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Comportamento ou conhecimento?

Postado as 08/05/2019 15:33:18

Por Ney José Lazzari

Elise Bozzetto

O reitor da Univates, Ney José Lazzari, que está em licença sabática na Espanha, escreve colunas contando suas vivências na Universidade de Málaga. Confira:

Assisti, recentemente, na Universidade de Málaga, a um fórum sobre que tipo de servidores estão sendo procurados para fazer parte dos quadros profissionais dos diversos organismos da União Europeia (UE).

 

A UE conta hoje com 28 países membros, uma população de mais de 500 milhões de habitantes, mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial e um conjunto de 24 línguas oficiais. Órgãos da UE, como o Banco Central Europeu, o Parlamento Europeu (com 751 membros) e o Tribunal de Justiça, definem grande parte da vida e do dia a dia dos europeus: desde cotas na produção agrícola e diretrizes básicas dos orçamentos dos países membros até a política fiscal e monetária. Talvez um dos pilares mais visíveis dessa unidade seja a política monetária única, que dá a necessária unidade econômica para, por exemplo, garantir uma só moeda, o Euro.

 

Só o fato de poder circular por toda a Europa sem barreiras alfandegárias ou de imigração e utilizando a mesma moeda já é algo espetacular. Toda a máquina da burocracia da UE é tocada por aproximadamente 40.000 servidores, com mais de 1.500 novos contratados por ano. Com tantas línguas, tantas peculiaridades e especificidades, como se dá a contratação dessas pessoas? Qual o perfil das pessoas que a UE quer como seus servidores?

 

Uma agência específica da UE chamada European Personnel Selection Office (EPSO) tem como única finalidade selecionar os quadros para a própria organização e tem se mostrado uma “máquina de selecionar”. A grande questão que essa agência levanta é como encontrar as pessoas com o perfil comportamental condizente com os princípios igualitários da UE. Não há cotas por país, por raça, por sexo, por etnia nem para pessoas com deficiência. Diversidade e igualdade é o lema.

 

Para concorrer a uma vaga na UE, o candidato deve conhecer, e bem, duas línguas dentre as 24 consideradas oficiais, ter curso superior e passar por um exaustivo processo seletivo. Não há peso diferenciado para essa ou aquela língua, e o curso superior pode ser em qualquer área do conhecimento.

 

A primeira parte do processo seletivo, na qual há mais de 40.000 candidatos por ano, consiste num concurso geral de testes pela internet, que inclui testes psicométricos de aptidão e capacidade. Os candidatos que passam nesses testes são convidados para um centro de avaliação, no qual, durante dois ou três dias, têm de fazer uma série de exercícios relacionados a situações de trabalho, num contexto de grupo, perante pelo menos dois avaliadores.

 

Como apontado no site da própria agência, algumas competências são consideradas necessárias para trabalhar nas instituições europeias: análise e resolução de problemas, comunicação, aprendizagem e desenvolvimento pessoal, estabelecimento de prioridades e organização, resiliência e adaptação, espírito de equipe e capacidade de liderança. Não há nenhuma prova de conhecimentos gerais ou específicos, nenhuma exigência de experiência profissional anterior: o que interessa é o comportamento. Se alguém não tiver um conhecimento específico na área do direito, da engenharia ou da saúde, sempre é possível aprendê-lo. Entretanto, alguém que não tem  comportamento ético, não sabe trabalhar em equipe ou não sabe como se portar num conflito com seus colegas ou com seu chefe não vai aprender isso no curto prazo.

 

Ninguém quer trabalhar com quem não tem comportamento ético ou não respeita ou não sabe como se portar numa situação inesperada. Valores e atitudes são essenciais nesse processo. De nada adianta ter um profundo conhecimento da área jurídica ou de engenharia e ser um “analfabeto social”. Assim, ter participado de intercâmbio, ter feito trabalho voluntário, ser sócio de entidades e associações pesam muito nas entrevistas do processo seletivo.

 

A questão é “que tipo de pessoa você quer trabalhando com você?”, e não “que conhecimentos devem ter as pessoas que vão trabalhar com você?”. Essa preocupação da UE com o perfil dos seus servidores é a mesma que permeia praticamente todas as empresas na atualidade, sejam elas nascentes startups ou consolidadas multinacionais.

 

Parafraseando a fala de um dos painelistas do fórum: no passado a pessoa era contratada pelo que constava na sua página no LinkedIn e poderia vir a ser demitida pelas suas demonstrações de comportamento, muito presentes nas manifestações no Facebook - contratada pelo LinkedIn e demitida pelo Facebook. Hoje normalmente a pessoa é contratada e demitida pelo seu comportamento.

 

Ney José Lazzari

 

Reitor da Univates em licença sabática. Saiba mais aqui.

 

Universidade de Málaga