS METODOLOGIAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: O TRABALHO DE UMA PROFESSORA NO MUNICÍPIO DE GOIANÉSIA DO PARÁ-Á EM TURMA MULTISSERIADA Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino, da Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES, como parte da exigência para obtenção do grau de Mestre em Ensino, na área de Alfabetização Científica e Tecnológica, na linha de pesquisa Formação de Professores, Estudo do Currículo e Avaliação. Orientadora: Profª Dra. Jacqueline Silva da Silva Lajeado, dezembro de 2021 Lindomar Pereira de Souza AS METODOLOGIAS DE ENSINO NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: O TRABALHO DE UMA PROFESSORA NO MUNICÍPIO DE GOIANÉSIA DO PARÁ-PA EM TURMA MULTISSERIADA A Banca examinadora da Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino, da Universidade do Vale do Taquari - UNIVATES, como parte da exigência para obtenção do grau de Mestre em Ensino, Alfabetização Científica e Tecnológica, na linha de pesquisa Formação de Professores, Estudo do Currículo e Avaliação. Profª Dra. Jacqueline Silva da Silva Orientadora - Universidade do Vale do Taquari Profº Drº Salomão Mufarrej Hage 1º Membro – Universidade Federal do Pará Profª Drª Silvana Neumann Martins 2º Membro – Universidade do Vale do Taquari Profª Drª Liliana Inês Ávila Garzon 3º Membro - Universidade Pedagógica e Tecnológica da Colômbia Lajeado, dezembro de 2021 Dedico esta dissertação as pessoas que me dão o maior sentido da vida. Ao meu pai, o Srº Fernando Pereira Souza, um homem de caráter singular, de uma sabedoria única, uma pessoa de palavras sábias que me dão forças no momento de precisão. A minha mãe a Srª Maria da Conceição Pereira, uma mulher de personalidade forte e única, guerreira e amiga que sempre me acolhe e quando precisa me diz o que pensa. É, e sempre será a mulher que terei como referência de mãe e de mulher do interior. Essas duas pessoas que nunca fugiram à luta para com seus filhos, mesmo residindo no campo desde quando nasceram no interior do Maranhão e atualmente moram no interior do Pará. Dedico ainda este meu trabalho aos meus padrinhos o Srº Xavier Vieira Vale (In memoriam) e a Srª Albetiza dos Santos Vale. Pessoas com as quais convivi desde a minha adolescência e me deram ensinamentos para a vida que trago comigo até hoje. Dedico também, ao meu companheiro, Bruno da Silva Dutra por ter acompanhado de perto essa minha caminhada rumo ao Mestrado e em direção de novos desafios em busca do saber na minha realização pessoal e profissional, por estar na minha companhia todas as vezes que tive de ir ao lócus da pesquisa. Por aturar as minhas constantes reclamações quando peço silêncio no momento que estou lendo ou escrevendo em casa, pela sua proximidade de minhas lutas e conquistas profissional e acadêmica. AGRADECIMENTO Agradeço profundamente ao nosso Deus criador pela oportunidade de nos possibilitar a chegada ao final de nossa caminhada com a obtenção do título de mestre em ensino. De maneira muito especial agradeço minha orientadora a Professora Doutora Jacqueline Silva da Silva, uma pessoa com a qual aprendi muito, me ensinou a ver as coisas de pontos e ângulos diferentes, me provocou a pensar grande acerca do ensino e da pesquisa. Por ter diretamente dado a sua valiosa contribuição para novas percepções sobre a educação do campo. Agradeço aos professores do PPGEnsino que a cada disciplina nos trazia novos olhares sobre o ensino e a pesquisa na pós-graduação, nos ensinando algo novo, fazendo florar reflexões sobre o ato de ensinar e de aprender e de pensar no exercício da docência. Agradeço aos colegas de turma pelas contribuições no momento dos debates, pelas amizades e parcerias na hora de realizar as atividades acadêmicas ao longo do curso. Agradeço ao Colégio Anunciada Chaves pelo aprendizado que nele obtive, a partir das relações com seu corpo docente e discente, desde o ano de 2011 quando passei a compor seu quadro funcional na função de Técnico em Educação pela esfera estadual. Agradeço a professora Alvina Maria Ferreira de Souza por me permitir aprender junto com ela ao longo de toda minha pesquisa, seja no tocante às questões do universo da docência como de outras questões de ordem social e pessoal. Pela oportunidade que me concedeu de enxergar a vida pela janela da superação, da luta pela sobrevivência e pela beleza de trazer e ver a alegria em pequenos gestos e momentos. Eterno Aprendiz (...) Viver e não ter a vergonha de ser feliz Cantar.. (E cantar e cantar...) A beleza de ser um eterno aprendiz Ah meu Deus! Eu sei... (Eu sei...) Que a vida devia ser bem melhor e será Mas isso não impede que eu repita É bonita, é bonita e é bonita (...) Gonzaguinha https://www.youtube.com/watch?v=tHkDVrNjbVw https://www.youtube.com/watch?v=tHkDVrNjbVw RESUMO Discutir o ensino na Educação do Campo é marcar esse território respeitando todos os sujeitos que dão vida para cada realidade do campo, e nessa perspectiva a formação continuada do professor atuante nessa realidade em turma multisseriada se torna uma questão a mais a ser respeitada e considerada por todos que fazem a educação sistemática acontecer. Vivenciar os desafios de ensinar numa escola do campo é, sobretudo acreditar no trabalho do professor, na sua capacidade de criação e recriação de metodologias de ensino em sua ação no cotidiano da sala de aula buscando melhorar sua prática pedagógica. O presente estudo teve como problema: Quais metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na Educação do Campo, em uma turma multisseriada no município de Goianésia do Pará? Dessa forma seu objetivo geral buscou: Investigar quais as metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na Educação do Campo, em uma turma multisseriada no município de Goianésia do Pará. A pesquisa teve uma abordagem de caráter qualitativo fundamentada no pensamento de Teixeira (2011) e Moreira (2011) e do tipo documental baseada em Gil (1999) e da pesquisa de campo na perspectiva do olhar de Marconi e Lakatos (1999), e ainda da Pesquisa-Ação conforme Thiollent (2007). O sujeito da pesquisa foi uma professora atuante numa turma multisseriada nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental da Educação do Campo no município de Goianésia do Pará/PA. A coleta de dados se efetivou através do uso da entrevista semiestruturada as quais foram gravadas com celular, da observação participante, registro por meio de fotografia e diário de campo. A mesma contou com as contribuições teóricas de autores que discutem a temática em debate como: Hage (2005, 2010); Pires (2012); Fighera (2018); Veiga (2012) entre outros que abordam esse campo de estudo, e ainda algumas legislações que regulamentam a Educação do Campo. A pesquisa apontou sobre a carência de materiais didáticos para auxiliar a professora em suas ações pedagógicas, assim como da necessidade de ampliação de formação continuada destinadas aos professores atuantes em turmas multisseriadas no campo, além de se pensar um planejamento pautado na coletividade. A pesquisa trouxe contribuições importantes no sentido de compreender a necessidade da elaboração de um projeto capaz de assegurar a formação continuada para professores de turmas multisseriadas do campo visando a melhoria da prática pedagógica em sala, bem como da construção de um planejamento baseado na realidade dos sujeitos residentes no espaço rural que necessitam da escola do campo. PALAVRAS-CHAVE: Educação do Campo. Turma Multisseriada. Metodologias de Ensino. ABSTRACT Discussing teaching in Rural Education is setting this territory, respecting every living element in the field, and with this perspective, continuing education by an active teacher in such reality of a mixed grade class, brings about another issue to be respected and considered by all who make the systematic education happen. Experiencing the challenges of teaching in a rural school, above all, involves trusting the teacher's work, their ability of creating and recreating teaching methodologies in their daily life action seeking classroom improvements in their pedagogical practice. The problem in this project is: What teaching methodologies are used by a teacher who works in Rural Education, in a mixed grade level class in the city of Goianésia do Pará? Thus, its general objective it sought to: Investigate which teaching methodologies are used by a teacher working in Rural Education, in a mixed grade level class in the city of Goianésia do Pará. The research had a qualitative approach based on Teixeira´s and Moreira´s ideas (2011) and the documentary type based on Gil´s (1999) and field research from the perspective of Marconi and Lakatos (1999), and also of Action Research according to Thiollent (2007). The research subject was an active teacher working in a mixed grade level class in the First Years of Elementary School of Rural Education in the city of Goianésia do Pará/PA. Data collection was performed through the use of semi-structured interviews, which were recorded with cell phones, participant observation, recording through photography and field diary. It also had theoretical contributions from authors who debate themes such as: Hage (2005, 2010); Pires (2012); Fighera (2018); Veiga (2012) among others that address this field of study, and still some legislation that regulates field education. The survey pointed to the lack of didactic materials to help the teacher in her teaching duties, as well as the need to expand continuing education aimed to teachers working in mixed grade level classes in the field, in addition to planning activities based on the community. The research brought important contributions in order to understand the need to prepare a project capable of ensure continuing education for teachers of mixed grade level classes of the field aiming at the improvement of pedagogical practice in the classroom, as well as building a plan based on the reality of the ones living in rural areas who need the country school. KEYWORDS: Rural Education. Mixed Grade Level Class. Teaching Methodologies. LISTA DE IMAGENS Imagem 1: Professora com o pesquisador com os jogos de Língua Portuguesa confeccionadas em sala 34 Imagem 2: Mapa da Região da Cinco Irmãos 35 Imagem 3: Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental Santa Cecília 36 Imagem 4: Sala de aula da EMEIF Santa Cecília 37 Imagem 5: Eu e a professora em um dos caminhos que dão acesso a escola Santa Cecília 38 Imagem 6: Jogos de leitura confeccionados pela professora, alunos e eu em sala 41 Imagem 7: Primeira Cena ilustrando a prática da professora em sala de aula 58 Imagem 8: Sala de aula Escola Santa Cecília 60 Imagem 9: Área externa da frente da Escola Santa Cecília 60 Imagem 10: Segunda CENA ilustrando a prática da professora em sala de aula 61 Imagem 11: caderno de planejamento da professora 63 Imagem 12: atividades elaboradas com a professora 85 Imagem 13: Desenho da sala de aula feito pela professora 86 Imagem 14: Desenho ilustrando a realidade do aluno em sua comunidade 95 Imagem 15: Pátio da escola onde as crianças realizam atividades recreativas 102 Imagem 16: Sala de aula da escola Santa Cecília 106 Imagem 17: Professora com jogos de leitura confeccionados em sala 108 Imagem 18: Professora ensinando leitura com jogo confeccionado por ela e eu 112 Imagem 19: Desenho que representa a realidade da aluna em sua comunidade 117 Imagem 20: Formação continuada para professores de turmas Multisseriadas 121 Imagem 21: Professores do campo da região pesquisada, em formação continuada 124 Imagem 22: Caminhos que dão acesso à escola Santa Cecília 129 SUMÁRIO 1 UM OLHAR NO RETROVISOR DE MINHA HISTÓRIA E O DESEJO DE APRENDER COM A PESQUISA 13 2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA: A TRILHA DA CAMINHADA 26 2.1 Caracterização da pesquisa: uma abordagem qualitativa 27 2.2 Tipos de pesquisa e suas contribuições 29 2.3 Lócus da pesquisa e os participantes 35 2.4 Instrumentos da pesquisa 40 2.5 Detalhamento das Atividades e a Técnica da Análise de Conteúdo 45 3 O ENSINO NA EDUCAÇÃO DO CAMPO E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DE UMA PROFESSORA ATUANTE NUMA TURMA MULTISSERIADA 48 3.1 O ensino na Educação do Campo: olhares e percepções 50 3.2 A prática pedagógica de uma professora numa realidade da Educação do Campo 57 3.3 A realidade do ensino multisseriado e os desafios de ensinar no campo 65 4 METODOLOGIAS DE ENSINO E OS DESAFIOS VIVIDOS POR UMA PROFESSORA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: RETRATO DE UMA REALIDADE MULTISSERIADA 74 4.1 As vozes advindas do ensino na Educação do Campo, uma realidade a ser visitada 75 4.2 Metodologias de ensino em turmas multisseriadas: o que dizer? 