Pesquisa

Estudante de Design cria cafeteira artesanal que transforma o preparo de café em experiência sensorial

Por Lucas George Wendt

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Postado em: 23/12/2025, 09:45:00

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A estudante Sarah Casagrande, do curso de Design da Universidade do Vale do Taquari - Univates, desenvolveu um artefato inovador para o preparo de café. O projeto, intitulado "Entre Aroma e Forma: Criação de um Artefato para Extração de Café", foi apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e aprovado por uma banca examinadora composta pela orientadora Prof. Me. Raquel Barcelos de Souza, pela Prof. Dra. Renata Lohmann e pelo Prof. Me. Rodrigo de Azambuja Brod, em julho de 2025.

A cafeteira, nomeada "Gema", é uma homenagem à avó materna da autora, que a introduziu ao universo dos cafés. O artefato alia praticidade, estética diferenciada e experiência sensorial, respondendo a um contexto contemporâneo marcado pela falta de tempo, mas sem abrir mão da qualidade e do prazer no preparo da bebida.

O problema que inspirou a solução

O ponto de partida do projeto foi a seguinte questão: como transformar a experiência sensorial e estética do preparo de café, incorporando inovações que atendam às demandas contemporâneas de praticidade e sustentabilidade? Sarah Casagrande, que também atua como barista, identificou um dilema crescente na vida moderna: o cotidiano acelerado faz com que rituais antes apreciados, como o preparo cuidadoso do café, sejam substituídos por soluções instantâneas e menos envolventes.

"O objetivo principal foi criar um produto que conseguisse unir funcionalidade, estética, emoção e sustentabilidade, redefinindo a experiência do preparo de café de maneira inovadora e compatível com a realidade das pessoas nos dias atuais", explica a designer.

Metodologia rigorosa guia o desenvolvimento

O projeto foi desenvolvido seguindo a metodologia de Bruno Munari (1981), amplamente reconhecida no campo do design. Esta abordagem divide o processo em duas grandes fases: problematização e hipóteses, seguida pela prática. Dentro dessas etapas, diversas subdivisões ajudaram a compreender e conduzir a solução do problema de forma sistemática.

A metodologia de Munari orienta o designer a decompor o problema em componentes menores, analisá-los individualmente e, posteriormente, reintegrá-los em uma solução coerente. No caso deste projeto, os componentes identificados incluíram: funcionalidade principal do artefato, exploração dos sentidos e experiência do usuário, transformação do ato de preparar café, estética com design atrativo e harmonioso, praticidade no uso diário, sustentabilidade na economia de recursos e alinhamento com o contexto contemporâneo.

Além da abordagem de Munari, o projeto fundamentou-se na teoria do design emocional de Donald Norman (2004), que defende que os produtos devem estabelecer conexões afetivas com os usuários, transcendendo a mera função prática. Norman propõe três níveis do design: o prático (funcionalidade), o estético (aparência) e o simbólico (significado emocional). A cafeteira Gema foi concebida para atender a esses três níveis de forma equilibrada.

Esboço elaborado pela estudante

Esboço elaborado pela estudante

Divulgação

Pesquisa científica embasa decisões de projeto

Na fase de coleta de dados, a pesquisadora analisou detalhadamente dois métodos de preparo de café: a pré-infusão e o uso de filtros metálicos. Para isso, baseou-se em resenhas técnicas do barista Gabriel Guimarães, da Unique Cafés, que realizou experimentos controlados para avaliar o impacto dessas variáveis no resultado final da bebida.

O primeiro estudo analisado testou três diferentes tempos de pré-infusão: 40 segundos, 1 minuto e 2 minutos. Os resultados revelaram transformações nos atributos gustativos da bebida. Com 40 segundos de pré-infusão, o café apresentou perfil equilibrado, com notas de caramelo tostado, acidez equilibrada e corpo leve. Com 1 minuto, a intensidade elevou-se, o amargor tornou-se perceptível e surgiram notas de chocolate meio amargo. Já com 2 minutos, o perfil foi completamente transformado, resultando em um café encorpado, robusto, com acidez quase nula e notas frutadas.

Quanto aos filtros metálicos, a análise apontou vantagens significativas em relação aos filtros de papel tradicionais. Os filtros de metal apresentam maior durabilidade, não geram resíduos descartáveis, permitem a passagem dos óleos naturais do café (resultando em bebida mais encorpada e saborosa), proporcionam economia a longo prazo e oferecem maior versatilidade no preparo. Além disso, são fáceis de limpar e reutilizar, tornando-se uma escolha mais sustentável e alinhada com o consumo consciente.

Design inovador e escolha criteriosa de materiais

O artefato final elaborado por Sarah possui 31 centímetros de altura e 6,5 centímetros de diâmetro, composto por três módulos principais que se complementam funcionalmente. A parte inferior, com 16 centímetros de altura, serve como reservatório da bebida extraída e pode ser utilizada diretamente como recipiente para consumo, permitindo ajustes de sabor através da adição de mais água.

