09/09/2020

Por: Drielle Oliveira, Flávia Oliveira, Marion Ruis e Hans Fröder

Especialistas na área de alimentos afirmam que o coronavírus é improvável de ser um risco alimentar

A Comissão Internacional de Especificações Microbiológicas de Alimentos (ICMSF) é uma organização não governamental e observadora do Codex Alimentarius (referência internacional para a solução de disputas sobre segurança alimentar e proteção do consumidor). Ela compartilhou recentemente percepções técnicas e científicas sobre o Covid-19, relevantes para profissionais dentro e ao longo da cadeia de abastecimento e governos que supervisionam a segurança alimentar. Para os cientistas da comissão, é altamente improvável que o SARS-CoV-2 seja um risco para a segurança alimentar.

A equipe técnica do ICMSF acredita que é altamente improvável que a ingestão de SARS-CoV-2 resulte em doença, pois não há evidência documentada de que o alimento seja uma fonte significativa e/ou veículo de transmissão. É vital diferenciar um perigo de um risco, ou seja, a presença de um agente infeccioso nos alimentos não significa necessariamente que ocorrerá uma infecção, apontam os especialistas.

A Organização Mundial da Saúde e a Organização para Alimentos e Agricultura publicaram em abril deste ano o Guia Covid-19, que trata sobre a segurança alimentar para empresas, e outro documento com recomendações para autoridades alimentares. Os especialistas do ICMSF disseram que o SARS-CoV-2 não deve ser considerado um perigo para a segurança alimentar, uma vez que ele entra no corpo humano com os alimentos, atravessa o trato gastrointestinal e pode infectar órgãos, tecidos, além de outras partes do corpo.

Para a garantia de segurança alimentar, o ICMSF não recomenda o teste do vírus SARS-CoV-2 em produtos acabados ou áreas ambientais de processamento de alimentos, ou seja, a amostragem e testes sistemáticos para o vírus não têm valor agregado para esses fins, principalmente em razão das incertezas e inconsistências em torno dos resultados analíticos esperados (apenas detecção de RNA).

Apesar das bilhões de refeições consumidas e embalagens de alimentos manipuladas desde o início da pandemia de Covid-19, não há nenhuma evidência de que alimentos, embalagens ou manipulação sejam uma fonte ou importante via de transmissão do vírus. No entanto, há relatos de vírus SARS-CoV-2 encontrados em ingredientes alimentícios, produtos e materiais de embalagem.

Segundo os cientistas, em muitos casos, esses relatos não são específicos sobre como o vírus foi identificado, a quantidade encontrada e se o vírus era viável e infeccioso. Como os métodos usados para identificação do vírus são principalmente baseados em genes, o que a maioria desses relatórios mostra é a presença de RNA do vírus, demonstrando que pode haver um perigo para a saúde humana. No entanto, não mostram que existe realmente um perigo, como um vírus viável, ou que há um risco para a saúde humana por meio da ingestão ou manuseio dos alimentos. Os vírus presentes nos alimentos ou embalagens perderão a viabilidade com o tempo.

Sabe-se que mundialmente o comércio de alimentos e as cadeias de abastecimento sofreram grandes interrupções devido ao impacto do Covid-19, do campo à mesa. Alguns países estão restringindo as importações de alimentos, como salmão, frango, camarão etc., testando produtos importados e/ou solicitando declarações de ausência de Covid-19. O ICMSF acredita que esses controles não são cientificamente justificados, pois não há evidências documentadas de que os alimentos sejam uma fonte e/ou veículo significativo para a transmissão de SARS-CoV-2.

A descoberta de traços genéticos de SARS-CoV-2 em alimentos pode levantar preocupações sobre a segurança, mas isso não indica um risco para a saúde pública e não deve ser a base para restringir o comércio de alimentos ou iniciar um recall, afirmam os especialistas do ICMSF. Eles destacam ainda que o SARS-CoV-2 é um risco ocupacional, que pode afetar a saúde dos funcionários e sua capacidade de trabalho. O foco para as empresas de alimentos deve ser a proteção de trabalhadores, consumidores e clientes de restaurantes, para que eles não sejam infectados pela disseminação de pessoa para pessoa.

Em empresas de alimentos, medidas eficazes podem ser melhor construídas e integradas às boas práticas de higiene e aos sistemas de gestão de segurança alimentar, como aqueles baseados em HACCP (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle), que as organizações já podem ter para garantir a higiene nas operações e a segurança do consumidor e dos produtos produzidos e manuseados. As empresas devem validar se as medidas são eficazes e verificar regularmente se são implementadas de forma adequada nas operações diárias, especialmente com a higiene e desinfecção das mãos, controle de temperatura antes e durante as atividades, entre outras. Umidade, baixas temperaturas, fluxo de ar limitado e esforço físico colaboram na disseminação do vírus de pessoa para pessoa.

Referências:

Food Safety News. Experts affirm that coronavirus is ‘highly unlikely’ to be food risk. Disponível em: https://www.foodsafetynews.com/2020/09/experts-affirm-that-coronavirus-is-highly-unlikely-to-be-food-risk. Acesso em: 15 set 2020