79 4.3 Falando sobre o espaço escolar e o planejamento de uma professora dos Anos Iniciais da Educação do Campo 86 5 A FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES ATUANTES NA EDUCAÇÃO DO CAMPO E AS AMARRAS DE UMA REALIDADE 99 5.1 A realidade da Educação do Campo e a formação continuada de professores: um olhar geral a respeito dessa questão 100 5.2 Formação continuada de professores, diretrizes e a proposta pedagógica para a Educação do Campo 111 5.3 Formação continuada de professores e a Educação do Campo em Goianésia do Para 120 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 127 REFERÊNCIAS 138 APÊNDICES 142 ANEXOS 149 13 1 UM OLHAR NO RETROVISOR DE MINHA HISTÓRIA E O DESEJO DE APRENDER COM A PESQUISA É historicamente, que o ser humano veio virando o que vem sendo: não apenas um ser finito, inconcluso, inserido num permanente movimento de busca, mas um ser consciente de sua finitude, (FREIRE, 2003, p. 10). Escrever sobre nossas experiências adquiridas ao longo da vida, não é simples como pensamos, uma vez que é necessária uma organização de ideias em conformidade com o tempo, o espaço e os fatos que vivenciamos nas mais diversas circunstâncias da vida. E essas circunstâncias dão sentido e marcam esse movimento do ser inconcluso, apontado por Freire (2003). É nesse ato da escrita, que ora me debruço firmemente com o desejo de expor de maneira memorável as minhas experiências, e a contemplar um espaço que marca minha trajetória e me impulsiona a mover forças, em busca de novos saberes. Marcas que até hoje carrego deixadas pela cultura do espaço escolar, das relações estabelecidas no seu bojo desde os meus quase 10 anos de idade, quando iniciei minha caminhada em direção a alcançar o saber, simbolizando, portanto, esse movimento, segundo Freire (2003), de permanente busca. E essa busca se registra numa simples e pacata comunidade do município de Goianésia do Pará, que outrora pertencia ao território da cidade de Rondon do Pará- Pará. Comunidade marcada pela vida simples, daqueles homens, mulheres e crianças que então desbravavam parte da floresta, com o objetivo de ali construir sua residência e deixar registro histórico e cultural naquela comunidade no início da década de 80. 14 Dou uma atenção especial aos desafios de minha vivência pessoal que já passei junto com minha família, e ainda parte de minha trajetória escolar no espaço rural com início na década de 80. Falo um pouco das minhas origens, já que compreendo a família como estrutura fundamental na construção da personalidade do indivíduo. Busquei nessa narrativa retratar o que já experienciei, não só como um menino filho de lavradores, mas especialmente como uma criança que iniciou sua vida escolar na zona rural, na Educação do Campo, onde a escola era um barracão onde funcionava uma turma Multisseriada, com alunos da 1ª a 4ª série na época. E esse contato com o espaço rural traz seus significados para mim, como pesquisador, e merece destaque devido às adversidades que são impostas aos sujeitos com os quais fiz a minha pesquisa e neles me remeto a pensar. Ao refletir sobre o tempo, a memória e ao ato de pesquisar, faço minhas afirmações como sujeito pertencente a uma história com enredo singular de uma família nordestina, vinda do interior do Maranhão para o estado do Pará. Meus pais chegaram ao Pará no início da década de 80, a procura de terra para trabalhar e ali nos criar. Iniciei minha caminhada como estudante, no ano de 1986 na 1ª série do 1º grau como era conhecido naquela época. Estudei numa turma multisseriada da educação rural, como era chamada naquele tempo. Na época eu ia completar 10 anos de idade, não tive o privilégio de cursar a alfabetização, tampouco a Educação Infantil. A princípio, eu e minha irmã mais velha (Arlete) estudávamos particular com a professora Nedina Luiz, que improvisou uma sala em um cômodo de sua casa. Ela, por sua vez, não tinha nem o Ensino Fundamental. Logo após, passamos a estudar na “escola” Romero Ximenes, com a mesma. Um barracão de taipa coberta de cavaco1 com apenas uma sala, onde estudavam alunos de séries diferentes, uma característica do ensino multisseriado no horário, das 13h às 17h de segunda a sexta- feira na comunidade Gleba Pitinga, onde até hoje meus pais residem. Lembro que ia mais para a escola por causa dos tantos amigos que tinha e, especialmente por conta das brincadeiras na hora do recreio, por ser um momento de fortalecimento dos laços de amizade com os demais colegas. Tinha dia que a professora não dava conta de receber a minha lição e nem de passar dever em meu 1 pequeno pedaço de madeira tirado em lasca que era utilizado para fazer cobertura de casa, ainda muito comum no interior, geralmente de madeira de lei, como: cedro, maçaranduba e outras. 15 caderno ou no quadro negro2. Aquilo chegava, às vezes, ser motivo de alegria, por não ter nenhum dever na escola ou não levar alguma atividade para fazer em casa. Hoje acredito que isso se dava, porque a professora deveria priorizar algumas séries por serem mais desenvolvidas. Na época não me faço recordar se os alunos com maior grau de aprendizagem auxiliavam a professora nas tarefas de sala, ajudando os colegas de uma série. Raramente os alunos da turma de 1ª série copiavam do quadro negro devido à falta de tempo, pois a professoras geralmente priorizava a escrita do quadro para os alunos de 3ª e 4ª série, enquanto para as outras séries ela fazia as atividades no caderno, com uma caneta de cor azul, registro de minha memória, que até hoje me faz lembrar com muita clareza desse objeto. As relações ali estabelecidas referem-se àqueles significados, modos de pensar e agir, valores, comportamentos, modos de funcionamento que, de certa forma, mostram a identidade dos sujeitos, das crianças que frequentavam aquele contexto, no campo e no campo. E aquela realidade tinha uma identidade que o tempo não apagará da minha memória, o quadro negro que ficava pendurado na parede do barracão que era a escola e constantemente mudava de posição, conforme a intensidade do sol quando era verão ou da chuva quando era inverno, devido o reflexo da luz solar, ou das goteiras que caiam sobre os bancos fixos no chão, usados como assentos pelos alunos. Os bancos eram feitos de madeira bruta, que serviam de assento para alunos e professora. As paredes eram cheias de buracos o que favorecia a ventilação no interior da sala e através desses buracos os alunos olhavam quem passava na estrada e os animais que pastavam no entorno da escola. Passada essa etapa de minha vivência no espaço rural, no ano de 1991 mais precisamente no mês de agosto tive que ir estudar na zona urbana, pois na escola que outrora estudava a professora só lecionava até a 4ª série. Chegando lá, precisei estabelecer outras relações com o espaço escolar, dando sentido à cultura que a escola apresentava e os seus significados. E o primeiro significado que construí no campo real, foi o estranhamento com aquele novo ambiente, bastante diferente do que eu conhecia. Havia tantas salas, banheiro masculino e feminino separados, os alunos tinham que usar farda, e principalmente, na sala só tinha alunos de uma série 2 Um pedaço de fórmica retangular pintado de verde escuro que era utilizado pela professora para escrever as tarefas a giz e ficava pendurado na parede da escola (barraco com um cômodo com uma turma multisseriada). 16 (turma seriada), nesse caso da 4ª série, na qual estudava e concluí no ano de 1991 na cidade de Jacundá. E na cidade de Jacundá (PA) residi, ora com meus padrinhos, ora com minha avó materna até concluir o Ensino Fundamental, ou seja, o primeiro grau como era conhecido. No ano de 1995, ali naquele espaço urbano pude perceber o intercruzamento de cultura oportunizado pela escola, um lugar capaz de aguçar o pensamento e o modo de agir das pessoas que as constitui. Ao refletir sobre nossa história e nossa busca como ser inconcluso, inserido num permanente movimento (FREIRE, 2003), destaco meu ingresso no campo educacional a partir 1996, atuando como auxiliar de secretaria no município de Itaituba (PA), e como docente desde 1997, nesta mesma cidade com uma turma de 2ª série do ensino fundamental. Tendo naquele ano o primeiro contato com o universo do ensinar e aprender em sala de aula e sentir de perto a cultura organizacional, falada por Freire (2003). Era uma escola situada numa comunidade carente em um dos bairros (Santo Antônio) mais pobres da cidade, o que constituiu um dos maiores desafios para um profissional que ora escolheu enveredar pelos caminhos da docência. E esse caminhar acontecia em direção da formação em nível médio Magistério, sendo meu, ingressado no ano de 1996, pois mesmo sem a qualificação mínima, já com muito afinco desenvolvia as atividades profissionais de docente em turmas de 1ª a 4ª série, o que caracterizou desde então um aprendizado significativo enquanto educador na busca permanente de conhecimentos pertinentes a minha profissão e, no ano de 1998, concluí o curso Normal em nível de Magistério e continuei atuando em sala de aula, com turmas de séries iniciais. No ano de 1999 a ampliação dessa busca e afinidade pela profissão docente, se consolida, quando ingressei na Universidade, no Curso de Formação de Professores, atualmente Pedagogia, pela Universidade do Estado do Pará - UEPA, ainda no município de Itaituba. Isso solidificou o meu maior desejo enquanto pessoa e fundamentalmente como profissional, uma vez que eu já estava atuando na docência. E foi ao concluir a graduação que tive a grata oportunidade de estabelecer contato com o universo da pesquisa, discorrendo sobre “As concepções de Currículo de Professores e Técnicos de Itaituba, Pará”, para fins de obtenção do título de 17 Licenciado Pleno em Pedagogia. Em seguida, já com a consciência e certeza constituída de que estava na profissão certa e que precisava ir além, em direção a minha identidade como sujeito parte integrante da escola, dando vida ao movimento de busca mencionado por Freire (2003). E essa busca se deu na Pós-Graduação em nível de Especialização que fiz na Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) em Administração Educacional, na cidade de Santarém (PA), localizada a 500Km da cidade onde morava em Itaituba/PA- no ano de 2003. Com o esforço em busca da formação na área de atuação posso destacar da mesma forma o desejo de buscar novos saberes através da pesquisa, como o título deste capítulo sugere “UM OLHAR NO RETROVISOR DE MINHA HISTÓRIA E O DESEJO DE APRENDER E PESQUISAR” E naquela ocasião escrevi sobre “O Currículo Escolar Numa Perspectiva Construtivista”, caracterizando um aprendizado bastante potente para minha formação, ao passo de trazer novas reflexões no âmbito do ensino no espaço escolar, visto que o currículo precisa ser percebido como algo vivo, que movimenta sujeitos e que é feito, que se manifesta a partir das relações e interesses. E como sujeito em busca de novos saberes, desde o ano de 2007 desenvolvo as minhas atribuições profissionais, seja na função de docente ou em outra voltada para o campo da educação/ensino na cidade de Goianésia do Pará, onde foi realizado nosso estudo, dando nessa perspectiva movimento de busca, de ida e vinda em busca do aprender, construindo um arcabouço teórico mais amplo a respeito da temática pesquisada. E nossa busca nesse aspecto é de compreender o movimento do ensino envolvendo uma professora atuante em turma multisseriada na Educação do Campo. Em Goianésia tenho perpassado as fronteiras da educação de Jovens e Adultos, modalidade de ensino que trabalhei de 2007 a 2014 quando aqui cheguei devido ser professor concursado para atuação nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. E de 2015 para cá, o meu contato tem sido com Séries Iniciais na escola, a destacar EMEIF Paulo Freire e foi a partir desse contato, com esses alunos de séries iniciais e, percebendo o árduo desafio de ensinar vários componentes curriculares para alunos de uma série com níveis distintos de aprendizagem e de comportamento que comecei a refletir sobre os desafios das turmas multisseriadas. 