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Fóssil da Iratinia australis

Reprodução/Instituto de Pesquisa Senckenberg

Univates integra equipe que identificou e descreveu mais antigo exemplar de cica do mundo

Postado as 23/03/2021 09:09:59

Por Lucas George Wendt

Muito presentes nos jardins e vegetais de importância ornamental, as cicas são plantas que a maior parte das pessoas sabe identificar. No entanto, o que poucos conhecem é a história evolutiva desse gênero vegetal, que acabou de ser reescrita a partir das descobertas de uma pesquisa realizada pela Universidade do Vale do Taquari - Univates, em parceria com o Museu de História Natural Senckenberg, em Frankfurt, na Alemanha, e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs).  

Profissionais das três Instituições descreveram uma nova espécie que é também o mais antigo exemplar de Cicadales do mundo, em um recente estudo publicado no periódico Review of Palaeobotany and Palynology. O fóssil de cerca de 280 milhões de anos indica que esta ordem de plantas esteve espalhada pelo mundo muito antes do que os estudos anteriores determinaram. O estudo completo pode ser lido (em inglês) aqui

O estudante de doutorado no Instituto de Pesquisa Senckenberg e Universidade de Tübingen, Rafael Spiekermann, é o autor principal do estudo. Spiekermann é graduado em Ciências Biológicas pela Univates. A pesquisa tem contribuição do paleobotânico, professor doutor André Jasper, do Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento (PPGAD) da Univates; das doutoras Anelise Marta Siegloch e Margot Guerra-Sommer, do Instituto de Geociências da Ufrgs; e do doutor Dieter Uhl, vinculado ao Instituto de Pesquisa Senckenberg e professor do PPGAD. 

Reprodução/Review of Palaeobotany and Palynology

Fóssil da Iratinia australis

Fóssil da Iratinia australis

Iratinia australis e sua importância 

O fóssil foi encontrado na formação de Irati, no Paraná, e é daí a origem de seu nome científico, Iratinia australis. O local apresenta afloramentos fósseis de vegetais do período Permiano, que foi de 252,1 milhões a 298,9 milhões de anos. As análises situam o fóssil no Kungariano (de 279,3 milhões a 272,3 milhões de anos), uma das idades nas quais o Permiano se subdivide. “Isso é antes dos dinossauros”, observa o pesquisador. Para termos de comparação, os primeiros fósseis de dinossauros têm a idade de 233 milhões de anos. 

O fóssil é importante pois é o mais antigo registro de uma Cicadales preservada anatomicamente do Permiano do Gondwana, o supercontinente que existiu entre 550 milhões e 180 milhões de anos. Além disso, a identificação do fóssil sugere que este tipo de vegetal estava bem estabelecido enquanto espécie há 280 milhões de anos. “Na área da paleobiologia esse fóssil é muito importante, pois ele permite indicar que todo o grupo de cicas surgiu antes do que se imaginava”, explica Jasper.

A presença deste espécime no Gondwana Ocidental, na porção do paleocontinente que hoje é o Brasil, pode sugerir que durante o Cisuraliano, outra divisão cronoestratigráfica do Permiano, as cicadáceas ou seus ancestrais diretos já estavam amplamente distribuídos.

O material foi coletado na década de 1980, no estado de São Paulo, e depois foi depositado na coleção do Museu da Terra, no Rio de Janeiro, que pertence à Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), vinculado ao Ministério de Minas e Energia, e órgão executor do Serviço Geológico do Brasil (SGB). “A partir daí ele acabou sendo enviado à Ufgrs, com a qual temos parceria. Nós trabalhávamos com licófitas, na época, e essa é justamente a brincadeira que se faz com o título do artigo 'Não uma licófita, mas uma cica...'”, brinca Jasper. 

Artur Dullius

Prof. Dr. André Jasper

Prof. Dr. André Jasper

Expectativa x realidade

“Fomos com a intenção de estudar o fóssil e descobrimos uma coisa completamente diferente”, revela o pesquisador. O espécime foi inicialmente interpretado como uma licófita - outra ordem de plantas -, no entanto o seu conjunto de características morfológicas e anatômicas preservadas indicou aos pesquisadores que o exemplar possuía, na verdade, uma afinidade sistemática maior com as Cicadales, ordem de plantas que produzem sementes e à qual pertence as cicas. 

Hebert Santos/Pexels

Cica

Cica

Montando um quebra-cabeças de milhões de anos 

Um dos maiores desafios do campo de estudo do professor André Jasper é preencher todas as lacunas da paleontologia evolutiva. “Como esse grupo, as cicas, é um muito antigo, acompanhamos essas plantas para ver como elas se comportam em termos paleoambientais a partir do registro fóssil”. 

O estudo tem implicações filogenéticas, ou seja, vai impactar os cladogramas - diagramas que demonstram as relações entre organismos - pois situa as cicas milhões de anos antes do que os estudos prévias fizeram. “Esse fóssil tem a capacidade de alterar a compreensão das relações evolutivas entre os organismos vegetais”. A partir da descoberta, surgem novas perguntas e novas possibilidades de interpretação em relação à história evolutiva dessas plantas. “Como aconteceu a sua migração?”, “Elas surgiram em Gondwana e se espalharam para outros lugares?”, são algumas delas.

O estudo está agora à disposição da comunidade científica. A caracterização taxonômica do espécime é extremamente importante para outros pesquisadores que estejam interessados em estudar as Cicadales por permitir a comparação da descrição quando outros estudiosos estiverem analisando novos fósseis. “Se alguém realizar uma diagnose em outro fóssil e encontrar as mesmas características que encontramos na Iratinia, vai ser a mesma espécie ou gênero”. 

Outros espécies descritas

O PPGAD da Univates tem desenvolvido diversos trabalhos na área da paleobotânica, com coordenação do professor Jasper. A pesquisa nasce no Laboratório de Paleobotânica e Evolução de Biomas, vinculado ao Museu de Ciências. O amplo trabalho na área da paleobotânica culmina com uma produção científica crescente. A Iratinia australis se soma a outras três espécies já descritas pela equipe do Laboratório: Coricladus quiteriensis, Hepaticites iporangae e Lycopodites riograndensis, todas encontradas na Formação de Rio Bonito. 

Fomento 

A pesquisa tem fomento brasileiro e alemão por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD) e Alexander von Humboldt Foundation

Reprodução/Instituto de Pesquisa Senckenberg