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As faces da Copa do Mundo no Brasil

Por Nathália Braga

Postado em 08/07/2014


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O evento esportivo com maior potencial de união entre os habitantes de uma mesma nação chega ao Brasil. Desde o último dia 12 de junho, 12 cidades brasileiras sediaram jogos das seleções de futebol participantes da Copa do Mundo 2014 e acolhem milhões de torcedores conterrâneos e estrangeiros.

A Fifa anunciou o país como sede do campeonato em 2007, escolha que foi alvo de críticas e aplausos. Foram sete anos para realizar reformas em aeroportos, rodoviárias, sistema de trânsito, hotéis, restaurantes, e para reestruturar passeios turísticos e locais de lazer, entre outras carências constatadas no país. Mesmo com o tempo destinado às obras, a Copa iniciou com inúmeras construções inacabadas ou não concretizadas.

As exigências da Fifa para realização do torneio forçaram o governo a aplicar recursos financeiros em mobilidade e segurança, melhorias que, após o encerramento da Copa, serão usufruídas pelos habitantes do país. Em contrapartida, diversas famílias precisaram procurar novas moradias, após serem desalojadas para oferecer mais espaço às ampliações viárias e aeroportuárias. Curitiba é exemplo disso. Habitantes de áreas irregulares foram retirados dos terrenos e tiveram de encontrar novos locais para residir.

Outro ponto positivo diz respeito à visibilidade que o evento proporciona ao Brasil e à cultura local, de forma a atrair turistas de todas as partes do mundo. Com isso, empresários investem em reformas nos negócios, contratam mais funcionários e a economia se fortalece. Como consequência, os serviços têm seus preços inflacionados, atingindo até mesmo quem não pretende assistir aos jogos do mundial.
O sistema de telecomunicações também recebe melhorias, principalmente internet e celulares, visando a atender a alta demanda durante os dias do evento. A modificação permanece mesmo após a Copa do Mundo, quando a população brasileira deverá ter a seu dispor melhores serviços de conectividades virtuais.

Ainda assim, o valor destinado às obras públicas ? mais de R$ 25 bilhões ? despertou questionamentos e foi motivo de protestos, iniciados ainda em 2013. Revoltada, a população que foi às ruas retomou os atos a poucos dias da abertura oficial da Copa do Mundo. Os manifestantes defendem que o grande montante de dinheiro público investido num evento esportivo, que ocorre por um mês, poderia ser direcionado às áreas de saúde e educação.

Outro questionamento dos protestantes é o custo-benefício da construção de parte dos estádios. Em algumas regiões do país, eles poderão ser subutilizados após o mundial. Casos assim foram registrados na África do Sul, sede da Copa do Mundo em 2010. Construído a R$ 1 bilhão, o estádio de Green Point, na Cidade do Cabo, permanece vazio e em desuso por quase todo o ano e custa R$ 10 milhões anuais aos cofres públicos, devido à manutenção. Em Durban, o gigante Mosses Mabhida é ocupado por feiras, shows e pulos de bungee jump, uma vez que não atrai público suficiente com o futebol do time local, AmaZulu.

Na cidade de Porto Elizabeth, a realidade é semelhante. Menos de 20 jogos ocorreram no estádio Nelson Mandela Bay desde o fim da última Copa do Mundo. A administração do local vende a estrutura como salão para festas de casamento e já recebeu cerca de 60 eventos privados em quatro anos.

Em meio à época de jogos das seleções de futebol, cabe a nós, espectadores, aguardar o desfecho deste grande evento que ficará para sempre marcado na história do Brasil.

Saúde em jogo
A vinda de estrangeiros de diversos continentes para a Copa do Mundo também traz riscos para a saúde. Conforme a bióloga da Univates e doutoranda em Ciências Veterinárias ? Epidemiologia, Saneamento e Profilaxia pela Ufrgs, Mônica Jachetti Maciel, se por um lado os brasileiros estão contentes com o evento, por outro existe a preocupação das autoridades sanitárias em evitar a transmissão de doenças importadas, provenientes de outros países. ?Conterrâneos e estrangeiros transitarão por rodoviárias, aeroportos e estádios, aumentando o risco de contágio de doenças transmitidas por aproximação humana, como gripe e sarampo, e por mosquitos, como febre amarela e dengue?, afirma.

Para se prevenir, tanto brasileiros como estrangeiros devem manter medidas básicas de higiene, como lavar as mãos com água e sabão ? em especial antes de ingerir alimentos ?, após utilizar transporte público e visitar lugares com grande fluxo de pessoas. ?Utilizar álcool gel e cobrir a face ao tossir fazem diferença?, reforça.

O consumo de alimentos e bebidas em más condições também favorece a contaminação. Segundo Mônica, deve-se beber somente água engarrafada, evitar gelo nas bebidas e alimentos vendidos pelos ambulantes, além de consumir alimentos bem cozidos. ?Dessa forma, se evita a contaminação de doenças veiculadas por alimentos e água, como hepatite A, febre tifoide, giardíase e diarreia do viajante?, afirma.

A especialista lembra ainda que utilizar repelentes e roupas com proteção previne doenças transmitidas por mosquitos. Além disso, reforça que o uso de preservativos garante a saúde sexual.