18 Eu tinha que desdobrar ações pedagógicas, metodologias para fazer acontecer o ensino na sala de aula, com o desejo de atender a todos igualmente. E ali por vezes passei a questionar: se trabalhar vários componentes curriculares para alunos de um ano é difícil, imagine numa turma multisseriada? Assim me pus a pensar, a questionar- me, a matutar, a problematizar sobre a realidade dos professores atuantes em turmas multisseriadas da Educação do Campo do município de Goianésia do Pará. E diante dessa minha inquietude então, no ano de 2019 busquei a seleção na Univates, tendo como ponto de partida de meu problema de pesquisa, o qual foi investigado no Mestrado em Ensino no ano de 2021. Também faz saber que desde 2009 muito tenho contribuído para o ensino na realidade no município local da pesquisa, na função de professor formador nos cursos de formação inicial Licenciatura Plena em Matemática (UFPA3: 2009 - 2013) e no curso de Licenciatura em Pedagogia numa instituição particular no período de 2009 a 2016, assim como em formação continuada para professores da rede municipal de ensino quando convidado pela Secretaria Municipal de Educação. Nesse contexto, é importante destacar que na função de coordenador em que sou efetivo na função de Técnico em Educação, no Colégio Estadual de Ensino Médio Profª Anunciada Chaves desde o ano de 2011, proporciono formação continuada para professores que trabalham naquela instituição de ensino estadual no município de Goianésia do Pará. Esse Colégio de Ensino Médio, representa para mim enquanto pesquisador, um espaço rico de discussão e aprendizagem no tocante ao planejamento do ensino para alunos de nível médio que o mesmo oferece a sua comunidade. E nesse espaço, em 2015, realizei uma pesquisa para obtenção do título de especialista em Gestão Escolar – EAD – pela Universidade Federal do Pará (UFPA) que investigou, "As causas da não participação efetiva dos diversos atores no desenvolvimento dos projetos planejados pela escola de maneira efetiva”. Pois por essa razão, esse colégio tem se configurado num espaço singular acerca do ensino planejado a partir das discussões e aprendizagens feitas em formação com esses professores, dadas provocações no sentido de fomentar novas metodologias de ensino nas formações, um novo olhar ao ensinar os conteúdos dos diversos componentes curriculares do Ensino Médio, buscando reconstruir o ensino a uma 3 Universidade Federal do Pará 19 nova perspectiva, de modo a atender as expectativas do alunado e comunidade local. Trazer para a prática do professor ações metodológicas que ampliam o ensino e torna as aulas mais atraentes. Inclusive com propostas já oriundas de nossa formação no programa de Mestrado em Ensino, provocadas pela disciplina Estratégias de Ensino I, realizada em janeiro de 2020. É nessa tônica que nossa caminhada segue, ao encontro de novas descobertas no âmbito do ensino. Que o professor essencialmente possa refletir a prática pedagógica no contexto da escola e utilizar mecanismos que venham favorecer o aprendizado dos alunos, no sentido de envolvê-los com os mais variados conteúdos, das diversas áreas do conhecimento, despertando o interesse deles pelo aprender, reconhecendo- os, como seres históricos, “inseridos num permanente movimento de busca, mas um ser consciente de uma finitude” (FREIRE, 2003, p. 10) É certo dizer que minha pesquisa está relacionada com minhas vivências na condição de estudante de uma escola do meio rural em turma multisseriada, pela razão de ser professor efetivo dos Anos Iniciais e Educação Infantil, com formação específica do Ensino Fundamental da rede municipal de ensino de Goianésia do Pará. Desse ponto de vista, e partindo da premissa de que só tem pesquisa se houver problema capaz de fazer fluir indagações, uma inquietação por parte de um pesquisador é que propus buscar explicação para tais indagações e assim efetivamente fazer valer o ato de pesquisar. Nessa perspectiva, expresso o pensamento que norteou a pesquisa realizada, apresentando o seguinte problema de pesquisa: Quais metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na educação do campo, em uma turma multisseriada no município de Goianésia do Pará? E com a intenção de esclarecer o que desejei alcançar com o estudo aqui proposto, elenco os seguintes objetivos: Geral: Investigar quais as metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na Educação do Campo, em uma turma Multisseriada no município de Goianésia do Pará. E os objetivos Específicos foram assim traçados: Identificar as principais dificuldades e facilidades enfrentadas pela professora atuante na turma multisseriada em relação ao ensino na sua prática pedagógica; Descrever e analisar as metodologias de Ensino utilizadas por uma professora atuante em uma turma Multisseriada na Educação do Campo, no município de Goianésia do Pará; Conhecer os programas de formação 20 continuada oferecidos aos professores que atuam em turmas Multisseriadas na Educação do Campo em Goianésia do Pará; Na perspectiva de alcançar os objetivos tratados acima para a pesquisa, apresento as questões norteadoras da mesma: Quais são as dificuldades enfrentadas por uma professora atuante em turma multisseriada em relação ao ensino na sua prática pedagógica? Que metodologias de Ensino uma professora atuante em turmas multisseriadas da educação no campo de Goianésia do Pará utiliza? Como e onde são oferecidas as formações continuadas para os professores que atuam em turmas multisseriadas na Educação do Campo em Goianésia do Pará? O que é oferecido na formação para professores da Educação do Campo que atuam em turmas multisseriadas? Após considerar as questões norteadoras acima descritas, realizei a Contextualização do tema da pesquisa. Nessa direção, a discussão que permeia o ensino em suas diversas singularidades, nos permite argumentar acerca da temática que propus escrever, por entender ser um momento de possibilidades de externar pensamentos compartilhados por autores do campo de estudo, bem como suas reflexões quanto ao ato de ensinar em turmas multisseriadas na Educação do Campo. Nesse sentido, minha escrita a princípio se sustenta em bases empíricas, a partir de nossas vivências enquanto profissional da educação da rede municipal de ensino. E a partir desse contato me permitiu buscar autores que discutem questões pertinentes ao ensino e os desafios vividos por professores atuantes em turmas multisseriadas na Educação do Campo, a destacar especialmente as metodologias por eles utilizadas em seu fazer pedagógico diário, numa comunidade do município de Goianésia do Pará. Por isso, falar do ensino multisseriado é retratar a realidade de sujeitos que vivenciam realidades no espaço rural que não condizem com o estabelecido nas leis, como por exemplo4 (BRASIL, 2013). O que temos visto no contexto ao qual imprimimos nossas ideias é a ausência de políticas públicas do poder municipal local, bem como das advindas da esfera federal já fragilizada, no sentido de não ser efetivada nos mais distantes espaços rurais do município onde foi realizada a investigação. Nesse sentido, o ensino do campo tem ficado às margens do atendimento das diretrizes estabelecidas pelos poderes constituídos. 4 LDB e PRONACAMPO – Programa Nacional de Educação do Campo. 21 A refletir nessa linha de pensamento, nossa questão fundamental diz respeito, à necessidade de tecermos questionamentos sobre certos marcos regulatórios da Educação do Campo. Falar de como o ensino na educação básica poderá se organizar e até podemos afirmar a sua simplicidade, porém na prática do ponto de vista da legislação essa efetividade não se consolida e de modo bem visível quando se trata do ensino na Educação do Campo em turmas multisseriadas. Do mesmo modo, podemos dizer sobre os Entes Federados quando se trata das responsabilidades deles quanto à universalização do acesso e permanência escolar de crianças, jovens e adultos na Educação Básica. Em relação a este tema, a Educação do Campo e o ensino em turmas multisseriadas, precisaram situar a localidade na qual o nosso estudo será concretizado. A pesquisa será efetivada numa realidade do interior do estado do Pará, no município de Goianésia do Pará, com um recorte a considerar apenas uma região do município, lócus da investigação ora proposta. A escolha do local da pesquisa, a região da comunidade Cinco Irmãos teve como critérios a distância da cidade (mediana 58.5 km aproximadamente), o contato com moradores e especialmente devido às reclamações de professores (colegas de profissão) atuantes nas turmas multisseriadas na região, por não terem formação que possibilite novas metodologias de ensino e ainda o contato com professores em formação no curso de Pedagogia devido insatisfações quanto aos desafios enfrentados por eles nas turmas onde lecionam. Essa localidade, conhecida pelo nome de Região da Cinco Irmãos/e ou Ararandeua, é formada por cinco (05) núcleos, com aproximadamente setenta famílias assentadas em cada núcleo, oriundos de várias localidades do estado do Pará. Nesses cinco (05) núcleos temos atualmente 5 (cinco) escolas que ofertam o ensino multisseriado, cada uma delas com sua singularidade, incluindo a escola polo da região, situada no núcleo dois (02). No lócus de nosso estudo, é muito comum o professor ainda trabalhar com turmas multisseriadas. E para exemplificar essa realidade vivenciada por professores da região da qual fazemos menção, trazemos um dado representativo dessa realidade. Pois num quantitativo de 35 professores daquela localidade atuantes com turmas de Anos Iniciais do Ensino Fundamental, 71.24% deles ainda trabalham com turmas 22 multisseriadas, ou seja, com alunos de Anos diferentes, ambos juntos numa mesma sala e horário, (Fonte 2021: Secretaria Municipal de Educação/ Departamento da Educação do Campo). Nesse sentido, faz saber a prática pedagógica desses professores atuantes em turmas multisseriadas do Ensino Fundamental no tocante às metodologias usadas por eles em sala de aula. E pensando nesses desafios com os quais os professores da Educação do Campo lidam diariamente, com a percepção de pesquisador, e por ter situado a localidade onde aconteceu a materialidade de nossa investigação, a seguir, apresento os argumentos fundamentais que deram sustentação às razões pelas quais a referida pesquisa merece um olhar singular na perspectiva do conhecimento científico e assim a mesma se justifica: Porque sou professor com desejo de ampliar meus saberes no campo do ensino e, tendo transitado da Educação Infantil ao Ensino Médio em escolas públicas e particulares; Por ter contribuição em cursos de formação de professores na educação básica na Amazônia paraense (Goianésia e outras); Devido ter estudado até a 4ª Série do Ensino Fundamental em turma multisseriada em uma escola do meio rural; Em razão do convívio com professores atuantes em turmas multisseriadas em comunidades do entorno da cidade de Goianésia do Pará, Amazônia, Brasil, onde foi realizada a nossa investigação; Por compreender que o estudo proposto se configura numa produção acadêmica científica de extrema relevância para a região, estado e país; Por compreender a potência da pesquisa em ensino que servirá como fonte de pesquisa para outros trabalhos nesse campo de estudo. Da mesma forma porque nessa realidade, o trabalho do professor tem sido marcado pela escassez de material didático, por um planejamento que considere a realidade do campo, pelas condições que a maioria dos alunos e professores vivenciam nesses espaços escolares; Pelo distanciamento dos gerenciadores da educação em possibilitar o debate acerca da compreensão das dificuldades e facilidades enfrentadas pelos professores de turmas multisseriadas no tocante às metodologias de ensino desenvolvidas no chão da escola em que a pesquisa poderá estreitar essa relação. 