Aos 32 anos, o poeta e escritor Vinícius Knecht, natural de Estrela (RS), vive um momento de transição e amadurecimento literário. Atualmente cursando o segundo ano da Licenciatura em Letras Português na Universidade do Vale do Taquari – Univates, ele reflete sobre como a formação acadêmica vem influenciando sua prática criativa, ao mesmo tempo em que se mantém fiel a uma escrita marcada por inquietações estéticas e existenciais.
Autor do livro Amarelando blue, contemplado por um edital cultural e publicado em edição limitada de 300 exemplares, Knecht resiste ao rótulo de “escritor acadêmico”. Prefere, em suas palavras, cultivar uma voz poética “rouca”, resultado de mais de uma década escrevendo compulsiva e obsessivamente, quase todos os dias, desde os 18 anos. “Amadurecer em um estilo não significa escrever melhor, mas resistir. Continuar poeta aos 21, 25, 27, 30, 32 anos. A arte em ritual e resistência já é amadurecimento”, afirma.
Uma voz poética que nasceu da insistência
Apesar de ainda estar em formação universitária, Knecht já possui uma trajetória marcada pela insistência na literatura como prática diária e como forma de enfrentamento. Ele não esconde uma certa desconfiança diante da influência da academia sobre a sua escrita, mas reconhece que a experiência universitária começa a abrir novas perspectivas.
“Sou um escritor que escreve compulsiva e obsessivamente meio que todos os dias desde os 18 anos. Ainda em formação, acredito que meu estilo amadurece nas diferentes tentativas de ser o mais original e autêntico possível. Provocando, debochando do ‘contemporâneo’, sofrendo, amando, fazendo da literatura o que bem entendo (ou não entendo).”
A concepção de amadurecimento que ele defende não está ligada a uma ideia de “escrever melhor”, mas a permanecer no ofício, a continuar criando, mesmo em meio às dificuldades e incertezas. “Resistir já é amadurecer”, resume.
O impacto da academia: entre resistência e descobertas
Embora Amarelando blue tenha sido escrito antes de ingressar no curso de Letras, Knecht admite que as disciplinas já começam a influenciar suas escolhas estéticas. Um exemplo é sua recente aproximação com a prosa, especialmente contos e crônicas, algo que considera resultado do contato com novos repertórios oferecidos na graduação.
O escritor cita com entusiasmo o impacto de ter lido, pela primeira vez, Machado de Assis durante uma disciplina. “Só agora, graças a uma disciplina, estou lendo e estudando Machado de Assis pela primeira vez. Estudante de Letras nunca ter lido Machado talvez devesse constar em algum Código Penal de uma lei literária ou de um dicionário imaginário”, brinca.
Esse contato com clássicos brasileiros representa, para ele, um reencontro com tradições literárias que, paradoxalmente, podem ser as verdadeiras fontes de novidade no presente. “Às vezes, a novidade está em trazer o passado de volta”, observa.
Teoria, crítica e criação, um diálogo indireto
Se por um lado o poeta confessa que a pesquisa acadêmica não lhe “dá versos”, por outro admite que a teoria literária e a crítica despertam emoções, questionamentos e dúvidas fundamentais para a escrita. “O estudo em Letras não ensina a escrever poemas ou ficção. Não existe poema racional. Mas a teoria literária, a crítica e todo o universo do curso oferecem instrumentos, repertório, referências, questionamentos e, principalmente, dúvidas. Talvez as dúvidas sejam o essencial”, reflete.
Ele também reconhece que a formação em Letras traz consciência sobre a escrita como um ato político, cultural e histórico, o que reforça o caráter de resistência presente em sua obra. “Enche-me de esperança e sorrisos saber que uma estudante de Letras, como Sally Rooney, foi capaz de escrever tanta coisa foda ainda durante a graduação. Acredito que, aqui no Brasil, esse movimento também tende a revelar vozes semelhantes”, projeta.
Identidade, cultura e linguagem como rituais
Na visão de Knecht, a arte precisa recuperar seu caráter ritualístico, em uma sociedade que muitas vezes a relega a um espaço marginal. “Acredito que a arte voltará a ser ritual. Aposto na educação, na cultura e nos livros”, declara.
Em Amarelando blue, a presença de elementos identitários e culturais se mistura a uma linguagem provocadora, que busca impactar e questionar. Ele lembra de um verso em que escreveu: “Por que existem tantas pedras nos trilhos de trans?”. Segundo o autor, o efeito poético da palavra “trans” foi intencional, mas ele teme que muitos leitores interpretem como erro tipográfico de “trens”.
Essa tensão entre linguagem e interpretação revela o lugar político da escrita. “Me assusta a possibilidade de alguém interpretar meu poema da pior forma. Me incomoda que poucos leiam meus poemas de protesto. Me estranha que tantos ainda não percebam que a arte é uma necessidade básica e a escrita é um ato político”. Na sua visão, a identidade, a cultura e a linguagem em sua obra funcionam como nos filmes de Quentin Tarantino: uma mistura de referências, exageros e transformações que produzem algo novo a partir do caótico.