A parte central, com 5 centímetros de altura, foi produzida em madeira reflorestada e abriga o sistema de filtragem. Esta seção é dividida em duas partes que se conectam por meio de ímãs de neodímio de 3mm x 2mm, permitindo acesso fácil ao filtro metálico microperfurado de 61mm de diâmetro para limpeza e manutenção. A madeira recebeu tratamento com óleo mineral atóxico, conferindo proteção, realce dos veios naturais e maior resistência à umidade.

A parte superior, com 10 centímetros de altura, é onde se coloca o café moído e a água quente para a pré-infusão. Após este processo, a cafeteira é rotacionada 180 graus, e a bebida é extraída por meio da gravidade, atravessando o filtro metálico até chegar ao reservatório inferior.

A escolha dos materiais seguiu critérios rigorosos de sustentabilidade, durabilidade e funcionalidade. Para as partes externas, optou-se por acrílico de parede dupla de 3mm de espessura, que oferece excelente isolamento térmico, permitindo manusear o equipamento com segurança mesmo quando a bebida está em alta temperatura. O acrílico também foi escolhido por ser mais leve e menos frágil que vidro ou cerâmica, além de ser reciclável e permitir precisão na fabricação.

A madeira reflorestada foi selecionada não apenas por suas propriedades físicas, mas também por seu apelo estético e sensorial, transmitindo uma imagem de produto cuidado, artesanal e conectado à natureza. O filtro metálico microperfurado, por sua vez, mostrou-se extremamente eficiente na retenção de partículas, impedindo que resíduos sólidos atingissem a bebida final, ao mesmo tempo em que permite a passagem dos óleos essenciais responsáveis por grande parte da experiência sensorial do café.

Render do artefato

Render do artefato

Divulgação

Processo de prototipagem e validação

Para a fabricação do protótipo, foi utilizada a tecnologia de impressão 3D do tipo FDM (Fused Deposition Modeling), permitindo a construção de geometrias complexas com custo-benefício. Foram utilizados dois tipos de filamentos: PLA Premium na cor marrom, para partes que exigiam maior resistência mecânica e acabamento refinado, e PLA reforçado com grafeno nas demais partes, material que proporciona aumento de até 9,88% na resistência à tração e incremento de 10,31% no módulo de elasticidade.

A fase de verificação revelou resultados promissores. O artefato demonstrou capacidade de extração de aproximadamente 350ml de café, volume suficiente para mais de uma porção individual. O filtro metálico mostrou alta eficiência na retenção de partículas, resultando em uma bebida limpa e com textura agradável. As camadas duplas de acrílico proporcionaram excelente isolamento térmico, garantindo segurança e conforto durante o manuseio.

Do ponto de vista sensorial, a autora, como profissional da área, notou diferenças entre o café extraído com o novo artefato e aqueles preparados em métodos convencionais. O sistema de pré-infusão mostrou-se altamente eficaz para ressaltar os compostos aromáticos e destacar as notas sensoriais da bebida. A possibilidade de realizar todo o processo com um único equipamento trouxe vantagens em termos de praticidade e economia de tempo.

Três níveis de experiência integrados

O projeto atende de forma equilibrada aos três níveis fundamentais do design de produtos propostos por Norman. No aspecto prático, a montagem simples e o sistema de extração por gravidade permitem utilização intuitiva e rápida, reduzindo etapas e eliminando a necessidade de múltiplos utensílios. A moagem recomendada é a média-fina, mas o equipamento apresenta boa versatilidade, acomodando diferentes granulometrias.

No nível estético, a combinação entre acrílico transparente e madeira natural cria um contraste visual que remete ao equilíbrio entre tecnologia e natureza. As formas cilíndricas, os acabamentos manuais e o cuidado com as texturas reforçam a identidade visual do produto, tornando o processo de preparo também um momento de apreciação visual e tátil.

No campo simbólico, o artefato representa a reconexão do usuário com o ritual de preparar café de forma mais consciente e personalizada. A escolha da madeira reforça a relação com o artesanal e o natural, transmitindo a sensação de participação em um processo mais humano e menos industrial. A possibilidade de personalizar o preparo amplia a conexão emocional, permitindo que cada preparo seja uma experiência.
 

Protótipo

Protótipo

Divulgação

Perspectivas futuras e contribuições

O trabalho abre portas para futuras explorações dentro do design de produtos voltados ao universo do café, como o desenvolvimento de novas variações do equipamento, melhorias no sistema de montagem e adaptações para produções em maior escala. A pesquisadora identificou alguns pontos de melhoria, como o reforço do sistema magnético de junção das partes centrais e ajustes no sistema de rosqueamento para maior estabilidade durante o manuseio.

O projeto também pode servir como base para estudos futuros relacionados ao design emocional, ao comportamento do consumidor e à experiência do usuário com objetos do cotidiano. Sarah Casagrande reconhece que ainda há muito espaço para inovação e aprimoramento dentro desse segmento, e espera que este trabalho possa inspirar outras pesquisas e projetos que valorizem a experiência sensorial e a conexão emocional por meio do design.

Sarah Casagrande

Sarah Casagrande

Divulgação/Acervo pessoal

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