23 A pesquisa a qual realizei é potente, pela oportunidade de compartilhar conhecimento, especialmente no tocante ao ensino da Educação Básica de escolas públicas de uma realidade amazônica, com recorte sobre metodologias utilizadas por professores atuantes em turmas multisseriadas da educação do campo nas séries iniciais. Também pela possibilidade de dar visibilidade à comunidade Amazônica no aspecto da produção científica no campo de saber que ora discutimos. Portanto, é nessa perspectiva que julgamos serem questões importantes e justificáveis à escolha da temática para o presente estudo. Diante do exposto, e tendo como elemento basilar os objetivos traçados para minha investigação, apresento os capítulos com uma breve descrição trazendo uma provocação de conhecer os achados advindos do campo teórico sobre a temática, do lócus da pesquisa a considerar as sessenta (60) horas de observações de campo registradas no diário de itinerância no período de maio e junho de 2021, assim como de minhas interpretações feitas quando em contato com o objeto de pesquisa. E nesse ritmo, caminhando na direção de conhecer aquilo que ocupa toda a discussão posta na minha dissertação, apresento a mesma desdobrando o núcleo de seus seis capítulos. No capítulo 1, intitulado de “Um olhar no retrovisor de minha história e o desejo de aprender e pesquisar”, é um momento da escrita que trago um relato de momentos de minha vida e trajetória escolar, com um recorte temporal, olhando o tempo que fui morador e estudante de escola multisseriada no espaço rural. Trago ainda as informações introdutórias da pesquisa, com exposição dos elementos obrigatórios de sua composição como por exemplo: o objeto de investigação, os objetivos, as questões norteadoras do estudo, a contextualização e a delimitação do problema e os argumentos que sustentam a justificativa pela escolha da temática. O capítulo 2, com o título de “Procedimentos metodológicos da pesquisa: a trilha da caminhada”, onde descrevo os passos dados para atender cada etapa da caminhada proposta metodologicamente, estando dividido em cinco subseções dos quais: 2.1 Caracterização da pesquisa: uma abordagem qualitativa, 2.2 . Tipos de pesquisa e suas contribuições, 2.3 Lócus da pesquisa e os participantes, 2.4 Instrumentos da pesquisa, 2.5 Detalhamento das atividades e a técnica da análise de conteúdo. 24 No capítulo 3, denominado de “O ensino na Educação do Campo e a prática pedagógica de uma professora atuante numa turma multisseriada”, o mesmo manifesta questões relacionadas os desafios do ato de ensinar de uma professora que leciona numa turma multisseriada na Educação do Campo, e de como a prática dela tem sido efetivada em sala. O mesmo está organizado em três subseções sendo: 3. 1 O ensino na Educação do Campo: olhares e percepções, 3.2 A prática pedagógica de uma professora numa realidade da Educação do Campo, 3.3 O ensino multisseriado e os desafios de ensinar no campo. No capítulo 4, intitulado de “Metodologias de ensino e os desafios vividos por uma professora da Educação do Campo: retratos de uma realidade multisseriada”, em que faço a descrição e análise das metodologias de Ensino utilizadas por uma professora atuante em uma turma Multisseriada na Educação do Campo, no município de Goianésia do Pará. Este capítulo está detalhado em três subseções, sendo: 4.1 As vozes advindas do ensino na Educação do Campo, uma realidade a ser visitada, 4.2 Metodologias de ensino em turmas multisseriadas: o que dizer?, 4.3 Falando sobre o espaço escolar e o planejamento de uma professora dos Anos iniciais da Educação do Campo. O capítulo 5, cujo título é “A formação continuada para professores atuantes na Educação do Campo e as amarras de uma realidade”, e nele apresento informações e discussões a respeito dos programas de formação continuada oferecidos aos professores que atuam em turmas Multisseriadas na Educação do Campo em Goianésia do Pará. O mesmo se encontra desdobrado em três subseções, sendo as seguintes: 5.1 A realidade da Educação do Campo e a formação continuada de professores: um olhar geral a respeito dessa questão, 5.2 Formação continuada de professores, diretrizes e a proposta pedagógica para a Educação do Campo, 5.3 Formação continuada de professores e a Educação do Campo em Goianésia do Pará. No capítulo 6, intitulado de “Considerações finais”, estão postas as características principais de minha pesquisa, levando em consideração os achados da mesma, tornando assim relevante para o universo social, acadêmico e científico. Também é o espaço onde apresento as informações relacionadas aos objetivos traçados para tal e como essas questões abordadas nos capítulos dialogam com cada objetivo, bem como as respostas dadas ao objeto que ora propus a investigar. Nele ainda são colocadas reflexões importantes relacionadas ao ensino da Educação do Campo, 25 extraídas a partir do contato do pesquisador com o lócus da pesquisa, dos autores lidos e das legislações que dão sustentação à existência da Educação do Campo. Por fim, termino a escrita da dissertação com as Referências, os Apêndices e os anexos. 26 2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA: A TRILHA DA CAMINHADA Fazer pesquisa é uma manifestação subjetiva de alguém que em seu eu é tocado pelo desejo da descoberta, da explicação de um dado fenômeno e a elucidação de resposta de algumas indagações feitas por um pesquisador. A pesquisa e o desejo de compartilhar conhecimentos é marcante no pensamento de quem é incomodado por certas afirmações, que vivem a quicar em nossa cabeça provocadas por uma ou outra razão. O senso comum é um atributo a ser considerado, pois é na convivência das afirmações do cotidiano, de pessoas simples de saberes distintos que o pesquisador manifesta o desejo de conhecer o até então desconhecido, trazendo seu posicionamento assegurado nos critérios do saber científico e assim sustentando certas afirmações ou negando-as. É no embalo do conhecer, do brilho do girassol o símbolo da Educação do Campo e do florescer do conhecimento entre a professora pesquisada e o pesquisador que digo a respeito da caminhada planejada na busca de afirmações da investigação que norteou a minha pesquisa, com o apoio de autores que discutem o campo teórico metodológico da pesquisa. [...] “a pesquisa em ensino tem como foco o ensino. [...] o ensino tem sempre como objetivo a aprendizagem e, como tal, perde significado se for tratado isoladamente” (MOREIRA, 2011, p. 15). Para potencializar a afirmação de Moreira (2011), entendo que para falar de pesquisa em ensino no contexto da contemporaneidade se faz necessário algumas reflexões acerca do ato de ensinar e de aprender, ou seja, esses dois atos estão diretamente ligados à realidade da sala de aula em todo Brasil. Assim, trazer à tona uma discussão oriunda de uma pesquisa em ensino, de um programa de Pós-Graduação Stricto 27 Sensu é um compromisso do ponto de vista acadêmico e social e que tal produção percorre etapas até seu produtor dar a mesma por acabada. E é com o pensamento de produzir discussões sobre o ensino na Amazônia, com o recorte da Educação do Campo, numa realidade paraense, no Município de Goianésia do Pará, que apresento a metodologia da pesquisa nesse capítulo de minha dissertação. Aqui apresento o balizamento metodológico da pesquisa realizada e seus elementos constituintes que nos forneceu resposta com seriedade da produção desejada, ao passo de contemplar o conhecimento acadêmico produzido no universo da pesquisa em ensino. 2.1 Caracterização da pesquisa: uma abordagem qualitativa Na perspectiva do olhar metodológico da pesquisa, desdobro neste capítulo os caminhos que trilhei na busca de resposta aos meus objetivos propostos e a elucidação do problema de pesquisa, a saber: Quais metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na educação do campo, com turma multisseriada no município de Goianésia do Pará? Assim, escolhi trabalhar na perspectiva da abordagem qualitativa fundamentado em Teixeira (2011) e Moreira (2011). E a partir do olhar desses autores e focado no desejo de conhecer os pressupostos metodológicos, o estudo em questão se constituiu a partir de uma abordagem qualitativa da pesquisa, eis de considerar o pensamento de Teixeira (2011), quando fala que a pesquisa qualitativa tem sua relevância por que: [...] o pesquisador procura reduzir a distância entre a teoria e os dados, entre o contexto e a ação [...] isto é, da compreensão dos fenômenos pela sua descrição e interpretação. As experiências pessoais do pesquisador são elementos importantes na análise e compreensão dos fenômenos estudados (p. 137). Para Teixeira (2011), quando o pesquisador adere à abordagem qualitativa da pesquisa ele estabelece uma relação de compreensão daquilo que deseja clarificar, considerando a relevância dos detalhes descritivos apresentados após serem notados na realidade em questão pelo pesquisador. Isso significa dizer que o pesquisador tem o respaldo técnico científico em tecer suas considerações à luz de sua compreensão 28 como produtor de conhecimento que “mergulhou”5 num desejo de conhecer algo até então desconhecido, de buscar resposta a perguntas curiosas e provocantes. Nessa abordagem de pesquisa segundo Teixeira (2011), às experiências do pesquisador devem ter uma atenção singular quando se faz a análise e a compreensão do fenômeno pesquisado, pois essa experiência suscitada pela autora possibilita estabelecer relações com outros saberes e posterior afirmação dos achados do estudo. Ao fazer menção ao trabalho do pesquisador, a autora considera a experiência desse sujeito como sendo algo importante reconhecer nesse cenário na busca pelas explicações dos fatos perceptíveis no mundo real do estudo. Por isso, o contexto no qual o pesquisador é parte integradora, carrega consigo uma importância no sentido de estreitar as percepções minutas dos detalhes a serem escritos acerca do objeto em estudo. Ainda, na direção da importância que o pesquisador deve ter consigo quanto ao uso da abordagem qualitativa da pesquisa em ensino, Moreira (2011, p. 50 e 51) destaca: O pesquisador qualitativo também transforma dados e eventualmente faz uso de sumários, classificações e tabelas, mas a estatística que usa é predominantemente descritiva. Ele não está preocupado em fazer interferências estatísticas, seu enfoque é descritivo e interpretativo ao invés de exploratório ou preditivo. Interpretação dos dados é o aspecto crucial do domínio metodológico da pesquisa qualitativa. A escolha pela abordagem qualitativa da pesquisa, se sustenta por considerarmos a proposta quanto ao aspecto analítico mais preciso e de melhor manuseio das informações obtidas em campo. Também devido às descrições dos fatos estarem bem mais ao nosso alcance, de modo que a subjetividade esteja clarificada e a manifestação do conhecimento sobre o fenômeno por parte do pesquisador: Quais metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na Educação do Campo, em uma turma multisseriada em Goianésia do Pará?. Portanto, a pesquisa qualitativa não visa a generalização das informações, porque trabalha com um recorte de uma realidade, em que o pesquisador qualitativo tem a 5 Grifo meu 29 capacidade de modificação de dados e sua interpretação é predominantemente descritiva, considerando os significados ali perceptíveis. 