Impactos sociais
Do ponto de vista sociológico, o período de preparação para os jogos da Copa do Mundo foi marcado por atrasos nas obras, falta de planejamento, superfaturamento, deslocamentos populacionais forçados, mortes de trabalhadores em construções de estádios e protestos nas ruas. É isso o que afirma o professor doutor e coordenador da Área de Humanidades do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Univates, Daniel Granada. Ele defende que poderiam existir pontos positivos se estivessem concretizadas as obras de infraestrutura, melhoria urbana nas grandes cidades e reformas nos aeroportos. Porém, aponta que parte dos projetos sequer saiu do papel, enquanto outros estão inacabados.

Segundo o doutor, outro ponto que poderia ser positivo para o país é a visibilidade internacional proporcionada pelo evento a fim de atrair turistas para o Brasil. Entretanto, destaca, nada saiu como o esperado. ?A imagem do Brasil divulgada na imprensa estrangeira ressalta os atrasos nas obras, a violência nas cidades e as manifestações de rua que ainda ocorrem nas capitais do país.?

Deste modo, Granada considera que as potencialidades se transformam em problemas que exteriorizam dificuldades de organização e planejamento. Em relação ao superfaturamento, o professor refere-se a uma reportagem veiculada em março deste ano, num jornal de São Paulo, na qual consta a informação de superfaturamento de 263% do valor final das obras no período de seis anos.  ?Cabe a reflexão de que, talvez, a realização deste evento apenas evidencie problemas já conhecidos de nós brasileiros. Quem sabe o maior legado que este evento pode deixar para o país seja o desejo de estender o padrão de excelência internacional de nossos novos estádios de futebol para outras áreas de maior relevância para a nossa população.?

Vitrina para o mundo
A doutoranda em Estudos Estratégicos Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e gerente da Assessoria para Assuntos Interinstitucionais e Internacionais da Univates, Viviane Bischoff explana que os problemas do Brasil são conhecidos amplamente no exterior, muito antes dos acontecimentos acerca da Copa do Mundo. Ela partilha da opinião de Daniel Granada ao observar que a desorganização com os preparativos para o evento, especialmente no que diz respeito à infraestrutura, prejudicou a imagem do país perante outras nações.

Mesmo assim, a doutoranda considera o campeonato uma vitrina para o mundo. Ela aponta que todas as atenções estarão voltadas ao Brasil, e os acontecimentos serão comentados e analisados tanto por brasileiros quanto por estrangeiros. Para tentar melhorar a imagem do país, na opinião de Viviane, a Copa não é o momento mais oportuno para revolta, mas sim para deixar de lado as questões políticas e ser patriota. ?Vamos receber nossos visitantes e tratá-los bem. Depois da Copa, ordenadamente pode-se protestar e reivindicar aquilo que se julga ser de direito e de dever?, defende.

Para bem recepcionar os estrangeiros, a doutoranda avalia ser necessário ordem, gentileza, solidariedade e amor à Pátria. ?Lembrando que Pátria não é governo, pois ela perpassa qualquer ideologia política. A alegria do brasileiro pode deixar nossa Copa na história, nossa marca registrada no exterior. É isso que ficará marcado nos visitantes estrangeiros?, acredita.

A história da Copa
Bolsista de Iniciação Científica e graduando em História pela Univates, Moisés Blum Vedoy conta que o rápido desenvolvimento do futebol no início do século XX motivou a competição em nível mundial. A iniciativa partiu do francês Jules Rimmet, antigo presidente da FIFA, que rompeu com a federação Olímpica e projetou a primeira Copa do Mundo de seleções para 1930. A sede escolhida foi o Uruguai. ?Foi uma alternativa sensata, pois a Europa ainda sofria os impactos da Primeira Guerra Mundial?, comenta Vedoy.

Na primeira Copa do Mundo, equipes europeias precisaram driblar dificuldades financeiras para transpor o Atlântico de navio e se manter no Uruguai durante um mês. A competição contou com 13 times. O Uruguai venceu a Argentina por 4 a 2, consagrando-se a primeira seleção campeã do mundo.

Desde então, com exceção do período da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a cada quatro anos o mundo se volta para o futebol. O Brasil agora busca o hexacampeonato, inserido numa Copa que se tornou um megaevento. O estudante explica que isso ocorreu devido à globalização, no fim do século XX. ?Os jogadores se transformaram em vitrinas para os produtos das grandes marcas.? 

O Brasil e a Copa de 70
Durante a ditadura, em 1970, quando o Brasil vivia o clima tenso de repressão, o presidente Médici usou a visibilidade do time. O lema ?Pra Frente Brasil? e a veiculação da imagem do presidente junto à equipe teve como objetivo ligar o governo ao triunfo da seleção brasileira.

Conforme Vedoy, ditaduras e democracias, de esquerda ou direita, usaram o futebol, principalmente em ano de Copa do Mundo. ?Como disse o escritor uruguaio Eduardo Galeano, 'o futebol não tem culpa dos pecados cometidos em seu nome'?, ressalta. Para o estudante, é preciso acompanhar o evento com olhar crítico, para buscar entender o mundo atual.

Texto: Nathália Braga

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