2.2 Tipos de pesquisa e suas contribuições Quanto ao tipo de pesquisa foram utilizadas as opções a seguir, visando desenvolver melhor a ampliação de meu olhar sobre o fenômeno em estudo. Lancei mãos da pesquisa documental e do estudo de caso de acordo com Gil (1999) e da pesquisa de campo na perspectiva do olhar de Marconi e Lakatos (1999), da Pesquisa-Ação conforme Thiollent (2007), tendo cada autor suas contribuições ao demarcarem características específicas do objeto de investigação, que deu sentido a essa dissertação. No sentido de tornar minha pesquisa ainda mais consistente quanto sua relevância acadêmica e social, usei a pesquisa documental, pois a pesquisa aqui realizada tem em seu escrito também o desejo de compreender questões referentes aos registros legais que orientam a efetivação do trabalho da professora pesquisada. Nesse aspecto, Gil (1999, p. 66) corrobora dizendo que: A pesquisa documental assemelha-se muito com a pesquisa bibliográfica. A única diferença entre ambas está na natureza das fontes. Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa. O desenvolvimento da pesquisa documental segue os mesmos passos da pesquisa bibliográfica. Apenas há que se considerar que o primeiro passo consiste na exploração das fontes documentais, que são em grande número [...]. O uso da pesquisa documental se faz preciso, pois é uma oportunidade que a investigação tem de revelar informações importantes escritas nos conteúdos dos documentos oficiais, tanto da Secretaria Municipal de Educação, da Secretaria de Estado de Educação e/ou do Ministério da Educação, no tocante à discussão proposta na pesquisa. A saber, o que essas fontes têm a dizer sobre a Educação do Campo, até que ponto as ações pensadas, planejadas e escritas nesses documentos se 30 realizam na prática no ambiente escolar onde o ensino se efetiva no seu contexto único. E com o objetivo de capturar informações a serem obtidas conforme propõe o meu terceiro objetivo específico analisei os seguintes documentos no âmbito municipal: Proposta de ensino para a Educação do Campo nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental; Projeto que institui o Programa de formação para professores da Educação do Campo para os Anos Iniciais; Calendário escolar específico para a educação do campo; Plano de curso para a Educação do Campo Anos Iniciais; Planejamento da professora entrevistada; Plano Municipal de Educação (PME6) para ver o que tem a dizer sobre a modalidade de educação a qual foi pesquisada. Ao se tratar da esfera federal, pesquisei o que os marcos regulatórios em nível nacional da Educação do Campo tem apresentado para essa modalidade de Educação, a destacar: Resolução nº 1, de abril de 2002; Parecer CNE7/CEB8 Nº 1 de fevereiro de 2006; Resolução nº 2, de 28 de abril de 2008; Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010; PRONACAMPO 9 documento orientador e o relatório das Conferências Nacionais por uma Educação Básica do Campo, ocorridas nos anos de 1998 e 2004, respectivamente. Um olhar sobre essas fontes documentais nos possibilita o conhecimento de como a Educação do Campo tem sido desenhada ao longo dos tempos na educação brasileira, do mesmo modo como essa modalidade de educação tem se materializado em Goianésia do Pará e a partir dessas importantes informações se pensar e planejar o ensino na Educação do Campo de modo a se aproximar o quanto mais das diretrizes traçadas para a educação do campo. Nessa perspectiva, a Pesquisa Documental de acordo com Gil (1999), oportuniza conhecer dados e demais informações pertinentes que contribuíram para minha pesquisa. E foi de posse desses esclarecimentos que obtive discussão sobre a formação de professores que atuam em turmas multisseriadas na Educação do Campo e demais informações que por sua vez estão relacionadas ao estudo realizado. 6 Plano Municipal de Educação; 7 Conselho Nacional de Educação; 8 Câmara de Educação Básica; 9 Programa Nacional de Educação do Campo; 31 Ainda falando da pesquisa documental, a destacar suas características Marconi e Lakatos (1999, p. 64), afirmam que: A característica da pesquisa documental é que a fonte de coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes primárias. Estas podem ser recolhidas no momento que o fato ou fenômeno ocorre, ou depois. De acordo com as autoras, esses documentos são fontes de dados e estão restritos, podendo ser de fonte primária ou não. Os documentos os quais foram manuseados são denominados de fontes primárias, devido ainda não ter passado por nenhuma análise, e os mesmos revelaram a realidade vivida pela professora10 na escola onde leciona em sua comunidade. Na ocasião tive acesso aos termos legais, das resoluções que normatizam a modalidade de ensino na rede municipal de ensino, ao se tratar do termo educação multisseriada, bem como do uso da expressão “educação no campo ou do campo”, e de informações do ponto de vista legal e prático. Ainda de acordo com as fontes documentais do órgão gerenciador da educação municipal, Secretaria Municipal de Educação, pude atender um dos objetivos da pesquisa - Conhecer os programas de formação oferecidos aos professores que atuam em turmas Multisseriadas dos Anos Iniciais na Educação do Campo em Goianésia do Pará. Pois de acordo com Marconi e Lakatos (1999, p. 66) “Para que o investigador não se perca na “floresta” das coisas escritas deve iniciar seu estudo com a definição clara dos objetivos, para poder julgar que tipo de documentação será adequada às suas finalidades”. Os documentos os quais são todos relacionados à modalidade de Educação do Campo e a partir de minha leitura sobre eles, certamente meu leque de saber se ampliou e se solidificou frente a produção de conhecimento na área. E com o desejo de melhor compreender o fenômeno pesquisado, fiz uso da Pesquisa de Campo, por entender sua validade ao se tratar da possibilidade do maior contato do pesquisador com o problema de pesquisa, da possibilidade de maior proximidade de onde tal problema se manifesta efetivamente. Com a intenção de consolidar a 10 Utilizarei a palavra professora devido ser somente professoras que atuam nas escolas da região a ser pesquisada em turmas multisseriadas, conforme informação da Secretaria municipal de Educação em 2019. 32 importância da pesquisa de campo para o estudo proposto, as autoras citadas, salientam que: A pesquisa de campo é aquela utilizada com o objetivo de conseguir informações e/ou conhecimentos acerca de um problema para o qual se procura uma resposta, ou de uma hipótese que se queira comprovar, ou, ainda, descobrir novos fenômenos ou as relações entre eles. Consiste na observação de fatos e fenômenos tal como ocorrem espontaneamente, na coleta de dados a eles referentes e no registro de variáveis que se presume relevantes, para analisá-los (MARCONI; LAKATOS. 1999, p. 85). No mesmo passo de entendimento que Marconi e Lakatos (1999), tive a oportunidade de estreitar a relação com o fenômeno pesquisado, tendo como fio condutor o referencial teórico condizente com o conteúdo do estudo. A pesquisa de campo é o espaço que se tem a constatação ou não do objeto de investigação, é nele que o pesquisador entrelaça os elementos teóricos com os elementos práticos da realidade vivida pelos sujeitos investigados. É no campo em contato com a realidade que se institui o contato com o fato real pesquisado e observado pelo pesquisador que temos a oportunidade de minuciosamente fazer as descrições dos detalhes ali percebidos a caracterizar uma descoberta ou provocação de uma nova indagação. De acordo com Gil (1999. p.72), “o estudo de campo tende a utilizar muito mais técnicas de observação do que de interrogação”. Ainda falando sobre o tipo de pesquisa usado nesse estudo, fiz uma aproximação com o Estudo de Caso, com o desejo de compreender com maior profundidade o objeto ora investigado, presente no contexto de uma sala da aula da Educação do Campo numa turma de alunos marcados por uma característica específica, uma turma multisseriada e com o desejo de identificar as metodologias de ensino usadas por uma professora atuante nessa realidade de ensino. Frente essa realidade Gil (1999, p. 72- 73), afirma que: “O estudo de caso é caracterizado pelo estudo profundo e exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira a permitir o seu conhecimento amplo e detalhado tarefa praticamente impossível mediante os outros tipos de delineamentos considerados”. 33 Postos os argumentos de Gil (1999) no estudo de caso, se faz necessário ampliar e detalhar o objeto a ser estudado. Esse tipo de estudo busca investigar um fenômeno dentro de seu contexto onde o pesquisador deve usar várias fontes de evidências. Nesse aspecto, a curiosidade não ocupa lugar de destaque de modo a prender a atenção do pesquisador, que informações desnecessárias a fazer questionamento sobre essa ou aquela situação da realidade a qual está sendo pesquisada. Assim a pesquisa de campo carrega consigo seus atributos favoráveis para uma investigação capaz de evidenciar as questões que ora desejo compreender. Foi o momento de conhecer o campo, devido ser lá que o problema se manifesta, se materializa, cabendo ao pesquisador conhecê-lo, e, portanto, ter a resposta de sua pergunta sobre o problema ora investigado. Ainda sobre o tipo de pesquisa usado na pesquisa, busquei apoio no sentido de uma aproximação também com a Pesquisa-Ação apresentada por Thollent (2007). Pois nessa proposta devo estabelecer um vínculo ativo construído na interação com os participantes da realidade a ser investigada. E, portanto, será uma aproximação dessa metodologia de estudo devida não se seguir em sua completude os seus pressupostos. Nesse sentido Thiollent (2011, p. 20) destaca: [...] a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação e do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. Nessa direção é importante saber que ao longo da pesquisa-ação tive a oportunidade de registrar e conhecer o problema a partir de minha observação dada ali com os participantes, especialmente com a professora pesquisada. A pesquisa-ação busca conhecer melhor esse problema numa realidade coletiva e assim criar mecanismo capaz de conhecer a prática da professora, conversando com ela, observando-a, propondo sugestão, interagindo com a professora e os alunos no espaço onde a pesquisa foi realizada. A imagem que segue diz respeito a um momento de interação entre pesquisador e professora pesquisada na elaboração de jogos de leitura de Língua Portuguesa. 34 Imagem 1: Professora com o pesquisador com os jogos de Língua Portuguesa confeccionadas em sala Fonte: Pesquisador (2021) Na pesquisa-Ação, o pesquisador e os participantes do estudo na pesquisa-ação têm uma relação de proximidade, estão naquele contexto envolvido onde suas relações acontecem de modo colaborativo, onde o pesquisador apresenta uma participação efetiva em busca da solução do problema. Pois Thiollent (2011), afirma que: (...) a pesquisa-ação pode ser vista como modo de conceber e de organizar uma pesquisa social de finalidade práticas e que esteja de acordo com as exigências próprias da ação e da participação dos atores da situação observada (p. 32) O pesquisador nesse momento da pesquisa em contato com o campo estabelece uma relação bastante singular e específica na pesquisa, o de observação da realidade sem se deixar levar pelas emoções, mesmo tendo uma relação de estreita confiança com os sujeitos a serem pesquisados, nesse caso uma professora atuante numa turma multisseriada na Educação do Campo e seus alunos. Foi um momento em que a questão ética/profissional teve de prevalecer e a realidade ter a devida atenção. Foi um momento exploratório no sentido de conhecer o problema a ser investigado, manuseando documentos, planejamento e plano de aula da professora, objetos didáticos, observando a realidade, assim como algumas imagens da escola, pátio, dos arredores, trechos do caminho percorrido pelos alunos e a professora para ter acesso à escola. 35 2.3 Lócus da pesquisa e os participantes Imagem 2: Mapa da Região da Cinco Irmãos Fonte: Departamento de Terras/ Prefeitura Municipal de Goianésia do Pará (2020) Com o objetivo de ilustrar visualmente melhor o lócus da pesquisa trouxe esse mapa feito por satélite pelo Departamento de Terras da prefeitura de Goianésia do Pará, e assim termos uma visão melhor como a região está organizada em cinco núcleos, que no mapa está marcado com N01, N02, N03, N04 e N05 e por onde se tem o acesso, através da ROD PA 150 e Vicinal 05 Irmãos. O lócus da pesquisa foi uma escola da rede Municipal de Ensino Fundamental, localizada no município de Goianésia do Pará, que oferece a Modalidade Educação do Campo em turma multisseriada, com jurisdição da Secretaria Municipal de Educação instituição a qual tive a autorização para a realização da pesquisa (APÊNDICE A). A imagem três apresenta uma visão geral da frente da escola onde a pesquisa foi realizada. 36 Imagem 3: Escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental Santa Cecília Fonte: Pesquisador (2020) A escola pesquisada está localizada no espaço rural, numa comunidade chamada “Cinco Irmãos”11 a uma distância de aproximadamente 55 quilômetros da sede da cidade de Goianésia do Pará (ver o mapa, na imagem 02). Vale lembrar que essa região é formada por 5 núcleos de famílias assentadas, onde cada núcleo tem aproximadamente 70 famílias, acrescida de mais 2 comunidade que fazem parte dessa região, a região da Alfaia e Vila Ipiranga. Esses núcleos são realidades singulares da Amazônia paraense, região sudeste do Pará e se constituem em realidades onde a figura do professor tem enfrentado grandes desafios no tocante à apropriação de metodologias de ensino oriunda de formação continuada para atuação em turmas multisseriadas nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Essa singularidade é vivenciada pelos sujeitos que residem em cada núcleo, que por sua vez tem uma escola com uma sala de aula que oferece a Educação do Campo no formato multisseriado em um turno, quando não em dois turnos um pela manhã ou tarde e noite com a modalidade EJA - Educação de Jovens e Adultos. A imagem (04) apresenta a sala de aula em dois focos, um voltado um quadro um (01) fixado no fundo da parede e outro focado no quadro dois (02) fixado na parede da frente da sala, onde a professora pesquisada realiza suas atividades docentes cotidianamente. 11 De acordo com relatos da comunidade esse nome se deve em homenagem aos 5 irmãos que doaram o lote para ser divido entre as famílias assentadas daquela região; 37 Imagem 4: Sala de aula da EMEIF Santa Cecília Fonte: Pesquisador (2020) A escola escolhida para minha investigação foi a escola Municipal de Ensino Infantil e Fundamental Santa Cecília, situado no núcleo 03 da região da “Cinco Irmãos” ou PA12 Ararandeua13, como também é conhecida. Essa escolha foi marcada em razão do trabalho diferenciado apresentado pela escola, pois segundo relatos de moradores da comunidade e de funcionários do Departamento da Educação do Campo da Secretaria Municipal de Ensino, a escola tem se destacado em comparação com as outras da região. Tive a oportunidade de enxergar com maior proximidade a realidade do ato de ensinar dessa professora atuante numa turma multisseriada e a partir de meu estudo compartilhar suas metodologias de ensino ali colocadas em prática de maneira a garantir o aprendizado de seu alunado. Tive a circunstância oportuna de mostrar o protagonismo de uma profissional da Educação do Campo, de como são tantos os desafios para ensinar, de registrar o trabalho tão árduo e muitas vezes esquecido, porém importante para sua comunidade. Protagonismo que precisa ser visto e conhecido no universo da academia e então servir de apoio a outras escolas de realidades que ainda vivem nos moldes do ensino multisseriado. Sobre os participantes da investigação foi uma professora negra, residente num assentamento há mais de 12 anos, mãe de 8 filhos e atualmente leciona na escola acima destacada a qual já foi comunicada sobre minha pesquisa envolvendo-a, e tendo a mesma assinado o TCLE14 (APÊNDICE B). Antes de se tornar professora 12 Projeto de Assentamento 13 É o nome do rio que passa na região e nele os moradores pescam peixes para sua alimentação 14 Termo Consentimento Livre e Esclarecido; 38 trabalhou por 10 anos como servente na mesma escola e somente no ano de 2019 após concluir o Ensino Médio na modalidade Normal e ingressar no Ensino superior em pedagogia assumiu a sala de aula, uma turma multisseriada. A professora no ano de 2021 foi lotada com uma turma multisseriada na EMEIF Santa Cecília, turma esta composta de alunos de quatro níveis de ensino diferentes, pré-escola, alunos com quatro e cinco anos de idade na Educação Infantil e alunos de 1º e 2º ano dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. A professora é residente na mesma comunidade onde a escola é localizada, no núcleo 03, ela tem apresentado um trabalho diferenciado na sala de aula com seus alunos em relação sua proposta de ensino e também apresenta uma relação muito forte de envolvimento com a comunidade, conseguindo, desse modo, o respeito profissional e destaque diante de sua comunidade. A imagem a seguir foi registrada em um dos caminhos que dão acesso à escola no dia em que fui visitar a comunidade e entregar e receber atividades do segundo bimestre dos alunos. Imagem 5: Eu e a professora em um dos caminhos que dão acesso à escola Santa Cecília Fonte: Pesquisador (2021) No tempo que estive com a professora, juntos realizamos visitas nas casas dos alunos dela para receber ou entregar atividades a eles e conversar com os pais e/ou responsáveis a respeito do desempenho escolar deles. A imagem acima traduz a realidade de um dos caminhos de acesso que alunos e comunidade têm para chegar até a escola. Vale ressaltar que embora o foco de minha pesquisa não tenha sido as crianças, alunos dessa professora, os familiares foram convidados a assinarem o TCLE 39 (Apêndice C) autorizando a participação das crianças assim como o uso da imagem das crianças, sendo elas também convidadas para participarem concedendo sua autorização. Essa autorização foi obtida mediante conversas e, também, diante de manifestações das crianças em sala frente a confiança que a me foi concedida por elas. Confiança manifestada pelas crianças, quando solicitaram ajuda para resolução de atividades em alguma disciplina proposta pela professora, de pesquisa em livros ou em outras fontes, na organização da sala de aula ou em atividade proposta pela professora, a ser feita em sala de aula, por solicitação de uso de algum objeto meu (lápis, caneta, lápis de cor, borracha, apontador) ou em outras ações desenvolvidas no contexto da escola lócus da pesquisa. E a minha escolha já clara anteriormente em pesquisar a Educação do Campo no âmbito do ensino multisseriado, se deve em decorrência de minha proximidade com esse universo da Educação do Campo, e porque também sou professor efetivo dos Anos Iniciais com longa experiência em turma seriada. E na ocasião tenho que trabalhar todos os componentes curriculares, por exemplo, matemática, língua portuguesa, história, geografia e outras. Esse trabalho requer o domínio de várias áreas do conhecimento e não é fácil trabalhar com tantos componentes curriculares e isso tem sido uma inquietação minha. Inquietação em querer conhecer as metodologias utilizadas assim como uma professora consegue desenvolver suas metodologias de ensino em sala de aula, numa turma multisseriada. Realidade vivida por essa professora, entendo que desenvolver o ensino numa turma com uma série não é fácil, imagine numa turma com diferentes níveis de aprendizagens em um turno só, tendo a professora que lecionar todos os componentes curriculares. Nesse sentido, refletir sobre as metodologias de ensino usadas por essa professora atuante em turma multisseriada na Educação do Campo se configura num importante fenômeno, que tem muito a ser conhecido em nossa realidade, por isso a pesquisa me possibilitou fazer uma reflexão quanto ao ato de ensinar, tendo como fator balizador as metodologias de ensino utilizadas por uma professora em suas práticas diárias que a cada dia realiza com compromisso e afinco seu ofício de educar, crianças, jovens e adultos em escolas com turmas multisseriadas Brasil a fora. 40 2.4 Instrumentos da pesquisa A busca do conhecimento que confere significado a pesquisa que ora realizei contou com instrumentos indispensáveis para a chegada dos resultados alcançados. Para tanto, destaco o uso de instrumentos da pesquisa científica, a considerar o pensamento de autores como: Marconi; Lakatos (1999); Gil (1999), Bardin (1977) e outros que convido a conhecer mais a frente dessa minha escrita. Em relação aos instrumentos de pesquisa, fiz uso no período ao longo da pesquisa de campo da observação participante, da entrevista semiestruturada, da fotografia e do diário de itinerância que serviram como instrumentos de coleta de dados cuja intenção foi capturar as devidas informações que precisei acerca do problema de estudo proposto. A observação participante de acordo com o pensamento de Marconi; Lakatos, (1999), a entrevista semiestruturada a contento com a fala dos autores Ludke; André (2012). Para Marconi e Lakatos (1999): A observação é uma técnica de coleta de dados para conseguir e utilizar os sentidos na obtenção de determinados aspectos da realidade. Não consistem em apenas ver e ouvir, mas também em examinar fatos ou fenômenos que se deseja estudar. (p. 90) Ainda com base no pensamento das autoras acima proferidas, a técnica da observação me auxiliou na coleta de informações sine qua non a partir da realidade vivida pelos sujeitos investigados. Uma vez que para Marconi e Lakatos (1999), a observação ajuda o pesquisador obter informação inerente à realidade onde o fenômeno se faz presente. A observação por ser uma técnica da coleta de dados (MARCONI; LAKATOS, 1999, p. 90), apresentam vantagens importantes a serem destacadas, a citar algumas: Possibilita meios diretos e satisfatórios para estudar uma ampla variedade de fenômeno; b. Exige menos do observador do que as outras técnicas; c. Permite a coleta de dados sobre um conjunto de atitudes comportamentais típicos; d. Depende menos da introspecção ou da reflexão; e. Permite a evidência de dado não constantes do roteiro de entrevistas ou de questionários. 41 No tocante ao tipo de observação, optei pela observação participante, pois a luz do pensar de Marconi e Lakatos (1999, p. 92) “Consiste na participação do pesquisador com a comunidade ou grupo. Ele se incorpora ao grupo, confunde-se com ele. Fica tão próximo quanto um membro do grupo que está estudando e participa das atividades normais deste”. E ao definir a escolha do instrumento, nesse caso, a observação participante significa dizer do meu compromisso com a produção científica, pois se trata de um estudo relevante para minha região tendo sido planejado em consonância com os objetivos traçados. Durante o percurso da pesquisa estabeleci contato com a professora pesquisada e seus alunos e, nesse tempo, me envolvi com ela e alguns alunos na construção de jogos de leitura por dois dias juntos na sala de aula, caracterizando, portanto como bem aponta Marconi e Lakatos (1999) a pesquisa participante. Imagem 6: Jogos de leitura confeccionados pela professora, alunos e eu em sala Fonte: Pesquisador (2021) Em relação ao período de observação participante no campo, foi realizada nos meses de maio e junho de 2021 perfazendo uma carga horária de 60 horas. No mês de maio foi realizado um quantitativo de 48 horas estando dividida em 6 dias, oito horas por dia. E no mês de junho foram dois encontros, um de oito horas e outro de quatro horas. Faz saber que a observação obedeceu a um cronograma estabelecido pela escola polo da região, a qual está situada no núcleo 02 e a escola pesquisada localizada no núcleo 03 (ver imagem 3), em virtude de as aulas estarem acontecendo por meio de 42 grupo de WhatsApp e com orientações presenciais das atividades dos cadernos pedagógicos, em que cada professor destinasse um tempo para auxiliar seus alunos de modo a respeitar os protocolos sanitários, em razão da Covid-19 na escola. Na realidade pesquisada a professora escolheu o dia de segunda-feira para ficar na escola os dois horários e atender seus alunos, dando-lhes as devidas orientações quando solicitadas pelas crianças que vinham à escola acompanhadas pelos responsáveis. Na ocasião traziam as atividades respondidas, pediam orientação para a professora e levava as atividades do caderno seguindo, quando era o caso. E no período da manhã e tarde eu ficava junto com ela e os alunos, sempre em número reduzido e seguindo as orientações de segurança em saúde. Nesse período de observação participante que fiquei no campo, tive o contato direto com o objeto de investigação, vivi a experiência de trabalhar com alunos de turma multisseriada juntamente com a professora pesquisada e seus alunos, mesmo com a participação deles ordenados em grupos menores. Essas observações ocorreram em diferentes momentos da rotina desses alunos em sala de aula, onde eu pude conhecer de que modo as metodologias de ensino da professora se apresentam quando ela realiza sua prática na escola. Após o meu contato com o cotidiano pesquisado, eu percebi algum estranhamento por parte dos alunos, pois os mesmos se sentiram envergonhados, ficaram por um período tímidos, tendo a professora e eu que explicar a razão de minha presença na sala junto com todos. E em pouco tempo já conseguia conversar e até mesmo ajudá- los na resolução de atividades. Com a intenção de evidenciar os objetivos de minha pesquisa, as observações seguiram um roteiro previamente organizado e foram realizadas no final de abril e início de junho (APÊNDICE D), e posteriormente os registros advindos dos roteiros das observações foram devidamente analisados obedecendo um diálogo com os marcos teóricos do campo de estudo. Quanto à escolha de outro instrumento de coleta de dados que usei, foi a entrevista semiestruturada, porque ela “se desenrola a partir de um esquema básico, porém não aplicado rigidamente que o entrevistador faça as necessárias adaptações” conforme argumenta (LUDKE; ANDRÉ, 2012, 34). De acordo com as autoras, o pesquisador ao 43 realizar a entrevista com o pesquisado pode inserir em seu esquema de perguntas, novas informações que achar relevante no momento da conversa, sem preocupação de uma rigidez em seu roteiro de perguntas. Para Marconi e Lakatos (1999, p. 94). “A entrevista é um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de um determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional”. Na pesquisa fiz uso da entrevista do tipo semi estruturada em dois momentos. A primeira entrevista foi feita no final do mês de abril de 2021 e a segunda entrevista no início do mesmo de junho do mesmo ano (APÊNDICES E e F). Cada entrevista com a professora, foi realizada na própria escola sempre após a aula respeitando sua disponibilidade. E, essa sugestão, quanto ao horário das duas entrevistas, a professora foi previamente informada, porque no momento da entrevista se faz necessário um ambiente sem ruídos de modo que a gravação não seja prejudicada na sua qualidade e também, para que não ocorra intervenções no momento que estiver acontecendo a entrevista. As entrevistas aconteceram na escola por ser merecido entender que é um espaço onde a professora tem uma familiaridade de maior frequência com as questões educativas e ali ela pode ficar mais à vontade para falar de seu trabalho, falar de uma realidade a qual tem domínio. As duas entrevistas foram gravadas no meu celular, transcritas e analisadas. E nessa perspectiva, a coleta das informações obtidas no lócus da pesquisa, penso que na condição de pesquisador tenho a responsabilidade de fazer uso de tais informações com intenção apenas de caráter científico, de modo que “Não dar mais para ignorar atitudes éticas e sociais” (TEIXEIRA, 2011, p. 157). O pesquisador deve reconhecer, por exemplo, os espaços que usam para realização de seus estudos como um local de identidade, como um território que a partir dele se produz conhecimento, onde essa identidade deve ser respeitada na sua singularidade. Devendo obedecer ao princípio ético profissional. Pensando assim, Teixeira (2011, p. 157), ressalta o seguinte: Não dá mais para entrar e sair de escolas, salas de aula e residências sem explicar nossos objetivos, intenções e métodos de pesquisa bem como sem 44 contribuir com aqueles que participam dando informações, às vezes pessoais, às vezes profissionais, para que possamos concluir nosso estudo. Todos os pesquisadores devem estar alerta sobre essas questões. De acordo com Teixeira (2011), o pesquisador é responsável de uma atribuição sine qua non, a produção do saber sistemático, devendo esse saber ser compartilhado nos espaços utilizados como fonte de investigação, a destacar as escolas por fornecerem relevantes informações, devendo a preocupação ética do pesquisador ser respeitada em toda a trajetória da produção acadêmica. E, ainda, no campo em contato com os participantes da pesquisa, fiz uso de registros fotográficos que, de acordo com (MARCONI; LAKATOS, p. 72), “Fotografias – [...] referem-se a um passado menos distante”. A escolha por fotografias tem o objetivo de fazer o registro da realidade envolvendo as ações desenvolvidas no período de observação, bem como no momento de análise dos registros, caso necessário retomo as imagens com o desejo de captar informações importantes que de repente passaram despercebidas. E nessa perspectiva, o uso da fotografia segundo (ACHUTTI, 2004, p. 111) é importante para: [...] recolher pequenas porções do reflexo da realidade, é aprisionar a luz do instante presente para fixar breves fragmentos do passado. A fotografia é uma operação exercida sobre o passado ou sobre um presente recente. O futuro não lhe diz respeito. [...] é um ato intencional determinado pelo ponto de vista particular daquele que olha e adota uma certa posição frente à realidade. Uma fotografia é a materialização de um olhar, é o discurso de um olhar. E a luz do pensamento de Achutti (2004) e também no sentido de trazer novos olhares, porções da realidade a qual conheci, selecionei imagens para ilustrar o texto de minha dissertação, pondo em evidência o trabalho de uma professora atuante no ensino do campo numa turma multisseriada em Goianésia do Pará, bem como de outros elementos que fizeram a composição da investigação. É importante destacar que as observações e demais anotações no decorrer da pesquisa foram registradas por meio de um diário de itinerância. Pois segundo (BARBIER, 2007, p. 133 – 134 apud SILVA, 2011, p. 39) o diário de Itinerância é um instrumento metodológico específico da pesquisa- ação. Ele toma emprestado ao diário íntimo seu caráter relativamente singular e privado. Nele registram-se pensamentos, sentimentos, desejos, sonhos muito secretos. 45 Nele ficou contido as minhas anotações, as manifestações pertinentes ao meu problema de pesquisa vivenciadas juntamente com a professora e os alunos na realidade que fomos parte integrante. Nesse diário registrei como os sujeitos se manifestam na realidade vivida por eles em seu cotidiano, quais as metodologias de ensino a professora faz uso em sua prática pedagógica ao trabalhar com diferentes Anos e componentes curriculares na mesma turma? Como as atividades do dia a dia da turma se desenvolvem? O que é prioridade dessa professora junto da turma no tocante ao ensino? Se é ensinar a ler ou escrever? Como tem sido o planejamento da professora? E que metodologia utiliza, por exemplo, dentre outras anotações. Nesse diário se faz preciso anotar informações que foram responder os objetivos específicos da pesquisa, a saber: Identificar as principais dificuldades enfrentadas pela professora atuante numa turma multisseriada em relação a sua prática pedagógica e descrever as metodologias de Ensino utilizadas pela professora da turma Multisseriada da educação no campo de Goianésia do Pará e, nesse sentido, teremos uma visão ampliada do percurso investigativo, possibilitando reflexões sobre as informações da pesquisa. 2.5 Detalhamento das Atividades e a Técnica da Análise de Conteúdo E, para a análise dos dados, foi realizada uma aproximação com a técnica da Análise de Conteúdo, proposta por Bardin (1977), por se tratar de uma técnica bastante utilizada no meio acadêmico, com a perspectiva de analisar as comunicações ao ponto de compreender o sentido demonstrado na fala dos sujeitos que compõem a investigação. Em relação a essa questão Bardin (1977, p. 38) faz a seguinte afirmativa: [...] análise de conteúdo aparece como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das mensagens. [...] A intenção da análise de conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção [...]. 46 Na busca de compreender o fenômeno a ser investigado tendo como técnica a Análise de Conteúdo, apontada por Bardin (1977), o olhar de pesquisador deve ser uma olhar direcionado às diferentes comunicações possíveis captadas das informações advindas das observações e do campo, o contexto da pesquisa das entrevistas, acerca do objeto de estudo. Dali então, precisamos retirar informações contidas nas falas dos sujeitos aos quais estamos pesquisando, e então realizar análise dessas informações de modo a validar ou refutar os objetivos elaborados para a pesquisa. E nessa perspectiva e com o desejo de fazer a análise das informações capturadas em campo ao longo da pesquisa, escolhi realizar uma aproximação com a Técnica da Análise de Conteúdos, a luz do pensamento de Bardin (1977). A análise de conteúdo atua sobre a fala e “procura conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre as quais se debruça [...] a análise de conteúdo é uma busca de outra realidade através das mensagens” (BARDIN, 1977, p. 44). No primeiro momento, dei o devido tratamento à etapa da “pré-análise”, que conforme Bardin (1977, p. 96), “A pré-análise tem por objectivo a organização, embora ela própria seja composta por actividades não estruturadas, abertas, por oposição à exploração sistemática dos documentos”, constituindo portanto, o “corpus”. Tive o cuidado de reunir diferentes elementos que subsidiaram a pesquisa como: as entrevistas, registros de observação participante e documentos os quais foram analisados. E ainda nessa fase da pesquisa realizei uma “leitura flutuante”, e organização do material a ser analisado, pois para Bardin (1977, p. 96), “A leitura flutuante [...] consiste em estabelecer contato com os documentos a analisar e em conhecer o texto deixando-se invadir por impressões e orientações”. No segundo momento, me debrucei na fase de “exploração do material”, a qual conforme aponta Bardin (1977, p. 101), “Esta fase, longa e fastidiosa, consiste essencialmente de operações de codificações, desconto ou enumeração, em função de regras previamente formuladas”. Foi o momento de codificação e categorização dos dados obtidos na pesquisa. Nessa fase, desenvolvi a codificação como uma unidade de registro identificada por verbos ou temática, por exemplo, conforme escolha do pesquisador, com ainda a criação de cores e códigos para identificação das categorias analisadas. Seguindo assim, foi feita a codificação de registro por tema 47 do tipo: prática pedagógica, discutida no capítulo três, metodologia de ensino no capítulo 4 e formação de professores no capítulo cinco da dissertação em tela. As duas entrevistas eu agrupei em três temas conforme já anunciados anteriormente, com o objetivo de direcionar e melhorar a qualidade da discussão da temática posta em cada um dos três capítulos. Na terceira fase da análise da pesquisa “tratamento dos resultados obtidos e interpretação”, busquei apoio no pensamento de Bardin (1977, p. 101), ao indicar que nessa fase “Os resultados brutos são tratados de maneira a serem significativos (falantes) e válidos”. Foi nesse momento que precisei realizar a organização dos elementos da etapa anterior, e em seguida fazer uso de inferência no ato da interpretação dos dados, dialogando com as dimensões teóricas e, sobretudo devendo estabelecer uma conexão com o problema de pesquisa e os objetivos propostos ou ainda por encontrar novos achados surgidos no desenrolar da pesquisa. Por fim, diante do exposto neste capítulo, detalhar os caminhos de minha pesquisa pressupõe entender que nessa caminhada planejada pude melhor lidar com o ato da descoberta. Construí e ampliei uma relação com o campo do saber, de modo a entender que fazer pesquisa envolve sujeitos, dedicação, ética e estes merecem toda nossa atenção e respeito no sentido de manter o sigilo de informações que não dizem respeito ao interesse da pesquisa da produção científica. A pesquisa requer do pesquisador a obrigação de adotar uma postura ética em todas as etapas da pesquisa, antes, durante e depois, sem perder de vista ao final das análises a resposta para elucidar ou não o problema de investigação em discussão. 48 3 O ENSINO NA EDUCAÇÃO DO CAMPO E A PRÁTICA PEDAGÓGICA DE UMA PROFESSORA ATUANTE NUMA TURMA MULTISSERIADA Entendo a prática pedagógica como uma prática social orientada por objetivos, finalidades e conhecimentos, e inserida no contexto da prática social. A prática pedagógica é uma dimensão da prática social que pressupõe a relação teoria-prática, e é essencialmente nosso dever, como educadores, a busca de condições necessárias à sua realização (Veiga, 1992, p. 16) O presente capítulo apresenta os achados da pesquisa que estão relacionados ao primeiro objetivo específico que por sua vez buscou identificar as principais dificuldades enfrentadas pela professora atuante na turma multisseriada em relação ao ensino, na sua prática pedagógica. Como bem salienta Veiga (1992) a prática pedagógica é uma manifestação da prática docente e nesse aspecto a investigação tem em seu alicerce a discussão da prática pedagógica, que ora permeia na Educação do Campo fazendo um recorte sobre as metodologias de ensino de uma professora atuante numa turma multisseriada numa comunidade conhecida por “PA15 ou Região da Cinco Irmãos” localizada no interior do município de Goianésia do Pará, no estado do Pará. Também apresento elementos que marcam os desafios e os pontos positivos destacados pela professora pesquisada ao colocar em ação sua prática em sala de aula na comunidade onde reside. A escrita se consolida como uma construção pautada no diálogo a partir das informações capturadas no campo por meio das observações e anotações realizadas no diário de itinerância do pesquisador, das 15 Projeto de Assentamento 49 entrevistas realizadas com uma professora a qual foi o sujeito pesquisado ao longo do período planejado para a realização do estudo. Os autores que deram embasamento teórico metodológico das questões apontadas sobre a temática em discussão, assim como o que a professora diz, da mesma forma as anotações feitas no diário de Itinerância deram sentidos científicos à pesquisa que ora falo sobre tal. Nesse sentido faço a triangulação das informações com o objetivo de dar a robustez nos resultados alcançados neste capítulo e nos dois próximos, como bem destaca Moreira (2011, p.105): A triangulação pode envolver o uso de diferentes fontes de dados, diferentes perspectivas ou teorias, diferentes pesquisadores ou diferentes métodos; é uma resposta holística à questão da fidedignidade e da validade dos estudos interpretativos. De acordo com Moreira (2011) as informações as quais são postas na minha escrita advêm de um olhar amplo sobre o objeto de investigação “Quais metodologias de ensino são utilizadas por uma professora atuante na educação do campo, em uma turma multisseriada no município de Goianésia do Pará?”. A triangulação das fontes que me apropriei me permitiu visualizar e registrar a belezura do trabalho realizado por uma professora com experiência em turma multisseriada. O contato com o lócus da pesquisa me possibilitou além de refletir sobre os desafios ao trabalhar no campo com alunos de faixas etárias diferentes, trazer achados importantes para pensarmos a modalidade de ensino e chamar a atenção para ampliação do debate. Pude me apropriar de diferentes olhares a respeito do objeto investigado, tive a oportunidade de conhecer os desafios vividos pela professora investigada, o que me fez pensar e repensar o ensino na Educação do Campo após vivenciar a realidade de uma escola do campo, de modo a considerar as reflexões feitas a partir das informações vindas do campo onde efetivamente aconteceu o estudo. Neste Capítulo, assim como nos demais que dão formato a esta dissertação, trago ao conhecimento do leitor reflexões e outros pensamentos a respeito da Educação do Campo. O trabalho no geral busca no seu bojo novas reflexões sobre o cotidiano dos povos campesinos e de suas riquezas e grandezas feitas na realidade de sua existência, 50 assim como a flor do girassol tem na sua solidez a busca pelo brilho do sol e a boa colheita na existência da vida no campo. Nessa perspectiva, as discussões apresentadas são sustentadas nas contribuições teóricas de autores como: Hage (2005; 2010); Pires (2012); Fighera (2018) entre outros que dialogam com a educação do campo, além de Veiga (1992); Alarcão (2011); Zabala (1998) que serviram de base para construção do debate pertinente à prática pedagógica manifestada no cotidiano da professora pesquisada como uma ação social presente no fazer pedagógico e as impressões que marcam o pensamento acerca do ser professor reflexivo. Questões que estão relacionadas ao objetivo que deu origem a este capítulo, que por sua vez, é desdobrado em três subitens: Educação do Campo: olhares e percepções; A prática pedagógica de uma professora numa realidade da educação do campo; O ensino multisseriado e os desafios de ensinar no campo. Assim convido você a fazer toda a leitura para melhor conhecer as discussões que dão significados a este capítulo da dissertação. 3.1 O ensino na Educação do Campo: olhares e percepções O girassol é o atual símbolo do movimento da Educação do Campo e foi escolhido pois o sol é o grande orientador do trabalho e cotidiano, como também dos saberes e conhecimentos do camponês em sua realidade no campo. Enraizada no solo fértil e vivaz, a flor do girassol representa a metáfora da colheita (...). Apresenta-nos o olhar e perfil da escola do campo, que “colhe a luz” na sua experiência do processo de ensino e aprendizagem de seus alunos e na valorização dos saberes que residem e se expressam do e no campo (GONDIM, 2016, p. 10 e 11) . Guiado pelo brilho do girassol, pelo desejo de querer conhecer, inspirado nas palavras expressadas Gondim (2016) em respeito e valorização dos saberes dos sujeitos que compõem a Educação do Campo, apresento a seguir, as percepções que tenho quanto ao conceito de Educação do Campo. Educação da qual precisa ser compreendida como uma modalidade 16 de ensino ofertada em escolas que atualmente ainda oferecem o ensino na modalidade multisseriada. Hage (2005), nos 16 No ano de 2010 com a homologação das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (Resolução nº 04/2010/CEB/CNE) a Educação do Campo passa ser reconhecida como modalidade de ensino. 51 provoca a pensar a Educação do Campo, de modo a enxergar como o ensino em escolas multisseriadas nesses espaços têm se manifestado. Isso se deve em razão de o referido autor ter uma vasta contribuição científica sobre a temática no estado do Pará. Nessa direção, nos interessa particularmente compreender como o ensino e a Educação do Campo tem sido notado na realidade pesquisada. Pois a partir de um dos dispositivos legais (o Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010), cabe esclarecer que a expressão, a ser utilizada ao longo deste texto será Educação do Campo17 e não Educação no Campo ou Educação Rural. Também é importante saber para quais cidadãos essa modalidade de educação se destina especialmente, no seu aspecto mais específico. Sendo assim, para os efeitos do decreto nº 7.352 de 2010 Art. 1º a Educação do Campo deve atender: I – população do campo: os agricultores familiares, os extrativistas, os pescadores artesanais, os ribeirinhos, os assentados e acampados da reforma agrária, os trabalhadores assalariados rurais, os quilombolas, os caiçaras, os povos da floresta, os caboclos e outros que produzem suas condições materiais de existências a partir do trabalho no meio rural; e. II – escola do campo: aquela situada em área rural, conforme definida pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ou aquela situada em área urbana, desde que tenda predominantemente a populações do campo. No tocante à legislação e a realidade das escolas no espaço rural, a Lei 9394/96 destaca que o calendário deve necessariamente atender a necessidade de cada localidade a respeitar os ciclos da economia vivida, naquele contexto. Em outras palavras, é necessário estarmos atentos como a discussão posta acima, identifica os atores que dão vida e movimentam esse espaço do camponês. E para nos fazer pensar sobre essas questões ARROYO; CALDART; MOLINA (2009, p. 150 e 151), destacam que: A educação do campo se identifica pelos seus sujeitos: é preciso compreender que por trás da indicação geográfica e da frieza de dados estatísticos está uma parte do povo brasileiro que vive neste lugar e desde 17 Expressão conforme estabelecida no Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010. Dispões sobre a política e educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA. 52 as relações específicas que compõem a vida no e do campo, em suas diferentes identidades e em sua identidade comum; estão pessoas de diferentes idades, estão famílias, comunidades, organizações, movimentos sociais (...) A perspectiva da educação do campo é exatamente de educar este povo, estas pessoas que trabalham no campo, para que se articulem, se organizem e assumam a condição de sujeitos da direção de seu destino. Diante da colocação das autoras acima pergunto: Então como tem sido tratado o ensino na Educação do Campo de uma realidade do Norte do Brasil? A falar de uma professora que além de exercer suas atribuições profissionais em sala de aula, ainda tem tempo de efetivamente participar de certas ações ali efetivadas, a destacar: visita periódica na casa de seus alunos, a participação nas programações da igreja de sua comunidade bem como, em ações voluntárias beneficentes. Ações essas, que consolidam o envolvimento dela para além da escola, e, portanto, consolida sua contribuição dando contorno em sua vida e a vida de seus pares do campo, no campo. Nessa perspectiv